Correlações entre idade, auto-avaliação, protocolos de qualidade de vida e diagnóstico otorrinolaringológico, em população com queixa vocal Palavras-chave: Protocolos, Qualidade de Vida, Voz Fernanda Farias da Silva, Renata La Torre, Maria Gabriela Cunha, Marcia Menezes, Domingos Hiroshi Tsuji, Katia Nemr INSTITUIÇÃO: Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo Introdução Na Investigação da Queixa, a Escala Analógica Visual - EAV tem como seu objetivo principal captar a percepção do paciente em relação a sua própria voz. Para a sua realização o paciente é instruído a assinalar, na escala, o ponto que representa o quanto a sua voz é alterada, sendo zero nada alterada e dez muito alterada. Hogikyan e Sethuraman 1, elaboraram o protocolo de Mensuração de Qualidade de Vida e Voz - QVV, traduzido e adaptado por Behlau et al 2, utilizado para analisar o impacto da disfonia na qualidade de vida e dia-a-dia do sujeito. O questionário possui 10 itens, que abrangem dois domínios: o físico e o sócio-emocional. Suas respostas variam de zero a cinco. O protocolo Voice Handicap Index - VHI idealizado por Jacobson 3 é um questionário de auto-avaliação da capacidade vocal, criado com o desígnio de mensurar as dificuldades vivenciadas por sujeitos com distúrbios na voz, sendo utilizado para descrever o impacto vocal nos domínios emocional, funcional e orgânico. É composto por 10 questões em cada um de seus domínios, suas respostas variam de zero a quatro. O impacto das alterações vocais na qualidade de vida dos sujeitos disfônicos tem sido foco de pesquisas e podem auxiliar os profissionais nas condutas adotadas em relação às necessidades comunicativas dos sujeitos. Pesquisar possíveis diferenças do impacto das disfonias em relação ao diagnóstico de disfonias funcionais, orgânico-funcionais e orgânicas e das mesmas em relação à idade é fundamental para o estudo da voz humana e de suas alterações. Objetivo Este estudo tem o objetivo de pesquisar possíveis associações entre o sexo, as médias de idade, QVV, VHI e EAV, com os diagnósticos otorrinolaringológicos.
Método A. Casuística: Participaram do estudo indivíduos com lesões benignas em atendimento na RGV (Reunião Geral da Voz) na Divisão de Otorrinolaringologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, no período entre março e maio de 2009, totalizando 39 casos. Dos indivíduos 22 eram mulheres (56,4%) e 17 homens (43,6%), com idades entre 9 e 80 anos. Dentre os sujeitos 5 apresentavam disfonia funcional, 12 disfonia orgânica e 22 apresentavam disfonia. Todos os sujeitos assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido. B. Material: QVV; e o VHI. Para este estudo foram utilizados três protocolos: o de Investigação da Queixa; o C. Procedimento e análise dos dados Os pacientes responderam os protocolos antes do atendimento na RGV no Amblatório de ORL. A EAV foi a primeira a ser aplicada nos pacientes, seguida do QVV e por último, o VHI. Os dados foram analisados estatisticamente com aplicação dos testes: Qui- Quadrado, Mann-Whitney e Pearson, todos considerando significância de 5%. Resultados A tabela 1 mostra as associações entre idade, QVV, total VHI e seus três domínios: funcional, emocional e orgânico e EAV, dos pacientes com lesões benignas apresentando disfonia funcional, ou orgânica. Os dados apontam valor de p marginalmente significante (p=0,053) para a variável funcional. O grupo com disfonia obteve respostas com pontuações menores, no domínio funcional do VHI, do que os grupos de disfonia funcional e orgânica. Não houve valores significantes para nenhuma outra variável. Para a realização desta associação foi aplicado o teste de Mann-Whitney. Na correlação entre o diagnóstico e o sexo, apresentados na tabela 2, foram aplicados os testes de Qui-Quadrado. Não houve associação significativa entre o sexo e o diagnóstico otorrinolaringológico. O teste de Qui-Quadrado não foi aplicável devido à baixa incidência.
Para a associação das variáveis idade, QVV, VHI total e seus domínios funcional, emocional e orgânico, e EAV, utilizou-se o teste de Pearson. A variável idade não se correlacionou com nenhuma das outras variáveis, não sendo significante. Houve associação estatística de todas as outras variáveis entre si, com significância. Demonstrou-se, neste teste, que quanto mais alterações os indivíduos apresentaram na EAV, mais impactos negativos foram observados tanto no QVV quanto VHI em seus três domínios. IDADE QVV TOTAL VHI FUNCIONAL EMOCIONAL ORGÂNICO ESCALA ANALÓGICA Tabela 1 - Correlação entre Diagnóstico, Idade, QVV, Total VHI, Funcional, Emocional, Orgânico e EAV. Diagnóstico Teste Kruskal- Wallis Disfonia Disfonia Disfonia Funcional Orgânica Organofuncional (p) Média 39,6 52,0 41,6 17,1 21,4 18,4 0,196 Média 63,5 51,3 65,5 32,0 24,9 25,4 0,277 Média 49,8 55,8 42,2 30,3 26,3 26,1 0,379 Média 19,2 19,8 11,0 13,7 11,5 9,9 0,053 Média 14,4 13,4 12,7 13,0 10,3 9,9 0,955 Média 16,2 22,6 18,6 8,3 8,2 9,9 0,353 Média 4,0 5,6 5,1 2,2 3,5 1,8 0,430 n 5 12 22 Resultado SEXO Tabela 2 - Correlação entre Diagnóstico e sexo. DIAGNÓSTICO Disfonia Funcional Disfonia Orgânica Disfonia Organofuncional Total N % N % N % N % F 4 80,0% 6 50,0% 12 54,5% 22 56,4% M 1 20,0% 6 50,0% 10 45,5% 17 43,6% Total 5 100,0% 12 100,0% 22 100,0% 39 100,0%
Discussão Os protocolos de auto-avaliação são meios que permitem observar o impacto da disfonia na qualidade de vida do paciente, seja no domínio sócio-funcional, emocional, físico ou orgânico. É possível, também, utilizá-los para observar e avaliar os resultados dos tratamentos realizados 4. O QVV correlaciona o quanto o impacto vocal altera a qualidade de vida do sujeito 2. Ele vem sendo utilizado de modo crescente para associar a disfonia junto às dificuldades do dia-a-dia do paciente. É divulgado como um protocolo de fácil aplicação e rápido, tornando-o prático 5. Kosama e Brassoloto 4 correlacionaram os domínios do QVV concluindo que quanto maior for a pontuação no domínio sócio-emocional, maior será o valor obtido no domínio físico, ocorrendo o mesmo inversamente, resultando em um maior escore total. O VHI é utilizado para medir o impedimento vocal e os seus efeitos no dano social e psicológico das alterações vocais 3, porém permite a avaliação apenas do ponto de vista do paciente. Tsuji et al 7 em um estudo aplicaram o VHI em pacientes com disfonia espasmódica de adução. Após tratamento, o questionário mostrou melhoras evidentes na voz nos três domínios abordados pelo VHI, com reintegração social e econômica dos pacientes. A autopercepção vocal por parte do paciente é muito valorizada, por ser uma medida subjetiva é normalmente utilizada para comparação com as medidas objetivas obtidas na avaliação 4. A EAV é um ótimo método de mensuração da auto-avaliação. Neste estudo, observou-se que quanto maiores foram as alterações relatadas pelos pacientes, através da EAV, piores se mostraram os valores obtidos no QVV, VHI total e em seus três domínios. Resultado semelhante obteve-se em um estudo de Köhle et al 8, que buscou por correlações entre auto-avaliação vocal, por meio da EAV, queixas e avaliação fonoaudiológica perceptivo-auditiva e acústica para investigar o perfil da população atendida em uma ação de proteção da saúde vocal. Observou-se que indivíduos que apresentaram pior escore de auto-avaliação vocal tinham alteração vocal. Conclusão
Esta pesquisa mostrou uma tendência de associação entre o domínio funcional com maior impacto nas disfonias orgânica e funcional. Não houve associação entre idade, sexo em nenhuma das variáveis estudadas. Observou-se que quanto maiores às alterações na EAV, piores os escores observados no QVV e VHI, mostrando associação entre as diferentes formas do indivíduo demonstrar seu grau de insatisfação com a voz. Referências Bibliográficas 1. Hogikyan ND, Sethuraman G. Validation of an instrument to measure voice-related quality of life (V-RQOL). J. Voice, Mosby, vol. 13, nº 4, 557-569, dez. 1999. 2. Behlau M, Madazio G, Feijó D, Pontes P. Avaliação de voz. Voz O Livro do Especialista. Ed. Revinter; 2001. 123. 3. Jacobson BH, Johnson A, Grywalski C, Silbergleit A, JACOBSON GP, Benninger MS, Newman CW. The voice handicap index: development and validation. Amer J. Speech Lang. Pathol., Rockville, v. 6, nº 3, 66-70, ago. 1997. 4. Kosama, S.T. Brasolotto, A.G. Percepção vocal e qualidade de vida. Pró-fono, Barueri, vol. 19, nº 1, 2007. 5. Behlau M, Hogikyan ND, Gasparini G. Quality of life and voice: study of a Brazilian population using the voice-related quality of life measure. Folia Phoniatr Logop, vol. 59, nº 6, 286-96, 2007. 6. Spina AL, Maunsell R, Sândalo K, Gusmão R, Crespo A. Correlação da qualidade de vida e voz com atividade profissional. Rev. Bras. Otorrinolaringologia, São Paulo, vol. 75, nº 2, mar./apr., 275 a 279, 2009. 7. Tsuji DH, Chrispim FS, Imamura R, Sennes LU, Hachiya A. Impacto na qualidade vocal da miectomia parcial e neurectomia endoscópica do músculo tireoaritenóideo em paciente com disfonia espasmódica de adução. Rev. Bras. Otorrinolaringol, São Paulo, vol.72, nº2, 261-266, mar./apr. 2006. 8. Köhle J, Nemr K, Leite GCA, Santos AO, Lehn CN, Chedid HM. Ação de proteção de saúde vocal: perfil da população e correlação entre auto-avaliação vocal, queixas e avaliação fonoaudiológica perceptivo-auditiva e acústica. Dist. Com., São Paulo, vol. 16, nº 3, 333-341, dez. 2004.