A SEMIÓTICA COMO FERRAMENTA NA ANÁLISE DE TEXTOS NAS AULAS DE LÍNGUA INGLESA SEMIOTICS AS A TOOL FOR TEXT COMPREHENSION IN ENGLISH CLASSES

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Transcrição:

A SEMIÓTICA COMO FERRAMENTA NA ANÁLISE DE TEXTOS NAS AULAS DE LÍNGUA INGLESA SEMIOTICS AS A TOOL FOR TEXT COMPREHENSION IN ENGLISH CLASSES Fábio Henrique Rosa SENEFONTE UEL capmont@hotmail.com Paula Kracker FRANCESCON UEL francescon.paula@gmail.com RESUMO Dentre as várias teorias que auxiliam o trabalho com o texto nas aulas de línguas, o presente trabalho tem como objetivo expor, à luz dos pressupostos teórico-metodológicos da semiótica de linha francesa (greimasiana), uma proposta para a análise de texto nas aulas de língua inglesa (BARROS, 1990; FIORIN, 2002, 2004; LIMOLI & NETO, 2001; entre outros). Como exemplificação prática, optamos pela análise da fábula The Lion in Love, de Ésopo. Ressaltamos que a escolha desse gênero é meramente para ilustração prática da teoria escolhida, uma vez que é possível aplicá-la aos diversos gêneros textuais presentes nas esferas sociais e trabalhados em sala de aula. Nosso foco é em aulas de inglês no Ensino Médio, o que não invalida a aplicação dessa teoria em outros segmentos educacionais. Esperamos contribuir oferecendo uma opção a mais para se trabalhar com o texto, aumentando o número de procedimentos didáticos disponíveis para o professor utilizar nas aulas de línguas. Palavras-chave: Interpretação de Texto; Teoria Semiótica; Aulas de Inglês. ABSTRACT Among the many theories that help the work with texts in the language classroom, this paper aims to expose, in the light of theoretical and methodological assumptions of French semiotics (Greimasian), a proposal for analysis of text in English language classes (Barros, 1990; FIORIN, 2002, 2004 LIMOLI & NETO, 2001, among others). As a practical illustration, we chose to analyze the fable The Lion in Love, by Aesop. We emphasize that the choice of this genre is merely for practical illustration of the theory chosen, since it is possible to apply it to the severaltext genres present in the social spheres and worked with in the classroom. Our focus is on English classes in high school, which does not invalidate the application of this theory in other educational segments. We hope to contribute by offering an additional option for working with text, increasing the number of didactic procedures available for the teacher to use in language classes. Keywords:Text Comprehension; Semiotic Theory; English Classes. 1. INTRODUÇÃO Ancorados no postulado de que toda atividade linguística é necessariamente textual (ANTUNES, 2003), concordamos que o texto deveria ser o objeto de estudo de toda aula de língua, seja ela materna ou estrangeira. Diante disto, uma questão para reflexão é levantada: qual a melhor metodologia para se abordar o texto em sala de aula? Essa não é uma questão tão fácil de ser respondida, se pensarmos que não existe uma fórmula mágica, única e eficaz capaz de dar conta de todas as dimensões de um 63

texto. Assim, existem várias teorias que abordam o texto em sala de aula, e uma delas é a semiótica. Assim, este trabalho apresenta, por meio de procedimento semiolinguístico, uma possível análise da fábula The Lion in Love. Tal análise está baseada nos pressupostos teórico-metodológicos da semiótica de inspiração greimasiana. Optamos pela semiótica por corroborarmos que esta pode ser uma metodologia eficaz para o trabalho com o texto em aulas de línguas, uma vez que o aluno não precisa, em primeiro momento, recorrer a conhecimentos sócio-histórico-culturais para a compreensão do texto, já que esta se faz por meio de dados intrínsecos ao texto (LIMOLI & NETO, 2001; LIMOLI et al. 2005). Vale ressaltar que esta teoria possibilita explorar as múltiplas potencialidades de significação de uma forma criativa, como defendem os autores Limoli & Neto (2001). O foco deste escrito é em aulas de língua inglesa do Ensino Médio, daí a escolha pelo gênero fábula. Além de estar amplamente presente nos livros didáticos para este segmento educacional, este gênero tem extensão relativamente pequena, escrita acessível e costuma chamar a atenção dos alunos pelo enredo, personagens e fundo moralístico. A escolha deste segmento educacional, bem como do gênero, é devida à familiaridade destes pesquisadores com estes contextos. Entretanto, cabe ressaltar que essa escolha não limita a aplicação dessa teoria em outros contextos educacionais, bem como em outros gêneros textuais. Nosso estudo não pretende esgotar as inúmeras possibilidades de interpretação da fábula em questão, nem invalidar as inúmeras metodologias do trabalho textual em sala de aula. Acreditamos que a semiótica é mais uma possibilidade que o professor pode utilizar para tornar suas aulas cada vez melhores, objetivando o trabalho de alunos mais ativos e críticos em relação ao texto. Para estes fins, este escrito se estrutura nas seguintes seções: introdução, teoria semiótica, análise da fábula e considerações finais. 64

2. TEORIA SEMIÓTICA 30 Dentre as teorias semióticas existentes, adotamos para este trabalho a teoria desenvolvida por A.J. Greimas. Tal escolha se deve ao fato de julgarmos que essa teoria do texto seja mais pertinente ao contexto escolhido para este escrito. Por semiótica, entendemos que essa lida com o texto, com o sentido do texto. Assim, a semiótica tem por objeto o texto, ou melhor, procura descrever e explicar o que o texto diz e como ele faz para dizer o que diz (BARROS, 1990, p. 7). Dessa forma, a construção do sentido do texto, de acordo com a teoria semiótica, é feita por um percurso gerativo de sentido. Tal percurso parte de uma análise do mais simples e abstrato ao mais complexo e concreto (BARROS, 1990; FIORIN, 2004). De forma breve iremos expor como se dá a construção de sentido do texto à luz da semiótica greimasiana. O percurso gerativo de sentido se desenvolve em três etapas / níveis, a saber: nível fundamental, nível narrativo e nível discursivo. Cada nível desses tem sua parte sintática e semântica. 2.1. Nível Fundamental É o nível mais simples e abstrato. Na parte semântica, a significação surge por uma oposição semântica mínima (BARROS, 1990). Só se opõe o que se tem em comum, assim, uma categoria semântica fundamenta-se numa diferença, numa oposição. No entanto, para que dois termos possam ser apreendidos conjuntamente, é preciso que tenham algo em comum e é sobre esse traço comum que se estabelece a diferença (FIORIN, 2002). Nessa fase do percurso, essa categoria semântica é qualificada como eufórica ou disfórica, sendo que uma relação eufórica tem um valor positivo enquanto uma relação disfórica apresenta um valor negativo (FIORIN, 2002). É importante ressaltar que esses valores de euforia e disforia estão no próprio texto e não atribuídos pelo leitor. Na parte sintática, ocorrem duas operações: a de negação e a de asserção. Como explica Fiorin (2002), numa relação A versus B, por exemplo, tem- se as seguintes possibilidades: afirmação de A, negação de A, afirmação de B ou afirmação de B, negação de B e afirmação de A. 30 Com esta seção, objetivamos traçar um breve e superficial resumo da teoria semiótica com finalidade de contextualizar e facilitar para o leitor a parte do procedimento de análise. Assim, para uma visão aprofundada desse tópico recomendamos a consulta de Barros (1990) e/ou Fiorin (2002). 65

2.2. Nível Narrativo É a segunda etapa do percurso. A narrativa é organizada do ponto de vista de um sujeito (BARROS, 1990). Na sua parte sintática, podemos identificar no texto dois tipos de enunciados: enunciado de estado (relação de conjunção ou disjunção estabelecida entre o sujeito e o objeto) e enunciado de fazer (transformações do sujeito ao longo do texto). (FIORIN, 2002). Esse autor nos lembra que a noção de sujeito não está relacionada a uma pessoa, sujeito pode ser qualquer coisa, já a concepção de sujeito na teoria semiótica diz respeito ao papel narrativo. Na narrativa, esses enunciados se apresentam de forma hierárquica em que o enunciado de fazer comanda um enunciado de estado, essa relação recebe o nome de programa narrativo. (BARROS, 1990) De acordo com Fiorin (2002), uma narrativa complexa se estrutura em quatro fases, cuja ordem lógica seria: manipulação (o sujeito age sobre o outro para conseguir o que quer, pode ser realizada por tentação, intimidação, sedução e provocação), competência (o sujeito possui ou adquire uma competência para realizar a transformação principal da narrativa), performance (momento no qual ocorre de fato a transformação) e sanção (depois de ocorrida a transformação, vem a entrega de prêmios ou castigos ). Cabe ressaltar que essa ordem nem sempre se apresentará dessa forma em todos os textos, e nem sempre há todas essas fases também. A parte semântica desse nível é dedicada para o objeto, este assume valores, a saber: objetos modais (o querer, o poder, ou seja, a competência para realizar a performance) e objetos de valorou objeto-valor(objetos que o sujeito entra em conjunção ou disjunção na performance principal da narrativa, é o objetivo final do sujeito) (FIORIN, 2002). 2.3. Nível Discursivo É o nível mais complexo e concreto, nesse ponto a narrativa é assumida pelo sujeito da enunciação. É o nível mais próximo da manifestação textual (BARROS, 1990). A análise desse nível está relacionada, de certa forma, às condições de produção textual. A parte sintática é responsável pela compreensão das marcas da enunciação (FIORIN, 2002). Assim, esta sintaxe procura estabelecer tanto as relações do sujeito da enunciação com o discurso-enunciado como as relações entre o enunciador e 66

enunciatário. Desse modo, de acordo com Barros (1990) e Fiorin (2002), essa parte sintática se dá por duas etapas: projeções da enunciação e relação entre enunciador e enunciatário. No que tange às projeções de enunciação, temos o seguinte pressuposto: Estudar as projeções da enunciação é, por conseguinte, verificar quais são os procedimentos utilizados para constituir o discurso e quais os efeitos de sentido fabricados pelos mecanismos escolhidos. (BARROS, 2002, p.54).tais projeções utilizam as categorias de pessoa, espaço e tempo para se concretizarem. Sobre as relações argumentativas entre enunciador e enunciatário, Barros (1990) e Fiorin (2002) corroboram ao dizer que o discurso é sempre persuasivo, em que o enunciador assume o papel de manipulador, persuadindo o enunciatário a crer nas verdades do discurso. Esse processo pode ocorrer por diversas formas de manipulação. Para isto asseveramos o mesmo postulado de Fiorin (2002, p. 75): A finalidade última de todo ato de comunicação não é informar, mas persuadir o outro a aceitar o que está sendo comunicado. Por isso o ato de comunicação é um complexo jogo de manipulação com vistas a fazer o enunciatário crer naquilo que se transmite. Por isso, ele é sempre persuasão. Na parte semântica desse nível, temos a ocorrência de dois procedimentos: a tematização e a figurativização; em outras palavras, diz respeito ao plano de conteúdo e expressão do texto, respectivamente. Por tema entendemos o processo de construção de ideias abstratas presentes no texto e a figura corporifica essas ideias abstratas. A figurativização é o cenário do texto. Pelas figuras desvendamos os temas. 3. ANÁLISE DA FÁBULA Para exemplificar o processo de leitura proposto pela teoria semiótica, propomos, neste momento, uma possível leitura da fábula The Lion in Love, de Ésopo. Retificando a justificativa dada anteriormente, a escolha pelo gênero fábula foi feita devido a sua presença em livros didáticos e por ser um texto relativamente fácil de ser trabalhado, devido a sua pequena extensão e estruturação narrativa com a qual os alunos têm maior familiaridade. Além disso, é interessante destacar que a leitura proposta neste trabalho não pretende ser completa e final. As leituras realizadas de um texto devem sempre ser consideradas parciais, pois a leitura de um texto sempre depende da subjetividade do leitor e as escolhas que ele faz ao ler. 67

A primeira etapa da interpretação realizada nesta leitura da fábula é a divisão do léxico do texto em campos de acordo com suas relações semânticas, conforme apresentado por Limoli e Neto (2001) e Limoliet al. (2005), seguindo a proposta de Maurand (1992). Devido à subjetividade de cada leitor, os campos lexicais e o léxico pertencente a cada um também podem variar a cada leitura do texto, o que não é visto como problema para interpretação de acordo com o embasamento semiótico. Wildness Lion Enrage King of beasts Fear Injury Claws Teeth Sensitivity Fell in love Beautiful Maiden Proposed marriage Affection In love Submission / power Feel highly honoured Majesty (2x) Might I venture to suggest Sacrifice for love had his claws trimmed had his big teeth taken out Betrayal laughed at his face bade him to do his worst Parents feelings did not know what to say did not like did not wish A composição dos campos lexicais é de grande valia no reconhecimento das isotopias textuais, pois cada campo lexical proposto contempla as palavras e expressões do texto que apresentem uma ideia semelhante e, portanto, são agrupadas segundo essa categoria que as une. As isotopias, que são a reiteração de temas e a recorrência de figuras ao longo do texto e que ajudam a garantir uma linha sintagmática do discurso e a coerência textual (BARROS, 1990), podem auxiliar na interpretação de importantes aspectos apresentados no texto, observando o que cada categoria representa para a compreensão textual e a relação que elas apresentam entre si. 68

No seguimento da interpretação da fábula, partiremos para a análise da estrutura narrativa do texto. O programa narrativo básico da fábula é F(casar) [S1 (S1 O) (S1 U O)], no qual S1 é o leão, que está disjunto de seu objeto valor (O), que é a moça que com ele deseja se casar. Assim, a fábula decorre a partir do desejo do leão de ter a permissão dos pais da moça para se casar com ela. O pedido de casamento feito pelo leão aos pais da moça revela a relação de poder representado pela força do leão, e o medo dos pais da moça em negar o pedido, mostrando os sentimentos contrastantes dos pais, observados no trecho They did not want to give their daughter to the Lion, yet they did not wish to enrage the King of Beasts. Então, o pai da moça, sabendo que não poderia confrontar a força do leão, usa a esperteza para resolver a situação. Assim, para resolver a situação sem enfrentar o leão e sua força, o pai da moça condiciona o aceite do pedido de casamento ao fato de o leão arrancar suas garras e retirar seus dentes, sob o pretexto de que ele poderia machucar sua filha. Essa parte do texto configura a manipulação do leão, que é realizada por meio da tentação, caracterizada por um /querer-fazer/, pois o leão tem a escolha de fazer o que o pai pediu ou não, e aceita fazer movido pelo desejo de se casar com sua amada. Com isso, é possível depreender que a competência necessária para que o leão conquiste seu objeto valor é que ele deixe de ser selvagem perigoso para a moça com quem quer se casar. Desse modo, para conquistar tal competência, ele realiza sua performance: arranca suas garras e tira seus dentes. Mesmo o leão tendo feito o que os pais de seu amor pediram, a sanção final deles é negativa os pais da moça riem da cara do leão e não cumprem seu trato de ceder a mão da filha em casamento. Isso só é possível porque o leão deixou de deter a força e impor medo aos pais, já que estava sem suas armas de defesa. A partir dessa hipótese de leitura narrativa e os campos lexicais, propomos a oposição básica do nível profundo do texto como sendo: wildness x taming, a qual se desenvolve durante o texto e cuja relação orientada é wild notwild tamed, já que o leão iniciou a narrativa como um ser selvagem, mas acabou sendo domado, ou amansado movido pelo amor que sentia pela moça. Desse modo, apesar de o leão ter feito o que os pais da moça pediram, acabou com uma sanção negativa, portanto, seu sacrifício de arrancar as garras e dentes foi em vão. Dessa forma, pode-se dizer que a relação orientada do texto é disfórica, pois o leão acabou sem seus símbolos de força e poder. 69

Em termos discursivos, há diversos temas que podem ser explorados na leitura dessa fábula. Com a ajuda dos campos lexicais, podemos apresentar alguns deles, assim como as figuras que são utilizadas para representar esses temas. A figura do leão, por exemplo, serve como figurativização para temas como o poder e a força, que também são representados no texto pelas garras e dentes. A figura da moça solteira e bonita remete ao tema da docilidade e sutileza, temas presentes em histórias de amor. Também se observa a submissão dos pais da moça, evidenciada pelo tratamento que eles dão ao leão, chamando-o de majestade, assim como em algumas expressões feel highly honoured e Might I venture to suggest. Além desses, outros temas também podem ser abordados, como o amor, a coragem do pai ao pedir para o leão retirar suas garras e dentes e a coragem do próprio leão de fazê-lo por amor, e assim por diante. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS A partir dos pressupostos teóricos da semiótica greimasiana, apresentamos, nesse trabalho, uma proposta de interpretação de texto em língua inglesa possível de ser utilizada nas aulas da língua. Com isso, a semiótica se mostra como uma boa ferramenta para o trabalho com textos em aulas de línguas, dando possibilidade de trabalhar de forma ativa e criativa em relação ao texto utilizando somente os elementos intratextuais. É importante ressaltar que não estamos afirmando que os elementos extratextuais não devam ser utilizados para a interpretação de textos, pois nosso objetivo nesse trabalho foi a utilização da teoria semiótica como mais uma ferramenta de interpretação textual, não invalidando as outras metodologias de trabalho textual. O interessante é que os professores tenham conhecimento de uma variedade de meios de interpretar os textos para que possam escolher conscientemente com qual deles trabalharão em sala de aula. Por fim, vale ressaltar que as escolhas feitas nesse trabalho foram para efeitos ilustrativos, sendo que a teoria apresentada pode ser aplicada para vários gêneros textuais e segmentos educacionais. Ainda, que a leitura apresentada da fábula escolhida nesse estudo é apenas uma leitura das muitas possíveis, e que diferentes leituras sempre devem ser valorizadas dentro de sala de aula, desde que essas leituras possam ser corroboradas pelo texto. 70

REFERÊNCIAS ANTUNES, I. Aula de Português: encontro e interação. São Paulo: Parábola Editorial, 2003. BARROS, D. L. P. Teoria semiótica do texto. São Paulo: Ática, 1990. DONIN, E. S. et al. Língua Estrangeira Moderna. Espanhol/Inglês. Curitiba: SEED- PR, 2006. FIORIN, J. L. Elementos de Análise do Discurso. São Paulo: Contexto, 2002. (org.) Introdução à linguística: I objetos teóricos. São Paulo: Contexto, 2004 LIMOLI, L.; NETO, E. G. Semiolinguística e leitura do texto literário. Boletim, Londrina, p. 151 166. Jul./Dez. 2001. LIMOLI, L.; SGUASSÁBIA, F. C. M.; DORNELLES, F. C. B. Leitura do texto poético: uma abordagem semiótica. Mosaicos, Dourados, ano 1, n. 1, p. 75-86. Jul./Dez. 2005. MAURAND, G. Lire La Fontaine. Albi: C.A.L.S.,1992. ANEXO The Lion in Love An Aesop's Fable A Lion once fell in love with a beautiful maiden and proposed marriage to her parents. The old people did not know what to say. They did not like to give their daughter to the Lion, yet they did not wish to enrage the King of Beasts. At last the father said: "We feel highly honored by your Majesty's proposal, but you see our daughter is a tender young thing, and we fear that in the vehemence of your affection you might possibly do her some injury. Might I venture to suggest that your Majesty should have your claws removed, and your teeth extracted, then we would gladly consider your proposal again." The Lion was so much in love that he had his claws trimmed and his big teeth taken out. But when he came again to the parents of the young girl they simply laughed in his face, and bade him do his worst. Moral of Aesop s Fable: Love can tame the wildest 71