17º Imagem da Semana: Fotografia Enunciado Paciente de 61 anos, sexo masculino, natural e residente em Belo Horizonte, aposentado, apresentou, há cerca de 20 dias, lesões em membro superior esquerdo, com sensação de prurido e dor a pequenos traumas. Seu estado geral estava preservado e não observou presença de febre. Procurou atendimento médico e recebeu 1 dose de penicilina benzatina há uma semana sem modificação do quadro. Com base nos dados clínicos e na imagem, qual a hipótese diagnóstica mais provável? a) Erisipela b) Erisipeloide c) Síndrome de Sweet d) Reação hansênica tipo 1 Legenda Imagem 1: Acervo do serviço de Dermatologia do HC-UFMG.
Análise da Imagem Presença de placas eritematosas infiltradas distribuídas na mão, antebraço e cotovelo esquerdos acompanhadas de edema na mão e cotovelo. Diagnóstico As lesões da reação hansênica tipo 1 se caracterizam por exacerbação das lesões hansênicas pré-existentes, que se tornam edemaciadas, eritematosas e brilhantes, podendo chegar a ulceração. Neurites e sua sintomatologia são frequentes. Os quadros reacionais, às vezes, antecedem o diagnóstico da hanseníase, surgem durante o tratamento ou após a alta. Erisipela: A instalação e evolução são agudas, com sintomas e sinais gerais de infecção. Há febre, mal-estar e adenite satélite à região comprometida. Geralmente ocorre em membros inferiores e os agentes mais frequentes são os estreptococos beta-hemolíticos do grupo A. A droga de escolha no tratamento é a penicilina. Erisipeloide: É um quadro causado por um bacilo Gram-positivo, o Erysipelothrix rhusiopathiae, responsável por erisipela em porcos e outros animais domésticos, sendo a contaminação do homem acidental. É mais comum em pescadores, açougueiros e donas de casa. As lesões ocorrem mais frequentemente nos dedos da mão e pode haver febre baixa, mal estar geral, linfangite e linfadenopatia regional. O diagnóstico diferencial é feito principalmente com a erisipela e o tratamento é feito com a penicilina. Síndrome de Sweet: É uma dermatose neutrofílica que se caracteriza como uma síndrome de hipersensibilidade a vários tipos de antígenos virais, bacterianos e tumorais, por exemplo. É mais frequente em mulheres e pode ocorrer em qualquer idade. Na maioria dos casos, ocorre após processos infecciosos, especialmente de vias aéreas superiores. O curso é persistentemente febril e, geralmente, não há alterações sistêmicas. Existe associação com certas neoplasias malignas, como leucemia mieloide aguda. Discussão do Caso A hanseníase é uma infecção crônica, granulomatosa, curável, que tem como agente etiológico o Mycobacterium leprae ou bacilo de Hansen, um microorganismo de elevada infectividade, porém baixa patogenicidade, isto é, poucos indivíduos infectados adoecem. O Brasil continua sendo o segundo país em número de casos no mundo (perdendo apenas para a Índia).
As pessoas portadoras de formas multibacilares virgens de tratamento são a principal fonte de infecção. As vias aéreas superiores provavelmente constituem a principal via de inoculação e eliminação do bacilo. O período de incubação é longo, em média 5 anos, podendo ser de meses a mais de 10 anos. Depois da sua entrada no organismo, não ocorrendo a sua destruição, o M. leprae irá se localizar na célula de Schwann e na pele. Sua disseminação para outros tecidos (linfonodos, olhos, testículos, fígado) pode ocorrer nas formas graves da doença, nas quais o agente infectante não encontra resistência contra a sua multiplicação. O Ministério da Saúde (MS) define como caso de hanseníase para tratamento, quando um ou mais dos seguintes achados encontram-se presentes: (1) lesão de pele com alteração de sensibilidade, (2) espessamento de tronco nervoso ou (3) baciloscopia positiva na pele. O exame dos nervos periféricos é fundamental, procurando-se déficits motores, sensitivos e espessamento dos nervos pela palpação. A baciloscopia é o exame complementar mais útil no diagnóstico; é de fácil execução e baixo custo, porém só é positivo em cerca de 30% dos casos (percentual de multibacilares no Brasil). A biópsia da pele pode ser útil para o diagnóstico diferencial ou na classificação. São reconhecidas as formas paucibacilares (indeterminada e tuberculoide) e as multibacilares (virchowiana e dimorfa). As reações são episódios inflamatórios que se intercalam no curso crônico da hanseníase. Devem ser prontamente diagnosticadas e tratadas. Os tipos de reações mais importantes são a reação reversa ou reação do tipo 1 e a reação do tipo 2 ou eritema nodoso da hanseníase (ENH). As reações seguem-se a fatores desencadeantes, tais como: infecções intercorrentes, vacinação, gravidez e puerpério, medicamentos iodados, estresse físico e emocional. Os quadros reacionais podem anteceder o diagnóstico da hanseníase, surgir durante o tratamento ou após a alta. Os sintomas sistêmicos variam. Na reação do tipo 1, as lesões antigas se exacerbam e surgem lesões novas à distância. As neurites são freqüentes, podendo ser a única manifestação clínica. Podem ser silenciosas, ou seja, o dano funcional do nervo se instala sem quadro clínico de dor e espessamento do nervo.
A reação tipo 1 é mais encontrada na forma dimorfa e está relacionada a mudanças na imunidade celular. A reação do tipo 2 ou ENH é uma síndrome de imunocomplexos e ocorre nas formas virchowianas e dimorfas. Na pele, se caracteriza por lesões eritematosas, dolorosas, de tamanhos variados incluindo pápulas e nódulos localizados em qualquer região da pele. Edema de membros inferiores, pré-tibialgia e febre acompanham esta reação. O diagnóstico precoce da doença e o reconhecimento imediato dos quadros reacionais garantem a interrupção da cadeia de transmissão e a prevenção das incapacidades físicas. O tratamento é considerado eficaz. As drogas usadas nos esquemas padronizados pela OMS e MS são a rifampicina, dapsona e clofazimina. A definição do esquema e duração do tratamento depende da classificação final do caso. A reação do tipo 1 ou reversa pode ser tratada com analgésicos, anti-inflamatórios não hormonais (AINES) ou prednisona. As drogas usadas no tratamento da reação do tipo 2 são analgésicos e AINES, talidomida, clofazimina, pentoxifilina e prednisona. A prevenção consiste no diagnóstico precoce de casos e no uso da vacina BCG. Para tal, recomenda-se o exame dermatoneurológico de todos os contatos intradomiciliares (conviventes do domicílio nos últimos 5 anos) do caso diagnosticado. Aspectos relevantes» É causada pelo Mycobacterium leprae;» A doença manifesta-se em dois pólos estáveis e opostos (virchowiano e tuberculoide) e dois grupos instáveis (indeterminado e dimorfo);» O Ministério da Saúde (MS) define como caso de hanseníase presença de lesão de pele com alteração de sensibilidade; ou espessamento de tronco nervoso; ou baciloscopia positiva na pele;» O diagnóstico é clínico na maioria das vezes;» As reações hansênicas podem anteceder o diagnóstico da hanseníase, surgir durante ou depois do tratamento;» Os quadros reacionais devem ser prontamente reconhecidos e tratados, para evitar dano neural e prevenir incapacidades;
» O tratamento da hanseníase baseia-se na poliquimioterapia com rifampicina, dapsona e clofazimina. Referências SAMPAIO, S. A. P.; RIVITTI, Evandro A. Dermatologia. 3.ed., rev. ampl. São Paulo: Artes Medicas, 2007; ARAUJO, Marcelo Grossi. Hanseníase no Brasil. Rev. Soc. Bras. Med. Trop. 2003; Ministério da Saúde Portaria nº 3.125, de 7 de outubro de 2010; Organização Mundial da Saúde (OMS) - Global leprosy situation, 27 de agosto de 2010. Responsável Bruno Freitas Lage, acadêmico do 10º período de Medicina da UFMG. Email: brunoitabira[arroba]ufmg.br Orientador Marcelo Grossi Araújo, professor adjunto do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da UFMG. Email: mgrossi[arroba]medicina.ufmg.br Revisores Glauber Eliazar e Fabiana Resende