DESTRUIÇÃO, SUBTRAÇÃO OU OCULTAÇÃO DE CADÁVER. VILIPÊNDIO A CADÁVER. Prevê o artigo 211 do Código Penal:



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Transcrição:

DESTRUIÇÃO, SUBTRAÇÃO OU OCULTAÇÃO DE CADÁVER. VILIPÊNDIO A CADÁVER ROGÉRIO TADEU ROMANO Procurador Regional da República aposentado Prevê o artigo 211 do Código Penal: Destruir, subtrair ou ocultar cadáver ou parte dele: Pena - reclusão, de um a três anos, e multa. A destruição é a primeira modalidade do crime em discussão. Destrói-se um cadáver, queimando-o, tratando-o por processos químicos, por ação compreensiva, esmagamento, etc, mesmo que não seja possível reduzi-lo a detritos ou resíduos. A segunda modalidade envolve a subtração que significa tirar a coisa da esfera de proteção, guarda ou disponibilidade de outrem. Como revela Magalhães Noronha(Direito Penal, volume III, 10ª edição, pág. 92) é a tirada do cadáver da situação normal e regular em que se encontra, sob a proteção da família, parentes, amigos, vigias do cemitério etc. Mas não se exige o apossamento como no furto. O crime pode ser cometido por guardas, vigias do necrotério, parentes do defunto etc. Ocultar equivale a esconder, fazer desaparecer o cadáver sem destruí-lo. É conhecida a lição de Nelson Hungria(Comentários ao Código Penal, volume VIII, pág. 73) distinguindo a ocultação da subtração de cadáver, ensinou que aquela somente pode ocorrer antes do sepultamento; pressupõe que o cadáver ainda não se ache no lugar de seu destino. Nessa lição tem-se que a ocultação só pode ocorrer antes da inumação, mas pode a subtração pode dar-se antes ou depois do sepultamento, pois se durante um velório, pessoas tiram o corpo do ataúde e fogem com ele, haverá subtração. É crime de ação múltipla, sendo que a prática das várias ações mencionadas no tipo penal dá lugar apenas a um delito. O crime pode ocorrer no cemitério, no hospital, em logradouro público etc. O cadáver é o corpo humano privado de vida, morto. É o que viveu como o que nasceu sem vida, o natimorto. Exclui-se, portanto, o feto e a mola hidatiforme(é um distúrbio da gravidez em que a placenta e o feto não se desenvolvem adequadamente). O primeiro que não chegou a maturação necessária, não se pode tornar cadáver. A segunda é formação degenerativa do ovo fecundado, onde nunca houve vida. O objeto material do crime é o cadáver, corpo que ainda conserva a aparência humana, e não os restos em completa decomposição(rt 479/303). Quanto ao feto e ao natimorto há as seguintes posições: a) só é cadáver aquele que teve vida extrauterina(rt 218/136; 415/86; 478/308); é cadáver o natimorto expulso no termo da gravidez(rt 463/339; 488/327; 380/66; 526/328, dentre

outros); c) é cadáver o feto de mais de seis meses, por ser viável nos termos do artigo 1.597, I, do CC(RT 465/299; 450/366; 526/328). O feto que não atingiu a maturidade para ser expulso a termo não ode ser considerado cadáver(rt 624/355). Para Magalhães Noronha(obra citada, pág. 93), cadáver é o corpo que conserva a aparência ou a forma humana. Não se inclui nesse contexto a vítima de um grande esmagamento, em que os ossos fossem triturados, ficando reduzido, de todo, a uma pasta informe e irreconhecível. Já se decidiu que, para fins do artigo 211 do Código Penal, os restos humanos em estado de quase completa esqueletização não são considerados cadáver(rt 479/304). Não será cadáver o esqueleto(a Lei italiana refere-se a cinzas humanas), a múmia, que pode ser objeto de crime de furto. As cinzas humanas não são cadáver nem partes dele, sendo resíduos de combustão. A destruição a que se refere o artigo 211 do Código Penal não é apenas de todo cadáver senão de parte dele(rt 526/350). Assim não ficarão excluídos da tutela legal os membros, o tronco, que, ás vezes, são sepultados(oriundos de sinistros aeronáuticos, ferroviários etc quando os corpos se despedaçam e estracinham). Para Magalhães Noronha(obra citada, pág. 93), já o mesmo não acontece, em se tratando de braço, ou perna amputados, partes do corpo vivo. Fabbrini Mirabete(Manual de Direito Penal, volume II, 25ª edição, pág. 396) cita casos em que se tem decidido pelo crime em apreço: o abandono, em terreno baldio, de vítima de atropelamento que estava sendo socorrida e que vem a morrer(rt 537/202); atirar no natimorto na fossa(rt 478/308); o abandono em terreno baldio para encobrir o crime(rt 784/530); o arremesso do corpo às águas de córrego ou rio(rt 350/112, 402/113); a subtração pelo agente funerário que pede remuneração para devolver o corpo(rt 522/324). Não se reconheceu esse crime, no caso da condução de um corpo de um lugar para outro, para despistar a polícia(rt 275/144). O elemento subjetivo do crime é o dolo que não será específico. Para a consumação do crime não se exige a destruição total do cadáver. Há destruição se lhe arrancam a cabeça e os membros, deixando incólume o tronco, como bem lecionou Magalhães Noronha(obra citada, pág. 94). Na subtração, consuma-se o delito, com a tirada do corpo de sua esfera ou órbita de proteção e tutela. Na terceira modalidade ocultação consuma-se o crime tão logo haja o desaparecimento do cadáver. Já se entendeu que se configura a destruição mesmo que seja só de parte do cadáver(rt 526/350). O Supremo Tribunal Federal decidiu que retirar o cadáver do local onde deveria permanecer e conduzi-lo para outro em que não será normalmente reconhecido, configura-se, em tese, o crime de ocultação(rt 784/530), tratando-se de crime permanente que subsiste até o cadáver ser descoberto. Porém, já se entendeu que não se tipifica se o agente, imediatamente após haver escondido o cadáver, comunica o fato à autoridade, pois não procurou manter a ocultação, o que revela ausência de dolo(rt 552/361).

Se a destruição é de várias partes do cadáver o crime é único. Se alguém destrói vários cadáveres pratica diversos crimes. Discute-se com relação ao furto em sepultura. A retirada de dentes do cadáver configura o crime previsto no artigo 211 ou mesmo do artigo 210 do Código Penal e não o de furto, pois cadáver é coisa fora do comércio, a ninguém pertence(rt 608/305), salvo se for de Instituto Científico ou peça arqueológica(rt 619/291). Já se decidiu que se a finalidade era furtar, a violação de sepultura é absorvida pelo crime de furto(rt 598/313). Já a subtração pode conjugar-se com os delitos previstos nos artigos 209, 210 e 212; a ocultação com os dos artigos 209 e 212 e na destruição com estes e com o artigo 210. Convém trazer os tipos objetivos dos artigos 209 e 210 do Código Penal, que assim como os crimes aqui estudados têm como objetividade jurídica o respeito aos mortos. No artigo 209 do Código Penal(impedir ou perturbar enterro ou cerimônia funerária), crime de menor potencial ofensivo, com pena de detenção de um mês a um ano, ou multa, tem-se: impedir(impossibilitar, paralisar etc) ou perturbar(embaraçar,dificultar etc) o enterro ou a cerimônia fúnebre. O enterro, como bem explica Fabbrini Mirabete(obra citada, pág. 396), inclui a transladação do corpo para o local onde vai haver o sepultamento e a própria inumação. A cerimônia fúnebre é o ato civil em que se presta assistência ou homenagem ao falecido(velório, honras fúnebres junto à sepultura, cremação etc). Bem ainda lecionou Fabbrini Mirabete(obra citada, pág. 396) que havendo cerimônia religiosa a sua interrupção ou perturbação caracteriza o crime previsto no artigo 208 do Código Penal. Até por omissão esse crime pode ser cometido ao não se fornecer o esquife, a viatura para o transporte, as chaves do túmulo. O tipo subjetivo é o dolo, bastando a consciência, por parte do agente, de que sua conduta perturba o ambiente de respeito próprio das cerimônias funerárias, para a consumação do tipo(rt 410/313). Mas se há emprego de violência, há forma qualificada, artigo 209, parágrafo primeiro, a pena é aumentada de um terço, sem prejuízo da correspondente à violência. Consuma-se o crime com o impedimento ou com a simples perturbação de enterro ou cerimônia funerária. Já o tipo presente no artigo 210 do Código Penal(violar ou profanar sepultura ou urna funerária, com pena de reclusão de um a três anos e multa) envolve: violar(abrir, devassar, descobrir, escavar, alterar, romper, destruir) ou profanar(ultrajar, aviltar, macular, tratar com desrespeito á sepultura). Aqui se incluem: danificar ornamentos, escrever palavras injuriosas, na derrubada de cruz ou enfeite religioso etc. O crime abrange: sepulcros, mausoléus, tumbas, túmulos, covas etc e tudo que lhe é conexo imediatamente como lápide, ornamentos estáveis, inscrições, estátuas etc. Ensinaram Heleno Cláudio Fragoso e Nelson Hungria(comentários ao Código Penal, volume VIII, pág. 71) que, na modalidade de profanar, se exige elemento subjetivo específico, pois não há profanação sem o intuito de vilipendiar ou desprezar(dolo específico) enquanto na modalidade de violar basta a vontade consciente de alterar, abrir ou arrebentar sepultura ou urna funerária. Todavia, Magalhães Noronha(Direito Penal, volume III, pág. 102) exige,em ambas, a finalidade de faltar com respeito aos mortos. Há o entendimento de que é de todo irrelevante saber se o propósito dos réus era praticar um furto, quando é certo que tinham consciência de que estavam a praticar uma violação de sepultura (RT 305/106). Consuma-se o delito com qualquer ato de vandalismo ou profanação

sobre a sepultura, sendo admissível a tentativa. O furto de objetos da sepultura(placas, bronzes, cruzes), sem violação ou profanação, configura-se o crime presente no artigo 155 do Código Penal. Já se decidiu que falta tipicidade, por ausência de dolo, na conduta de sóciogerente de cemitério, que diante da inadimplência de parcelas referentes à manutenção e conservação da sepultura, exuma restos mortais, conforme permitia o contrato(rt 790/656). Estreitamente ligado ao crime do artigo 211 do Código Penal é o de vilipêndio a cadáver(artigo 212 do Código Penal) onde se lê: Vilipendiar cadáver ou suas cinzas: Pena - detenção, de um a três anos, e multa. Vilipendiar é tratar com desprezo grosseiro, aviltar, ultrajar etc. Tal conduta pode vir por palavras, por atos ou escritos. É o gesticular ofensivo, o arremesso de imundícies, a prática de obscenidades. Além de cadáver protege-se as cinzas, resíduos de combustão ou cremação do corpo(autorizada ou criminosa). São incluídos na proteção as partes do corpo, o esqueleto, caveiras etc. Nelson Hungria e Heleno Cláudio Fragoso(obra citada, pág. 74) ensinam que é necessário que o ato seja praticado sobre ou junto ao cadáver ou suas cinzas. Nelson Hungria(Comentários ao Código Penal, volume VIII, pág.74) exemplifica: tirar as vestes do cadáver, escarrar sobre ele, cortar algum membro com o objetivo de escárnio, atos de necrofilia(caso em que se pode duvidar da integridade mental do agente), derramar líquidos imundos sobre as cinzas, ou dispersá-las acintosamente. Nelson Hungria, portanto, fala em fim de escarnecer. A Lei 9.4334, de 4 de fevereiro de 1997, que passou a regular a remoção dos órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplantes e tratamento, prevê, como crimes, nos artigos 14 a 18, a remoção irregular de órgãos ou partes do cadáver, a realização de transplante ou enxerto utilizando tecidos, órgãos ou partes do corpo humano que tenham sido obtidos em desacordo da lei e a omissão na recomposição do cadáver, devolvendo aspecto condigno para o sepultamento ou a entrega ou na mora de sua entrega aos familiares ou interessados. O tipo subjetivo é o dolo, que consiste no desejo consciente de desprezar o corpo com a intenção de depreciá-lo(rt 532/368). Para Magalhães Noronha(obra citada, pág. 96), não existirá o delito sem o dolo genérico. Disse ele: não colhe dizer que o crime é contra o respeito aos mortos, pois, se de fato o bem jurídico é esse, não menos certo é que ele é ofendido pela ação contra o morto. É mister, portanto, que o agente tenha o fim ou escopo de aviltar o cadáver. Observe-se, de passagem, que o crime tem pontos de contato com o delito contra a honra é possível a calúnia contra os mortos -, nos quais se exige o dolo específico(animus diffamandi vel injuriandi), pois a palavra ofensiva, nem sempre é proferida com essa intenção, máxime nas classes inferiores. Consuma-se o crime com a prática do ato ultrajante, sendo possível a tentativa. O crime tanto pode ser formal como material; no primeiro caso, a ofensa oral; no

segundo, o vilipêndio por ato. Como crime formal não se admite a tentativa, tratando-se de crime unissubsistente. Na segunda forma, pode haver o fracionamento do iter, não chegando o agente ao resultado querido, como ensinou Magalhães Noronha(obra citada, pág. 96), sendo possível a tentativa. Pode haver concurso material com o crime definido no artigo 210 ou formal com os crimes previstos nos artigos 209 e 211 e calúnia contra os mortos(artigo 138, 2º, CP). Quando forem várias as ações, cada uma constituindo vilipêndio, mas sendo as consequentes continuação da primeira, existirá crime continuado.