Pág: 14 Corte: 1 de 5 FILEIRA MEDRONHO: MUITO MAIS DO QUE AGUARDENTE Produtores e investigadores têm mostrado crescente interesse pela cultura do medronho. O pequeno fruto autóctone está a deixar de ser visto exclusivamente como matéria-prima para a aguardente, para passar a ser utilizado em fresco e noutros sub-produtos. Rita Marques Costa e Sara Pelicano O pequeno fruto, vermelho quando maduro, é utilizado tradicionalmente para produzir aguardente de medronho. Cresce num arbusto, o Arbutus unedo, que pode atingir os 12 metros e se encontra em estado selvagem ao longo de toda a bacia do Mediterrâneo. Em Portugal, existe um pouco por todo o Pais, mas tem maior concentração junto das serras do Caldeirão e Monchique, no Algarve, e na zona de Castelo Branco, Beira Interior. Segundo a Direcção-Geral de Agricultura e Pescas do Centro, o medronheiro «é uma espécie com forte impacto ao nível paisagístico e protege e reabilita o solo, pois tem uma excelente acção ao nível da fixação, melhoria e protecção dos solos». Além disso, «é indicadora de solos que não perderam o seu fundo de fertilidade e apresenta uma extraordinária capacidade de regeneração após um fogo». Carlos Fonseca, presidente da Cooperativa Portuguesa do Medronho (CPM), calcula que existam, em Portugal, entre 400 a 500 hectares ocupados com medronheiros. A estimativa é feita as árvores «que já estão no terreno, embora ainda não produzam». O responsável afiança que, pelo facto de «boa parte do Pais ter apetência para esta espécie», há um «potencial de crescimento extraordinário» para os próximos anos. Os jovens agricultores são um dos grupos que começam a dedicar-se mais à cultura, nota Carlos Fonseca. Por várias razões: «é uma espécie que, à partida, se adapta bem. É muito robusta e suporta bem condições extremas de calor e até de frio e de chuva»; «vêem no medronho uma possibilidade de melhorar as suas terras»; e porque «tem havido um interesse extraordinário por parte das nossas universidades e institutos de investigação em saber mais sobre o medronho no sentido de o valorizar». O preço por quilo tem tendência a «oscilar» de ano para ano e de região para região, conta o dirigente. Contudo, o preço normal situa-se entre 0,50 euros e 0,70 euros. «Aqui [na CPM], segue-se um pouco a lei da oferta e da procura.»
Pág: 15 Área: 19,00 x 27,06 cm² Corte: 2 de 5 polpa, que depois pode ter múltiplas utilizações», conta o presidente da CPM. O conselho consultivo da cooperativa, nomeado durante o mês de Março, será composto «fundamentalmente por pessoas ligadas à investigação». Escola Superior Agrária de Bragança, Universidade de Aveiro, Universidade de Coimbra, Escola Superior Agrária de Coimbra, Instituto Politécnico de Castelo Branco, Universidade de Lisboa, Instituto Politécnico de Beja e Universidade do Algarve são as instituições que irão integrar o órgão. «Estamos a reunir pessoas que trabalham na investigação do medronho há alguns anos, uns na área da plantação, outros na química, outros no produto em fresco - que é algo em que vamos apostar bastante -, no sentido de perceber melhor o processo, a planta, a espécie e o fruto, que é muito perecível», conta Carlos Fonseca. As novas utilizações «Nos sabemos que grande parte do medronho produzido em Portugal tem como finalidade a aguardente e, portanto, isto representa um rendimento insuficiente para a rentabilidade de uma plantação e de uma cultura um pouco mais profissional», declara Carlos Fonseca. A solução está em encontrar novas aplicações para o fruto. Uma das possibilidades é a disponibilização do produto para consumo em fresco, tendo em vista a exportação. «Estamos também a pensar na polpa de medronho, que pode vir a ser usada em iogurtes e sumos.» O produto tem também potencial para ser aplicado na cosmética, já que é «muito anti-oxidante». A ser usado, seria aplicado em cremes cutáneos, já que tem características anti-envelhecimento. A medicina é outra das áreas onde Carlos Fonseca assegura que o produto poderá ser utilizado. Mesmo em relação à aguardente, já estão a ser analisadas formas de aproveitar os seus resíduos, bem como os que resultam da poda do medronheiro. Para diversificar a aplicação do medronho, torna-se crucial «dar escala à produção». É essencial «receber o fruto com cadernos de encargos diferentes para cada utilização e termos fruto em quantidade, para que possa servir uma percentagem para aguardente, outra para os iogurtes, outra para as compotas e outra para a medicina». Para isso, «só uma estrutura como uma cooperativa é que poderá ter essa capacidade», nota Carlos Fonseca. Descobrir para evoluir Sem investigação, a aplicação do medronho a outros fins seria uma meta mais difícil de atingir. Para conseguir transformar o medronho de modo a utilizá-lo para estas finalidades, há que «adaptar o processamento. Assim, vamos avançar com uma bolsa de iniciativas no âmbito da Rede Rural, para fazer mais investigação na área da transformação de medronho em
Pág: 16 Corte: 3 de 5 O valor da tradição Apesar do rol de novas aplicações do fruto, a produção de aguardente continua a ser a principal forma de utilização do medronho. A legislação mais rigorosa para a instalação de destilarias conduziu a que muitas destas zonas de produção de aguardente se tornassem ilegais. A Câmara Municipal de Monchique quis colocar fim a esse cenário e começou a ajudar os produtores no processo de legalização. Por isso, hoje o município algarvio conta com 80 destilarias. O medronho e a bebida que dele se extrai ganhou força na região. Rui André, presidente da Câmara Municipal de Monchique, salienta que o interesse pelo medronho tem vindo a crescer e há cada vez mais quem aposte nesta cultura. «Era uma actividade secundária, mas hoje tem interesse económico», diz, referindo que além da aguardente já há outras utilizações: compotas, aplicações gastronómicas e consumo em fresco. Aliado a este novo aproveitamento do medronho, surge outra área de actividade, que é o turismo. Monchique realizou no ano passado o Festival do Medronho, uma iniciativa a repetir este ano. «Na região Centro, teremos cerca de cinco ou seis destilarias legalizadas.» Para Carlos Fonseca, «há um grande desconhecimento e é preciso haver mais informação e divulgação daquilo que é necessário para legalizar uma destilaria». O presidente da Junta de Freguesia de Santo André das Tojeiras, Castelo Branco, tem o projecto para construção UM PROTOCOLO PARA A VARIAÇÃO TERRITORIAL O documento assinado entre a Cooperativa Portuguesa do Medronho, os municípios de Proença-a-Nova, Pampilhosa da Serra, Vila de Rei, Fundão e a Agência para o Desenvolvimento Turístico das Aldeias de Xisto no final de Janeiro faz parte de «uma estratégia de aproximação ao território e da necessidade de reforçar a produção», encetada pela CPM, explica Carlos Fonseca. As instituições irão colaborar na organização de acções de sensibilização nas escolas, colóquios e outros projectos que terão como objectivo a promoção do medronhal. Além disso, o acordo pretende chamar a atenção para a cultura do medronho, através de aplicações ornamentais, como por exemplo o preenchimento das avenidas destas vilas com medronheiros em vez de palmeiras «e outras espécies que nem sequer são de cá». No futuro, pretende estender-se o protocolo a outros municípios, como Oleiros e Sertã, também á Serra da Lousã e a outras zonas de Portugal, nomeadamente Portalegre, Baixo Alentejo, Alentejo Litoral, Algarve e Douro, «onde o medronhal é forte».
Pág: 18 Corte: 4 de 5 INVESTIGAÇÃO AO PORMENOR Rico em ómega 3 e 6, fibra, minerais, vitamina C e anti-oxidantes, o medronho despertou a atenção da comunidade científica nacional, que procura de uma unidade agro-industrial onde se fará aguardente, mas também se valorizará o fruto. «Além de destilaria, terá sala de prova, câmara de frio para conservar o fruto em fresco e uma unidade integrada de produção de licor e compotas», explica Luis Andrade. Na freguesia, nos últimos quatro anos, foram plantados 50.000 novos medronheiros. Imposto sobre o álcool A aguardente de medronho é taxada como as outras bebidas alcoólicas, o que levou a CPM a apresentar uma petição junto da Assembleia da República para que esta regra seja revista e o imposto reduzido. Carlos Fonseca explica que, no caso de uma garrafa de bebida, «que poderá atingir poucas dezenas de euros, mais de uma dezena é para o imposto». Isto vai «contribuir para a inviabilidade deste negócio». «Se fizermos as contas ao que e necessário para produzir um litro de aguardente, o produtor acaba por ser pouco beneficiado», defende o presidente da cooperativa. Uma das despesas do negócio está na colheita do medronho, que é particularmente custosa, já que tem de ser feita à mão. «Embora já tenham existido tentativas de mecanização, tem de ser feita à mão.» formas alternativas de utilizar o fruto. Investigadores da Universidade de Aveiro descobriram que o medronho tem um impacto positivo no controlo dos níveis de colesterol e na saúde da pele e dos ossos. Além disso, as suas propriedades anti-oxidantes tornam-no uma boa "arma" contra o envelhecimento. O Centro de Excelência para a Valorização dos Recursos Mediterrãnicos, em parceria com a Escola Superior Agrária de Évora e a empresa Sugar Bloom, instalaram um medronhal onde são testadas as formas mais eficazes de produzir o fruto. O trabalho concluiu, por exemplo, que o período ideal de colheita é quando a maturação está num estado óptimo, de modo a facilitar a sua conservação. Os investigadores testaram também diferentes aplicações do medronho, desde o fruto cristalizado, ao patê de medronho e chocolate, passando pelos chutneys, compotas e geleias.
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