Espectrometria Compton aplicada à medição de doses em mamografia para combinações W/Mo e Mo/Mo

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Artigo Original Revista Brasileira de Física Médica.2010;4(2):39-43. Espectrometria Compton aplicada à medição de doses em mamografia para combinações W/Mo e Mo/Mo Compton spectrometry applied to dose measurement in mammography for W/Mo and Mo/Mo combinations José N. Almeida Jr 1, Ricardo A. Terini 2, Silvio B. Herdade 3, Tânia A. C. Furquim 3 1 Curso de Física da Pontifícia Universidade Católica (PUC) São Paulo (SP), Brasil. 2 Departamento de Física da PUC São Paulo (SP), Brasil. 3 Instituto de Eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo (USP) São Paulo (SP), Brasil. Resumo A dose glandular média (DGM) não pode ser medida diretamente em equipamentos mamográficos. Métodos baseados na espectrometria Compton são alternativas para avaliar distribuições de dose em um simulador de mamas, tornando possível a estimativa da DGM. Neste trabalho, um detector de CdTe foi usado para as medições espectrométricas de feixes de raios X espalhados a aproximadamente 90 o, por efeito Compton, por um cilindro de PMMA, inserido entre as placas de um simulador de mama. A reconstrução do espectro dos feixes primários, a partir dos medidos, foi feita utilizando a teoria de Klein-Nishina e o formalismo de Compton, seguida pela determinação do kerma no ar incidente na superfície do simulador, da dose absorvida e, finalmente, da DGM. Os espectros dos feixes de raios X incidentes e as distribuições de dose em profundidade em um simulador de BR-12 foram determinados para a faixa de mamografia (28 a 35kV). Os resultados mostraram bom acordo com dados da literatura, obtidos com TLD. Palavras-chave: espalhamento Compton; mamografia; detector de raios X; simuladores; dosimetria. Abstract Mean Glandular Dose (MGD) cannot be measured directly in mammography equipments. Therefore, methods based on Compton spectrometry are alternatives to evaluate dose distributions in a standard breast phantom, as well as mean glandular dose. In this work, a CdTe detector was used for the spectrometry measurements of radiation scattered by Compton Effect, at nearly 90 o, by a PMMA cylinder inserted between the breast phantom plates. For this, the reconstruction of primary beam spectra from the scattered ones has been made using Klein-Nishina theory and Compton formalism, followed by a determination of incident air kerma, absorbed dose values in the breast phantom and, finally, MGD. Incident and attenuated X-ray spectra and depth-dose distributions in a BR-12 phantom have been determined and are presented for the mammography range (28 to 35kV). Results have shown good agreement with previous literature data, obtained with TLD. Keywords: Compton scattering; mammography; x-ray detectors; imaging phantoms; dosimetry. Introdução A mamografia com raios X é amplamente utilizada para prevenção do câncer de mama. Nessa técnica, há um risco pequeno, mas significativo, de carcinogênese induzida por radiação. Assim, a dosimetria em mamografia é essencial. A partir de medidas de kerma no ar incidente na superfície de simuladores de mama, fatores de conversão podem ser aplicados para avaliar a dose glandular média (DGM), uma grandeza relevante para a avaliação do risco de câncer na mamografia. Esses fatores de conversão são geralmente obtidos por cálculos de Monte Carlo, ou por medidas de dose em profundidade, em simuladores homogêneos de mama, realizadas utilizando TLD s ou câmaras de ionização 1,2. Neste trabalho, são apresentados os resultados de distribuições de dose em profundidade e de DGM, em um simulador mamário de BR-12, bem como os respectivos espectros de raios X, determinados com o auxílio de um espectrômetro Compton. Com essa finalidade, placas do simulador foram localizadas perpendicularmente a feixes padrões de raios X incidentes, produzidos por dois equipamentos adaptados para mamografia, para tensões de 28 a 35kV. Um cilindro espalhador de radiação foi inserido em algumas profundidades dentro do simulador, para as medições espectrométricas. Correspondência: Ricardo Andrade Terini Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Faculdade de Ciências Exatas e Tecnologia, Departamento de Física, Rua Marquês de Paranaguá, 111, Consolação 01303-050 São Paulo (SP), Brasil E-mail: rterini@pucusp.br Associação Brasileira de Física Médica 39

Almeida Jr JN, Terini RA, Herdade SB, Furquim TAC Material e métodos Os raios X eram produzidos por dois aparelhos: um mamógrafo clínico GE Senographe 700T, com combinação anodo/filtro Mo/30μmMo, e um sistema industrial Philips com tubo MCN323, adaptado para funcionar na faixa de mamografia, utilizando combinação W/60μmMo. Os feixes de raios X foram medidos com um espectrômetro de CdTe (Amptek, Inc.), após espalhamento a cerca de 90 em relação à direção de incidência do feixe primário, por uma vareta de Lucite (PMMA) de 6mm de diâmetro, localizada sob determinadas espessuras do simulador de mamas de BR-12 (50% glandular-50% adiposo) (Nuclear Associates, NY, USA). O simulador, formado por placas retangulares, configurava 6 cm de espessura total, para 30, 32 e 35kV, e 4cm, para 28kV. Os dados foram obtidos para repetidas exposições de 100 mas (GE), ou para exposições contínuas com correntes de 25 ou 30mA (Philips). Para as medições com o mamógrafo clínico foi adaptado um diafragma de chumbo (10 mm de diâmetro total), na saída do tubo e para o outro sistema, um colimador de chumbo de 21mm de abertura. A distância do ponto focal à superfície do simulador era de 58cm (para 30kV a 35kV) e 60 cm (para 28 kv), para os dois equipamentos. Determinação do ângulo de espalhamento O espectrômetro foi calibrado por meio de energias conhecidas de raios X e γ, de fontes radioativas de 241 Am e 133 Ba. Em seguida, a partir de cada espectro medido do feixe mamográfico espalhado e calibrado, foi calculado o ângulo de espalhamento através da equação (1), usando o formalismo de Compton 3, utilizando, para tanto, as energias medidas dos raios X característicos incidente (E) (K α 17,48keV, e K β 19,61keV) e espalhados (E ), com E e E em kev: = cos 1 E E θ 1 511. (1) E. E Na combinação Mo/Mo, obteve-se a energia E do feixe espalhado ajustando múltiplas curvas lorentzianas aos dados dos raios X característicos do espectro, por meio do método dos mínimos quadrados, aplicado aos picos deslocados (K α e K β ), e aos referentes às energias originais (E) do molibdênio. Na combinação W/Mo, E e E foram obtidas através de um método de determinação da tensão de pico (kvp), através de regressão linear no final do espectro 4. Nesse caso, E (kev) é numericamente igual ao valor de tensão (em kv) de referência aplicada ao tubo e E (kev), ao valor obtido pelo método de regressão. O ângulo de espalhamento θ foi calculado para cada feixe medido com o mamógrafo clínico e com o equipamento de potencial constante. Todos os espectros dos feixes de raios X espalhados foram corrigidos para eficiência intrínseca do detector, escape K e atenuação nos absorvedores situados entre espalhador e região sensível do detector. A Figura 1 mostra o equipamento usado nas medições dos espectros dos feixes espalhados pelo cilindro de PMMA, incluindo o espectrômetro Compton e as placas de BR-12, para a combinação Mo/Mo. Para a combinação W/Mo, o arranjo foi semelhante ao usado com Mo/ Mo. A distância entre o ponto focal e o suporte das placas foi mantida em 64cm. Determinação dos espectros dos feixes primários Para a reconstrução do espectro do feixe primário, via feixe espalhado, as teorias de Compton e de Klein-Nishina foram utilizadas. A contribuição do espalhamento coerente foi determinada e subtraída, porque é relevante na faixa de mamografia (acima de 18%). Na análise dos dados, foi usado um método 5 baseado no descrito por Yaffe et al. 6 e Matscheko et al. 7. Determinou-se a taxa de fluência, Φ inc (E,θ), do feixe incidente no espalhador, a partir da taxa de fótons, N d,incoh (E,θ), que sofreram espalhamento Compton e foram detectados, e da seção de choque do espalhamento incoerente, dσ/dω (E,θ) dada através de : dσ r ( E θ) 0 2.( 1 cos 2 θ ).( F ( E, θ)).( S( χ, Z )) KN dω (2) 2 incoh A correção para energia de ligação dos elétrons atômicos do material espalhador foi feita através da função de espalhamento incoerente, S (χ,z) 8. Além disso, r 0 = 2,81794.10-13 cm é o raio clássico do elétron; χ = [sen (θ/2)] /λ, é o momento do fóton, de comprimento de onda λ, transferido ao elétron; Z é o número atômico efetivo do PMMA e F KN é o fator de Klein-Nishina 3. Assim, a taxa de fluência de fótons incidentes no simulador, Φ inc (E,θ), em [fótons. s -1.cm -2.keV -1 ], foi obtida por: Φ inc E N ( E, θ) (, θ) d, incoh M d σ. ( E, θ). dω. f ( E, E, t). na dω incoh onde M é a massa irradiada do espalhador, que espalha os fótons que alcançarão o detector; na = N a / A, é o número de moléculas/grama de PMMA, para N a, o número de Avogrado e A, a massa molecular do PMMA; dω é o ângulo sólido de detecção da radiação espalhada; f(e,e,t) é um fator de correção para a absorção de fótons no espalhador, antes e depois do espalhamento, na espessura efetiva t 7. Determinação da dose absorvida no phantom O espectro de kerma no ar (K ar ) foi obtido a partir do espectro do feixe primário 3. Os espectros de dose absorvida no simulador foram determinados utilizando valores experimentais de coeficientes mássicos para absorção de energia no BR-12 (3) 40 Revista Brasileira de Física Médica.2010;4(2):39-43.

Espectrometria Compton aplicada à medição de doses em mamografia para combinações W/Mo e Mo/Mo ((μ Ab /ρ) BR-12 ), (em [mgy.mas -1.keV -1 ]), determinados por nós 9, como mostrado na equação (4): 6 µ Ab D E = E 19 10 ( ) Φ 1 602 10 BR 12 inc (E, θ), ρ mas BR 12 (4) O kerma no ar incidente e a dose absorvida no BR- 12, em [mgy.mas -1 ], foram determinados integrando os respectivos espectros obtidos. As taxas de kerma no ar determinadas foram comparadas com medidas diretas feitas com uma câmara de ionização (6M modelo 10x5,Radcal,Co). A partir dos valores de dose absorvida, obtidos para várias profundidades de BR-12, pelo método espectrométrico, doses relativas foram calculadas e comparadas a valores obtidos com TLD s por Stanton 1 (para combinação Mo/Mo). Aplicando fatores de conversão (f g ) para tecido glandular, e de retroespalhamento (B), calculou-se a DGM em uma mama comprimida de espessura τ, pelo modelo de Hammerstein et al. 10. Assim, a dose glandular média normalizada por unidade direta do kerma no ar na entrada do simulador (K S ) incidente na superfície é: τ 0, 5 f. B g K ( z ) τ 1 K S 0, 5 onde K(z) é o kerma no ar medido no espaço entre as placas de BR-12, à profundidade z da superfície. Obteve-se, para o mamógrafo clínico, também por medição direta na entrada do simulador com câmara de ionização, com base em algoritmo de Sobol 11. Resultados Na Tabela 1, para a combinação Mo/Mo, estão listados valores de dose absorvida na superfície de BR-12, de e de kerma no ar, bem como de camada semi redutora (CSR) e de ângulo de espalhamento, determinados para as medições feitas para os feixes incidentes no simulador. Na Tabela 2, estão listados os mesmos parâmetros da Tabela 1, obtidos para W/Mo sem atenuação e com profundidades de 1 a 4cm de BR-12. Nas Tabelas 3 e 4, estão presentes os resultados de kerma no ar, dose absorvida,, e CSR, obtidos com a câmara de ionização, para o mamógrafo clínico (Tabela 3) e para o sistema industrial (Tabela 4). Incertezas estão expressas com fator de abrangência k = 1. A influência da tensão do tubo pode ser notada na Figura 2 (para W/Mo). Os espectros de feixes incidentes na superfície de BR-12, podem ser observados para tensões de 28 a 35kV. A maior diferença entre eles está no final da região contínua. dz (5) Figura 1. Arranjo experimental usado para combinação Mo/ Mo, mostrando (1) espectrômetro de CdTe, com colimador de tungstênio com orifício de 2mm, suporte e pré-amplificador, (2) cilindro espalhador de PMMA entre (3) placas do simulador de BR-12, o qual é colocado entre (4) bandeja de compressão e (5) receptor de imagens, no equipamento GE Senographe 700T. Tabela 1. Resultados de dose absorvida em BR-12 (D BR-12 ), kerma no ar incidente(k Ar ), dose glandular média normalizada ( ) e camada semi-redutora (CSR), obtidos por espectrometria Compton, para combinação Mo/Mo. Todas as medições se referem a 0 cm de atenuação de BR-12. Tensão (kv) Ângulo D BR-12 K Ar CSR (graus) (mgy) (mgy) (mmal) 28 103,05(5) 6,23(19) 6,42(20) 0,38(3) 0,23(2) 30 102,38(5) 29,14(15) 30,88(16) 0,39(3) 0,16(2) 35 100,68(5) 47,54(22) 48,55(22) 0,43(4) 0,20(3) Tabela 2. Resultados de dose absorvida em BR-12 (D BR-12 ), kerma no ar incidente(k Ar ), dose glandular média normalizada ( ) e camada semi-redutora (CSR), obtidos por espectrometria Compton, para combinação W/Mo, em diferentes profundidades.no simulador de BR-12. Tensão Prof. Ângulo D BR-12 K Ar CSR (kv) BR12 (cm) (graus) (mgy) (mgy) (mmal) 0 88,13(10) 6,12(22) 6,39(23) 0,39(3) 28 1 90,05(11) 1,26(15) 1,29(15) 0,42(3) 2 90,01(08) 0,46(5) 0,45(5) 0,45(4) 3 84,38(30) 0,18(3) 0,15(2) 0,48(4) 0 89,94(08) 7,89(18) 8,10(19) 0,40(3) 1 90,50(12) 3,39(12) 3,33(12) 0,45(4) 30 2 89,95(07) 1,52(9) 1,46(9) 0,49(4) 3 89,86(07) 0,92(7) 0,76(7) 0,54(5) 4 84,28(31) 0,29(6) 0,22(4) 0,58(5) 0 89,71(10) 8,53(24) 8,57(24) 0,42(4) 1 90,29(08) 4,51(17) 4,37(16) 0,49(5) 32 2 90,10(07) 2,40(13) 2,10(11) 0,55(5) 3 89,86(07) 1,54(12) 1,31(10) 0,61(5) 4 84,48(31) 0,63(10) 0,47(8) 0,66(6) 0 90,91(10) 12,63(35) 12,09(36) 0,46(5) 1 90,15(08) 7,07(20) 6,39(18) 0,50(5) 35 2 90,26(07) 3,98(18) 3,02(14) 0,58(6) 3 89,83(06) 1,78(13) 1,20(9) 0,68(6) 4 84,58(32) 1,15(12) 0,67(7) 0,75(8) 0,05(1) 0,14(2) 0,15(2) 0,18(2) Revista Brasileira de Física Médica.2010;4(2):39-43. 41

Almeida Jr JN, Terini RA, Herdade SB, Furquim TAC Tabela 3. Resultados obtidos com câmara de ionização, para dose na entrada da pele (DEP(CI) BR-12 ) kerma no ar incidente (K Ar ), dose glandular média normalizada ( ) e camada semi-redutora (CSR), para combinação Mo/Mo, para 100 mas. Tensão (kv) DEP(CI) BR12 (mgy) K Ar (mgy) CSR (mmal) 28 9,5(3) 8,7(3) 0,38(1) 0,23 30 12,6(4) 11,5(4) 0,40(3) 0,16 35 19,4(7) 17,8(6) 0,44(1) 0,20 Tabela 4. Resultados obtidos com câmara de ionização, para dose na entrada da pele (DEP(CI) BR-12 ) (comparada ao obtido por espectro, DEP(esp) BR12 ), kerma no ar incidente (K Ar ), e camada semi-redutora (CSR), para combinação alvo/filtro W/Mo, normalizadas para 100mAs. Tensão (kv) DEP(esp) BR12 DEP(CI) BR12 K Ar CSR (mgy) (mgy) (mgy) (mmal) 28 7,0(2) 4,9(1) 4,1(1) 0,38(5) 30 8,8(2) 6,0(2) 5,0(2) 0,39(6) 32 9,3(3) 6,7(2) 5,6(2) 0,40(6) 35 13,2(3) 7,8(2) 6,5(2) 0,42(7) Na Figura 3, é mostrada uma comparação entre os espectros de feixes primários de raios X, obtidos para 30kV (Mo/Mo), para todas as atenuações do simulador mamário. As Figuras 4 e 5 mostram as distribuições de dose em profundidade para combinações Mo/Mo e W/Mo, obtidas para tensões de 28 a 35kV. Para comparação, os valores de kerma no ar e de dose absorvida foram corrigidos pelo inverso do quadrado da distância à superfície. As curvas exponenciais ajustadas aos valores de dose apresentaram resultados mais próximos entre si para a combinação de Mo/Mo. Discussão e conclusões Neste trabalho, foram apresentados resultados de distribuição de dose em profundidade e de DGM em BR-12, além de espectros de feixes de raios X primários, para dois Figura 2. Comparação entre espectros de taxa de fluência de fótons incidente (normalizados pelas áreas) na faixa de mamografia (28, 30, 32 e 35 kv), para combinação W/Mo. Figura 4. Dose relativa, por unidade de kerma no ar incidente, em função da espessura de BR-12, para 28, 30 e 35 kv (para combinação Mo/Mo). Figura 3. Espectros de taxa de fluência de fótons (normalizados pelo número de exposições do espectro obtido sem atenuação), para todas as espessuras de BR-12, com equipamento GE e 30 kv. Figura 5. Dose relativa, por unidade de kerma no ar incidente, em função da espessura de BR-12, para 28, 30, 32 e 35 kv (para combinação W/Mo). 42 Revista Brasileira de Física Médica.2010;4(2):39-43.

Espectrometria Compton aplicada à medição de doses em mamografia para combinações W/Mo e Mo/Mo diferentes equipamentos na faixa de mamografia (com combinações alvo/filtro diferentes), obtidos via espectrometria Compton. Como as medições não foram feitas em situação clínica (foi usado feixe estreito e colimado), os resultados supõem que toda a mama seja homogênea e irradiada homogeneamente. Pelos resultados, o método empregado é uma boa alternativa para a determinação da e distribuições relativas de dose em profundidade em mamografia. O método possibilita, em paralelo, o conhecimento dos espectros dos feixes primários, para equipamentos clínicos, através de espectrometria Compton. A diferença de comportamento entre as distribuições de dose, obtidas com o mesmo simulador para os dois equipamentos analisados (Figuras 4 e 5), pode ser entendida a partir das alterações que os espectros dos feixes sofrem à medida que varia a profundidade no simulador ou a tensão no tubo (Figuras 2 e 3). Para o mamógrafo, a energia média do espectro varia pouco, pois predominam os picos dos raios X característicos do Mo. Por outro lado, para a combinação W/Mo, varia significativamente a relação entre as intensidades dos raios X com energias menores e maiores do que 20 kev, alterando sensivelmente o poder de penetração do feixe. Agradecimentos Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pelo apoio financeiro; à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), pelos equipamentos; à International Atomic Energy Agency (IAEA), pelo mamógrafo; e ao Instituto de Eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo (IEE/USP), pela infraestrutura e pelo suporte técnico. Referências 1. Stanton L, Villafana T, Day JL, Lightfoot DA. Dosage evaluation in mammography. Radiology. 1984;150(2):577-84. 2. Dance DR, Skinner CL, CArlsson GA. Breast dosimetry. Appl Rad Isot. 1999;50(1):185-203. 3. Johns HE, Cunningham JR. The physics of radiology. 4 th ed. Springfield, Ilinois: Charles C. Thomas, USA; 1983. 4. Silva MC, Herdade SB, Lamoglia P, Costa PR, Terini RA. Determination of the voltage applied to x-ray tubes from the bremsstrahlung spectrum obtained with a silicon PIN photodiode. Med Phys. 2000;27(11):2617-23. 5. Vieira AA, Linke A, Terini RA, Herdade SB. Compton Spectrometer for x-rays in the Energy Range from 10 to 150 kev. In: International Nuclear Atlantic Conference, 2007, Santos. Proceedings of the International Nuclear Atlantic Conference. Rio de Janeiro: Associação Brasiliera de Energia Nuclear (ABEN), RJ; 2007. 6. Yaffe M, Taylor KW, Johns HE. Spectroscopy of diagnostic x-rays by a Compton-scatter method. Med Phys. 1976;3(5):328-34. 7. Matscheko G, Ribberfors R. A Compton scattering spectrometer for determining x-ray photon spectra. Phys Med Biol. 1987;32(5): 577-94. 8. Hubbell JH, Veigele WJ, Briggs EA, Brown RT, Cromer DT, Howerton RJ. Atomic form factors, incoherent scattering functions and photons scattering cross sections. J Phys Chem Ref Data. 1975;4:471-538. 9. Almeida Jr. JN, Terini RA, Herdade SB. Determinação experimental de coeficientes de atenuação de BR-12 através de espectrometria de fótons. In: XIV Congresso Brasileiro de Física Médica, 2009, São Paulo. Anais do XIV CBFM. São Paulo: Associação Brasileira de Física Médica (ABFM), SP; 2009. 10. Hammerstein GR, Miller DW, White DR, Masterson ME, Woodard HQ, Laughlin JS. Absorbed radiation dose in mammography. Radiology. 1979;130(2):485-91. 11. Sobol WT. et al. (1997) Parametrization of mammography normalized average glandular dose tables. Med Phys. 1997;24(4):547-54. Revista Brasileira de Física Médica.2010;4(2):39-43. 43