DESASTRES NATURAIS NA CIDADE DO SALVADOR, BAHIA: EVENTO CHUVOSO EXTREMO EM JUNHO DE 2006 Maria Regina da Silva Aragão 1, Aldinete Bezerra Barreto 2, Heráclio Alves de Araújo 3, Magaly de Fatima Correia 1 RESUMO Este trabalho apresenta um diagnóstico preliminar do evento chuvoso extremo ocorrido na cidade do Salvador, Bahia, com início na tarde do dia 11 de junho de 2006. As análises se fundamentam em dados fornecidos pela Secretaria de Recursos Hídricos (SRH) do Estado da Bahia e em informações disponíveis nas páginas da Defesa Civil (CODESAL) do Salvador, INMET, CPTEC e University of Dundee. O evento se destacou com totais pluviométricos elevados que causaram grandes transtornos em toda a cidade; valores acima de 80 mm foram registrados em quatro estações meteorológicas na manhã do dia 12. O período de chuvas mais intensas ocorreu na madrugada desse dia; cerca de 55 mm de chuva caída num período de 6 horas foram registrados pela estação automática da SRH. O evento esteve associado a um cavado formado na baixa-média troposfera que penetrou no Nordeste vindo de leste. O desenvolvimento e organização da convecção profunda é visto em imagens de satélite a partir das 00 UTC do dia 11, na área oceânica próximo ao Nordeste, do Rio Grande do Norte a Bahia. ABSTRACT This work presents a preliminary diagnosis of an extreme rain event that occurred in the city of Salvador, Bahia, starting in the afternoon of 11 June 2006. The analyzes are based upon data provided by the Secretaria de Recursos Hídricos of Bahia State and information available at the web sites of Defesa Civil (CODESAL) of Salvador, INMET, CPTEC and University of Dundee. High 24-hour rainfall totals caused many problems in the city; values above 80 mm were registered in the morning of June 12 at four meteorological stations. Rainfall was more intense in early morning, when about 55 mm of rain fell in a period of 6 hours, as registered by the SRH automatic platform. This event was associated with a trough formed in the lower-middle troposphere that entered the Northeast from the east. The development and mesoscale organization of deep convection are seen in satellite images starting at 00 UTC on June 11, close to the Northeast eastern coast, from Rio Grande do Norte to Bahia. 1 Profa. Dra., Unidade Acadêmica de Ciências Atmosf./UFCG, Campina Grande-PB, e-mail: regina@dca.ufcg.edu.br 2 Profa., Esc. Est. de Ens. Fund. e Méd. Monsenhor Amâncio Ramalho, Parelhas-RN, e-mail: abbanastacio@yahoo.com 3 Meteorologista, Secretaria de Recursos Hídricos do Estado da Bahia, Salvador-BA, e-mail: heraclio@srh.ba.gov.br
Palavras-chave: distúrbio de leste, chuva intensa, mesoescala INTRODUÇÃO Uma combinação de fatores naturais e antrópicos torna os centros urbanos localizados nos trópicos particularmente vulneráveis à variabilidade climática. Em particular, as características geomorfológicas, a variedade de sistemas meteorológicos causadores de chuvas intensas e persistentes, o grande contingente populacional de baixa renda vivendo em áreas de risco, etc., faz com que a cidade do Salvador, Bahia, registre um número elevado de desastres naturais que se concentram, em média, no período de março a julho, época chuvosa na região. Este trabalho enfoca o último episódio de chuva intensa registrado no Relatório Final da Operação Chuva 2006 da Defesa Civil (CODESAL) da Prefeitura Municipal do Salvador que culminou com a decretação de situação de emergência na cidade no dia 13 de junho de 2006. DADOS E METODOLOGIA Neste estudo foram utilizados dados de precipitação coletados em quatro estações meteorológicas instaladas na cidade do Salvador (Fig. 1): INMET, SRH-PCD, ATERRO CENTRO E ATERRO CANABRAVA. Também foram utilizadas informações disponíveis nas páginas da Defesa Civil (CODESAL) do Salvador, INMET, CPTEC e University of Dundee. Figura 1 Localização das quatro estações meteorológicas com dados de precipitação na cidade do Salvador, Bahia. As estações (estrelas vermelhas) são: INMET, ATERRO CANABRAVA, SRH- PCD e ATERRO CENTRO. (Fonte do mapa: http://www.defesacivil.salvador.ba.gov.br) RESULTADOS E DISCUSSÃO O Relatório Final da Operação Chuva 2006 da Defesa Civil (CODESAL) da Prefeitura Municipal do Salvador registra cinco episódios de chuva intensa no período da operação, entre 1 de
abril e 31 de julho de 2006. No último episódio registrado, 12 a 14 de junho, o dia 12 se destaca pela intensidade e volume das chuvas observadas nas quatro estações meteorológicas existentes na cidade. A Figura 2 mostra que totais diários acima de 80 mm foram registrados na manhã desse dia nas quatro estações, sendo que o valor de 95,4 mm da estação do INMET representa 38% da normal do mês, que é 251,0 mm (DNMET, 1992). Além disso, o gráfico da precipitação acumulada registrada pela estação automática da SRH (total diário de 89,0 mm) visto na Figura 3 ilustra que a chuva começou fraca nesse local às 15 UTC do dia 11, aumentando gradualmente de intensidade até um máximo entre 9 e 12 UTC do dia 12, quando cessa temporariamente a precipitação. PRECIPITAÇÃO (mm) 140 130 120 110 100 90 80 70 60 50 40 30 20 10 0 JUNHO DE 2006 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 DIA INMET SRH-PCD Aterro Canabrava Aterro Centro Figura 2 Totais diários de precipitação (mm) para o mês de junho de 2006 nas quatro estações meteorológicas representadas na Figura 1. (Fonte dos dados: Secretaria de Recursos Hídricos (SRH) do Estado da Bahia) Figura 3 Precipitação acumulada (mm) registrada pela estação automática da SRH no período de 12 UTC do dia 10 às 12 UTC do dia 13 de junho de 2006. (Fonte do gráfico: hppt://www.cptec.inpe.br)
O desenvolvimento desse evento extremo de chuva pode ser acompanhado através de imagens do satélite GOES-E obtidas com intervalo de 3 horas. A imagem para o dia 11 às 00 UTC (Fig. 4a) mostra as primeiras células de convecção inseridas numa área de nuvens menos profundas. O desenvolvimento da convecção prossegue ao longo do dia, até cobrir grande extensão da área oceânica a leste do Nordeste, às 00 UTC do dia 12 (Fig. 4b). Nesse horário, as áreas de convecção profunda são vistas ainda sobre o oceano. Nas 12 horas seguintes, elementos convectivos de mesoescala afetam a área litorânea (Fig. 4c-f) conforme também indica o gráfico da Figura 3. O suporte dinâmico para o desenvolvimento acompanhado nas imagens de satélite é visto em superfície e altitude. No campo da pressão ao nível médio do mar há um cavado com amplitude significativa a leste do Nordeste, no horário das 12 UTC do dia 10 (não mostrado) e 00 UTC do dia 11 (Fig. 5c). Na noite do dia 11 (00 UTC do dia 12), essa estrutura se apresenta bastante enfraquecida (Fig. 5d), o que não ocorre em 850 hpa, onde o cavado tem amplitude considerável e eixo situado sobre a área litorânea (Fig. 5b). Nesse nível o cavado pode ser identificado com eixo a leste do Nordeste às 12 UTC do dia 10 (não mostrado) e 00 UTC do dia 11 (Fig. 5a). No nível de 500 hpa (não mostrado), apenas nos dias 11 e 12 há evidência de cavado próximo ao extremo norte do litoral leste do Nordeste, resultante da bifurcação de um centro de alta pressão situado sobre o Nordeste e área oceânica adjacente (até 20ºW, aproximadamente). CONCLUSÕES Este trabalho enfoca um evento chuvoso extremo ocorrido na cidade do Salvador, Bahia, no período de 12 a 14 de junho de 2006, conforme registrado no Relatório Final da Operação Chuva 2006 da Defesa Civil (CODESAL) do Salvador. A intensidade e duração das chuvas nesse evento, combinadas aos efeitos adversos de outros episódios ocorridos nessa estação chuvosa acima da média, fizeram com que o governo municipal decretasse Situação de Emergência no dia 13 de junho de 2006, visando agilizar os procedimentos para atendimento à população atingida. Um cavado bem configurado no escoamento de leste na baixa-média troposfera, um distúrbio de leste, propiciou condições dinâmicas de grande escala favoráveis ao desenvolvimento da convecção profunda e sua organização em mesoescala, próximo à costa leste do Nordeste. Os sistemas precipitantes se desenvolveram a partir das 00 UTC do dia 11. A penetração do cavado na área litorânea foi acompanhada de chuvas intensas e persistentes que ocorreram na madrugada do dia 12, levando a Defesa Civil a atender um grande número de solicitações devido a deslizamentos de terra, alagamentos, ameaças de deslizamento de terra e de desabamento de imóveis, etc.
(a) (a) (a) Figura 4 Imagem do satélite meteorológico GOES-E na banda do infravermelho térmico para o dia 11/06/06 às 00 UTC (a) e para o dia 12/06/06 às: 00 UTC, (c) 03 UTC, (d) 06 UTC, (e) 09 UTC e (f) 12 UTC. (Fonte das imagens: Adaptado de http://www.sat.dundee.ac.uk/)
(a) (a) Figura 5 Análise para as 00 UTC do vento em 850 hpa (a,b) e da pressão ao nível médio do mar (c,d) para: (a,c) 11/06/06 e (b,d) 12/06/06. (Fonte dos mapas: http://www.cptec.inpe.br/) REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS DNMET. Normais Climatológicas (1961-1990). Departamento Nacional de Meteorologia. Brasilia- Brasil. 1992. 84f. DEFESA CIVIL (CODESAL). Relatório Final da Operação Chuva 2006. 2006 (disponível em http://www.defesacivil.salvador.ba.gov.br/)