Análise da distribuição espacial do vetor da dengue na cidade de Santarém (PA) a partir de técnicas de geoprocessamento e sensoriamento remoto Jéssica Ariana de Jesus Corrêa¹ Izaura Cristina Nunes Pereira¹ Antônio Carlos Lôla da Costa² ¹ Universidade Federal do Oeste do Pará UFOPA Rua Vera Paz, s/n, Salé 68135-110 Santarém-PA, Brasil {jehssicorrea, geoiza}@yahoo.com.br ² Universidade Federal do Pará UFPA Avenida Augusto Correa s/n, Guamá 66075-110 Belém-PA, Brasil lola@ufpa.br Abstract. Dengue is now one of the most important mosquito-borne diseases transmitted to humans constituting a serious public health problem. This study aimed to analyze the relationship between urban infrastructure and distribution vector Aedes aegypti from Infestation Index Building (IIB) in the city of Santarém-PA, through techniques of remote sensing and GIS. In this study we used entomological data distributed across neighborhoods and image Landsat 5 year of 2010. The classification was performed by using the algorithm Bhattacharya because this algorithm showed better classification results. After processing was generated map of land use in the urban area with 5 classes: Bodies of water, vegetation, urban density high, medium urban density, urban density low and cloud/bare Soil. It was observed that in the urban area of Santarem spatiality of dengue vector does not have a homogeneous distribution with respect to urban density, presenting IIP above rates of 1%, distributed in 3 classes of densification. Furthermore, the levels of infestation of Aedes aegypti are associated with the lack of urban infrastructure, and key services (water supply and garbage collection), thus favoring the spread of vector from potential breeding. This analysis guided in the use of geotechnology shows great applicability and functionality in epidemiological studies, since it allows to evaluate the relationship between the spatial component (geographic space) and the incidence of diseases such as dengue. Palavras-chave: land use, Aedes aegypti, remote sensing, uso do solo, Aedes aegypti, sensoriamento remoto. 1. Introdução A Dengue é hoje uma das mais importantes doenças transmitida por arbovírus aos humanos constituindo um grave problema de saúde pública. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que entre 50 a 100 milhões de pessoas se infectem anualmente, em mais de 100 países, pondo quase a metade da população do mundo em risco (WHO, 2012). A incidência de dengue é comumente observada nas regiões tropicais e subtropicais, compreendidas principalmente entre os paralelos (latitudes) 45 N e 35º S (Consoli e Oliveira, 1994). Observa-se que dentre as regiões que estão dentro da faixa de risco de transmissão, nas Américas foram reportadas importantes epidemias, principalmente, na América do Sul (Venezuela, Brasil e Paraguai). Martín et al (2010), através de dados da Organização Pan- Americana de Saúde (PAHO) observou que durante as ultimas três décadas o numero de casos de dengue saiu de 1 milhão de casos durante os anos 80 para 4,7 milhões no período de 2000 a 2007, dos quais mais da metade desses casos ocorreram na América do Sul. No Brasil a incidência da dengue vem aumentando devido principalmente à disseminação do principal vetor do vírus, o mosquito Aedes aegypti, em todos os estados (Lima et al., 2006). No Pará, os primeiros casos notificados de dengue ocorreram em 1995, nos municípios de Redenção e Rondon do Pará, região sudeste do estado (Travassos da Rosa et al., 2000). 8561
Desde então, a dengue permanece presente na maioria dos munícipios, atualmente com 32 munícipios prioritários para o Programa Nacional de Controle da Dengue. A transmissão da dengue pode ser explicada pelos fenômenos envolvidos na produção dessa infecção, principalmente, pela ecologia de populações no ambiente local, expansão geográfica dos vetores, densidade de mosquito e a circulação dos múltiplos sorotipos do vírus. Além disso, o mosquito da dengue apresenta-se hoje de forma domesticada, adaptada ao ambiente urbano, portanto o vírus é transmitido e mantido em um ciclo que envolve humanos- Aedes aegypti. Devido a essa adaptação, os mosquitos colocam seus ovos principalmente nas paredes dos recipientes artificiais onde a água pode se acumular, tanto no interior dos edifícios ou em seus arredores. Ações de prevenção e controle da dengue estão centradas no controle da população de Aedes aegypti através de controle e erradicação de depositos que podem armazenar água. Dois indices são usados para avaliar a presença ou ausência do mosquito vetor para prevenir a transmissão da dengue: Indice de Infestação Predial (IIP) que é o percentual de prédios encontrados com recipientes contendo água e larvas, em relação ao número total de predios examinados e Indice de Breateu (IB) percentual de recipientes encontrados com larvas, em relação ao numero total de prédios examinados. A análise de dados distríbuidos pelo espaço geográfico tem sido bastante utilizados na área de saúde, principalmente através de ferramentas que permitem realizar inferências ao integrar dados de diversas fontes. O Geoprocessamento e o Sensoriamento Remoto são ferramentas utilizadas na caracterização e quantificação de agravos à saúde e seus possíveis determinates, permitindo identificar áreas onde ocorrem os casos da doença, possibilitando e facilitando o diagnóstico local e auxiliando na tomada de decisão referente a situação de saúde de determinada população. Esses recursos possibilitam a criação de alternativas para os desafios encontrados no controle e vigilância de vetores de endemias. Assim, o objetivo deste trabalho consiste analisar a relação entre a infraestrutura urbana e a distribuição do vetor Aedes aegypti a partir do IIP na cidade de Santarém, através de técnicas de geoprocessamento e sensoriamento remoto. 2. Metodologia 2.1. Área de Estudo O município de Santarém situado na região oeste do Pará, mesorregião do Baixo Amazonas e microrregião de Santarém, na confluência dos rios Amazonas e Tapajós, ocupa uma área de 22.887 km², sendo 77 km² de perímetro urbano e 22.810 km², rural (IBGE 2010). O município possui uma população de 294.774 habitantes do qual 215.947 residem na zona urbana (IBGE, 2010), tendo como coordenada geográfica -2º 25 30 de latitude Sul e - 54º 42 50 de longitude Oeste. A Figura 1 ilustra a localização do município de Santarém, com destaque para a malha urbana do mesmo. O clima dominante na região é quente e úmido, com temperatura média anual variando entre 25º e 28º C. Apresenta pouca variabilidade na umidade e temperatura do ar. Segundo a classificação climática de Köppen, que leva em consideração os valores de temperatura e precipitação, Santarém enquadra-se no tipo climático Am, ou seja, o clima é equatorial úmido com uma estação seca bem definida e outra com elevados índices pluviométricos (Tsukamoto Filho et al., 2007). 8562
Figura 1- Mapa de Localização de Santarém. 2.2. Materiais Nesse estudo foi utilizada a base de dados de Índice de Infestação Predial (IIP) por bairro para o ano de 2010, a Malha do setor censitário obtidos no site do IBGE e uma imagem correspondente à passagem do satélite LANDSAT-5 na órbita 227 e ponto 62 na data de 29/06/2010. Tal cena foi obtida no catálogo de imagens do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), e o processamento foi realizado nos softwares SPRING 5.2 e ArcGis 10.0. 2.3. Métodos Na etapa de processamento a cena foi registrada no SPRING, aplicando-se a equação polinomial de primeiro grau para ajustar os pontos de controle adquiridos em campo pelo sistema de posicionamento global (GPS). Após o registro foi realizada a classificação pelo algoritmo Bhattacharya, pois este algoritmo apresentou melhores resultados de classificação levando em consideração a evolução da estrutura urbana da cidade. A partir desses procedimentos obteve-se uma imagem classificada, base para a geração de um Mapa de cobertura do solo com 5 classes: 1) Corpos d água, correspondendo áreas coberta por água; 2) Vegetação; 3) Adensamento urbano Alto, correspondendo área com maior espaço construído com limitado número ou sem arvores; 4) Adensamento urbano Médio, correspondendo a áreas de urbanização não consolidada; 5) Adensamento urbano Baixo, correspondendo baixo numero de imóveis residenciais, maior presença de cobertura vegetal; 6) Sombra/Solo Exposto. No ArcGIS foi necessário ajustar a malha municipal por setor censitário disponível em formato shapefile, já que esta não necessariamente representava a área total do bairro de forma contínua, por isso aplicou-se a função merge deste aplicativo para obtenção dos polígonos contínuos dos bairros da cidade de Santarém. A malha de setor censitário foi utilizada visando à espacialização dos dados dos vetores nos bairros de Santarém. 8563
3. Resultados e Discussão A partir dos resultados foi possível visualizar que em 2010, a classe urbana majoritária é baixo adensamento urbano com 28.33% da área total, conforme ilustra a figura 2. Além disso, é nessa classe que se encontra a maioria dos bairros de Santarém incluso na malha de expansão da cidade (tabela 1). A área urbana se desenvolveu a partir dos limitantes naturais seguindo o eixo oeste-leste, seguindo os principais eixos viários do município. Figura 2. Mapeamento dos padrões de ocupação urbana em Santarém. 8564
Tabela 1. Bairros de Santarém de acordo com o grau de adensamento. Grau de Adensamento Área (Km²) Alto 5.92 Médio 13.67 Baixo 28.21 Bairro Aldeia, Aparecida, Centro, Fatima, Laguinho, Prainha, Santa Clara. Aeroporto, Caranazal, Diamantino, Esperança, Interventoria, Jardim Santarém, Liberdade, Livramento, Mapiri, Salé, Santana, Santíssimo. Alvorada, Amparo, Area verde, Conquista, Elcione, Floresta, Ipanema, Jaderlandia, Jutaí, Maicá, Maracanã, Maracanã I, Matinha, Nova republica, Nova Vitória, Novo Horizonte, Pérola do Maicá, Santarenzinho, Santo André, São Francisco, São José Operário, Uruará, Urumari, Vigia, Vitória Regia. Em termos de área as classes com maior abrangência foi Adensamento Baixo e Vegetação, conforme figura 3. Figura 3. Área (km²) ocupada pelos padrões urbanos. Quanto à espacialidade do Aedes aegypti, os bairros mais afetados estão localizados na área classificada como médio adensamento com um índice de infestação predial maior que 5%. O Programa Nacional de Controle da Dengue determina que índices de infestação predial inferior a 1% não há risco de transmissão da dengue. Contudo, baixos índices de infestação reduzem o risco de transmissão, porém não o eliminam. Diante disto considerou-se na presente pesquisa que valores menores que 1% configura índice de infestação baixo; entre 1% e 3% IIP médio; entre 3% e 5% IIP alto; e acima de 5% IIP muito alto. Analisando a variação espacial do índice de infestação predial do Aedes aegypti para a área urbana em questão, os bairros com índice muito alto foram Diamantino (5.73%), Interventoria (5.39%) e Aeroporto Velho (5.6%), correspondendo a 6% do total de bairros. Esses bairros apresentam padrão de ocupação Médio Adensamento com presença de área residencial, moderada cobertura vegetal, ruas sem pavimentação, precariedade no abastecimento de água, entre outros. 8565
Conforme figura 4, os bairros classificados com índices entre médio e alto estão presentes nas 3 classes de ocupação urbana correspondendo a 80% do total de bairros. Já os bairros classificados com baixa incidência (>1%) correspondem a 13.33% dos bairros. Observa-se que na área urbana de Santarém a espacialidade do vetor da dengue não possui uma distribuição homogênea no que se refere ao adensamento urbano, apresentando índices de IIP acima de 1%, distribuídos nas 3 classes de adensamento. Além disso, os níveis de infestação do Aedes aegypti estão associados com a ausência de infraestrutura urbana, bem como dos principais serviços (abastecimento de água e coleta de lixo), favorecendo, assim, a proliferação do vetor a partir de potenciais criadouros como pneus, calhas, vasos de plantas, caixas d água, independentemente de estar localizado no centro ou nas áreas peri-urbanas da cidade. Figura 4. Índice de Infestação Predial do Aedes aegypti 2010. 4. Conclusões Ao se analisar a distribuição do Aedes aegypti pôde-se observar altos índices de infestação predial para a área urbana com valores maior que 1% para o ano em estudo. Constatou-se que os bairros classificados como médio e baixo adensamento tiveram infestação do vetor. Tal análise pautada no uso de geotecnologias mostra-se de grande 8566
aplicabilidade e funcionalidade em estudos epidemiológicos, pois permite avaliar a relação entre a componente espacial (espaço geográfico) e a incidência de doenças como a dengue, que em algumas cidades é considerada uma questão de saúde pública. Na Amazônia a intensificação do processo de urbanização de forma não planejada, principalmente em cidades médias pode acarretar na intensificação de endemias como a dengue. Desse modo, compreender a distribuição espacial de vetores epidemiológicos, muito mais que um exercício de representação gráfica, torna-se uma ferramenta de fundamental importância para subsidiar a tomada de decisão no que tange as políticas de saúde. Agradecimentos A Divisão de Vigilância em Saúde de Santarém/SEMSA pelos dados entomológicos de dengue fornecidos. A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) pelo apoio financeiro. Referências Consoli, R. A. G. B.; Oliveira, R. L.. Principais Mosquitos de Importância Sanitária no Brasil. Rio de Janeiro: Fiocruz, 1994. Lima-Camara, T.M.; Honório, N.A.; Lourenço-de-Oliveira, R. Freqüência e distribuição espacial de Aedes aegypti e Aedes albopictus (Díptera, Culicidae) no Rio de Janeiro, Brasil. Cadernos Saúde Pública, v. 22, p. 2079-2084, 2006. Martín, J. L. S.; Brathwaite, O.; Zambrano, B.; Solórzano, J. O.; Bouckenooghe, A.; Dayan, G. H.; Guzman,M. The Epidemiology of Dengue in the Americas over the Last Three Decades: A Worrisome Reality. Am. J. Trop. Med. Hyg., v. 82, n. 1, p. 128-135, 2010. Pan American Health Organization PAHO. Report on the Situation of Malaria in the Americas, 2008. Washington, D.C.: PAHO, 2010. Tauil, P.L. Urbanização e ecologia do dengue. Cadernos de Saúde Pública, v.17, suppl 1, p. 99-102, 2001. Travassos da Rosa, A.P.A.; Vasconcelos, P. F.C.; Travassos da Rosa, E. S.; Rodrigues, S. G.; Mondet, B.; Cruz, A. C.R.; Sousa, M. R.; Travassos da Rosa, J. F.S. Dengue Epidemic in Belém, Pará, Brazil, 1996 97. Emerging Infectious Diseases, v. 6, n. 3, 2000. Tsukamoto Filho, A. A.; Campos, M. N.; Vasconcelos, L. M. R.; Matos, S. P.. Diversidade florística de um parque zoobotânico no município de Santarém-Pará. In: VIII Congresso de Ecologia do Brasil, 2007, Caxambu- MG. World Health Organization WHO: 2012. Dengue. 2012. Disponivel em:< http://www.who.int/denguecontrol/en/index.html>. Acesso em: 05 novembro 2012. 8567