ACESSIBILIDADE E INCLUSÃO: PROJETO BIBLIOTECA FALADA E A AUDIODESCRIÇÃO DE PRODUTOS AUDIOVISUAIS*

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Transcrição:

ACESSIBILIDADE E INCLUSÃO: PROJETO BIBLIOTECA FALADA E A AUDIODESCRIÇÃO DE PRODUTOS AUDIOVISUAIS* Diana Reghini Vanderlei** Flávia Nosralla de O. Caruso*** Lara Rangel G. Sant Anna**** Suely Maciel***** RESUMO o projeto de extensão Biblioteca Falada, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), busca promover o acesso de pessoas com deficiência visual à comunicação, por meio da transposição de textos impressos, digitais e/ ou audiovisuais para áudio. Entre as diversas produções do projeto em 2015, destaca-se a audiodescrição do documentário em vídeo Noite sem fim, que fala dos alunos com deficiência visual da Escola de Música de Brasília. Este trabalho aborda todo o processo de produção da audiodescrição, bem como discute a importância desta e de outras formas de adaptação de textos midiáticos para a acessibilidade e inclusão das pessoas com deficiência. PALAVRAS-CHAVE: Audiodescrição. Acessibilidade e comunicação. Deficiência visual e mídia sonora. Biblioteca Falada. Apesar desse enorme contingente de pessoas, a sociedade contemporânea, ao valorizar maciçamente a cultura visual, comumente acaba excluindo e marginalizando esse grupo, o qual fica impedido de ter acesso à maioria das produções culturais, entre elas as midiáticas (MACHADO, 2012). A sociedade deve empreender um processo contínuo que vise acolher todas as pessoas, independentemente de suas diferenças individuais (SAS- SAKI, 2005). Sob essa ótica, a inclusão não deveria ser um pré-requisito de adequação por parte da pessoa com deficiência, para que ela pudesse ser inserida em um contexto educacional, de trabalho, de reabilitação etc. Muito pelo contrário, a inclusão deveria ser efetivada por uma ação preestabelecida pelas instituições, que se adaptariam com vistas à recepção dessas pessoas porque entendem que é direito de todos os indivíduos fazerem parte do contexto no qual são inseridos. * Recebido em 18/05/2016. Aprovado em 03/06/20 ** Universidade Estadual Paulista. E-mail: dvanderlei@gmail.com *** Universidade Estadual Paulista. E-mail: flavia_nosralla@hotmail.com **** Universidade Estadual Paulista. E-mail: lara.santanna@yahoo.com.br ***** Universidade Estadual Paulista. E-mail: suelymaciel@faac.unesp.br 24

A partir dessa perspectiva, o projeto de extensão Biblioteca Falada, da Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação (FAAC), da Universidade Estadual Paulista (Unesp), câmpus de Bauru, busca proporcionar o acesso das pessoas com deficiência visual a produções jornalísticas, literárias, ficcionais, dramatúrgicas etc., dos mais diferentes formatos. Para tanto, realiza a adaptação e transposição de textos originalmente impressos, digitais e/ou audiovisuais para o formato sonoro, bem como também realiza produções próprias e inéditas, sempre tendo o áudio como produto primordial e a linguagem para as mídias sonoras caracterizada pela integração dos códigos verbal, sonoro e musical, além do silêncio (BALSEBRE, 2005) como fundamento. Afinal, a audição torna-se um importante sentido quando da limitação ou ausência de visão. Por isso, textos em áudio podem e devem ser utilizados como recursos privilegiados para permitir o acesso a produções de diferentes ordens, até mesmo mensagens impressas ou audiovisuais, as quais deverão passar pelo processo de adaptação e/ou transformação sonora. O projeto busca também efetivar-se como espaço para o aprofundamento dos conhecimentos e da prática dos alunos dos cursos de Jornalismo e Radialismo quanto à produção para as mídias sonoras, como o rádio e a webrádio, uma vez que as atividades incluem adaptação, roteirização, locução, edição e sonoplastia, assim como o domínio das novas mídias digitais. Além disso, a proposta visa proporcionar o contato com a realidade de um grupo especial, que é o de pessoas com deficiência visual, contribuindo para desenvolver no discente o senso crítico em relação aos problemas dos diferentes grupos sociais e o respeito por eles, calcado nas noções de cidadania e direitos humanos. As atividades do projeto atendem principalmente as demandas dos alunos do Lar Escola Santa Luzia para Cegos (LESL), instituição de Bauru que busca promover a integração e o desenvolvimento humano, intelectual e social das pessoas com deficiência visual, por meio do oferecimento de cursos, formação profissional e promoção de atividades culturais, educativas e de lazer. Atualmente, o LESL atende cerca de 40 alunos, entre adolescentes, adultos e idosos, os quais apresentam, em encontros periódicos com bolsistas, voluntários e a coordenação do Biblioteca Falada, suas demandas de adaptação para o áudio, entre livros (dramas, novelas, poesias etc.), notícias de áreas diversas, informações sobre artistas e suas criações e audiodescrições de filmes, videoclipes, documentários, fotografias, páginas de redes sociais etc. Além desse grupo, o Biblioteca Falada vem atendendo também, desde o final de 2014, as demandas do Centro de Prevenção à Cegueira (CPC), de Americana (SP), e pedidos de pessoas com deficiência visual, as quais procuram o projeto por meio de seu site (www.bibliotecafalada.com) ou de sua página hospedada na rede social Facebook (www. facebook.com/bibliotecafalada). O público virtual do projeto é da ordem de dez mil pessoas, conforme estimativa do Serviço Técnico de Informática (STI) da Unesp/Bauru. De janeiro a agosto de 2015, as atividades incluíram a produção de uma gama variada e extensa de áudios, desde a locução de receitas e poesias até curso de Braille, resumos semanais de novelas, documentários sobre música e audiodescrições de personagens da teledramaturgia brasileira e internacional, sendo estas últimas uma produção inédita desenvolvida exclusivamente pelo projeto. Entre as produções de matriz audiovisual, destacou-se a audiodescrição de Noite sem fim, videodocumentário de quinze minutos sobre os alunos com deficiência visual da Escola de Música de Brasília (DF), dirigido por Zeca Zenner. A atividade foi realizada a partir de sugestão de um 25

aluno do LESL e foi autorizada pela Granmídia Produtora Audiovisual, de Brasília (DF), que realizou o documentário. A versão audiodescrita foi posteriormente compartilhada pela produtora (https://www.youtube.com/ watch?v=eah9yllu9tw) e também pode ser encontrada no site do Biblioteca Falada. O documentário Noite sem fim, de 2013, traz relatos de alunos sobre sua experiência com a música e sua relação com a escola. Mostra a instituição e o trabalho que esta realiza com o público das pessoas com deficiência. Além de cenas com os depoimentos, traz panorâmicas da escola e também do ambiente externo, geralmente os espaços por onde circulam os alunos. Quando se trata dos meios audiovisuais, as pessoas com deficiência visual enfrentam uma barreira física na compreensão do conteúdo, uma vez que a imagem é componente importante da narrativa. Com o objetivo de minimizar essa dificuldade, a audiodescrição é aplicada a essas produções, tornando-se uma parte relevante para o entendimento da obra. A audiodescrição pode ser entendida como uma tradução de imagens em palavras como ferramenta de acessibilidade cultural para os deficientes visuais (PINOT- TI, 2014, p.10). OBJETIVOS O projeto Biblioteca Falada tem como objetivo a inclusão social de pessoas com deficiência visual, por meio da promoção do acesso aos mais diversos produtos midiáticos e literários (textos impressos e digitais, sonoros e audiovisuais). Para tanto, realiza a adaptação e/ou roteirização das produções para posterior locução, edição e sonoplastia dos áudios resultantes desse processo. Com isso, busca fornecer produtos que integram todos os códigos da linguagem das mídias sonoras (verbal, sonoro e musical). No caso da audiodescrição do documentário Noite sem Fim, buscou-se colocar em prática, num texto concreto, estudos realizados previamente acerca da temática da audiodescrição e, por meio de um produto adaptado e transformado, garantir a acessibilidade do público com deficiência visual a este gênero de mídia que é o documentário em vídeo. Material e métodos As atividades do projeto são desenvolvidas conforme as demandas dos alunos do LESL e, eventualmente, dos alunos do CPC e do público em geral. Com base nestas demandas, faz-se a escolha do material a ser adaptado e se procede à roteirização dos textos, de forma a torná-los adequados para a transformação em áudio com respeito aos princípios da linguagem para as mídias sonoras, ou seja, o emprego dos códigos verbal (com uso da voz humana), sonoro (efeitos e silêncio) e musical (músicas, trilhas, BGs etc.) e visando garantir a clareza, a simplicidade, a nitidez, a objetividade e o dinamismo do texto em áudio (LÓPEZ VIGIL, 2003). Feita a roteirização, procede-se à vocalização, ou seja, à transformação dos textos em áudio, via processo de locução. Os áudios e áudiodescrições, por fim, são submetidos à edição final (com inclusão de trilhas e efeitos sonoros, quando for o caso), para posterior gravação em CDs e/ou DVDs, que são entregues aos alunos do LESL, para audição com o uso de aparelhos de reprodução de áudio e vídeo (microsystem, tocador de MP3, dvd player, smartphones, computador etc.). Além disso, os arquivos também são disponibilizados no site do projeto (bibliotecafalada.com). No caso da audiodescrição do documentário Noite sem fim, inicialmente foi solicitada a autorização da Granmídia Produtora para que se pudesse realizar a adaptação. Assim que a produtora manifestou sua concordância, deu-se início à elaboração do roteiro, 26

a qual esteve baseada em diversos estudos sobre a temática, principalmente os de Bell Machado (2011), bem como as sugestões e parâmetros apresentados por meios digitais especializados no assunto, como o Blog da Audiodescrição (www.blogdaaudiodescricao.com.br). Além desses, também serviram de baliza teórica autores como J. I. López Vígil (2003) e Gisela S. Ortriwano (1986), os quais tratam da linguagem radiofônica e da produção sonora. Para a elaboração do roteiro de audiodescrição, foi necessário assistir ao documentário várias vezes, para que se identificassem os elementos visuais que deveriam ser descritos porque essenciais à compreensão da obra, uma vez que não é possível audiodescrever absolutamente todas as cenas. Além disso, também foi importante a identificação de espaços de silêncio entre as falas dos personagens, para que as descrições das cenas pudessem ser inseridas de modo que o áudio não interferisse nestas ou se tornasse mais importante que elas. Finalizado o roteiro, deu-se início a sua locução. No caso da audiodescrição, é importante que a voz do audiodescritor não destoe do tom do filme, por isso optou-se por uma locução em volume médio e estilo suave, de forma a harmonizar com o ritmo do piano que fazia parte da trilha sonora do documentário. A etapa final da adaptação foi a edição do vídeo. Nesse momento, foi possível identificar algumas falhas de roteiro e locução: houve momentos, por exemplo, em que a audiodescrição se sobrepunha a alguma fala original do documentário, bem como se percebeu que algumas imagens poderiam ser mais bem descritas, com melhor aproveitamento dos momentos de silêncio nas cenas. Por causa desses problemas e visando aprimorar a adaptação, tanto roteiro quanto locução foram refeitos e só então se concluiu a edição. A edição do áudio e do vídeo foram realizadas, respectivamente, nos programas Audition e Premiere, ambos da Adobe. Depois de editado, o documentário audiodescrito foi encaminhado à produtora Granmídia para avaliação e, posteriormente, divulgação, a qual ocorreu no canal da produtora no site Youtube, bem como no site do Biblioteca Falada e nas páginas do Facebook do projeto e da Granmídia. O trabalho também foi entregue em DVD para os alunos do Lar Escola Santa Luzia. Figura 1: Imagem da audiodescrição Noite sem fim 27

RESULTADOS E DISCUSSÃO A audiodescrição do documentário Noite sem fim foi a primeira feita por meio de parceria entre o Biblioteca Falada e uma empresa de comunicação. Também foi a primeira experiência desse tipo para os alunos voluntários que compõem a equipe realizadora do trabalho, coordenada por uma aluna bolsista. Devido à inexperiência dos integrantes do projeto com a prática da audiodescrição, o processo levou cerca de um mês para ser concluído. No entanto, o resultado final se mostrou satisfatório, uma vez que foi aprovado pela produtora responsável pela criação de seu conteúdo. O vídeo finalizado e audiodescrito foi divulgado no canal da produtora Granmídia no Youtube no dia 3 de agosto de 2015, de modo que, estando disponível na internet, pode obter um maior alcance de público. Até abril de 2015, o vídeo tinha cerca de quatro mil visualizações, sendo 10% delas da versão audiodescrita. Ao se realizar as produções de audiodescrição, são exercitadas três tarefas básicas da produção em mídia sonora: o roteiro, a locução e a edição. Tal conhecimento é essencial na formação dos alunos participantes do projeto, em sua maioria estudantes dos cursos de Jornalismo e Radialismo. A experiência permitiu à equipe compreender um pouco mais a temática da deficiência visual, uma vez que é preciso se colocar no lugar desse público com deficiência ao produzir uma audiodescrição destinada a ele. Também foi possível identificar quais as dificuldades desse tipo de produção quando se trata de traduzir em palavras imagens que são tão comuns aos olhos das pessoas sem deficiência. A descrição das imagens deve se dar com base em palavras que garantam a conformação de um texto claro e sintético, que exerça a mínima interferência possível na interpretação pessoal de quem irá assistir ao vídeo, de forma que o espectador possa captar a mensagem visual sem perder as mensagens sonoras originalmente presentes no documentário (MACHADO, 2011). Também é um desafio inserir a audiodescrição nos momentos exatos e sem que a locução atrapalhe a compreensão da obra, por falta ou excesso de informação necessária. Essas dificuldades enfrentadas serviram de aprendizado para produções futuras. Além disso, a experiência contribuiu para a sensibilização quanto às demandas das pessoas com deficiência visual e a conscientização sobre a necessidade de produções acessíveis. Assim, a audiodescrição de Noite sem fim foi uma tentativa de garantir, às pessoas com deficiência visual, o acesso a um formato especial, que é o documentário audiovisual. Depois dessa experiência inicial, o Biblioteca Falada ampliou sobremaneira suas atividades de audiodescrição, tendo até mesmo realizado parceria com outra produtora, a Marca Passo, para a adaptação de vídeos. Figura 2: Reprodução de algumas das produções audiovisuais no YouTube 28

Até agora, já foram concluídas 12 produções, disponíveis em http://bibliotecafalada.com/audiodescricao, como o documentário Minha escolha pela música, entre outros. Figura 3: Reprodução de audiovisual Minha escolha pela música no YouTube CONSIDERAÇÕES FINAIS É possível, por meio das atividades realizadas pelo projeto Biblioteca Falada, ampliar a compreensão e o exercício das práticas inclusivas, bem como problematizar a discussão sobre elas. Embora não se possa negar que, nos últimos anos, este tem sido um debate que cada vez mais mobiliza importantes setores da sociedade, não se pode fechar os olhos para o fato de que ainda há uma significativa parcela da população sem acesso pleno à comunicação. O trabalho com a audiodescrição permitiu entender um pouco mais as barreiras encontradas por pessoas com deficiência visual no que tange às mídias audiovisuais. Afinal, a importância da audiodescrição reside justamente em superar os hiatos, decorrentes da ausência de visão, no entendimento e aproveitamento das produções neste formato. Como ressalta Pinotti (2014, p. 11), a audiodescrição é uma ferramenta de acessibilidade cultural, que visa proporcionar às pessoas com deficiência visual a oportunidade de ver através dos olhos do audiodescritor. No esforço contínuo de trilhar este caminho, o projeto Biblioteca Falada tem a intenção de aumentar cada vez mais as suas produções na área da audiodescrição. Dessa forma, ele cumpre seu objetivo de diversas maneiras concomitantemente: complementa a formação profissional dos alunos integrantes e disponibiliza produções midiáticas para pessoas com deficiência, estruturando-se, cada vez mais, como um instrumento de acessibilidade à comunicação e de inclusão. 29

REFERÊNCIAS BALSEBRE, Armand. A linguagem radiofônica. In: MEDITSCH, Eduardo. (org). Teorias do rádio: textos e contextos. Florianópolis, Insular, 2005. p. 327-36. COSTA, A.M. A tradução audiovisual: os desafios da áudio-descrição. Porto, 2014. IBGE. Censo Demográfico 2010 Religião e Deficiência. IBGE, 2010. Disponível em <ftp:// ftp.ibge.gov.br/censos/censo_demografico_2010/caracteristicas_gerais_religiao_deficiencia/ tab1_3.pdf> Acesso em: abril 2016. LOPEZ VIGIL, J. I. Manual urgente para radialistas apaixonados. São Paulo, Paulinas, 2003. MACHADO, I.P.R. A Linguagem Cinematográfica na Audiodescrição. Revista Brasileira de Tradução Visual. Ano 2, n. 8, p. 1-5. Setembro de 2011. Disponível em < http://www.rbtv. associadosdainclusao.com.br/index.php/principal/article/view/106/168> Acesso em: Jan. 2016 MACHADO, M.P. Como veem os cegos: uma análise sobre o universo sensorial na cegueira representado pelo Jornal Nacional. In: INTERCOM - Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação - XXXV Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação. Fortaleza, 2012. ORTRIWANO, G. S. A informação no rádio. São Paulo, Summus, 1986. PINOTTI, J.L. Comunicação e audiodescrição: estudos contemporâneos. Sorocaba, 2014. SASSAKI, R.K. Inclusão: O paradigma do século 21. Inclusão - Revista da Educação Especial. Ano 1, n. 1, p. 19-23. Outubro de 2005. Disponível em < http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/ pdf/revistainclusao1.pdf> Acesso em: Jan. 2016. Terminologia sobre deficiência na era da inclusão. Revista Nacional de Reabilitação. São Paulo, ano 5, n. 24,, p. 6-9. Janeiro/Fevereiro de 2002. 30