A PEGADA HÍDRICA DO RIO GRANDE DO SUL: ANÁLISE DAS COMMODITIES AGRÍCOLAS

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A PEGADA HÍDRICA DO RIO GRANDE DO SUL: ANÁLISE DAS COMMODITIES AGRÍCOLAS Sérgio Rodrigues Rocha 1 & Ticiana Marinho de Carvalho Studart 2 Resumo A água é muito consumida nas atividades agrícolas. Em diversos países com escassez hídrica, uma quantidade crescente de gêneros alimentícios está sendo importada; o que corresponde, praticamente, à compra de água, que, de outra forma, seria demandada para produção desses alimentos em seus próprios territórios. O comércio mundial de alimentos pode poupar água por meio de transferências de água, sob a forma virtual, de países muito produtivos, em termos de utilização de recursos hídricos, para outros menos produtivos. Uma maneira de mensurar esse volume de água é por intermédio da pegada hídrica, que representa a quantidade de água necessária à produção, ao longo de toda a cadeia produtiva e em várias localidades, dos bens e serviços consumidos por um indivíduo ou país. Este estudo avalia a pegada hídrica das exportações agrícolas do estado do Rio Grande do Sul, no Brasil. O resultado obtido foi muito expressivo (230 trilhões de litros, em dezesseis anos). Os gestores e os empresários devem examinar o resultado apresentado, para tomar decisões com o fim de reduzir as quantidades de água usadas nas cadeias produtivas das commodities. Um modo de diminuição é por meio do emprego de técnicas produtivas que usem menos água. Palavras-chave: pegada hídrica, commodities, Rio Grande do Sul. THE WATER FOOTPRINT OF RIO GRANDE DO SUL: ANALYSIS OF AGRICULTURAL COMMODITIES Abstract The water is consumed in agricultural activities. In many countries with water shortages, an increasing amount of food is being imported, which corresponds practically to the purchase of water, which otherwise would be demanded for the production of these foods in their own territories. The world food trade can save water through water transfers, as virtual country very productive in terms of water use, to other less productive. One way to measure this volume of water is through water footprint, which represents the amount of water needed to produce along the entire production chain and in many places, goods and services consumed by an individual or country. This study assesses the water footprint of agricultural exports from the state of Rio Grande do Sul, Brazil. The result obtained was very impressive (230 trillion liters, in sixteen years). Managers and entrepreneurs should examine the results presented, to make decisions in order to reduce the amounts of water used in the production chains of commodities. One way to decrease is through the use production techniques which use, in a culture, less water. Keywords: water footprint, commodities, Rio Grande do Sul. 1 Engenheiro Civil e Mestrando em Gestão de Recursos Hídricos (Universidade Federal do Ceará). E-mail: srrocha90@hotmail.com. 2 Professora do Departamento de Engenharia Hidráulica e Ambiental da Universidade Federal do Ceará, Campus do Pici, Centro de Tecnologia, Bloco 713, Fortaleza, Ceará, Brasil, CEP 60451-970. Telefone: (085) 3366-9770; e-mail: ticiana@ufc.br.

1. INTRODUÇÃO O recurso hídrico, que é fundamental à dessedentação de todos os animais e à sustentabilidade dos ecossistemas, é um fator de produção muito importante para as atividades agrícolas e industriais (CASTRO, 2012). Caso o quantitativo populacional, a alteração nos padrões de vida e a área da agricultura irrigada continuem a aumentar, o acesso à água tornar-se-á mais difícil e a escassez crescerá em demasia (GLEICK, 2000). O uso de água é proporcional ao padrão de consumo da humanidade. Em vista disso, é necessário conhecer-se o gasto de recurso hídrico e a poluição advinda da produção dos bens de consumo, sobretudo daqueles de uso intensivo de água, como é a situação das commodities agrícolas (ERCIN; ALDAYA; HOEKSTRA, 2012). Um modo de medição é por meio da pegada hídrica, que propicia o exame da conexão entre o consumo humano e a apropriação mundial de água doce. A pegada hídrica é um indicador de apropriação direta e indireta; que engloba, na opinião de Mekonnen e Hoekstra (2011), tanto o uso da água de consumo (pegadas verde e azul) quanto o consumo de água para assimilação da carga de poluentes (pegada cinza). A contabilização do uso de água é, geralmente, circunscrita aos volumes de recursos hídricos destinados aos setores industrial, agrícola e doméstico. Os indicadores de comércio de água virtual e de pegada hídrica são componentes de uma nova abordagem para a elaboração das contas nacionais de utilização de recursos hídricos (BULSINK; HOEKSTRA; BOOIJ, 2010); ao considerar volumes de águas pluviais utilizados, quantitativos de recursos hídricos usados para assimilação de poluição, volumes de água utilizados em outros países para produzir bens importados e quantidades de recursos hídricos usadas dentro do território nacional para produzir bens exportáveis (HOEKSTRA; MEKONNEN, 2012). O comércio internacional é uma maneira indireta de transferência de água, de uma nação para outra (DALIN et al., 2012), em que os países exportadores de gêneros alimentícios são, na visão de Yang et al. (2006), fontes virtuais de água. Esta pesquisa tem por objetivo avaliar a pegada hídrica das exportações do estado do Rio Grande do Sul, no Brasil, a partir dos produtos principais de sua pauta agrícola (commodities). 2. ÁGUA VIRTUAL E PEGADA HÍDRICA A concepção de água virtual foi idealizada, em 1993, por John Anthony Allan, ao analisar a possibilidade de importação de água sob a forma virtual, ou seja, escondida nas cadeias produtivas das mercadorias agrícolas, como uma maneira de solucionar parcialmente os problemas de escassez hídrica no Oriente Médio (HOEKSTRA, 2009). Allan concebeu a água virtual como uma ferramenta econômica e um modo alternativo de mensurar, por intermédio do comércio global, a distribuição mundial de recursos hídricos. Além disso, esse conceito inovou ao não se restringir apenas ao comércio da substância química água ; em virtude de considerar as transações comerciais de produtos que demandam recursos hídricos embutidos em suas cadeias de produção (SCHENDEL et al., 2007). A água virtual é, segundo Bulsink, Hoekstra e Booij (2010), o volume de recurso hídrico consumido ou poluído em todas as fases de produção de um bem ou serviço. Já a pegada hídrica foi concebida, em 2003, por Hoekstra (MEKONNEN; HOEKSTRA, 2011), como uma medição de apropriação de uso de água, que contempla os consumos diretos e indiretos desse bem natural, pelos moradores de um país ou de uma região, considerando-se seus padrões de consumo. Representa, pois, o volume total de recurso hídrico necessário à produção, em

todas as etapas da cadeia produtiva e em várias localidades, dos bens e serviços consumidos por um indivíduo ou uma comunidade. Para o cálculo da pegada hídrica, de uma cultura, devem ser considerados três componentes: o verde refere-se à água pluvial consumida ou evapotranspirada (SCHENDEL et al., 2007; MEKONNEN; HOEKSTRA, 2011); o azul relaciona-se ao volume consumido ou evapotranspirado de recursos hídricos subterrâneos e superficiais; e o cinza representa o volume de água doce necessário à assimilação da poluição gerada, em obediência a padrões ambientais de qualidade da água (MEKONNEN; HOEKSTRA, 2011). 3. COMÉRCIO INTERNACIONAL DE ALIMENTOS Os governos nacionais não possuem, quando analisam os usos dos recursos hídricos somente em seus territórios, uma noção completa do grau de sustentabilidade de seus consumos internos. Muitos governos têm analisado suas pegadas de água sem levar em consideração que os produtos importados causam escassez ou poluição hídrica nos países exportadores. O conhecimento do nível de dependência de água, proveniente de outras nações, é relevante para qualquer governo; não apenas no que se refere à sustentabilidade de sua política ambiental, mas, também, quanto à manutenção da segurança alimentar de seus cidadãos (HOEKSTRA; MEKONNEN, 2012). Em diversos países com carência hídrica, uma quantidade crescente de gêneros alimentícios está sendo importada; o que corresponde, praticamente, à compra de água, que, de outra forma, seria demandada para a produção desses alimentos em seus próprios territórios (YANG et al., 2006). O comércio mundial de alimentos pode poupar água por intermédio de transferências de água, sob a forma virtual, de países muito eficientes, em termos de utilização de recursos hídricos, para outros menos eficientes. Em decorrência disso, tem-se um menor uso de água por cultura (DALIN et al., 2012). Essa poupança de recursos hídricos na agricultura pode variar, em função do grau de produtividade de água, por cultura, que um país apresenta em relação a outro. 4. MATERIAL E MÉTODOS 4.1. Área de estudo O estado do Rio Grande do Sul, que se localiza na Região Sul do Brasil, foi selecionado como área de estudo desta pesquisa. Segundo Castro (2012), os brasileiros detêm 12% de toda a água disponível na Terra; sendo que o Rio Grande do Sul detém 3,314% do potencial hídrico do País (REBOUÇAS, 2006). 4.2. Dados pesquisados As exportações gaúchas foram obtidas da Secretaria de Comércio Exterior, do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), que classifica as conforme a Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM). As pesquisas realizadas por Mekonnen e Hoekstra (2010) serviram de modelo para definição do padrão de consumo por produto pegada hídrica (em litros/kg), para as condições de produção agrícola do Rio Grande do Sul.

4.3. Produtos escolhidos Este estudo selecionou 22 das principais commodities agrícolas da pauta de produtos básicos, que representam 28,29% de toda a pauta de exportação do Rio Grande do Sul (MDIC, 2013), em dólares, de 1997 a 2012 (Tabela 1). Portanto, os produtos agrícolas semimanufaturados e manufaturados não foram estudados nesta pesquisa. Tabela 1 Produtos selecionados da pauta de exportação agrícola do Rio Grande do Sul, de 1997 a 2012 Fonte: Elaboração do autor, com base em dados do MDIC (2013). 4.4. Metodologia de quantificação da pegada hídrica de uma cultura A pegada de água verde, de todo o processo de crescimento de uma cultura, é calculada por meio da Equação 1 (HOEKSTRA et al., 2011): Onde: PH verde é a pegada de água verde (m³/t); 10 é o fator de conversão da profundidade de água (mm) para volume de recursos hídricos por área (m 3 /ha); ET verde é a evapotranspiração de água verde; é o somatório da PH verde, desde o dia do plantio até o da colheita (dias); d=1 é o dia do plantio; tc é o tempo de crescimento (dias); e R é o rendimento da cultura (t/ha). Já a pegada hídrica azul é calculada por intermédio da Equação 2 (HOEKSTRA et al., 2011): Onde: PH azul é a pegada hídrica azul (m³/t); 10 é o fator de conversão da profundidade de água (mm) para volume de recurso hídrico por superfície (m 3 /ha); ET azul é a evapotranspiração de

água azul; é o somatório da ET azul, desde o dia do plantio até o da colheita (dias); d=1 é o dia do plantio; tc é o período de crescimento (dias); e R é o rendimento da cultura (t/ha). O cálculo da pegada de água cinza é feito por meio da Equação 3 (HOEKSTRA et al., 2011): Onde: PH cinza é a pegada hídrica cinza (m³/t); α é a fração de lixiviação; TA é a taxa de aplicação de fertilizantes, pesticidas ou inseticidas (kg/ha); c max é a concentração máxima admissível (kg/m 3 ); c nat é a concentração natural (kg/m 3 ); e R é o rendimento da cultura (t/ha). A Equação 4 quantifica a pegada de água total de uma cultura (HOEKSTRA et al., 2011): O cálculo final da pegada de água de um produto (em litros) é feita por meio da multiplicação do padrão de consumo da pegada hídrica (em litros/kg) pelo peso líquido (em kg) do produto exportado. 5. RESULTADOS E DISCUSSÃO O volume de recurso hídrico necessário para a produção de um quilograma de outros tipos de mate, produto de maior padrão de consumo de pegada hídrica por quilograma produzido, é 1.880,89% maior do que o volume demandado para a produção de um quilograma de maçãs frescas, produto de menor padrão de consumo de água por quilograma produzido (Tabela 2). Tabela 2 Padrão de consumo da pegada hídrica da pauta de exportação do Rio Grande do Sul, por produto Fonte: Elaboração do autor, com base em dados do MDIC (2013) e de Mekonnen e Hoekstra (2010).

De acordo com a Tabela 3, os produtos outros grãos de soja, mesmo triturados e bagaços e outros resíduos sólidos, da extração do óleo de soja, que pertencem ao chamado complexo soja, lideram as exportações de água virtual, com, aproximadamente, 75% de toda a pauta. Tabela 3: Pegada hídrica da pauta de exportação do Rio Grande do Sul, por produto, de 1997 a 2012 Fonte: Elaboração do autor, com base em dados do MDIC (2013) e de Mekonnen e Hoekstra (2010). A pegada hídrica, nos dezesseis anos analisados por esta pesquisa, apresentou média aritmética de 14.395.493.310.622,6 litros (Tabela 4). Tabela 4 Pegada hídrica da pauta de exportação do Rio Grande do Sul, por ano, de 1997 a 2012 Fonte: Elaboração do autor, com base em dados do MDIC (2013) e de Mekonnen e Hoekstra (2010).

Os produtos selecionados, por esta pesquisa, foram exportados para 171 países. China, Espanha, Tailândia e Itália são, conforme a Tabela 5, os maiores importadores de água virtual, respondendo por quase 50% de toda a pauta. Tabela 5 Pegada hídrica da pauta de exportação do Rio Grande do Sul, por país de destino, de 1997 a 2012 Fonte: Elaboração do autor, com base em dados do MDIC (2013) e de Mekonnen e Hoekstra (2010). A Argélia, que é muito podre em disponibilidade de recursos hídricos e com baixo nível de uso de água (MARGAT, 1998 apud REBOUÇAS, 2006), medidos em m 3 /habitante/ano, foi responsável pela 23ª maior pegada hídrica do período pesquisado (Tabela 5). Já a Indonésia, que é rica em potencial hídrico e com muito baixo nível de uso (MARGAT, 1998 apud REBOUÇAS, 2006), foi o nono maior comprador de água virtual (Tabela 5). Do exposto, depreende-se que essas nações economizaram água, comprando-a virtualmente dos gaúchos. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS Em virtude de o volume da pegada hídrica total, calculado por esta pesquisa, ter sido muito significativo 230 trilhões de litros, os gestores da área de águas e os empresários do setor agrícola devem examinar o resultado apresentado, para tomar decisões com o fim de reduzir as quantidades de recursos hídricos consumidas nas cadeias produtivas das commodities exportáveis. A diminuição da pegada hídrica de uma cultura pode ser conseguida por intermédio de investimento em pesquisas de técnicas produtivas que usem, por quilograma produzido, menos água; ou pela substituição de culturas que apresentem, de acordo com Castro (2012), elevado padrão de consumo por outras de menor necessidade de recurso hídrico e, outrossim, de maior valor de agregação econômica. Outro modo de redução da pegada hídrica é por meio do acréscimo de preço da água destinada ao setor agrícola, o que pode provocar a diminuição da demanda, bem como o uso mais eficiente e sustentável desse recurso natural. Vale ressaltar que os indivíduos

devem ser conscientizados para que alterem seus padrões de vida, visando ao atingimento do consumo sustentável, em escalas locais e global. REFERÊNCIAS BULSINK, F.; HOEKSTRA, A.Y.; BOOIJ, M.J. (2010). The water footprint of Indonesian provinces related to the consumption of crop products. Hydrology and Earth System Sciences, [S.l.], European Geosciences Union, v. 14, n. 1, p. 119-128. CASTRO, C. N. (2012). Gestão das águas: experiências internacional e brasileira. Textos para discussão, n. 1477. Brasília: IPEA. DALIN, C.; KONAR, M.; HANASAKI, N.; RINALDO, A.; RODRIGUEZ-ITURBE, I. (2012). Evolution of the global virtual water trade network. Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America, [S.l.], EUA, v. 109, n. 16, p. 5989-5994. ERCIN, A.E.; ALDAYA, M.M.; HOEKSTRA, A.Y. (2012). The water footprint of soy milk and soy burger and equivalent animal products. Ecological Indicators, [S.l.], n. 18, p. 392-402, Elsevier. GLEICK, P.H. (2000). The changing water paradigm: a look at twenty-first century water resources development. Water International, [S.l.], International Water Resources Association, v. 25, n. 1, p. 127-138. HOEKSTRA, A.Y. (2009). Human appropriation of natural capital: A comparison of ecological footprint and water footprint analysis. Ecological Economics, [S.l.], Elsevier, n. 68, p. 1963-1974. HOEKSTRA, A.Y.; CHAPAGAIN, A.K.; ALDAYA, M.M.; MEKONNEN. M.M. (2011). The water footprint assessment manual: setting the global standard. London/Washington: Earthscan. HOEKSTRA, A.Y.; MEKONNEN M.M. (2012). The water footprint of humanity. Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America, [S.l.], EUA, v. 109, n. 9, p. 3232-3237. MEKONNEN, M.M.; HOEKSTRA, A.Y. (2010). The green, blue and grey water footprint of crops and derived crop products: appendices. Value of Water Research Report Series, Delft, Holanda, UNESCO-IHE, v. 2, n. 47.. (2011). The green, blue and grey water footprint of crops and derived crop products. Hydrology and Earth System Sciences, [S.l.], European Geosciences Union, v. 15, n. 5, p. 1577-1600. MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO, INDÚSTRIA E COMÉRCIO EXTERIOR MDIC. (2013). Comércio Exterior. Disponível em: <http://www.desenvolvimento.gov.br/sitio/interna/index.php?area=5>. Acesso em: 16 maio 2013. REBOUÇAS, A.C. (2006). Água doce no mundo e no Brasil. In: REBOUÇAS, A. C, BRAGA, B. B.; TUNDISI, J. G. (Org.). Águas doces no Brasil: capital ecológico, uso e conservação. 3. ed. São Paulo: Escrituras. SCHENDEL, E.K.; MACDONALD, J.R.; SCHREIER, H.; LAVKULICH, L.M. (2007). Virtual water: a framework for comparative regional resource assessment. Journal of Environmental Assessment Policy and Management, [S.l.], Imperial College Press, v. 9, n. 3, p. 341-355. YANG, H.; WANG, L.; ABBASPOUR, K.C.; ZEHNDER, A.J.B. (2006). Virtual water trade: an assessment of water use efficiency in the international food trade. Hydrology and Earth System Sciences, [S.l.], European Geosciences Union, v. 10, n. 3, p. 443-454.