OZONÓLISE NO TRATAMENTO DO BAGAÇO DE CANA DE AÇÚCAR PRA PRODUÇÃO DE ETANOL CELULÓSICO POR HIDRÓLISE ENZIMÁTICA Olavo M. Perrone a, Jéssika S. Rossi a, Mauricio Boscolo a (PQ), Eleni Gomes b (PQ), Roberto da Silva b (PQ). olavo_perrone@hotmail.com / dasilva@ibilce.br / boscolo@ibilce.br Departamento de química e ciências ambientais, IBILCE, Universidade Estadual Paulista, UNESP. a Laboratório de Sucroquímica e química analítica. b Laboratório de Bioquímica e microbiologia aplicada. Resumo O tratamento do bagaço de cana de açúcar para produção de etanol celulósico foi realizado utilizando ozônio em meio alcalino e ultrassom, após o tratamento a fração sólida foi utilizada na avaliação térmica por TGA (TG 4000 Perkin Elmer ), caracterização química, avaliação por espectroscopia no infravermelho (Perkin Elmer FTIR-ATR Spectrum Two UART Two) e na hidrólise enzimática com solução enzimática comercial. O valor de glicose obtido no melhor tratamento (B60-O 3 ) foi de 417 mg de glicose / g de bagaço, aproximadamente 4,5 vezes maior que o bagaço sem tratamento. Palavras-chave: Etanol celulósico, Ozônio, ultrassom, hidrolise enzimática. Abstract Treatment o sugarcane bagasse for cellulosic ethanol production was performed using ozone in alkaline medium and ultrasound, after treatment, the solid fraction was used in the thermal analysis by TGA (TG 4000 Perkin Elmer ), chemical characterization, evaluation by infrared spectroscopy (Perkin Elmer FTIR-ATR Spectrum Two UART Two) and enzymatic hydrolysis with commercial enzyme solution. The glucose obtained in the best treatment (B60-O 3 ) was 417 mg / g of treated bagasse, this is approximately 4.5 times greater than value of untreated bagasse. Key-words: Cellulosic ethanol, ozone, ultrasound, enzymatic hydrolysis.
INTRODUÇÃO A fibra do bagaço de cana de açúcar é constituída principalmente de material lignocelulósico. Este material pode ser hidrolisado por enzimas para a produção de açúcares fermentescíveis. Entretanto o material lignocelulósico é altamente recalcitrante devido à presença de lignina, celulose cristalina e ligações cruzadas entre hemicelulose e lignina dificultando o acesso das enzimas ao substrato, tornando o processo de produção de etanol inviável (1). Neste cenário é necessário realizar o pré-tratamento do bagaço, a fim de alterar a estrutura do material lignocelulósico. O tratamento por ozônio tem sido relatado com sendo eficiente para desestruturação da parede celular vegetal (2), o ozônio é altamente reativo com compostos que possuem ligações duplas conjugadas e grupos funcionais com alta densidade de elétrons (3). Portanto a lignina é o material mais provável de ser oxidado pela ação do ozônio devido principalmente a estrutura aromática de seus precursores e a grande quantidade de ligações duplas entre carbonos. A principal vantagem da utilização de ozônio é que compostos inibidores da fermentação alcoólica, tais como, compostos furânicos, vanilina, siringaldeído, ácido cumárico e ácido ferúlico podem não ser gerados durante o processo de ozonólise (2,4). OBJETIVO Neste trabalho a fibra de bagaço foi exposta a três diferentes níveis de ozônio (5; 60 e 180 minutos) os efeitos do tratamento na fibra foram avaliados por meio da espectroscopia em infravermelho e pela técnica termoquímica de TGA/DTG, os resultados obtidos foram relacionados ao rendimento enzimático desse material e a caracterização química resultante de cada tratamento. MATERIAIS E MÉTODOS: Os tratamentos seguiram da seguinte maneira: exposição ao ozônio no tempo determinado (5, 60 ou 180 minutos) (32 mg/ min), homogeneização da fibra após a ozonólise, repouso em solução de NaOH (0,1 Mol L -1 ) por duas horas com 5 minutos iniciais assistidos por ultrassom, filtragem da porção liquida e por fim, utilização da fração sólida na hidrólise enzimática, avaliação térmica por TGA (TG 4000 Perkin Elmer ), caracterização química (5) e avaliação por espectroscopia no infravermelho (Perkin Elmer FTIR-ATR Spectrum Two UART Two).
RESULTADOS E DISCUSSÃO Durante a decomposição térmica do bagaço de cana de açúcar, cada um dos três principais componentes do material lignocelulósico (celulose, hemicelulose e lignina) tem características específicas, as quais são baseadas nos tipos de ligações existentes entres os componentes e na sua estrutura polimérica. O TGA (do inglês, Thermal Gravimetric Analysis) expressa à porcentagem de perda de massa em função da temperatura, enquanto o DTG (do inglês, Differential Thermal Gravimetric Analysis) expressa a derivada da TGA. Durante a decomposição térmica deste material a água é liberada na temperatura de aproximadamente 100ºC, nessa temperatura todos os termogramas apresentaram um primeiro evento de perda de massa de aproximadamente 7% atribuído à umidade do material (Figura 1), na temperatura de aproximadamente 240ºC algumas ligações químicas começam a se desfazer e ocorre o inicio da desestruturação térmica do material. Figura 1. Termogramas de TGA e DTG do bagaço sem tratamento, amostras B05-O 3, B60-O 3, B180-O 3, e padrões de lignina e celulose. A lignina e a hemicelulose degradam em temperaturas mais baixas do que a celulose. A lignina tem uma faixa ampla de degradação começando em aproximadamente 237ºC e terminando em aproximadamente 510ºC (Figura 1), já a hemicelulose geralmente degrada na faixa de 280ºC a 400ºC e é representada como um ombro na DTG (Bagaço sem tratamento, Figura 1). Por fim a celulose tem faixa curta de degradação entre 374ºC e 425ºC (Figura 1). A decomposição é um processo complexo, pois os
intervalos de temperatura de degradação da hemicelulose, celulose e lignina se sobrepõem parcialmente uns aos outros, sendo o termograma caracterizado pelo componente mais abundante. O termograma da amostra B60-O 3 tende a se assemelhar com o termograma do padrão de celulose, indicando elevado teor de celulose e baixa quantidade de lignina nessa amostra. Já o termograma da amostra B05-O 3 observa-se a presença de um ombro em aproximadamente 350ºC assemelhando-se ao termograma do bagaço sem tratamento, indicando elevada quantidade de hemicelulose, comprovado através da caracterização química (Tabela 1). Já a amostra B180-O 3 esperava-se maior estabilidade e maior semelhança ao termograma do padrão de celulose, entretanto esse tratamento, com elevada quantidade de ozônio, pode ter afetado não só a lignina, mas também a celulose presente na fibra, reduzido a cristalinidade deste componente e por sua vez reduzindo a estabilidade térmica. Tabela 1. Valores obtidos após a caracterização química e hidrólise enzimática dos tratamentos. Tratamento Caracterização Química (%) Hidrólise Enzimática Celulose Hemicelulose Lignina Glicose (mg / g) Sem tratamento 49,8 ± 0,1 18,9 ± 0,1 24,5 ± 0,2 75,5 ± 7,8 B05-O 3 56,3 ± 1,6 17,3 ± 0,4 22,9 ± 2,0 * B60-O 3 64,9 ± 0,5 14,2 ± 0,3 14,3 ± 0,3 417 ± 11 B180-O 3 63,1 ± 1,3 14,7 ± 1,6 14,7 ± 1,6 293 ± 20 *Não detectado pelo método utilizado. A relação com o rendimento da hidrólise enzimática não pode ser feita a partir de análises térmicas, uma vez que outros fatores influenciam no rendimento enzimático, como por exemplo, os inibidores enzimáticos, e não somente a disponibilidade de celulose e estabilidade térmica. Entretanto a maior disponibilidade de celulose, menor quantidade de lignina e menor quantidade de hemicelulose são os principais fatores para o elevado teor de glicose obtido após a hidrólise enzimática utilizando a amostra B60-O 3. A análise estrutural por infravermelho de amostras tratadas em diferentes tempos de ozonólise teve como foco as bandas onde foram encontradas as maiores modificações em relação ao bagaço sem tratamento, neste caso, as bandas localizadas em 1600 cm -1 (Figura 2, A), 1510 cm -1 (Figura 2, B) e 833 cm -1 (Figura 2, C), todas atribuídas à absorção pela estrutura da lignina.
Figura 1. Bandas selecionadas no espectro de infravermelho para amostras tratadas em diferentes tempos de ozonólise.(a) banda localizada em 1600 cm -1 ; (B) banda localizada em 1510 cm -1 ; (C) banda localizada em 833 cm -1. Observa-se a redução das bandas atribuídas a absorção pela lignina (Figura 2, A, B, C) após 5 minutos em ozonólise (B05-O 3 ). Após 60 e 180 minutos (amostras B60-O 3, B180-O 3 ) tais bandas não são mais visíveis no espectro. Esses dados, obtidos a partir de análise por infravermelho, indicam a ausência ou muita redução da lignina presente nesses tratamentos, estando esses dados de acordo com a caracterização química (Tabela 1). CONCLUSÃO A variação no tempo de ozonólise durante o tratamento demonstra a necessidade em utilizar uma quantidade controlada de ozônio para que ocorra a desestruturação desejada da lignina presente na fibra. Já com a análise térmica por TGA foi possível observar que a maior estabilidade térmica das amostras está amplamente relacionada ao grau de celulose e cristalinidade presente na fibra após o tratamento. A técnica de infravermelho possibilitou uma resposta rápida frente à redução da lignina e por fim, a caracterização da fibra permitiu comprovar o observado a partir das técnicas anteriores. A maior quantidade de celulose disponível foi obtida com o bagaço exposto em 60 minutos em ozônio, correspondente a uma injeção de aproximadamente 100 mg de ozônio / g de bagaço no tratamento.
AGRADECIMENTOS À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) processo nº. 2013/06234-3 pelo auxílio financeiro. REFERÊNCIAS (1) MOSIER, N.; WYMAN, C.; DALE, B.; ELANDER, R.; LEE, Y. Y.; HOLTZAPPLE, M.; LADISCH, M. Features of promising technologies for pretreatment of lignocellulosic biomass. Bioresource Technology, v. 96, p. 673-686, 2005. (2) TRAVAINI, R.; OTERO, M. D. M.; COCA, M.; DA-SILVA. R.; BOLADO, S. Sugarcane bagasse ozonolysis pretreatment: Effect on enzymatic digestibility and inhibitory compound formation. Bioresource Technology, v. 133, p. 332-229, 2013. (3) CUBERO, M. T. G.; BENITO, G. G.; INDACOECHEA, I.; COCA, M.; BOLADO, S. Effect of ozonolysis pretreatment of enzymatic digestibility of wheat and rye straw. Bioresource Technology, v. 100, p. 1608-1613, 2009. (4) KAUR, U.; OBEROI, H. S.; BHARGAV, V. K.; SHIVAPPA, R. S.; DHALIWAL, S. S. Ethanol production from alkali-and ozone-treated cotton stalks using thermotolerant pichia kudriavzevii HOP-1. Industrial Crops and Products, v. 37, p. 219-226, 2012. (5) SLUITER, A.; HAMES, B.; RUIZ, R.; SCARLATA, C.; SLUITER, J.; TEMPLETON, D.; CROCKER, D. Determination of structural carbohydrates and lignin in biomass (LAP). NREL, Golden, Co., USA, 2012.