A SEGREGAÇÃO ESPACIAL COMO RESERVA DE MERCADO: UM ESTUDO SOBRE A PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO PELO CAPITAL IMOBILIÁRIO EM MURIAÉ MG

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Transcrição:

A SEGREGAÇÃO ESPACIAL COMO RESERVA DE MERCADO: UM ESTUDO SOBRE A PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO PELO CAPITAL IMOBILIÁRIO EM MURIAÉ MG Felipe Perdigão Barbosa 1 ; Elias Lopes de Lima 2 RESUMO A urbanização serviu ao longo da história, como uma forma de resolução do problema relacionado ao capital excedente. A produção e a reprodução capitalista do espaço ocorrem de forma contínua e a aliança entre formas e conteúdos se faz visível na cidade. O trabalho em questão busca discutir o processo de segregação espacial através da hipótese de esta se apresentar, por vezes, como um estratégiade reserva de áreas a serem apropriadas no futuro pelo capital imobiliário. Para tanto, utilizou-se como unidade de análise os bairros Padre Tiago e Santa Laura, ambos localizados no município de Muriaé, Minas Gerais. Palavras Chave: produção do espaço, segregação espacial e capital imobiliário. Entre fluxos e fixos, como nos aponta o geógrafo Milton Santos, a cidade apresenta diversas dinâmicas espaciais e sociais. Tais dinâmicas denotam aspectos sobre a produção do espaço urbano, principalmente quando analisadas a partir de um viés crítico e contextualizado concernente à produção capitalista do espaço. A produção do espaço urbano apresenta-se histórica e mundialmente como estratégia de circulação de capital excedente. Harvey (2009, p.10), em seu texto, A liberdade da cidade, aponta o fato de a urbanização ser o caminho para a resolução de problemas relacionados ao capital excedente, ou seja, a urbanização seria uma forma de absorção do excedente em escalas geográficas sempre crescentes. Um exemplo de tal situação fica evidente em Paris no século XIX. Haussmann, através da tutela de Napoleão Bonaparte, como nos aponta Harvey (2009), compreendeu que a urbanização seria uma via importante para a resolução do problema do excedente de capital. 1 Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Juiz de Fora, Minas Gerais. Bolsista CAPES. Email: felipegeomorfologo@gmail.com 2 Professor do departamento de geografia da Universidade Federal de Minas Gerais.

De acordo com o autor supracitado, a reconstrução da capital francesa absorveu grandes quantidades de trabalho e de capital para os padrões da época. Outro ponto que merece destaque na narrativa de Harvey diz respeito ao grau de investimento nas reformas urbanas de Paris, provenientes de acordos com instituições financeiras através do desenvolvimento de instrumentos de crédito. O Brasil se inspirou em tal prática, tendo em vista que o país, principalmente nos séculos XIX e XX, fora palco de grandes intervenções e reformas urbanas, por vezes planejando cidades inteiras, como Belo Horizonte, por exemplo, que foi projetada segundo o modelo urbano reformista parisiense, tendo o barão francês como forte inspiração. Faz-se menção aqui a figura emblemática do Barão Georges-EugéneHaussmann, mais conhecido como Barão de Haussmann, responsável por fortes estruturações no espaço urbano de Paris entre os anos de 1853 e 1870. A busca por modernidade através de reformas urbanas e/ou planejamento de novas cidades denotou aspectos de desigualdades econômicas, principalmente no que se refere à produção do espaço urbano, entendendo que a cidade é dotada de vários agentes que ao mesmo tempo são produtos e produtores do espaço. Diante de tal perspectiva, torna-se evidente que a segregação espacial se apresenta de certa forma como um sintoma, por vezes uma faceta da ocupação desigual do espaço, em contraste com as zonas mais valorizadas da cidade. A escassez de infraestrutura nos espaços segregados gera uma demanda social que é alvo de reivindicações e apelos de toda a sorte, envolvendo um conjunto muito tenso de correlações de forças e interesses. A infraestrutura a partir de então disponibilizada (o que nem sempre é o caso), entendendo que essa infraestrutura adquirida demanda tempo, em muitos casos décadas, é consequência dessa complexa trama de interesses, sobretudo do capital imobiliário. Verifica-se que, por vezes, o Estado, por meio de suas intervenções, dota parcialmente áreas segregadas de infraestrutura e, por vezes, estas são absorvidas pelo mercado imobiliário, sendo incorporados no valor de troca da mercadoria solo urbano. A urbanização serve, de certa forma, como um escoadouro de reinvestimentos, de maneira a fazer circular e ampliar capitais. Diante disso, como problema de pesquisa, surge o questionamento sobre que papel cumpre a produção da segregação espacial na cidade com vistas à reprodução do capital? A partir de tais perspectivas torna-se fundante refletir sobre

qual o papel da segregação espacial em meio as estratégias imobiliárias de realocações de excedentes para fins de reprodução do capital por meio da produção do espaço urbano. Como resposta preliminar a essa questão deriva a hipótese de que a segregação é deliberadamente produzida para fins de privilegiar interesses mercadológicos. Desta forma, o trabalho em questão discute a hipótese de áreas socialmente segregadas no espaço urbano serem utilizadas, de forma estratégica e por vezes até perversa, como reserva para a implantação de empreendimentos imobiliários. Tal hipótese perpassa ainda a relação entre o Estado e os agentes imobiliários na produção ou viabilização deste processo no espaço geográfico, entendendo o espaço através de um movimento dialético, onde este apresenta-se como meio e fim, sendo produto por ora, e produtor em outros momentos, ou seja, palco de contradições inerentes ao capitalismo. Para abordagem empírica do tema proposto, tomou-se como unidade de análise o bairro Padre Tiago e o loteamento residencial Santa Laura, ambos localizados na porção leste do município de Muriaé, que, por sua vez, localiza-se na Zona da Mata mineira. O bairro Padre Thiago foi criado em 2011. Torna-se fundamental informar ao leitor que o bairro Padre Tiago surgiu no ano de 2011, através da junção das extensões dos bairros Marambaia e Vale Verde. Tal fato se deu como homenagem póstuma ao Padre Tiago Prins, fundador da iniciativa Pró-Moradia, que faleceu no ano de 2011. O bairro Marambaia, considerado como área de ocupação popular da cidade, principalmente no que tange à infraestrutura básica, surgiram através de construções espontâneas, em um primeiro momento sem anuência do poder público. É neste contexto que surge a importante figura do Padre Tiago. O padre em questão fora um missionário holandês, vinculado à Igreja Católica que deu início às ações, em 1992, de um projeto popular conhecido como Pró-Moradia. O referido projeto é uma organização sem fins lucrativos criada para dar acesso à moradia a famílias de baixa renda. O projeto construiu, de forma comunitária, mais de 700 residências distribuídas entre os bairros Marambaia e Vale Verde (hoje Padre Tiago) e o bairro São Joaquim. Vale menção ao fato de que, através da iniciativa de seu idealizador, o projeto buscou regularizar e organizar as ocupações dos bairros Marambaia e Vale Verde, denotando um novo arranjo espacial local. A filosofia da ação desenvolvida pelo projeto Pró-Moradia vai além da construção de habitações, perpassando ainda o desenvolvimento e a participação dos moradores na vivência

comunitária. Ressalta-se que a construção se dá através da formação de mutirões, oriundos da participação dos futuros moradores, sendo cada unidade habitacional produzida em média, em um período de seis meses. Além da produção habitacional, o referido projeto busca prestar assistência, orientar e educar as famílias quanto a utilização dos espaços. As obras do Pró-Moradia são voluntárias, como supracitado, e contam com doações que provém tanto da iniciativa privada quanto pública, inclusive de investidores externos provenientes da Holanda e França, sendo a infraestrutura, porém, de responsabilidade da prefeitura municipal. Cabe aqui um parêntese. O fato de o poder público investir em infraestrutura no local contradiz, a princípio, a ideia de segregação, pois o investimento em benfeitorias a partir de iniciativas do Estado pressupõe uma relativa diminuição da segregação. No entanto, tem-se em conta o fato de a segregação produzir uma demanda por infraestrutura urbana, impondo um determinado grau de investimento estatal, que, por sua vez, agrega valor ao solo urbano, no qual uma vez valorizado é reapropriado pelo capital, retroalimentando o ciclo de produção capitalista do espaço. No bairro Santa Laura, a contradição em questão, configura-se como o oposto de sua área confrontante. A área mencionada apresenta-se como um loteamento da iniciativa privada, com alto investimento de capital, inclusive ao que se refere à infraestrutura. Segundo a propaganda local, trata-se de um ótimo local para investir e excelente para morar em Muriaé. O loteamento possui um total de 2.355 terrenos, distribuídos em 64 quadras. Ressaltase que os terrenos são vendidos a partir de financiamento próprio, o que caracteriza indícios de um forte capital de giro da empresa. O bairro supracitado, ao contrário do Bairro Padre Tiiago, sugere formas mercadológicas de produção do urbano que evocam uma negação do direito à cidade (LEFEBVRE, 2001) ou, no limite, sua deterioração, tendo em vista que a negação à cidade condiz com a possibilidade, ou não, de acesso igualitário a propriedade privada, ou seja, a cidade mercadoria. Logo, verifica-se a conversão da cidadania em uma lógica de consumo expressa na moradia como valor de troca prevalecendo sobre o valor de uso. O recorte temporal definido para a pesquisa se dá entre os anos de 1992, que condiz com a data do primeiro mutirão do Pró-Moradia, e 2015, que se caracteriza por ser o ano de consolidação da infraestrutura e desenvolvimento da negociação dos lotes do bairro Santa Laura. O recorte temporal proposto acima se deu pela necessidade de entendimento sobre as

condições concretas que servirão de base para a implantação dos bairros Padre Tiago e Santa Laura. Entende-se pôr objetivo do trabalho, que se refere à utilização da experiência da produção do espaço urbano no município de Muriaé, em espacial os processos de segregação espacial, como base empírica para a compreensão do urbano como lócus privilegiado da reprodução do capitalismo. Outro ponto em destaque se refere à necessidade de pôr em evidência a relação entre Estado e mercado imobiliário, levando em conta suas relações de dependência, principalmente no que se refere à reprodução do sistema capitalista dentro do espaço urbano. Para tanto, a metodologia de trabalho partiu de uma pesquisa exploratória a fim de determinar a delimitação do estudo, bem como o levantamento bibliográfico pertinente à pesquisa e a leitura e análise documental. Após este momento, partiu-se para construção de um referencial teórico e bibliográfico que se fundamentou a partir de livros científicos, legislações, periódicos, artigos, dissertações e teses. No primeiro capítulo procura-se evidenciar o objeto de estudo, bem como dar ênfase à delimitação do tema. Para tanto, apresenta-se a cidade de Muriaé através de seus pressupostos físicos e socioeconômicos. Ainda em referência ao primeiro capítulo, tornou-se necessário a abordagem cuidadosa do projeto Pró-Moradia, onde abordam-se questões pertinentes às formas de produção espacial, principalmente no que se refere à produção habitacional, através de ações de programas sociais. Por fim, busca-se a compreensão da cidade mercadoria através do bairro Santa Laura, que apresenta-se como a produção do urbano por meio do mercado imobiliário e capital imobilizado, denotando com isso as contradições entre os valores de uso e troca. Já no segundo capítulo, discute-se a produção do espaço através de uma perspectiva crítica, dando ênfase a uma discussão que gira em torno de uma produção espacial sob a égide do capital. No desenvolvimento do capítulo trabalha-se ainda com o conceito de segregação espacial, conceito este, assim como o de produção do espaço, norteador do trabalho. Ainda no segundo capítulo propõe-se a discussão sobre os aspectos relacionados às legislações urbanas, principalmente a política nacional de habitação e o estatuto da cidade. O terceiro e último capítulo da dissertação, tratará de apresentar uma discussão que fundamente o fato de a segregação espacial, por vezes, comportar uma estratégia para a reprodução do capital implicada na produção do espaço urbano. Para tanto, será fundante discutir sobre a perversidade das práticas segregacionistas, bem como o olhar dos de dentro,

ou seja, o olhar dos sujeitos assolados pela segregação. Tornar-se-á ainda de fundamental importância apreender a complexa tessitura do planejamento urbano do Brasil e de como este se transforma, na verdade, em uma ferramenta de exclusão. METODOLOGIA A metodologia do trabalho, a primeira momento, se estruturou a partir de uma pesquisa exploratória a fim de determinar a delimitação do estudo, bem como o desenvolvimento bibliográfico pertinente à pesquisa e leitura e análise documental. Após este primeiro momento, tornou-se de suma importância a realização de uma pesquisa bibliográfica que se pautou na análise de livros científicos, legislações, periódicos, artigos científicos, dicionários e legislações. Ainda como procedimento metodológico fora organizado uma pesquisa documental, fundamentada pela busca de informações em revistas, jornais, filmes, cartas e fotografias. CONSIDERAÇÕES FINAIS Ressalta-se que o trabalho em questão apresenta-se como uma discussão ainda em desenvolvimento, haja visto que trata-se de parte da dissertação de mestrado do autor. No entanto, verifica-se que os caminhos escolhidos partem muito da compreensão da relação entre Estado e agentes imobiliários a produção e reprodução do espaço urbano capitalista. Por fim, se observa a importância da cidade no que se refere a reprodução e absorção de capital. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CORRÊA, Roberto Lobato. O espaço urbano. São Paulo: Ática S.A, 1989 FERRO, Sérgio. Arquitetura e trabalho livre. São Pauro: Cosacnaify, 2006. HARVEY, David. A Liberdade da Cidade. Geousp Espaço e Tempo, São Paulo, SP, Nº 26, 09-17, 2009.. A produção capitalista do espaço. São Paulo: Annablume, 2005.. Spaces of Capital. Towards a critical geography. Edinburgh: Edinburg University Press, 2001.. Social Justice and the City (Geographies of justice and Social Transformation). Georgia: UniversityofGeorgia Press, 2009.

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