A COFINS UMA BREVE HISTÓRIA

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IV - APELACAO CIVEL

Transcrição:

A COFINS UMA BREVE HISTÓRIA A tributação das receitas das pessoas jurídicas teve início com a lei de origem do Finsocial, o Decreto-lei 1.940, de maio de 1982, sob os seguintes dispositivos: Art. 1º É instituída contribuição social de 0,5%, que incidirá sobre a receita bruta das empresas que realizam venda de mercadorias, bem como das instituições financeiras e das sociedades seguradoras.... 2º Para as empresas que realizam exclusivamente venda de serviços, a contribuição será de 5% e incidirá sobre o valor do imposto de renda devido, ou como se devido fosse. 1 Observe-se que o Finsocial nasceu com duas bases de cálculo: receita bruta e lucro, o que demonstra que ele foi predecessor não somente da Cofins mas também da CSLL. 1 Cobrar a contribuição sobre o imposto de renda devido ou como se devido fosse é conceitualmente equivalente a cobrá- la sobre o lucro, no caso, o lucro tributável pelo IRPJ, o chamado lucro real.

Existia naquela época, no âmbito da Receita Federal, a falsa percepção de que empresas de serviços não deveriam ser tributadas sobre a receita. Decidiu-se então tributá-las sobre o lucro, e por tal motivo elas foram segregadas no segundo parágrafo do artigo. A lei do Finsocial, em consequência, discriminou atividades empresariais em vez de espécies de receitas (o que teria sido feito não existisse aquela infundada percepção). Essa justificativa, evidentemente, não exclui o erro taxonômico cometido na enumeração das atividades. Pouco depois de editado o DL 1.940, as empresas que vendiam mercadorias e serviços, como as concessionárias de veículos, por exemplo, passaram a demandar o Judiciário, quase sempre com sucesso, alegando não se enquadrar nem como empresas que realizam venda de mercadorias nem como aquelas que realizam exclusivamente venda de serviços. Ou seja, alegavam não estar sujeitas ao Finsocial, nem sobre receita nem sobre lucro. Essa questão foi superada somente 5 anos depois, em dezembro de 1987, com o art. 27 do Decreto-lei 2.397, que deu nova redação ao caput do art. 1º do Decreto-lei 1.940, que passou a ostentar a seguinte nova redação: Art. 1º É instituída contribuição social de 0,5% que incidirá sobre a receita bruta das pessoas jurídicas que realizam vendas de mercadorias e de mercadorias e serviços, de qualquer natureza, bem como das rendas e receitas operacionais e patrimoniais das instituições financeiras e das sociedades seguradoras. Tendo em vista futuras referências a esse dispositivo, é oportuno assinalar que a expressão posta em destaque, vendas de mercadorias e de mercadorias e serviços, apesar da desagradável redundância, foi o necessário contraponto à expressão do parágrafo segundo, empresas que realizam exclusivamente venda de serviços. Com o novo texto, então, todas as empresas (pessoas jurídicas, na nova redação) ficaram legalmente sujeitas ao pagamento da Contribuição para o FINSOCIAL, discriminadas como a seguir, segundo a atividade e a base de incidência da Contribuição: a) sobre a receita bruta: - pessoas jurídicas que realizam vendas de mercadorias - pessoas jurídicas que realizam vendas de mercadorias e serviços - instituições financeiras - companhias seguradoras b) sobre o lucro: - pessoas jurídicas que realizam exclusivamente vendas de serviços. Logo a seguir, em outubro de 1988, foi promulgada a Constituição Federal, cujo artigo 195 dispôs que faturamento e lucro seriam bases de cálculo de distintas contribuições sociais. Já em dezembro daquele mesmo ano, apenas dois meses depois da Constituição, foi editada a Lei 7.689, que instituiu a contribuição social sobre o lucro líquido, a CSLL. O art. 9º da Lei da CSLL estabeleceu a permanência [ ficam mantidas... ] das contribuições sociais sobre a folha de salários e sobre o faturamento, com fundamento no art. 195, inciso I, da Constituição : Art. 9º Ficam mantidas as contribuições previstas na legislação em vigor, incidentes sobre a folha de salários e a de que trata o Decreto-lei nº 1.940, de 25 de maio de 1982, e alterações posteriores, incidente sobre o faturamento das empresas, com fundamento no art. 195, I, da Constituição Federal.

Pela primeira vez, a contribuição ao Finsocial, do Decreto-lei 1.940 (quanto à incidência sobre receita bruta), foi legalmente equiparada àquela da Constituição, incidente sobre o faturamento. Junto com a Lei 7.689, porém, veio também um segundo lapso do legislador tributário: ao se manter inalterado o Finsocial, as empresas que realizavam exclusivamente venda de serviços ficaram sujeitas a duas contribuições sobre o lucro (Finsocial e CSLL) e a nenhuma contribuição sobre o faturamento. O art. 28 da Lei 7.738 corrigiu esse erro em março de 1989, ainda antes de se iniciar a cobrança da contribuição sobre o lucro: Art. 28. Observado o disposto no art. 195, 6º, da Constituição [prazo de 90 dias], as empresas que realizam exclusivamente venda de serviços calcularão a contribuição para o Finsocial à alíquota de 0,5% sobre a receita bruta. Com isso, o Finsocial das empresas de serviços deixou ser cobrado sobre o lucro, passando a incidir sobre a receita bruta. Desfez-se, então (por falta de alternativa, é verdade), a falsa percepção de não se poder tributar a receita das empresas de serviços. Com isso, pela primeira vez, as cinco atividades empresariais ficaram sujeitas à contribuição sobre receita bruta, base de cálculo legalmente equiparada a faturamento. Mas a segunda parte do art. 9º da Lei 7.689, no que manteve o Finsocial, assim como o art. 28 da Lei 7.738, sofreram pesada carga de demandas judiciais. Desde o final de 1990 as decisões dos tribunais superiores prenunciavam um futuro sombrio para o Finsocial e evidenciavam, ao mesmo tempo, que o Poder Judiciário ainda não chegara a um entendimento uniforme sobre as contribuições sociais do art. 195 da nova Carta. No julgamento do RE 150.764, por 6 votos a 5, o Tribunal Maior decidiu, por dois motivos, que o art. 9º da Lei 7.689 não poderia, sob a Nova Carta, convalidar a contribuição para o Finsocial. Em primeiro lugar, por que este [o Finsocial], decidira o Tribunal em julgados anteriores, era um imposto inominado da competência residual da União, outorgada pela antiga Constituição (na qual não existiam contribuições sociais ). Em segundo, por que o art. 56 do ADCT previra a edição de lei específica para instituir a contribuição sobre o faturamento, e este não era o caso da Lei 7.689. Sobre o primeiro ponto, é oportuno assinalar, o Finsocial consta no art. 56 como a contribuição instituída pelo Decreto-lei 1.940. Malgrado essa explícita menção do Constituinte, o STF, naquele julgamento, manteve o Finsocial como um imposto inominado. Mas esse lapso foi rapidamente corrigido. Em julgado posterior, o Tribunal mudou seu entendimento e veio a reconhecer que o Finsocial fora um imposto inominado apenas na antiga Constituição, mas passara a ser uma contribuição social a partir da Carta de 1988. Naquele julgamento, o Tribunal decidiu também que as duas objeções relativas ao Finsocial, não se aplicariam à contribuição sobre a folha de salários.

A Decisão, tomada em dezembro de 1992, alcançou o período que se seguiu à Carta de 1988 até a edição da Lei Complementar 70, em dezembro de 1991, durante o qual o Finsocial permaneceu vigente, mas judicialmente congelado. Essa interpretação, fruto da Decisão, tornou inconstitucionais (para as empresas comerciais, as instituições financeiras e as companhias seguradoras) as sucessivas leis que aumentaram a alíquota da Contribuição naquele período. 2 Quase ao mesmo tempo, porém, no julgamento do RE 150.755, encerrado em novembro de 1992, o Tribunal decidiu pela constitucionalidade do art. 28 da Lei 7.738, no qual havia equivalente remissão à Contribuição ao Finsocial, no caso, em relação às empresas que realizam exclusivamente vendas de serviços. Em consequência, para essas, foram válidos os sucessivos aumentos da alíquota do Finsocial; quanto às empresas de serviços que também vendiam mercadorias, assim como às demais (entre as quais, as instituições financeiras), a alíquota ficou congelada em 0,5%. Um peso, duas medidas. Em meio a esse contexto foi instituída a Cofins pela Lei Complementar 70, em dezembro de 1991. A desnecessária opção por Lei Complementar, por si só, é denotativa da insegurança jurídica em que operava o legislador àquela época. Agora, decorridos mais de 25 anos, um olhar retrospectivo nos mostra que a LC 70 marcou a contribuição social sobre o faturamento com dois importantes referenciais, igualmente significativos, mas antagônicos quanto à legalidade e aos efeitos. Em primeiro lugar, ela foi extremamente oportuna em relação às empresas industriais e comerciais de bens e serviços, tendo em vista as decisões judiciais já comentadas a respeito do Finsocial. Em segundo lugar, injunções externas à equipe tributária deram origem ao art. 11, que excluiu da Cofins as instituições financeiras e as companhias seguradoras, em troca de um adicional de 8 pontos percentuais na CSLL. Tendo-se presente que naquela época era inconstitucional discriminar as alíquotas das contribuições sociais (o que somente veio a ser permitido com a Emenda 20, oito anos depois), não é difícil perceber o efeito desse artigo em relação ao setor financeiro. Quanto às empresas comerciais e industriais, deve ser destacado o disposto no art. 2º da LC 70, no qual o legislador, corretamente, eliminou a menção a atividades das pessoas jurídicas, limitando-se a enumerar espécies de receitas. Mas deve-se destacar também sua inequívoca demonstração de insegurança, ao transcrever, de modo redundante, cada uma das espécies nominalmente citadas na legislação do Finsocial: receitas da venda de mercadorias, de mercadorias e serviços e de serviços de qualquer natureza. Nascia aí um dispositivo contendo uma dupla redundância absolutamente desnecessária. Sem perda de acepção ou abrangência, bastaria ter dito receita da venda de mercadorias e serviços. Foi mais um lapso, o terceiro nessa matéria. Logo após a edição da LC 70, é importante assinalar o surgimento de um surpreendente volume de ações judiciais, amparadas em uma restritiva interpretação do alcance do conceito de faturamento introduzido com a citada LC. 2 Art. 7º da Lei 7.787, de 1989, de 0,5% para 1,0%, a partir de setembro de 1989; art. 1º da Lei 7.894, de 1989, de 1,0% para 1,2%, a partir de janeiro de 1990; e art. 1º da Lei 8.147, de 1990, de 1,2% para 2,0%, a partir de abril de 1991.

Empresas de construção civil, holdings, empresas com receitas derivadas de royalties, de aluguel de automóveis e imóveis, e inúmeras outras, obtinham liminares que as isentavam do pagamento da Cofins, sempre sob a alegação de que não vendiam mercadorias nem prestavam serviços. O princípio da solidariedade contributiva, introduzido pelo caput do art. 195 da Constituição, invocado em muitos julgamentos dos Tribunais Superiores no País, tornarase letra morta para o Poder Judiciário ao início dos anos 90. Foi então que o legislador tributário tomou a iniciativa de propor uma Emenda à Constituição, que tratou exclusivamente de assuntos tributários (veio a ser a Emenda 3, de 1993), na qual instituiu-se a ADC (Ação Declaratória de Constitucionalidade), uma espécie de contraponto à ADI (Ação Declaratória de Inconstitucionalidade). Não por acaso, evidentemente, a ADC nº 1 tratou da LC 70, pondo um final às ações judiciais contra a Cofins. O art. 11 da LC, pelas razões já citadas, não pode ser alcançado pela ADC-1. Em novembro de 1998, dez anos depois da Constituição e sete anos após a LC 70, o legislador tributário finalmente universalizou a cobrança da Cofins com a edição da Lei 9.718, que não somente ampliou como também tornou claro o conceito legal-tributário de faturamento, substituindo a imprecisa e redundante definição da LC 70. O principal ponto a destacar na Lei 9.718 é que a base de cálculo da Cofins, assim como a equivalente base do PIS, foi criteriosamente especificada, com a exclusão das receitas não operacionais, a dedução dos custos e despesas da intermediação financeira e a exclusão das receitas vinculadas ou derivadas das reservas das companhias seguradoras. Com a Lei 9.718, é verdade também, houve um quarto lapso do legislador tributário: as instituições financeiras e as companhias seguradoras ficaram cumulativamente sujeitas à Cofins (Lei 9.718) e ao adicional da CSLL (LC 70), uma vez que este foi validado com a introdução do 9º ao art. 195 da CF, combinado com o disposto no art. 12 da Emenda 20. Mas, ainda antes de a Lei 9.718 produzir efeitos, o art. 7º da Medida Provisória 1.807, em janeiro de 1999, eliminou o adicional introduzido pelo art. 11 da LC 70. Em dezembro de 2003, já sob a vigência da Emenda 20, a Lei 10.833 instituiu a COFINS não-cumulativa, incidente sobre a receita bruta das pessoas jurídicas. O art. 10 da citada Lei, expressamente, excluiu da nova contribuição [Cofins não-cumulativa] as instituições financeiras e as companhias seguradoras que, dessa forma, permaneceram sujeitas à Cofins segundo as normas anteriormente vigentes, ou seja, as normas da Lei 9.718. A inconstitucionalidade do conceito de faturamento da Lei 9.718 foi decidida pelo STF em novembro de 2005, no julgamento, entre outros, do RE nº 346.084. Em março de 2009, finalmente, o art. 71 da Lei 11.941 veio revogar o já então proscrito conceito de faturamento da 9.718. Esse, em linhas gerais, o breve histórico dos conceitos tributários das bases de cálculo receita bruta e faturamento, desde o primeiro, associado ao Finsocial, depois o contido na Lei Complementar 70 e, finalmente, o conceito da Lei 9.718, este rechaçado pelo Tribunal Maior.