A VERDADEIRA AMAZÔNIA

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Transcrição:

A VERDADEIRA AMAZÔNIA SAMUEL HANAN e IVES GANDRA MARTINS* A realização da Conferência Ministerial de Defesa das Américas, em Manaus, embalada pelo debate do Plano Colômbia, trouxe à baila, por alguns dias e de maneira parcial, a temática amazônica. É bem possível que, em algumas semanas a questão de sua floresta estará novamente dormitando em berço esplêndido, ao menos no Brasil. É monótona a repetição do mesmo filme sobre a Amazônia há tantos anos. Toda vez, que os amazônidas rompem o silêncio nacional e reclamam um programa de desenvolvimento, inclusive para proteção das desguarnecidas fronteiras, imediatamente a mídia e o Poder Central minimizam ou desqualificam tais preocupações, afirmando que, por detrás dessas reivindicações, está o velho interesse nos benefícios fiscais. Toda vez, que as Forças Armadas e Polícia Federal ousam demonstrar preocupação quanto à questão da integridade do território nacional, aeroportos, portos e imensas faixas de

fronteiras desprotegidas, aos riscos de soberania, ou, mais recentemente, sobre os perigos da Operação Colômbia, de igual forma, a mídia nacional e o Poder Central reduzem ou eliminam a relevância do debate, a pretexto de que ele mal esconderia solicitação por maior dotação orçamentária, retorno do Projeto Calha Norte, aumento de contingentes. Toda vez, que o Poder Central e a mídia falam, é para dizer que a Amazônia está em chamas, sendo dizimada de forma irracional e irresponsável. É, todavia, ao Poder Central e à mídia nacional que nos voltamos, para chamar a atenção para essa imensa extensão do território nacional. Quem tem o poder de influenciar a opinião pública e o poder de governar, terá condições de transformar a causa da floresta em causa nacional, necessidade que se revela urgente. Não se trata de recorrer à argumentação tradicional, mas de trazer alguns questionamentos à reflexão dos brasileiros: organismos internacionais, uma região que tem segundo alguns especialistas, 14%, segundo outros, 20% da água potável do mundo? organismos internacionais, uma região de possui mais de 200 espécies diferentes de árvores por hectare, cerca

de 30% da biodiversidade da Terra e é reconhecida como a maior fonte natural para produtos bioquímicos e farmacêuticos (maior banco genético do planeta)? organismos internacionais, uma região que tem em seu subsolo um potencial mineral de grande porte, estimado em dezenas de bilhões de dólares, sendo que algumas das riquezas já detectadas são escassas no resto do planeta? organismos internacionais, uma região que tem mais de um terço das florestas tropicais do mundo? organismos internacionais, uma região que tem uma extensão territorial equivalente a 45% do território brasileiro e à área de dezenas de países europeus reunidos (onde moram quase meio bilhão de pessoas), habitada por menos de 10 milhões de pessoas e que produz menos de 5% do PIB brasileiro (enorme vazio econômico e demográfico)? organismos internacionais, uma região imensa e que faz fronteiras com sete países, sendo que três sabidamente contaminados por narcotráfico e/ou narcoguerrilha?

É evidente que a soma desses questionamentos à omissão, ao descaso e ao silêncio do governo brasileiro e da sociedade em relação à Amazônia, poderão encorajar o já existente processo potencial de interesse internacional sobre a região, transformando-o em problema real. O governo federal, em parceria com os governos dos Estados e a imprensa nacional devem assumir o comando e, cada um em sua esfera específica, iniciar um debate nacional sobre a Amazônia, com toda a sociedade, e não apenas em reuniões acadêmicas ou reservadas. Deve-se propor um programa de desenvolvimento para a Amazônia, economicamente viável, socialmente justo e ambientalmente saudável para o bem da nação. É indispensável e inadiável o respeito à Constituição, sobretudo no que tange aos Artigos 3º, 43, 151, 165 do texto permanente, como também ao Artigo 40, do ADCT. Os brasileiros não devem se iludir. Enquanto o problema não é discutido aqui, a comunidade internacional debate a Amazônia em eventos, mais ou menos amplos, todos os dias. A floresta é um patrimônio nacional, definido no artigo 225 da Constituição. A floresta deve ser preservada não por imposição estrangeira, e sim como produto de uma consciência nacional, mantida a soberania brasileira, devendo-se entender a preservação como um benefício para toda a humanidade.

O que se deve pleitear da comunidade internacional, especialmente dos países mais desenvolvidos, é o seu efetivo engajamento num programa brasileiro de preservação, concomitante a uma política de redução da miséria e do abandono das minorias excluídas do processo econômico atual (população indígena, população ribeirinha, caboclos, órfãos da borracha e outros), envolvendo ações concretas de investimentos privados em atividades não agressoras do meio ambiente, (turismo ecológico, indústria do pescado, etc...), estimulando-se a realização de parte das convenções das grandes empresas globalizadas, na Amazônia assim como a adoção de tarifas preferenciais aplicáveis às importações de produtos dessa região. O Estado do Amazonas, não está em chamas, como dizem. Ao contrário, mantém 98,2% de suas florestas intactas. Este fantástico percentual é fruto do modelo econômico e da renúncia econômica dos amazonenses. A Amazônia está à espera desse programa nacional. * SAMUEL HANAN, engenheiro, é vice-governador do Amazonas IVES GANDRA MARTINS, jurista, é Professor Emérito da Escola de Comando e Estado Maior do Exército e da Universidade Mackenzie.