2 Espectrometria de fluorescência molecular

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Transcrição:

2 Espectrometria de fluorescência molecular 2.1. Fluorescência molecular 2.1.1. O Fenômeno A luminescência molecular é a emissão de radiação eletromagnética (na região do ultravioleta próximo-visível) proveniente de moléculas que foram excitadas, retornando ao seu estado fundamental. Esse fenômeno é denominado de fotoluminescência, quando a absorção de fótons de luz (h ex ) é o responsável pela excitação da molécula pela elevação de elétrons de valência de um orbital menos energético para um orbital de maior energia. A luminescência molecular é formalmente dividida em fluorescência e fosforescência, dependendo da natureza do estado excitado envolvido no processo. Se o estado excitado envolvido é singleto, onde o spin do elétron no orbital excitado mantém sua orientação original, tem-se a fluorescência (Figura 7). Por outro lado, na fosforescência, a orientação do elétron que foi promovido ao estado excitado é invertida (estado excitado tripleto, T n ). Em conseqüência da retenção da orientação original, o retorno de uma população que se encontra no estado excitado singleto para o estado fundamental (que tem caráter singleto), é permitido e ocorre muito rapidamente (tempo de vida na ordem de ns). Assim, a fluorescência é intrinsecamente um fenômeno luminescente mais comum que a fosforescência, competindo eficientemente com processos de desativação não-radiativos do estado excitado. Como conseqüência direta disso, é possível observar facilmente fluorescência na temperatura ambiente e diretamente em solução, o que torna o procedimento experimental fluorimétrico bastante simples.

44 Figura 7: Representação do estado fundamental e dos estados excitados singleto e tripleto. Após a absorção de radiação de comprimento de onda característico, a população de moléculas é promovida para um estado excitado singleto, S n, (Figura 8). Segundo a regra de Kasha, a molécula se desativa por relaxamento através dos níveis vibracionais de estados eletrônicos de mesma multiplicidade até atingir o primeiro nível vibracional do estado excitado singleto de menor energia (S 1 ). Este processo de relaxamento recebe o nome de cruzamento interno (CI) e é um fenômeno que ocorre com muita rapidez (10 -l3 a 10-11 s) e sem emissão de radiação. Figura 8: Diagrama de Jablonski modificado. (A) absorção de um fóton, (S 0 ) estado fundamental, (S n ) estado excitado singleto, (S 1 ) primeiro estado excitado singleto, (RV) relaxamento vibracional, (CI) cruzamento interno, (CSI) cruzamento intersistemas, (T n ) estado excitado tripleto. (Adaptado de Cardoso, 2003)

45 A partir de S 1, se a multiplicidade da população molecular não mudar, ela pode seguir dois caminhos para retornar ao estado fundamental. Primeiro, se a diferença de energia entre S 1 e S 0 (estado fundamental) não for muito grande e existir possibilidade de sobreposição de níveis vibracionais, a molécula pode ser levada ao mais baixo nível vibracional de S 1 por relaxamento vibracional sem emissão de radiação eletromagnética, ou seja, ocorre um CI. Se, no entanto, a diferença energética entre S 1 e S 0 for relativamente grande, a desativação para o estado fundamental se dá com emissão de radiação na forma de fluorescência. A fluorescência é a base da fluorimetria que engloba o conjunto de técnicas analíticas baseadas na detecção dos fótons emitidos por moléculas excitadas de caráter singleto quando estas retornam para o estado fundamental. 2.1.2. Fatores que afetam a fluorescência Para que ocorra a fluorescência, uma molécula precisa ter estrutura apropriada e estar em um meio que favoreça a desativação radiativa S 1 S 0, sendo esses dois fatores críticos na magnitude da eficiência quântica fluorescente ( f ) de uma substância. A eficiência quântica fluorescente de uma substância é a razão entre o número de fótons emitidos por fluorescência e o número de fótons absorvidos (Equação 1). Uma molécula será significativamente fluorescente se sua eficiência quântica tiver magnitude considerável (entre 0,1 e 1). I F (1) f I A onde I F e I A são respectivamente as intensidades da radiação fluorescente e absorvida. Embora seja difícil prever teoricamente se uma molécula exibirá luminescência sem o prévio conhecimento da diferença de energia relativa entre o

46 estado excitado singleto e o fundamental, pode-se, de um modo geral, se observar alguns requisitos. Primeiramente, moléculas relativamente rígidas e ricas em elétrons (como no caso das moléculas aromáticas), contendo ou não heteroátomos em sua cadeia principal, são potencialmente fluorescentes. Estruturas moleculares rígidas (com restrições de liberdade vibracional) têm o processo de desativação não-radiativo por CI significantemente minimizado com conseqüente aumento da f. Já uma estrutura molecular planar favorece a fluorescência, pois aumenta a interação e conjugação entre o sistema de elétrons. A fluorescência advém de transições * (entre orbital pi anti-ligante orbital pi ligante) e em menor escala * n (entre orbital pi anti-ligante orbital não-ligante). A presença de grupos substituintes na molécula também é fator importante, pois afeta a intensidade e o tipo de luminescência, sendo que a presença de grupos hidroxi (-OH), metoxi (-OR), amino (-NR 2 ), cianeto (-CN) e sulfônico (-SO 3 H) têm tendência em amplificar a fluorescência. Por outro lado, grupos cetônicos (-C=O) carboxílicos (-COOH) e halogênios (-X) favorecem o cruzamento intersistemas, trocando a multiplicidade da população excitada (S 1 T n ) e por conseqüência diminuindo à fluorescência (Ingle e Crouch, 1988). Outros fatores também são essenciais, tais como: a temperatura, ph, solvente e a presença de outras espécies podem ter um profundo efeito nas características luminescentes de uma substância, afetando não somente a velocidades dos processos luminescentes e dos processos não-radiativos, mas também a natureza e a energia relativa do estado excitado de menor energia (Schulman, 1977). Em geral o aumento da temperatura tem como conseqüência um aumento na eficiência dos processos de relaxamento vibracional (CI) na desativação do estado excitado. No entanto, por ser um fenômeno de tempo de vida relativamente curto, esse fator é menos crítico no caso da fluorescência, o que permite fácil observação do fenômeno na temperatura ambiente. A natureza do sistema de solventes também é fator relevante sendo que a sua viscosidade, polaridade e caráter prótico podem afetar significantemente a luminescência. A viscosidade pode diminuir a taxa de colisões bimoleculares desativadoras (quenching) pela diminuição da difusão de espécies desativadoras e do oxigênio no meio. No caso da fluorescência, a presença do oxigênio não é

47 crítica, pois este é apenas desativador do estado excitado tripleto, sendo assim, este é um parâmetro importante, no caso da fosforescência. Já a polaridade e o caráter prótico do solvente são importantes, pois afetam a energia do estado excitado (Ingle e Crouch, 1988). As moléculas rapidamente se reorientam em torno da molécula luminescente logo após serem promovidas para o estado excitado e antes do retorno para o estado fundamental. Conseqüentemente, a energia relativa do estado excitado após a fluorescência pode ser significantemente diferente do que era durante o processo de absorção. No caso das transições - *, comuns na fluorescência, a molécula no estado excitado é mais polar e tem caráter mais básico do que quando ela se encontra no estado fundamental. Assim, o aumento da polaridade do solvente ou do seu caráter prótico, acarreta numa diminuição da energia relativa do estado excitado, com deslocamento batocrômico do espectro (em direção ao vermelho). Essa diminuição de energia pode também acarretar no aumento da eficiência da CI com a contrapartida da diminuição da fluorescência. No caso das transições n- *, o estado excitado é menos polar e o aumento da polaridade ou do caráter prótico do solvente ocasiona deslocamentos hipsocrômicos (em direção ao azul). Outro efeito comum é decorrente da mudança do estado excitado singleto de n, * para, * (se as energias dos mesmos forem próximos o suficiente para permitir a troca) na presença de solventes polares ou de maior caráter prótico. Isso explica o porquê de algumas substâncias não fluorescerem ou apresentarem fraca fluorescência em solventes apolares ou não-próticos enquanto fluorescem intensamente em solventes polares e próticos (Ingle e Crouch, 1988). O efeito do ph nos sistemas de solventes próticos é relevante na fluorescência em moléculas aromáticas contendo grupos funcionais básicos ou ácidos, sendo muito comum observar significante diferença entre as propriedades luminescentes de moléculas protonadas e não-protonadas. Em fluorescência, certos cátions e ânions de elementos de elevada massa atômica causam a desativação do estado excitado singleto, seja pela mudança da multiplicidade do mesmo (S 1 T n ) ou pelo aumento da velocidade dos processos de desativação não-radiativos. Por exemplo, no caso dos halogenetos, esse efeito é mais comum para o iodeto, seguido do brometo e em muito menor intensidade

48 para o cloreto e fluoreto. Esse maior efeito desativador do estado excitado singleto causado por íons mais pesados se deve ao melhor acoplamento spin-orbital obtido entre esses íons e moléculas no estado excitado. Esse efeito, denominado de efeito externo do átomo pesado, é também observado para outros íons tais como Cd 2+, Pb 2+, Hg 2+ e Tl +. Outras substâncias podem desativar o estado excitado singleto por meio do quenching dinâmico. Quenching pode ser definido como transferência de energia, por processo não-radiativo, da substância de interesse no estado excitado (fluoróforo) para outras moléculas, que serão denominadas aqui como agentes desativadores (Q), que por sua vez passam para o estado excitado enquanto o fluoróforo retorna para o estado fundamental. O quenching dinâmico é um processo colisional e por isso requer o contato entre as espécies envolvidas. Em conseqüência, a magnitude dessa desativação é proporcional à concentração do agente desativador e da sua capacidade de difusão no meio. Substâncias concomitantes, presentes em maiores concentrações, podem também reduzir a luminescência líquida emitida por uma população de fluoróforos por meio da reabsorção da fluorescência (absorção secundária) (Ingle e Crouch, 1988; Schulman, 1977). 2.1.3. Relações quantitativas A relação existente entre concentração (C) e a intensidade da radiação absorvida (I a ) é dada pela Lei de Beer-Lambert (Equação 2). (2) I a = I 0 I t = I 0 (1-10 - Cl ) onde I 0 e I t são, respectivamente, as intensidades de radiação incidente e transmitida, é a absortividade molar característica da molécula absorvente, C é a concentração do analito e l é a espessura do caminho ótico percorrido pela radiação dentro do compartimento onde se encontra a amostra. No processo luminescente, I a passa a ser denominada de radiação de excitação.

49 Como vários processos competem pela desativação do estado excitado singleto, a intensidade de fluorescência I f (Equação 3) é obtida multiplicando-se a Equação 2 por f que é o fator que indica a fração de moléculas no estado excitado que efetivamente fluorescem. (3) I f = f I a Assim, combinando-se as Equações 2 e 3, temos a Equação 4: (4) I f = f I 0 (1-10 - Cl ) Considerando que a amostra contendo o fluoróforo (substância fluorescente) esteja em solução, que exista mínima perda por espalhamento da radiação de excitação, e que os valores de.c.l seja menor que 0,02 (condições opticamente finas observadas em soluções diluídas de fluoróforo), pode-se fazer a expansão em série da Equação 4. Os termos superiores da série podem ser negligenciados para simplificar o procedimento, obtendo-se assim a Equação 5: (5) I f = 2,3 f I 0.C l ou (6) I f = k C onde o valor de k pode ser facilmente obtido a partir de uma curva analítica. O efeito quantitativo da presença de agentes desativadores na fluorescência medida é dado pela relação de Stern-Volmer (Equação 7). 0 I F (7) 1 K q [ Q] I F onde I 0 F e I F são as intensidades das fluorescências na ausência e na presença do agente desativador Q, K q é a constante de Stern-Volmer, que por sua vez é a razão

50 entre a constante de velocidade do quenching (k q ) e o somatório dos outras constantes de velocidade dos processos de destativação do estado excitado singleto a mencionar: a constante de velocidade da fluorescência (k F ), a constante de velocidade do cruzamento interno (k CI ) e a constante de velocidade do cruzamento intersistemas (k CIS ), que por sua vez é o processo de mudança de multiplicidade do estado excitado (S 1 T n ). A relação entre K q e k q é dada pela Equação 8, onde 0 é o tempo de vida do evento luminescente na ausência do agente desativador. (8) K q = k q 0 Considerando que a taxa para colisão bimolecular em solução na temperatura ambiente é da ordem de 10 10 L mol -1 s -1, e que de todas as colisões resultam em desativação, o valor máximo para k q será 10 10 L mol -1 s -1. No caso da fluorescência, cujo tempo de vida é da ordem de ns (por exemplo, 0 = 1 ns), o valor esperado para K q é 10 L mol -1, que ao ser substituído na Equação de Stern- Volmer, implica em um quenching dinâmico da fluorescência quase negligenciável para concentrações de agente desativador na ordem de 1 mmol L -1. Para efeito de comparação, no caso da fosforescência (que tem 0 da ordem de ms), k q pode alcançar 10 7 L mol -1, o que implica em total desativação da luminescência com concentrações de agente desativador na ordem de 1 mmol L -1. Assim, no caso da fluorescência espera-se desativação significativa apenas em casos onde o agente desativador for um componente majoritário na matriz onde o analito se encontra (por exemplo, uma substância ativa associada presente em maior quantidade ou um veículo, no caso de medicamentos), já considerando as diluições inerentes à preparação da amostra. Fica claro a partir da discussão acima, que o conhecimento dos parâmetros experimentais é fundamental para se aproveitar o potencial máximo do fenômeno luminescente, em aplicações na química analítica, pois a manipulação de condições pode acarretar em significante aumento tanto da sensibilidade quanto da seletividade das determinações fluorimétricas (Ingle e Crouch, 1988 e Schulman, 1977).

51 2.2. Derivação fotoquímica Substâncias que não apresentam luminescência intrínseca natural podem ser induzidas a fluorescer ou fosforescer através de diversas reações que modificam a estrutura da molécula e conseqüentemente as propriedades físico-químicas dessas substâncias, obtendo-se assim, um derivado luminescente (derivação). Para a obtenção destes derivados pode-se efetuar, como por exemplo, reações com agentes oxidantes, agentes redutores, agentes fluorogênicos ou fosfogênicos (Yamaguchi et al., 1991; Katayama et al., 1993; Shibata et al., 1998), formação de quelatos com íons de terras raras e até mesmo por meio de simples reações ácido-base (Schulman, 1977). Esta técnica é amplamente utilizada em métodos analíticos baseados na fluorescência. Existe um outro tipo de derivação onde a molécula do analito de interesse é modificada por meio de reações fotoquímicas provocadas principalmente por radiação eletromagnética na região do ultravioleta (UV). O tratamento com UV é usado para obter a espécie derivada de um analito que possa ter, por exemplo, um rendimento quântico luminescente mais elevado, que melhore a sensibilidade das determinações analíticas. Alternativamente, este procedimento pode gerar derivados não-luminescentes provenientes de compostos luminescentes, que podem ser úteis para suprimir a luminescência de potenciais interferentes, quando misturas complexas são analisadas. Propriedades das moléculas como a absortividade molar, propriedades oxi-redutoras e as propriedades de retenção da mesma são também modificadas pela derivação fotoquímica. Em uma derivação fotoquímica faz-se uso da radiação UV para promover modificações em um determinado analito, não somente por meio da degradação da molécula original, mas também por reações catalisadas pela radiação UV. Dependendo de sua estrutura e dos componentes do meio reacional, um analito pode sofrer reações de fotoxidação, fotoredução, fotodecomposição, fotohidrólise entre outras reações. A radiação UV pode ser vista como um reagente prontamente disponível em várias intensidades, apresentando um baixo custo para sua aplicação e eliminando problemas relacionados com contaminação, como potencialmente pode-se observar com a adição de reagentes químicos. É também

52 possível selecionar faixas estreitas da banda do espectro para melhorar a reação de seletividade para misturas complexas (Calatayud e Benito, 1991). As reações de derivação fotoquímica têm sido usadas para induzir ou amplificar a luminescência de diversas drogas e outras substâncias de interesse clínico-biológico tais como os antihipertensivos, os antimicrobianos, os antidepressivos, e os antiinflamatórios, entre outros. Com tal procedimento, grande sensibilidade e seletividade podem ser alcançadas nas determinações analíticas dessas substâncias, utilizando um procedimento experimental relativamente simples. 2.3. Objetivos do Trabalho O objetivo deste trabalho é desenvolver um procedimento experimental para induzir fluorescência em moléculas de dois glicocorticóides sintéticos (prednisolona e triancinolona acetonido) que não possuem fluorescência natural. Por meio de um tratamento fotoquímico pretende-se obter um fotoproduto luminescente estável que possa ser utilizado para desenvolver uma metodologia analítica espectrofluorimétrica para análise de formulações farmacêuticas em várias apresentações (comprimidos, injetáveis e pomadas). Para alcançar este objetivo, o trabalho foi dividido em etapas: - Estudo preliminar das condições necessárias para obtenção de derivados fluorescentes. - Desenvolver e otimizar um procedimento analítico padronizado que promovesse, em condição ótima, intensa fluorescência dos derivados fotoquímicos dos analitos diretamente em solução. - Obter parâmetros analíticos de mérito e validar, mesmo que parcialmente, o método analítico. - Aplicar o método na analise de medicamentos. - Estudar a potencialidade da aplicação do procedimento de indução fotoquímica de fluorescência com técnicas de cromatografia líquida.