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Transcrição:

52 DISMORFIA MUSCULAR EM HOMENS NÃO ATLETAS PRATICANTES DE TREINAMENTO RESISTIDO: UMA REVISÃO SISTEMÁTICA Sidnei Jorge Fonseca Junior 1 Aldair José de Oliveira 2 Anna Paola Trindade Pierucci 1 RESUMO Desde a adolescência os homens desejam um corpo mais musculoso. O objetivo do estudo foi investigar a prevalência ou incidência da dismorfia muscular em homens não atletas praticantes de treinamento resistido. Foram analisados os títulos e resumos nas bases de dados Web of Science, BVS (Biblioteca Virtual em Saúde) e Pubmed, utilizando os seguintes termos: muscle dysmorphia OR bigorexia. Do total de 22 artigos selecionados para leitura apenas quatro artigos foram utilizados neste estudo por apresentarem a prevalência de DM especificamente em homens não atletas praticantes de TR. Os valores de prevalência de DM variaram de 10% a 54%, dependendo do critério de avaliação e das características da amostra. Os valores de prevalência de DM em homens praticantes de TR foram considerados altos por se tratar de uma amostra de não atletas, podendo, ainda, estarem subestimados devido às limitações dos métodos de diagnóstico. Palavras-chave: Imagem corporal, Exercício físico, Desordens alimentares, Saúde. ABSTRACT Muscle dysmorphia in non-athletes males who practice strength exercise: a systematic review. Since adolescence, boys desire a more muscular body. The aim of the study was to investigate the prevalence of muscle dysmorphia in non-athletes males who practice strength exercise. We analyzed the titles and abstracts in the databases Web of Science, BVS and PubMed using the following terms: muscle dysmorphia OR bigorexia. Of the total of 22 articles selected for reading only four were used in this study because showed prevalence of dysmorphia muscle in nonathletes males who practice strength exercise. The values of prevalence ranged from 10 % to 54 %, depending on the evaluation criteria and sample characteristics. The values of prevalence were considered high because is a sample of non-athletes males, and may also be underestimated due to the limitations of the diagnostic methods. Key words: Body image, Exercise, Eating disorders, Health. 1-Desenvolvimento de Alimentos para Fins Especiais e Educacionais (DAFEE)/Instituto de Nutrição Josué de Castro, Universidade Federal do Rio de Janeiro. 2-Laboratório de Dimensões Sociais Aplicadas à Atividade Física e ao Esporte (LABSAFE)/Departamento de Educação Física e Desportos, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. E-mail: sjfjunior@gmail.com oliveira.jose.aldair@gmail.com appierucci@gmail.com Endereço para correspondência: Endereço: Rua Guaraná, n90, Rocha Miranda, Rio de Janeiro RJ. CEP: 21540-700, São Paulo. v. 8. n. 43. p.52-57. Jan/Fev. 2014. ISSN 1981-9927.

53 INTRODUÇÃO Descrita inicialmente como anorexia reversa, a dismorfia muscular (DM) é um subtipo de transtorno dismórfico corporal e caracteriza-se pela busca compulsiva da hipertrofia muscular e redução da gordura corporal. Dentre as principais características estão o treinamento resistido (TR), ou seja, exercícios de contra resistência para o desenvolvimento da força e hipertrofia muscular de forma compulsiva apesar das dores ou lesões, dietas isentas de gorduras e com alto teor de proteínas mesmo quando há fome, utilização e dependência de esteroides anabolizantes androgênicos, a imagem de um corpo pequeno e franzino quando na realidade é grande e musculoso e reflexos negativos na vida social (Pope e colaboradores, 1997; Behar e Molinari, 2010; Murray e Touyz, 2013). Nesse sentido, por serem indivíduos mais propensos a DM, devido a necessidade de massa muscular hipertrofiada e baixa quantidade de gordura corporal para uma boa performance, os fisiculturistas, halterofilistas e jogadores de futebol americano são comumente investigados, havendo uma busca pela identificação e diferenciação de suas sintomatologias (Baghurst e Lirgg, 2009; Choi, Pope e Olivardia, 2002). Entretanto, as imposições da mídia por um padrão de beleza masculino que destaca corpos fortes e musculosos podem contribuir para uma busca compulsiva pelo aumento da musculatura e distorções na imagem corporal também em não atletas (Iriart, Chaves e Orleans, 2009). O estudo de Hildebrant e colaboradores (2006) identificou uma prevalência de DM de 16,9% em uma amostra de 237 indivíduos usuários de academias de TR, frequentadores de lojas de suplementos nutricionais, universidades e comércios. A prevalência poderia ser maior caso a amostra fosse restrita aos usuários de academias e de suplementos nutricionais por serem grupos mais propensos aos comportamentos de risco para DM, sendo este resultado um alerta para investigações em não atletas praticantes de TR. Em adendo, Babusa e Túri (2012) identificaram o uso de esteroides anabolizantes e as desordens alimentares entre as características de DM em praticantes não atletas de TR, mas não se preocuparam em descrever a prevalência. Ayensa e colaboradores (2011) caracterizaram os usuários de academias de TR como uma população mais propensa a hábitos alimentares e práticas de exercícios inadequados. Segura-Garcia e colaboradores (2010) descreveu um grupo de 52 usuários sem fins competitivo de uma academia de TR que tinham o objetivo de hipertrofia muscular, observando que 53,8% faziam uso de suplementos alimentares e esteroides anabolizantes, além de 90,4% realizarem dietas hiperproteicas, que são características da DM. Nesse âmbito, ao levar em consideração que desde a adolescência o gênero masculino deseja um corpo mais musculoso (Jones e Crawford, 2005) e que as academias de TR seria um dos lugares mais propícios para a conquista deste sonho, surge a importância de analisar as investigações específicas sobre a prevalência de DM em praticantes de TR não atletas, com o intuito de alertar sobre a necessidade de estratégias de prevenção como já ocorre com a anorexia e a bulimia nervosa. Desta forma, o objetivo do estudo foi investigar, através da literatura pertinente, a prevalência da DM em homens não atletas praticantes de TR. MATERIAIS E MÉTODOS A revisão sistemática da literatura constou de uma busca nas bases de dados Web of Science, BVS (Biblioteca Virtual em Saúde) e Pubmed, em julho de 2013, utilizando os seguintes termos: muscle dysmorphia OR bigorexia. Foram analisados os títulos e resumos por um único avaliador, sendo selecionados para leitura artigos em inglês, espanhol e português, que apresentaram a prevalência de DM em praticantes de Artigos que apresentaram dados que possibilitaram o cálculo da prevalência também foram incluídos. A busca na Web of Science resultou em 147 resumos, com 18 selecionados para a leitura dos artigos na íntegra. A busca na BVS resultou em 73 resumos, dos quais 41 eram duplicatas da busca da Web of Science. Entre, São Paulo. v. 8. n. 43. p.52-57. Jan/Fev. 2014. ISSN 1981-9927.

54 os 32 analisados, quatro foram selecionados para leitura; Na Pubmed 70 resumos foram analisados, dos quais 61 eram duplicatas da Web of Science ou BVS, sendo analisados mais nove resumos e nenhum selecionado. Do total de 22 artigos selecionados para leitura apenas quatro artigos foram utilizados neste estudo por apresentarem a prevalência de DM em homens não atletas praticantes de TR. RESULTADOS Os resultados dos quatro artigos incluídos neste estudo para maiores discussões podem ser observados na tabela 1, sendo analisados o país de publicação, as características da amostra, os métodos de avaliação de DM e a prevalência encontrada. O estudo de Zapeda, Franco e Valdés (2011) utilizou como amostra indivíduos de 18 a 38 anos de idade que realizavam TR no mínimo três vezes por semana, com duração maior que uma hora e que não realizavam outras atividades físicas que interferissem na hipertrofia muscular. A amostra foi selecionada de forma intencional em uma cidade pequena e semiurbana. Tabela 1 - Prevalência de DM em homens praticantes de treinamento resistido não atletas. Autores (ano) - Instrumento de avaliação Amostra Prevalência de DM país de DM Zepeda, Franco Escala de Motivação pelo 100 praticantes de 22 % apresentaram sintomas e Valdés (2011) Desenvolvimento Muscular de DM. - México. (DMS- sigla em inglês). Behar e Molinari (2010) - Chile. Lima, Moraes e Kirsten (2010) - Brasil. Sardinha, Oliveira e Araújo (2008) - Brasil. 88 praticantes de 23 praticantes de 100 praticantes de Uma entrevista autoadministrada construída pelas autoras com base nos critérios diagnósticos da literatura atual. MASS Muscle Appearance Satisfaction Scale Versão traduzida para a língua portuguesa do (MASS); Índice antropométrico (braço contraído/perna>1) Legenda: TR=Treinamento resistido; DM=Dismorfia muscular. 13,6% foram considerados com DM. 17,4% apresentaram risco de DM. Prevalência através do MASS: 10% antes do TR 14% após o TR; Prevalência através do Índice antropométrico: 37% antes do TR 54% após o TR Behar e Molinari (2010) investigaram homens que praticavam TR por um período maior que seis meses, treinavam três ou mais vezes por semana e não possuíam antecedentes de transtornos alimentares. Indivíduos de quatro academias particulares que estavam de acordo com os critérios de inclusão foram convidados a participar entre os anos de 2006 e 2009. A pesquisa de Lima, Moraes e Kirsten (2010) investigou homens declaradamente saudáveis, com idade entre 18 e 35 anos de idade e praticantes de exercícios de hipertrofia muscular regularmente. Os indivíduos foram selecionados aleatoriamente de academias do Centro, no entanto os autores relataram resistência de participação devido ao receio de declarar o uso de substâncias licitas ou ilícitas, assim como a exposição de sua composição corporal, podendo observar uma grande negação dos indivíduos visualmente com DM. Sardinha, Oliveira e Araújo (2008) utilizaram homens de 18 a 35 anos de idade, praticantes de exercícios de fortalecimento muscular por no mínimo seis meses, sem interrupções de treinamento superiores a um mês nos últimos seis meses, não estar participando de atividades aeróbias, e ter completado a sessão de TR planejada para o, São Paulo. v. 8. n. 43. p.52-57. Jan/Fev. 2014. ISSN 1981-9927.

55 dia do estudo. Os indivíduos foram selecionados por conveniência. DISCUSSÃO Após análise dos artigos, apenas quatro foram os que se dedicaram a investigar a prevalência de DM em praticantes de TR não atletas, parecendo que esta população ainda não gera maiores preocupações por parte dos pesquisadores. Dificuldades de aceitação em participar das pesquisas, em virtude da necessidade de responder sobre dados excessivamente pessoais, pode ser mais uma explicação para não haver uma quantidade expressiva de estudos. A respeito dos métodos de avaliação de DM, o MASS foi utilizado em dois dos estudos selecionados (tabela 1) e é comumente referenciado na literatura (Nieuwoudt e colaboradores, 2012), sendo inclusive considerado para validar demais métodos (Oliveira e Araújo, 2004; Robert, Munroe-Chandler e Gammage, 2009). Os outros métodos utilizados foram o DMS, uma entrevista estruturada de acordo com sintomas referenciados pela literatura e um critério antropométrico. Entretanto, a pesquisa de Nieuwoudt e colaboradores (2012) sugere que futuras investigações devem examinar a confiabilidade e validade de métodos de diagnóstico da DM, incluindo a avaliação da inter e intra confiabilidade de avaliadores. Em geral, os valores de prevalência de DM variaram de 10% a 54%, dependendo do critério de avaliação e das características da amostra (tabela 1). Por não se tratar de uma amostra de atletas que necessitam de hipertrofia muscular, esses valores podem ser considerados altos e perigosos. O estudo de Sardinha, Oliveira e Araújo (2008) apresentou a prevalência de DM avaliada através de um critério antropométrico e do MASS; Neste estudo observou-se através dos dois instrumentos de avaliação uma prevalência maior após o treino, uma informação que merece novas investigações. A maior prevalência encontrada através do critério antropométrico pode ser considerada preocupante, pois os resultados obtidos por meio de questionários podem ser subestimados, devido às questões oferecerem certo constrangimento para as respostas. Observa-se que os estudos selecionados foram realizados em países da América Central e do Sul que sofrem influências da cultura norte americana e, consequentemente, do culto a muscularidade corporal e magreza (Giardino e Procidiano, 2012), contribuindo com os altos valores encontrados na prevalência. Entretanto, as limitações citadas e observadas no processo de seleção dos participantes em todos os estudos selecionados podem ter subestimados esses valores. Vale ressaltar que os processos de seleção da amostra determinam quem são os usuários de academias praticantes de TR mais propensos a DM. Nesse sentido, observa-se maiores preocupações com indivíduos de idade jovem, que realizam treinamento por mais de seis meses sem interrupção, treinando mais de três vezes por semana, com programas que superam uma hora diária de treinamento e que não realizam atividades aeróbicas. As consequências negativas à saúde deveriam gerar maiores preocupações a respeito da DM em não atletas. O uso exacerbado de substâncias ergogênicas, incluindo os esteroides anabolizantes (Behar e Molinari, 2010), hábitos alimentares inadequados incluindo dietas hiperproteicas e com baixa quantidade de gordura e casos de transtornos alimentares (Contesini e colaboradores, 2013; Ayensa e colaboradores, 2011; Segura-Garcia e colaboradores, 2010; Olivardia, Pope e Hudson, 2000), relações interpessoais prejudicadas, com interferências na vida sexual e profissional (Behar e Molinari, 2010; Murray e Touyz, 2013), sintomas depressivos (Leone, Sedory e Gray, 2005) e outras possíveis comorbidades psiquiátricas associadas (Cafri, Olivardia e Thompson, 2008) mostram a necessidade de uma equipe multidisciplinar para um tratamento eficaz. Ademais, a possibilidade de aumento na prevalência de DM nas próximas décadas, devido, principalmente, ao aumento da insatisfação masculina com sua aparência e ao culto da musculosidade como padrão de beleza, mostra a importância da propagação de maiores conhecimentos ao assunto aos profissionais de saúde que são responsáveis pela prescrição de TR e dietas de usuários de academias, pois o problema parece ser tão grave para o gênero masculino como os transtornos alimentares são para o feminino,, São Paulo. v. 8. n. 43. p.52-57. Jan/Fev. 2014. ISSN 1981-9927.

56 embora a aparência repleta de músculos bem desenvolvidos seja confundida como saudável (Leone, Sedory e Gray, 2005; Murray e Touyz, 2013). CONCLUSÃO Os valores de prevalência de DM em homens praticantes de TR foram considerados altos por se tratar de uma amostra de não atletas, podendo, ainda, estarem subestimados por ocasião das limitações dos métodos de diagnóstico. Nesse âmbito, surge a importância de uma maior atenção por parte das políticas de saúde pública, devido, principalmente, as consequências negativas à saúde física, social e mental que podem ser causadas em indivíduos com DM. Futuras investigações em populações de usuários de academias parecem necessárias, incluindo a análise da incidência e de estratégias de informação e prevenção para este transtorno psiquiátrico por parte dos profissionais que atuam com este público. REFERÊNCIAS 1-Ayensa, J. I. B.; Díaz, A. G.; Ortiz, C. R.; Andujo, O. S. Imagen corporal, hábitos alimentarios y hábitos de ejercicio físico en hombres usuarios de gimnasio y hombres universitarios no usuários. Revista de Psicología Del Deporte. Vol. 20. Núm. 2. 2011. p353-366. 2-Babusa, B.; Túry, F. Muscle Dysmorphia in Hungarian non competitive male bodybuilders, Eating Weight Disorders. Vol. 17. Núm. 1. 2012. p49-53. 3-Baghurst, T.; Lirgg, C. Characteristics of muscle dysmorphia in male football, weight training, and competitive natural and nonnatural bodybuilding samples. Body Image. Vol. 6. 2009. p.221-227. 4-Behar, R.; Molinari, D. Dismorfia muscular, imagen corporal y conductas alimentarias em dos poblaciones masculinas. Revista Medica de Chile. Vol. 138. 2010. p1386-1394. 5-Cafri, G. A.; Olivardia, R.; Thompson, K. Symptom characteristics and psychiatric comorbidity among males with muscle dysmorphia. Comprehensive Psychiatry. Vol. 49. 2008. p374 379. 6-Choi, P. Y. L.; Pope Jr, H. G.; Olivardia, R. Muscle dysmorphia: a new syndrome in weightlifters. British Journal Sports of Medicine. Vol. 36. 2002. p.375-377. 7-Contesini, N.; Adami, F.; Blake, M. T.; Monteiro, C. B.; Abreu, L. C.; Valenti, V. E.; Almeida, F. S.; Luciano, A. P.; Cardoso, M. A.; Benedet, J.; Vasconcelos, F. A.; Leone, C.; Frainer, D. E. Nutritional strategies of physically active subjects with muscle dysmorphia. International Archives of Medicine. Vol. 25. Núm. 6. 2013. p.1-6. 8-Giardino, J. C.; Procidano, M. E. Muscle dysmorphia symptomatology: a cross-cultural study in Mexico and the United States. International Journal of Men s health. Vol. 11. Núm. 1. 2012. p.83-103. 9-Hildebrandt, T.; Schlundt, D.; Langenbucher, J.; Chung, T. Presence of muscle dysmorphia symptomology among male weightlifters. Comprehensive Psychiatry. Vol. 47. 2006. p.127-135. 10-Iriart, J. A. B.; Chaves, J. C.; Orleans, R. G. Culto ao corpo e uso de anabolizantes entre praticantes de musculação, Cadernos de Saúde Pública. Vol. 25. Núm. 4. 2009. p.773-782. 11-Jones, D. C.; Crawford, J. K. Adolescent boys and body image: weight and muscularity concerns as dual pathways to body dissatisfaction. Journal of Youth and Adolescence. Vol. 34. Núm. 6. 2005. p.629-636. 12-Leone, J. E.; Sedory, E. J.; Gray, K. A. Recognition and Treatment of Muscle Dysmorphia and Related Body Image Disorders. Journal of Athletic Training. Vol. 40. Núm. 4. 2005. p352-359. 13-Lima, L. D.; Moraes, C. M. B.; Kirsten, V. R. Dismorfia Muscular e o uso de Suplementos Ergogênicos em Desportistas. Revista Brasileira de Medicina do Esporte. Vol. 16. Núm. 6. 2010. p.427-430., São Paulo. v. 8. n. 43. p.52-57. Jan/Fev. 2014. ISSN 1981-9927.

57 14-Murray, S. B.; Touyz, S. W. Muscle dysmorphia: Towards a diagnostic consensus. Australian & New Zealand Journal of Psychiatr. Vol. 4. Núm. 3. 2013. p.206-207. 15-Nieuwoudt, J. E.; Zhou, S.; Coutts, R. A.; Booker, R. Muscle dysmorphia: Current research and potential classification as a disorder. Psychology of Sport and Exercise. Vol. 13. 2012. p.569e-577. Revista Chilena de Nutrición. Vol. 38. Núm. 3. 2011. p.260-267. Recebido para publicação em 19/11/2013 Aceito em 27/12/2013 16-Olivardia, R.; Pope, H. G.; Hudson, J. I. Muscle dysmorphia in male weight-lifters: a case-control study. American Journal of Psychiatry. Vol. 157. 2000. p.1291-1296. 17-Oliveira, A.; Araújo, C. G. S. Proposição de um critério antropométrico para suspeita diagnóstica de dismorfia muscular. Revista Brasileira de Medicina do Esporte. Vol. 10. Núm. 3. 2004. p.187-190. 18-Pope Jr, H. G.; Gruber, A. J.; Choi, P.; Olivardia, R.; Phillips, K. A. Muscle dysmorphia. An under recognized form of body dysmorphia disorder. Psychosomatics. Vol. 38. 1997. p.548-557. 19-Robert, C. A.; Munroe-chandler, K. J.; Gammage, K. L. The relationship between the drive for muscularity and Muscle Dysmorphia. The Journal of the Strength and Conditioning Research. Vol. 23. Núm. 6. 2009. p.1656-1662. 20-Sardinha, A.; Oliveira, A.; Araújo, C. G. S. Dismorfia Muscular: Análise Comparativa Entre um Critério Antropométrico e um Instrumento Psicológico. Revista Brasileira de Medicina do Esporte. Vol. 14. Núm. 4. 2008. p.387-392. 21-Segura-Garcia, C.; Ammendolia, A.; Procopio, L.; Papaianni, M. C.; Sinopoli, F.; Bianco, C.; De Fazio, P.; Capranica, A. Body uneasiness, eating disorders, and muscle dysmorphia in individual who over exercise, The Journal of the Strenght and Conditioning Research. Vol. 24. Núm. 11. 2010. p.3098-3104. 22-Zapeda, E.; Franco, K.; Valdés, E. Estado Nutricional y Sintomatologia de Dismorfia Muscular em Varones Usuarios de Gimnasio,, São Paulo. v. 8. n. 43. p.52-57. Jan/Fev. 2014. ISSN 1981-9927.