HOMICÍDIO E CULPABILIDADE Liliane Krauss, Aluna do 8 o semestre de Direito manhã DA Faculdade de Direito do CEUNSP de Salto) RESUMO Este trabalho visa um estudo de maior profundidade sobre o tema homicídio, a sua história desde os tempos mais remotos a sua evolução e como ele é visto hoje. E ainda, a sua previsão legal. Também será visto a culpabilidade em nosso ordenamento jurídico. Palavras-chave: homicídio, morte, culpabilidade. INTRODUÇÃO Desde que o mundo existe, ou seja, desde que o homem existe, o homicídio foi praticado; e portanto, sempre foi uma conduta reprovável nas mais diversas civilizações do planeta. Será visto o primeiro homicídio, as punições em decorrência desse crime, e as mudanças que houveram no curso da evolução do mundo. E, ainda, a possibilidade de mesmo havendo o homicídio, não haver a punição em decorrências de algumas condições prevista na legislação. 1. O PRIMEIRO HOMICÍDIO
2 Homicídio do latim homicidium que significa morte violenta, é entendido como toda ação ou omissão que possa causar a morte de um homem. Segundo Greco (2008) a Bíblia, em Gênesis, capítulo 4, nos relata a história do primeiro homicídio, cometido por Caim contra seu irmão Abel. Caim agiu impelido por sentimento de inveja, pois Deus havia se agradado da oferta trazida pelo seu irmão Abel e rejeitado a dele. Dessa forma, Caim chamou Abel para com ele ir ao campo e, lá, o matou. Pelo fato de ter causado a morte de seu irmão, Deus puniu Caim amaldiçoando-o, fazendo com que passasse a ser um fugitivo e errante pela Terra. Caim, prevendo que também seria morto como vingança pelo crime por ele praticado, disse a Deus, em Gênesis 4, versículos 13 a 16: É tamanho o meu castigo, que já não posso suportá-lo. Eis que hoje me lanças da face da Terra, e da tua presença hei de esconder-me; serei fugitivo e errante pela Terra; quem comigo se encontrar me matará. O SENHOR, porém, lhe disse: Assim qualquer que matar Caim será vingado sete vezes. E pôs o SENHOR um sinal em Caim para que o não ferisse de morte quem quer que o encontrasse. Retirou-se Caim da presença do SENHOR e habitou a Terra de Node, ao oriente de Éden (Greco, 2007, p. 140). A Bíblia também faz distinção entre o homicídio doloso e culposo. Para quem praticava o culposo, foram criadas as cidades de refúgio, destinadas a acolher o agente que, de maneira culposa, causou a morte de alguém, a fim de não ser morto, também pelo vingador de sangue. Aquele que passasse a viver nessas cidades de refúgio estaria a salvo da vingança privada. Se o homicídio fosse doloso, não importando o lugar onde estivesse o agente, ele seria entregue nas mãos do vingador, para que morresse. 2. HISTÓRIA
3 Desde os tempos mais remotos o homicídio é considerado crime e a punição geralmente era a morte. Segundo Fragoso (2008) nos tempos de Numa Pompílio, rei que sucedeu a Rômulo, fundador de Roma (no ano 753 ou 754 A.C.), o homicídio era considerado crime público, com o nome de parricidium. Não significava, originalmente, esta palavra a morte do pai ou de ascendente (patris occidium), mas, sim, a morte de um cidadão sui juris (paris coedes ou paris excidium). Somente ao fim da República é esta palavra empregada apenas para designar a morte dada a parente próximo (MOMMSEN, II, 325). Sobre o homicídio dispunha a Lei das XII Tábuas (ano 450/451 A.C.) na Tábua Sétima Dos Delitos, item 17: se alguém matar um homem livre e empregar feitiçaria e veneno que seja sacrificado com o último suplício; em seu item 18: se alguém matar o pai e a mãe, que se lhe envolva a cabeça e seja colocado um saco costurado e lançado ao rio. Desde esse tempo, e mesmo anteriormente, já havia juízes para o processo do homicídio, os quais se chamavam quaestores parricidii. O escravo não podia ser sujeito passivo do crime de homicídio, porque não era pessoa, e sim coisa (res) e como tal objeto do crime de dano (FRAGOSO, op. Cit.). Ainda segundo o autor, a fonte de incriminação do homicídio - em Roma - era a Lei Cornélia (lex Cornelia de sicariis et veneficiis), promulgada ao tempo de Sila (81 A.C.). A pena, dependendo da condição do réu e das circunstâncias do fato, poderia ser: a deportatio (exílio), a confiscatio (confisco) ou a decapitatio (decapitação), para os honestiores, e a condenação aos animais ferozes (ad bestias) ou a vivicrematio, para os humiliores. Já se previa, como formas mais graves do homicídio, o parricídio, o envenenamento e o latrocínio. Com as normas do governo de JUSTINIANO (535 D.C.) a pena de morte é aplicada indistintamente a todos os homicidas. O homicídio era crime privado no direito germânico, e sujeitava o agente à vingança da família do morto ou à composição. Com o ressurgimento do direito romano e a influência do direito canônico, o homicídio voltou a ser considerado crime público. Foi em torno ao crime de homicídio que os praxistas desenvolveram a doutrina de inúmeros institutos da parte geral (tentativa, participação, concurso, etc.).
4 Consideravam os práticos, em geral, qualificado, o homicídio nos casos de parricídio (morte dada a parente), emboscada, latrocínio, assassínio (morte mediante paga) e envenenamento. A morte continuou sendo a pena usual. Com o movimento humanista do sec. XVIII algumas legislações substituiram a pena de morte pela de prisão celular e pelo trabalho forçado, reservando-a apenas para os casos de homicídio qualificado. Nossas Ordenações Filipinas cuidavam do homicídio voluntário simples, do venefício, do assassínio e do homicídio culposo, no Livro V, Tít. 35. Afora este último, punido com pena extraordinária, os demais eram punidos com a morte, sendo, em algumas formas, cortadas as mãos do criminoso e confiscados os seus bens. O parricídio está previsto no Livro V, tít. 41 1º. O código de 1830 ocupou-se do homicídio na parte III, título II, cap. I, considerando-o qualificado se ocorriam o emprego de veneno ou fraude, emboscada, ou se fosse cometido mediante pagamento ou por mais de uma pessoa. As penas variavam desde a morte e galés perpétuas até prisão com trabalho. O código imperial não cuidava do homicídio culposo, sendo esta uma de suas grandes falhas, corrigida, aliás, pela Lei nº 2.033, de 20 de setembro de 1871 FRAGOSO, op. Cit.). O código de 1890, ainda, previa o homicídio (art. 294), qualificando-o em numerosas circunstâncias. As penas eram a de prisão celular, de 12 a 30 anos (nas formas qualificadas) e de 6 a 24 anos (para o homicídio simples). 3. PREVISÃO LEGAL O homicídio está previsto no Código Penal, art. 121 caput e seus parágrafos, na forma simples, privilegiada, qualificada e culposa. O homicídio simples, previsto no caput do art. 121, é o ato voluntário, pelo qual se destrói a vida de um ser humano, sem qualquer agravação ou qualificação que venha alterar a natureza com de um crime. A forma privilegiada está prevista no parágrafo 1º, e trata-se de uma causa especial de pena.
5 Em seu parágrafo 2º, prevê o homicídio qualificado, é a designação dada a figura delituosa do homicídio enumerado pela lei penal com os elementos qualificativos, que o modificam com relação ao simples. A qualificação do homicídio, assim, apresenta o crime agravado ou de maior gravidade, em vista da intensidade do dolo, nele anotada, da natureza dos meios usados para executá-lo, do modo de ação, ou desejo de fugir a punição. Revela, o grau de perversidade do agente ou a visível maldade de sua prática i. No parágrafo 3º a previsão é de homicídio culposo, designação dada ao homicídio que resulta por negligência, imprudência e imperícia, não tendo a intenção criminosa. É o homicídio resultante de uma falta cometida pelo agente, ou seja, não havia a intenção de matar, mas o ato que não foi previsto, quando devia, veio dar causa ao resultado. 4. CULPABILIDADE Segundo Silva (2007), culpabilidade, derivado do adjetivo latino, culpabilis, de culpa, significa que merece repreensão, digno de exploração, culpável. Possui o sentido de indicar, em acepção estrita, os estado da falta ou violação considerada como condição para imputabilidade da responsabilidade civil ou penal. Em sentido mais amplo, significa, a mera possibilidade de ser imputado ao agente a autoria de um delito, previsto na lei transgredida. Segundo GRECO (2007) culpabilidade é o juízo de reprovação pessoal que se realiza sobre a conduta típica e ilícita praticada pelo agente. Os elementos da culpabilidade para a concepção finalista são: Imputabilidade; Potencial consciência da ilicitude;
6 Exigibilidade de conduta diversa. Na concepção finalista trazida por Wetzel toda conduta humana tem uma finalidade; esta, portanto se baseia em que o homem, graças a seu saber causal, pode prever, dentro de certo limites, as conseqüências possíveis de sua atividade, estabelecendo, portanto, fins diversos e dirigir sua atividade, conforme o seu plano, a consecução desses fins. A imputabilidade é a capacidade de entender o caráter ilícito do fato previsto pela lei penal, ou seja, para isso teria o agente de possuir condições para entender a ilicitude do ato. São excludentes de imputabilidade a doença mental, desenvolvimento mental incompleto ou retardado, e embriaguez proveniente de caso fortuito ou força maior. Os critérios de aferição da inimputabilidade são: o sistema biológico, nos casos de menores de 18 anos, nos quais, o desenvolvimento incompleto presume a incapacidade de entendimento e vontade artigo 27 do Código Penal; Art. 27 Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial. o sistema psicológico; e o sistema biopsicológico que foi adotado como regra, conforme se verifica no artigo 26, caput, do Código Penal a seguir: Art. 26. É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou omissão, inteiramente incapaz d entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Já a potencial consciência (saber o que está fazendo) da ilicitude (contrário ao ordenamento jurídico) é a possibilidade do agente conhecer o caráter ilícito da conduta, a lei presume que todos a conhecem. Porém pode ocorrer o erro de
7 proibição, que consiste na errada compreensão de uma determinada regra legal que pode levar o agente a supor que determinada conduta injusta seja justa, a tomar uma errada por certa, a encarar uma anormal como normal. A conseqüência no erro de proibição sempre exclui a atual consciência da ilicitude. Com efeito, se esta é a possibilidade de conhecer o caráter injusto do fato e se o erro de proibição inevitável é aquele que o agente não tinha como evitar, somente essa modalidade de erro leva a exclusão de culpabilidade. Está previsto no artigo 21 do Código Penal, a seguir: Art. 21 O conhecimento da lei é inescusável. O erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável, isenta e pena; se evitável, poderá diminuí-la de um sexto a um terço. Na exigibilidade de conduta diversa, como causa de exclusão de culpabilidade, fundase no princípio de que só podem ser punidas as condutas que poderiam ser evitadas. A exigibilidade de conduta diversa pode ser excluída por duas causas: a) coação, ou seja, obrigar a pessoa a fazer algo ou deixar de fazer em desacordo com sua vontade e, b) obediência hierárquica. Portanto, caso o agente não atenda as esses requisitos, não há culpabilidade do agente. CONSIDERAÇÕES FINAIS Como pode ser visto diante do que foi pesquisado o homicídio é considerado crime desde os tempos mais remotos. O ser humano é dotado de inteligência, raciocínio, compreensão, discernimento, porém, também possui os sentimentos mais indesejáveis e nocivos que se pode imaginar, ou ainda, devido a problemas de ordem mental que pode acometê-lo, comete os atos mais repreensíveis, e repugnantes que uma pessoa pode praticar. O homicídio é considerado crime nas mais diversas civilizações, e nos tempos mais antigos era punido com a morte. O fato é que no Direito Penal ocorreu uma evolução na forma de punição em decorrência de influência de períodos mais humanistas.
8 Atualmente, principalmente no Ocidente a pena geralmente é a prisão, apesar de existirem em muitos países que a pena de morte é adotada ainda. Também é avaliada a forma como é cometido, contra quem, em que circunstâncias e assim aplicar a pena de acordo com o ocorrido, podendo ocorrer uma maior punição, ou até uma forma mais branda da mesma. É importante frisar que muitas vezes apesar do indivíduo ter cometido o homicídio, ou seja, fato típico e antijurídico, pode ocorrer a falta de culpabilidade, isto é, não atendeu os requisitos para haver a culpabilidade ficando assim isento de pena ou com a pena reduzida. REFERÊNCIAS 1. FRAGOSO, Heleno Cláudio. Crimes contra a pessoa. Crimes contra a vida. Homicídio. http://www.fragoso.com.br/cgi-bin/heleno_artigos/arquivo58.pdf. acesso em 14/11/2008, 10:02 hrs. 2. GRECO, Rogério. Curso de direito penal. 8 ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2007. 3. GRECO, Rogério. Curso de direito penal: parte especial.vol II. Introdução a teoria geral da parte especial: crimes contra a pessoa. 5 ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2007. 4. SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. 27 a ed. Rio de janeiro, 2007. i Disponível em: http://74.125.93.132/search?q=cache:0dwo Sxws8J:www.heloisaquaresma.com/crimes_contra_a_vida.htm+A+qualifica%C3%A7%C3%A 3o+do+homic%C3%ADdio,+assim,+apresenta+o+crime+agravado+ou+de+maior+gravidade,+em+vista+da+intensidade+do+dolo,+nele+an otada,+da+natureza+dos+meios+usados+para+execut%c3%a1- lo,+do+modo+de+a%c3%a7%c3%a3o,+ou+desejo+de+fugir+a+puni%c3%a7%c3%a3o.+revela,+o+grau+de+perversidade+do+agente+ ou+a+vis%c3%advel+maldade+de+sua+pr%c3%a1tica.&cd=1&hl=pt-br&ct=clnk&gl=br