Nanocompósitos para liberação controlada de fertilizantes nitrogenados Viviane J.M. da Silva 1*, Talita S. Matos 2, Erica S.A. Lima 2, José Carlos Polidoro 2, Leila L.Y. Visconte 1, Regina Sandra V. Nascimento 3 1 Instituto de Macromoléculas Professora Eloisa Mano Universidade Federal do Rio de Janeiro IMA/UFRJ Rio de Janeiro RJ vjmsilva@ima.ufrj.br 2 Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária EMBRAPA SOLOS Rio de Janeiro RJ 3 Instituto de Química Universidade Federal do Rio de Janeiro IQ/UFRJ Rio de Janeiro RJ O estudo objetivou o desenvolvimento de materiais nanoestruturados capazes de reduzir a taxa de liberação de nitrogênio no solo a partir de um fertilizante nitrogenado agrícola. Quatro sistemas diferentes de compósitos poliméricos foram preparados: (1) argila montmorilonita / fertilizante, (2) argila montmorilonita / fertilizante e amido termoplástico, (3) argila montmorilonita / fertilizante, amido termoplástico e polietileno de baixa densidade (PEBD) e também (4 ) argila montmorilonita / fertilizante, amido termoplástico e policaprolactona. Verificou-se a formação dos materiais nanoestruturados por análise elementar (CHN) e difração de raios X (DRX). A cinética de liberação do nitrogênio foi verificada por análise colorimétrica enzimática através de espectroscopia no ultravioleta/visível. Os resultados mostraram que todos os materiais avaliados funcionaram como sistemas que reduzem a velocidade de liberação de nitrogênio em fertilizantes. Palavras-chave: liberação controlada, nanocompósitos, fertilizante, argila montmorilonita, amido termoplástico Nanocomposites for controlled release of nitrogen fertilizer The study aimed at the development of nanostructured materials capable of reducing the rate of release of nitrogen in the soil from an agricultural nitrogen fertilizer. Four different systems of polymer composites were prepared: (1) montmorillonite clay / fertilizer, (2) montmorillonite clay / thermoplastic starch and fertilizer, (3) montmorillonite clay / fertilizer, thermoplastic starch and low-density polyethylene (LDPE) and also (4) montmorillonite clay / fertilizer, thermoplastic starch and polycaprolactone. It was confirmed the formation of nanostructured materials by elemental analysis (CHN) and X-ray diffraction (XRD). The kinetics of nitrogen release was detected by enzymatic colorimetric analysis and spectroscopy in the ultraviolet / visible. The results showed that all materials evaluated were able to reduce the rate of release of nitrogen in the fertilizers. Keywords: controlled release, nanocomposites, fertilizer, montmorillonite clay, thermoplastic starch
Introdução O manejo inadequado e o emprego excessivo de fertilizantes nitrogenados e potássicos em culturas importantes têm levado a grandes perdas econômicas e ecológicas. Os principais mecanismos de perda são lixiviação, erosão e, para o caso do nitrogênio em solos tropicais, volatilização na forma de NH 3 e desnitrificação, com a formação de óxidos nitrosos NOx. Estas perdas de NOx acarretam sérias conseqüências ambientais, por se tratarem de potentes gases de efeito estufa. Além disso, esses nutrientes lixiviados e transportados pela erosão, acabam contaminando os mananciais superficiais e sub-superficiais [1]. A questão da eficiência do uso dos nutrientes pelas plantas é de extrema importância. O ponto chave dessa eficiência é a disponibilidade desses nutrientes no momento de maior necessidade das plantas, otimizando-se o seu uso e minimizando-se as perdas. Isso pode ser conseguido com o emprego de fertilizantes com liberação controlada, os chamados fertilizantes inteligentes, sendo o ideal aquele que libere os nutrientes de acordo com as necessidades das plantas durante seu crescimento [2,3]. Segundo Fabunmi e colaboradores, a longa busca do desenvolvimento de plásticos biodegradáveis a base de amido tem testemunhado o uso de diferentes amidos em muitas formas, tais como granulados de amido nativo, amido modificado, amido termoplástico (TPS) (produzido a partir da combinação de amido, plastificante e energia termomecânica), e também em misturas com diversos polímeros sintéticos, tanto biodegradáveis (policaprolactona, quitosana, celulose, etc) quanto não-biodegradáveis (polietileno de baixa densidade, poliuretano, poliestireno), a fim de alcançar rentabilidade e biodegradação, respectivamente. No entanto, a maioria dos materiais a base de amido forma compósitos apresentando propriedades como resistência à tração, elasticidade, rigidez, alongamento na ruptura, resistência à umidade e estabilidade relativamente baixas. Por outro lado, para a utilização na produção de fertilizantes esse baixo desempenho em relação às propriedades mecânicas, que são consideradas prejudiciais para a maioria dos materiais, são consideradas benéficas para a agricultura, pois facilitam a sua degradação [4]. Zeppa e colaboradores observaram a melhoria das propriedades de barreira e a adsorção de água em duas séries de filmes. Na primeira foi utilizada argila modificada e amido de batata
plastificado com glicerina e, na segunda, argila modificada com amido de batata plastificado, contendo com uma mistura de uréia/etanolamina. Nos dois sistemas estudados houve redução significativa da permeabilidade do oxigênio, que estava relacionada à elevada dispersão da argila [5]. Yin e colaboradores avaliaram as propriedades reológicas e térmicas de compósitos poliméricos com polietileno de baixa densidade (PEBD) e amido de milho plastificado com glicerol. Os mecanismos de degradação das blendas foram identificados por meio de análise termogravimétrica (TGA), sendo atribuída à perda de massa a lixiviação do plastificante, e à degradação do amido e de frações do polímero sintético [6]. Li e colaboradores observaram os aspectos críticos do amido termoplástico com glicerol e excesso de água. Misturas foram analisadas para determinar o tempo e a temperatura limites necessários para que o amido termoplástico em um ambiente de processamento de polímeros fundisse. Os resultados foram relacionados à morfologia, e a eficácia da plastificação foi demonstrada por uma drástica redução de seis vezes no tamanho da fase dispersa [7]. O presente trabalho teve como objetivo principal a obtenção de nanocompósitos poliméricos a partir do amido termoplástico com glicerina, da policaprolactona (polímero sintético biodegradável) ou do polietileno de baixa densidade (PEBD) para desenvolvimento tecnológico de um novo produto fertilizante agrícola de liberação controlada, utilizando o fertilizante uréia adsorvido nas entrecamadas da argila montmorilonita. Experimental Foram feitas adsorções em argila do tipo montmorilonita com uréia utilizando-se como variáveis os tempos de adsorção, e mantendo constantes a concentração do fertilizante (20% m/v), o volume da solução (35mL), a quantidade de argila (1g) e a temperatura (30ºC). O sistema argila/fertilizante foi seco em estufa por sete dias e moído em moinho de bolas. Os sistemas de partículas de argila contendo o fertilizante adsorvido em suas superfícies internas foram avaliados por análise elementar (CHN), sendo construídas isotermas de adsorção. A partir das análises de difração de raios-x (DRX) foram avaliadas a capacidade de adsorção do fertilizante nas entrecamadas e o espaçamento basal da matriz
argilomineral após a adsorção. Quatro sistemas diferentes de nanocompósitos poliméricos granulados foram preparados em misturador intensivo Haake a 50 rpm por 10 min e temperaturas de processamento de 140ºC, 140ºC e 90ºC respectivamente para os sistemas 2, 3 e 4: (1) argila montmorilonita / fertilizante, (2) argila montmorilonita / fertilizante e amido termoplástico, (3) argila montmorilonita / fertilizante, amido termoplástico e polietileno de baixa densidade (PEBD) e também (4) argila montmorilonita / fertilizante, amido termoplástico e policaprolactona. As misturas posteriormente foram moídas em moinho de facas e peneiradas entre 4 e 8 mesh. A cinética de liberação do nitrogênio foi verificada por análise colorimétrica enzimática através de espectroscopia no ultravioleta visível. Nesse método, a uréia da amostra é hidrolisada pela enzima urease com produção de gás carbônico e íons amônio. Este, na presença de salicilato, hipoclorito e nitroprussiato (reação de Berthelot modificada) produzem o corante azul indofenol o qual possui um máximo de absorção em torno de 600 nm. A cor formada é proporcional à concentração de uréia presente no meio. Resultados e Discussão A partir dos teores de carbono das matrizes de argilominerais determinados por CHN, foi construída uma curva de adsorção (Figura 1) onde é possível perceber que o percentual de nitrogênio total aumentou com o aumento da concentração de fertilizante nitrogenado, alcançando 16% de nitrogênio para 20% da concentração do fertilizante (uréia) na solução, como adsorção máxima.
Curva de adsorção do fertilizante em argila % de N 18 16 14 12 10 8 6 4 2 0 0 5 10 15 20 25 Concentração de fertilizante (%) Figura 1 - Curva de adsorção do fertilizante nitrogenado na argila A partir das análises de DRX foram avaliados a capacidade do fertilizante de penetrar nas entrecamadas e o espaçamento basal da matriz argilomineral após a adsorção. Os difratogramas das Figuras 2 e 3, obtidos antes e após a incorporação do fertilizante, demonstraram que ocorreu a intercalação da uréia, formando assim um material nanoestruturado. O espaçamento interplanar basal (d001) em uma montmorilonita pode ser definido como a distância entre o plano de uma das folhas tetraédricas e o plano correspondente da próxima folha de silicato, também tetraédrica, sendo este um dos parâmetros para a classificação dos argilominerais [8,9]. A montmorilonita sódica utilizada no presente trabalho, apresentou uma distância interplanar basal de aproximadamente 12 Å na forma anidra, isto é, antes da adsorção com a solução aquosa de uréia; e de aproximadamente 17 Å após a adsorção, comprovando assim a entrada da uréia na entrecamada da argila. As camadas na rede cristalina estão ligadas pelas fracas interações de van der Waals, que permitem que a água, e diversos compostos orgânicos polares e sais penetrem por essas estruturas, expandindo-as [8].
Figura 2 Análise de DRX da argila montmorilonita Figura 3 Análise de DRX da argila montmorilonita / fertilizante nitrogenado Os resultados da análise colorimétrica enzimática estão apresentados na Figura 4 e mostram que a liberação do nitrogênio no sistema (1) argila / fertilizante atingiu 100% após uma hora de contato com a água. A Figura 5 mostra os resultados obtidos com os sistemas de liberação controlada de nitrogênio estudados utilizando polímeros. Os resultados mostram que a hidrofilicidade do amido, no sistema (2) argila montmorilonita/ fertilizante e amido
termoplástico, levou à uma liberação que atingiu 100% após 3 horas de contato com a água. Os melhores resultados foram obtidos com os sistemas (3) e (4) (respectivamente com PEBD e policaprolactona) os quais apresentaram um comportamento semelhante, e com uma liberação imediata e prolongada, na qual após 3 horas, haviam sido liberados apenas 70% do nitrogênio total. O fato do PEBD ter uma cadeia mais hidrofóbica, provavelmente contribuiu para a diminuição da velocidade da saída de nitrogênio para a solução. Curva de liberação de N no sistema argila/fertilizante Curva de liberação de N 100 100 % de N liberado 80 60 40 20 % de N liberado 80 60 40 20 Sistema 3 Sistema 2 Sistema 4 0 0 50 100 150 200 tempo (min) 0 0 50 100 150 200 tempo (min) Figura 4 - Curva de liberação de nitrogênio do sistema 1 Figura 5 Curvas de liberação de nitrogênio dos sistemas 2, 3 e 4. Conclusões Os resultados mostraram que todos os materiais avaliados funcionaram como redutores da velocidade de liberação do nitrogênio da uréia para o meio. Mesmo o sistema nanoestruturado contendo apenas argila/fertilizante poderia ser considerado como um sistema de liberação lenta adequado, uma vez que liberou todo o seu conteúdo de nitrogênio em 60 minutos, portanto de forma muitas vezes mais lenta que o sistema convencional contendo apenas uréia. Os nanocompósitos de argila com fertilizante, contendo tanto polímeros mais hidrofóbicos como o PEBD quanto mais hidrofílicos como o amido termoplástico e a policaprolactona levaram à liberações de nitrogênio mais prolongadas, alcançando tempos superiores a 180 min. Concluiu-se que todos os materiais
avaliados demonstraram um potencial para aplicação no controle de liberação do fertilizante. Agradecimentos CNPQ Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico EMBRAPA SOLOS - Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária Referências Bibliográficas 1. E.S. Araújo; R.M. Boddey; S.Urquiaga; B.J.R. Alves. Câmara coletora para a quantificação de N-NH 3 volatilizado do solo.comunicado técnico 87, Embrapa Solos, 2007, 4p. 2. L.G.Helmer; E.E.Bartley. Progress in the utilization of urea as a protein replace for ruminants.journal of Dairy Science, 1971, 54, 25-51. 3. S. Urquiaga; R.L. Victoria; F.Buitrón; J.C. Neyra. Perdas por volatilização do 15 N-uréia e 15 N-sulfato de amônio num solo calcário da parte central da região costeira do Peru. Pesquisa Agropecuária Brasileira, Brasília, 24: 1989, 607-613. 4. O. O. Fabunmi; L. G. Tabil; P. R. Chang; S. Panigrahi. Developing biodegradable plastics from starch. American Society of Agricultural and Biological Engineers, St. Joseph, Michigan, 2007, RRV07130, ASABE/CSBE North Central Intersectional Meeting. 5. C. Zeppa; F.Gouanve; E.Espuche. Effect of a plasticizer on the structure of biodegradable starch/clay nanocomposites: Thermal, water-sorption and oxygen-barrier properties.journal of apllied polymer science, 112 (4); 2009, 2044-2056. 6. Q. Yin; A.Q. Dong; J.L. Wang; Y. Yeping. Rheological and thermal behavior of starch/ LDPE blends containing EAA. Polymer Composites. 2008, 29, 745-749. 7. G. Li; P.Sarazin; D.F. Basil. The Relationship between starch gelatinization and morphology control in melt-processed polymer blends with thermothermoplastic starch. Macromolecular Chemistry and Physics. 2008, 209, 991-1002. 8. P.S. Santos. Ciência e Tecnologia das Argilas, Edgard Bücher, São Paulo, 1989; 499p.
9. P.C. Viviana; B.M. Liliana; Ton-That; V.Analia. Physical and mechanical properties of thermothermoplastic starch/montmorillonite nanocomposite films. Carbohydrate Polymers. 2008, 73, 55-63.