O ESPAÇO DA AGRICULTURA FAMILIAR NO MUNICÍPIO DE ESPERANÇA/PB: DESAFIOS E PERSPECTIVAS À AUTO-SUSTENTABILIDADE NO ASSENTAMENTO RURAL CARRASCO Autor: Crisólogo Vieira de Souza Graduando do Curso de Licenciatura Plena em Geografia (UEPB) crisologogeografia@hotmail.com Co-autor: Lincoln da Silva Diniz Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Geografia (PPGEO/UFPE) lincoln.diniz@hotmail.com 1. INTRODUÇÃO A partir do século XX as transformações decorrentes da globalização propiciaram o surgimento da grande agricultura comercial/moderna, voltada para atender, sobretudo, ao mercado externo, além da implantação de novas técnicas de cultivo, emprego de máquinas e equipamentos avançados, o que ampliou a produção, mas não atingiu todos os espaços agrícolas. Nos espaços de atividades agrícolas tradicionais ainda dominam a pequena agricultura familiar de subsistência. No município de Esperança, localizado na Mesorregião do Agreste Paraibano, desenvolve-se comumente a pequena agricultura familiar que se assemelham ainda as primeiras práticas tradicionais agrícolas, pois a produção é destinada principalmente ao próprio consumo familiar e o excedente é destinado à comercialização no mercado local, especialmente nos espaços das feiras livres. Outras características são os estabelecimentos rurais de pequena extensão, onde o chefe de família muitas vezes não é dono das terras, sendo arrendatário ou rendeiro, parceiro ou até posseiro ou ocupante, predomina a pouca utilização de equipamentos e técnicas modernas e a maior parte da mão-de-obra utilizada é familiar. Diante do exposto, o presente estudo ainda em fase de desenvolvimento pelos autores, tem por objetivo analisar as transformações recentes no espaço rural do município de Esperança/PB, a partir da implantação e desenvolvimento das técnicas/ projetos de 1
auto-sustentabilidade agrícola entre famílias de agricultores do Assentamento Rural Carrasco, bem como avaliar os desafios e as perspectivas deste espaço produtivo no contexto agrícola tradicional do semi-árido paraibano. Para realizar este estudo, vem sendo efetuado um levantamento bibliográfico sobre projetos de auto-sustentabilidade aplicados ao semi-árido, além da utilização de entrevistas e questionários com técnicos/ estudiosos da EMATER regional (Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural), da Secretaria de Agricultura do município e, sobretudo, com os agricultores instalados no Assentamento Rural Carrasco. Pode-se afirmar, portanto, que no assentamento rural do Carrasco, desenvolvem-se práticas agrícolas auto-sustentáveis, bem como sistemas ecologicamente adequados e eficientes que permitem aos agricultores familiares do referido assentamento rural se manterem no campo de forma produtiva e viável as suas próprias condições sócio-culturais. 2. AGRICULTURA FAMILIAR E A SUA VIABILIDADE SOCIOECONÔMICA A agricultura familiar no Brasil é responsável por grande parte da alimentação que é consumida diariamente, sendo em torno de pelo menos 70% do feijão e 87% da mandioca provenientes deste setor da agricultura brasileira. A esse respeito, Oliveira (2007, p. 90) argumenta que: [...] as pequenas unidades camponesas têm sido responsáveis pela maior parte da produção dos alimentos básicos da população e de várias matérias-primas industriais [...]. Nesse contexto, a agricultura familiar é responsável pela produção dos alimentos básicos da alimentação brasileira. Outro aspecto a ser destacado se refere ao crescimento das unidades agrícolas brasileiras, destinadas a agricultura familiar e, que são responsáveis por gerar um número expressivo de empregos no campo. Quanto aos assentamentos agrícolas, estes são também vistos como resultado de ações políticas e sociais importantes para o desenvolvimento da agricultura familiar. Na opinião de David (2008), os assentamentos rurais são fundamentais no processo de dinamização da agricultura familiar, bem como possibilita novas perspectivas para um meio rural mais socializado entre as populações mais desfavorecidas. Sobre isso, destaca: Com os assentamentos, ampliou-se o debate sobre agricultura familiar e as alternativas de desenvolvimento rural. Os assentamentos têm-se constituído em um laboratório de experiências sociais e vêm dinamizando o debate sobre as 2
perspectivas do meio rural brasileiro e possibilidades de novas alternativas de desenvolvimento (DAVID, 2008, p. 21). Dessa forma, tem se ampliado os debates sobre as potencialidades da agricultura familiar a partir dos assentamentos rurais, sobretudo, a sua importância socioeconômica. No entanto, a agricultura de forma geral, e especialmente a familiar, sofreram os efeitos do modelo de exportação de produtos primários, da importação substitutiva de produtos nacionais. Afirma Rosa (1999) que: Na transição da década de 80 para a de 90, a agricultura brasileira, anteriormente protegida, foi exposta à concorrencia internacional. O conjunto dos produtores não rurais familiares não acompanhou esta evolução e, como resultado, perdeu competitividade frente a seus concorrentes internacionais (ROSA, 1999, p.02). Nesse sentido, a agricultura familiar perdeu competitividade deviddo a concorrência, e apesar dos incentivos do governo, ainda enfrenta muitas dificuldades, sendo ainda insuficientes os projetos de acompanhamento dos produtores que desenvolvem a pequena agricultura familiar. 3. O ESPAÇO DA AGRICULTURA FAMILIAR NO MUNICÍPIO DE ESPERANÇA A agricultura familiar desenvolvida no espaço rural do município de Esperança/PB assemelha-se ainda, de forma dominante, as primeiras práticas agrícolas tradicionais. A presença de estabelecimentos rurais de pequenas extensões, onde a figura do chefe de família muitas vezes não é dono das terras, sendo arrendatário ou rendeiro, parceiro ou até posseiro ou ocupante. Outras características que predominam na maioria das propriedades agrícolas do município de Esperança são o predomínio de pouca utilização de equipamentos e técnicas modernas, a maior parte da mão-de-obra utilizada é familiar e a produção é destinada principalmente ao próprio consumo familiar e o excedente é destinado à comercialização no mercado local, especialmente nos espaços das feiras livres. No que se refere à produção agrícola, o municipio de Esperança apresenta condições de clima e também de solo que favorecem ao cultivo de diferentes culturas temporárias a exemplo do feijão, milho, mandioca entre outras, onde se deduz que há uma razoável geração 3
de renda e de empregos. No entanto, apresenta uma produtividade baixa, assim como na maior parte das cidades circunvizinhas, que se dedicam, principalmente, as práticas rudimentares que são utilizadas a exemplo das queimadas, a ausência de práticas eficaz de conservação do solo e de combate à erosão, a fraca difusão de sementes selecionadas, a falta de tecnologias modernas. Outros obstáculos enfrentados pelos agricultores familiares do município de Esperança referem-se à assistência técnica, além de poucos investimentos municipais, estaduais, e também federais no desenvolvimento de projetos voltados para atender a agricultura familiar. É importante ressaltar que o governo Federal possui alguns projetos para fortalecimento da agricultura familiar, como o Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), o Garantia-Safra que prevê indenização quando ocorrem perdas de 50% da produção. Esse programa tem sido uma das principais ajudas recebidas pelos agricultores familiares do município. As práticas de auto-sustentabilidade são ainda pouco desenvolvidas no espaço rural do município, ocorrendo em poucas propriedades, onde enfrentam dificuldades, devido à ausência tanto de investimentos, como de assistência técnicas de órgãos governamentais, e também a própria resistência as práticas tradicionais. 3. ASSENTAMENTO RURAL DO CARRASCO: UMA EXPERIÊNCIA DE AUTO-SUSTENTABILIDADE NO ESPAÇO AGRÍCOLA ESPERANCENSE O assentamento rural do Carrasco está localizado no sítio Carrasco na zona rural do município de Esperança. A área foi adquirida através do Credito Fundiário, programa do governo Federal para aquisição de terras (que é caracterizado pela reunião de pequenos agricultores familiares sem terra), onde ocorreu à reunião de dez famílias que não possuíam terras e trabalhavam como arrendatário ou rendeiro, parceiro ou até posseiro em outras propriedades, e que realizaram a compra de 60 hectares de terras que fazia parte de uma propriedade de 400 hectares. A área que corresponde ao assentamento rural do Carrasco era improdutiva, e as dez famílias se reuniram e formaram a Associação dos Produtores Orgânicos da Fazenda Carrasco- APROFACO. Adquiriram a propriedade com prazo de 20 anos para realização 4
do pagamento, cada família assentada também realizou um projeto do Pronaf, destinado pelo governo Federal para atender a assentamentos, esse projeto é destinado à realização de melhorias na propriedade, como a construção de cercas, barreiros, entre outras, além da construção de casas através dos recursos do FGTS Patrimônio do Trabalhador da Caixa Econômica Federal. No assentamento rural do Carrasco, desenvolve-se plenamente a agricultura familiar, assim como na maioria dos estabelecimentos rurais do município de Esperança e também de municípios adjacentes, porém o que diferencia é a diversidade técnica e produtiva implantada e desenvolvida no citado assentamento, que dispõem ainda de acompanhamento técnico fornecido pela EMATER do próprio município. Os agricultores familiares do assentamento são orientados pelos técnicos da EMATER a desenvolverem, além das culturas tradicionais, como o feijão, o milho, a mandioca entre outras, culturas permanentes como a laranja e o limão, bem como hortaliças de vários tipos, criação bovina, avicultura, apicultura, o que tem proporcionado maior rentabilidade e envolvimento dos trabalhadores. As técnicas agrícolas desenvolvidas no assentamento Carrasco se diferenciam muito das técnicas tradicionais utilizadas pela maioria dos agricultores familiares do município, pois toda a produção é orgânica, não sendo utilizado agrotóxico para combate de pragas, não ocorrendo, portanto, grandes agressões ao meio ambiente local. Existe uma preocupação dos agricultores familiares com a preservação das matas nativas existentes no assentamento, configurando uma área total de 12 hectares destinada à preservação (Foto 1). 5
Foto 1: Área de preservação ambiental no Assentamento Rural do Carrasco Foto: Crisólogo Vieira de Souza, Abril/ 2010 A produção orgânica desenvolvida pelos agricultores familiares aproveita-se do adubo, produzido no próprio assentamento, como o esterco dos animais, restos de cultivos, produzindo a matéria orgânica de excelente qualidade, evitando a utilização de adubos e fertilizantes químicos, ou qualquer produto químico, que possa causas danos ao meio ambiente e a saúde humana. É explorado o potencial do assentamento, explorando os recursos existentes como os mananciais para o desenvolvimento de irrigação por gotejamento de hortaliças de vários tipos (Foto 2), que são comercializadas na feira orgânica do município de Esperança e feiras orgânicas de Campina Grande/PB. 6
Foto 2: Produção orgânica de hortaliças de vários tipos Foto: Crisólogo Vieira de Souza, Abril/ 2010 Outros recursos explorados são a flora para o desenvolvimento da apicultura, que atende ao consumo familiar, como também na geração de renda a partir da sua comercialização no mercado local. A avicultura e a criação de suínos estão associadas à produção de hortaliças, na qual fornece as sobras que são utilizadas como complementação da alimentação desses animais. Em todas as atividades desenvolvidas no assentamento rural do Carrasco, não são permitidas práticas que possam causar destruição do meio ambiente, como por exemplo, as queimadas, ou qualquer outra atividade predatória. Desde o plantio até a colheita são aplicadas técnicas modernas que estão aliadas as práticas auto-sustentáveis e ao desenvolvimento de sistemas ecologicamente adequados Destarte, a produtividade obtida e as técnicas agrícolas avançadas implantadas entre os produtores deste referido assentamento contrastam, sobretudo, com o perfil produtivo da própria zona rural do município de Esperança, como também dos municípios vizinhos, uma vez que nestes são utilizadas práticas rudimentares, como as queimadas, a ausência de assistência técnica de práticas se conservação do solo e combate à erosão, além da ausência de sementes selecionadas e tecnologias modernas. 7
Pode-se afirmar, portanto, que no assentamento rural do Carrasco, desenvolvem-se práticas agrícolas auto-sustentáveis, apresentando diversificação de culturas adaptadas as condições ambiental-climatológicas do semi-árido, manejo adequado do solo, combate a erosão, bem como sistemas ecologicamente adequados e eficientes que permitem aos agricultores familiares do referido assentamento rural se manterem no campo de forma produtiva e viável as suas próprias condições sócio-culturais. 4. REFERÊNCIAS ESPERANÇA, Diagnóstico sócio-econômico. João Pessoa: SEBRAI/PROBER, 1997. DAVID, Cesar de. Agricultura Familiar em Assentamentos Rurais: contribuições à dinâmica regional do sul do estado do Rio Grande do Sul. In: MARFON, Glaucio José; PESSÔA, Vera Lúcia (orgs.). Agricultura, desenvolvimento e transformações socioespaciais: reflexões interinstitucionais e construção de grupos de pesquisas no rural e no urbano. Uberlândia: Assis Editora, 2008, p. 15-37. OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino. A geografia Agrária e as transformações territoriais recentes no campo brasileiro. In: CARLOS, Ana Fani Alessandri (org.). Novos caminhos da geografia. 5. Ed. São Paulo: Contexto, 2007, p.63-110. ROSA, Sueli l. Couto. Agricultura familiar e desenvolvimento local sustentável. 37º Congresso Brasileiro de Economia e Sociologia Rural-SOBER, Foz do Iguaçu, 1999. [s.n.]. 8