Caracterização elétrica e dielétrica do sistema policristalino Bi 12 TiO 20 Denise de Jesus Santos, Luciara B. Barbosa, Zélia Soares Macedo

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Transcrição:

SCIENTIA PLENA VOL., NUM. 29 www.scientiaplena.org.br Caracterização elétrica e dielétrica do sistema policristalino Bi 12 TiO 2 Denise de Jesus Santos, Luciara B. Barbosa, Zélia Soares Macedo Grupo de Materiais Cerâmicos Avançados, Departamento de Física, Universidade Federal de Sergipe, 49.1-1, São Cristóvão SE, Brasil zelia.macedo@gmail.com (Recebido em 1 de abril de 29; aceito em 2 de maio de 29) A produção, caracterização elétrica e dielétrica de corpos cerâmicos de titanato de bismuto (Bi 12 TiO 2 - BTO) são relatados neste trabalho. Este material tem potencial para diversas aplicações que estão intimamente relacionadas com suas propriedades foto e radio-condutoras. Os dados experimentais obtidos por medidas elétricas em modo AC foram deconvoluídos para se obter separadamente as contribuições de grão e contorno de grão. Para amostras sinterizadas a baixa temperatura, observou-se o mesmo mecanismo de condução já relatado para o monocristal, com energia de ativação em torno de 1 ev. As amostras mais densas, no entanto, apresentaram um valor superior a 1eV, que pode estar relacionado ao surgimento de um novo mecanismo de condução no material. A permissividade relativa apresentou um comportamento dispersivo na região de baixas freqüências. No entanto, o valor de permissividade relativa ε=2 medido em 1 khz está em ótima concordância com o valor relatado para o monocristal. Palavras-chave: Titanato de Bismuto, microestrutura, espectroscopia de impedância The production, electrical and dielectric characterization of bismuth titanate (Bi 12 TiO 2 -BTO) ceramic bodies are reported in this work. BTO has potential to technological applications that are closely related to its photo and radio-conductive properties. The experimental data obtained from AC electrical measurements were doconvoluted to obtain the separate contributions from grain and grain boundaries. For the samples sintered at low temperatures, it was observed the same charge transport mechanism related before for single crystalline samples, with activation energy at around 1 ev. Nevertheless, samples with higher density presented activation energies higher than 1eV, which can be related to a new conduction mechanism in this material. The relative permittivity presented a dispersive behaviour at low frequencies and the value ε=2 measured at 1 khz is in good agreement with the value reported for single crystal. Keywords: Bismuth titanate, microstructure, impedance spectroscopy 1. INTRODUÇÃO O Titanato de Bismuto (Bi 12 TiO 2 -BTO) é um material cristalino com estrutura cúbica de corpo centrado, pertencente à família das selenitas [1]. As selenitas são uma família de cristais cúbicos do grupo espacial I23 [2]. Este composto apresenta uma estrutura cristalina formada por poliedros Bi-O, nos quais os íons de Bi estão ligados a cinco íons de oxigênio formando um arranjo octaédrico junto com um par de elétrons do Bi 3+. A rede poliédrica por sua vez está conectada a tetraedros TiO 4 [3]. Os defeitos intrínsecos mais prováveis na estrutura cristalina do Bi 12 TiO 2 se devem a uma ocupação do sítio de Ti 4+ por um íon Bi 3+ associado a um buraco h +. Este defeito é considerado como o principal responsável por uma condução do tipo p no material. [4] Diferente do composto Bi 4 Ti 3 O 12 (Titanato de Bismuto- BIT), que é um material ferroelétrico, adequado para aplicação em elementos de memória[], o interesse particular nos compostos na estequiometria Bi 12 TiO 2 vem da combinação de suas propriedades eletro-ópticas e fotocondutoras, que dão a este material grande potencial de aplicação em elementos foto-sensores. [], [7]. Sendo os íons Bi 3+ ótimos atenuadores de fótons de alta energia, o Bi 12 TiO 2 torna-se ainda um potencial candidato para aplicação em dispositivos radiocondutores para detecção de radiação. A caracterização elétrica e dielétrica deste material é, portanto, de grande interesse, uma vez que suas propriedades estão diretamente ligadas à sua aplicação. A técnica de caracterização física utilizada neste trabalho foi a espectroscopia de impedância. Nesta técnica, aplica-se um potencial externo alternado V*(t)=V e iωt ao material, enquanto sua 481-1

Denise J. Santos, Luciara B. Barbosa, Zélia S. Macedo., Scientia Plena, 481, 29 2 resposta I*(t)=I e i(ωt + φ) (onde φ é um ângulo de fase) é monitorada. A impedância Z*=V*/I* é então determinada em função da freqüência ω da medida. A espectroscopia de impedância de cerâmicas permite a separação das contribuições de grão e contorno de grão, as quais ocorrem em valores de frequência característicos. No presente trabalho, a técnica foi usada para a caracterização elétrica e dielétrica do sistema policristalino Bi 12 TiO 2. O ajuste dos dados experimentais é feito por um modelo que usa circuitos equivalentes para representar a amostra, com blocos RC paralelos, ligados em série entre si, correspondendo às contribuições de grão e contorno de grão separadamente [8]. A impedância elétrica de cada micro-região é descrita pela equação (1), * R R Z RC ( ω ) = = (1) 1+ i RC 1+ i [ ω ] [ ϖτ] Os dados experimentais Z*=Z +iz são representados no plano complexo por meio do diagrama de Nyquist, no qual Z representa a parte real e tem direção x, Z representa a parte imaginária e tem direção y e o número complexo i=(-1) 1/2 =e (iπ/2) indica uma rotação de π/2 no plano xy, no sentido anti-horário. O ajuste dos dados experimentais ao modelo apresentado na equação (1) fornece os valores de R e C das regiões intra e inter-grãos, permitindo que a condutividade e a permissividade dielétrica destas micro-regiões sejam conhecidas. 2. PROCEDIMENTO EXPERIMENTAL A fase única do pó Bi 12 TiO 2 foi obtida através do método de síntese de estado sólido. Neste processo, os precursores óxido de bismuto-bi 2 O 3 (Alfa Aesar, 99.99%) e óxido de titânio-tio 2 (Merck, 99,9%) - na proporção estequiométrica :1 foram homogeneizados em almofariz de ágata durante 2min e calcinados a 7 C por h em cadinho de platina, em forno elétrico com atmosfera aberta e taxa de aquecimento de 1 /min. Após a calcinação, o pó foi moído em almofariz de ágata e misturado a uma pequena quantidade do ligante orgânico PVA (polyvinil alcool), em concentração de,1g/ml. Este material foi prensado na forma de corpos cerâmicos com 2mm de espessura e mm de diâmetro (prensagem uniaxial com pressão nominal de 1Kgf/cm²). Os corpos cerâmicos foram sinterizadas as temperaturas de 7, 7 e 8 C sem patamares de sinterização, e 8 C com patamares de 1h, 2h e 3h, em forno elétrico com atmosfera aberta e taxa de aquecimento de 1 /min. Estas amostras serão chamadas, respectivamente, de BTO7sp, BTO7sp, BTO8sp, BTO81h, BTO82h e BTO83h. A densidade das cerâmicas produzidas foi determinada pelo método de Arquimedes, por imersão em água destilada [9]. Estas amostras passaram então por um processo de polimento com lixa d água 12, seguida de limpeza por ultra-som em banho de água destilada e secagem a 1 C durante 1h. Em seguida, foram depositados, sobre as faces paralelas da amostra, eletrodos de platina na forma coloidal, com secagem e densificação a 7 C durante 3min em forno elétrico. As medidas de impedância foram realizadas num impedancímetro Solartron 12, em modo AC utilizando uma tensão com uma amplitude de 1mV. Foi utilizado um intervalo de temperatura desde a ambiente até 7 C para as amostras sinterizadas a 7 C e 8 C, e até C para as amostras sinterizadas a 7 C. As medidas foram realizadas tanto no aquecimento quanto no resfriamento das amostras, em intervalos de 2 C num intervalo de freqüência de 1Hz a 1MHz. Os dados experimentais obtidos foram analisados utilizando o software Zview[1] que ajusta os dados experimentais por modelos de circuitos equivalentes. 3. RESULTADOS A Figura 1 apresenta o padrão de difração da amostra calcinada a 7 C por h, no qual observamos a fase cristalina desejada, Bi 12 TiO 2. O refinamento dos padrões de difração através do método Rietveld utilizando o programa DBWS[11] confirmou a estrutura cúbica e o grupo espacial I23. A Figura 2 apresenta os resultados do ajuste, bem como os valores de parâmetro de rede e fatores de qualidade R Bragg, R p R wp e a qualidade do ajuste S =,3.

Denise J. Santos, Luciara B. Barbosa, Zélia S. Macedo., Scientia Plena, 481, 29 3 BTO-7 C/h JCPDS#78118- Bi 12 TiO 2 Intensity(u.a.) 2 3 4 7 2θ( ) Figura 1: Padrão de difração da amostras calcinadas a 7 C por h em cadinho de platina. Intensity(u.a.) R Bragg = 2, R p = 4,83% R wp = 7,4% S =,3 a=b=c= 1,243 yobs ycal ydif B 2 3 4 7 2θ( ) Figura 2: Refinamento feito através do método Rietveld utilizando o programa DBWS, para o padrão da amostra de BTO calcinada a 7 C por h. A Figura 3 mostra o diagrama de Nyquist das amostras cerâmicas de BTO densas e porosas. Neste diagrama cada ponto experimental representa uma freqüência de medida diferente, cujos valores são crescentes da direita para esquerda. Uma vez que as propriedades elétricas e dielétricas de cerâmicas são sensíveis à microestrutura [12], para uma investigação mais detalhada, as medidas de impedância das amostras porosas (BTO7sp e BTO7sp) foram tomadas nas mesmas condições da amostra densa (BTO8sp). Desse modo, constatamos que os valores de resistividade elétrica que dependem do diâmetro do semicírculo, aumentam com a porosidade da amostra. Isto ocorre porque, para as amostras mais porosas, há uma maior contribuição da região inter-granular para a resistência elétrica.

Denise J. Santos, Luciara B. Barbosa, Zélia S. Macedo., Scientia Plena, 481, 29 4 7 C BTO7sp BTO7sp BTO8sp Z'' (Ω.cm) 4 3 ρ = % ρ = 71% 1 4 ρ = 97% 4 4 1 3 4 7 Z' (Ω.cm) Figura 3: Diagrama de Nyquist,com impedância em função da densidade relativa das amostras de cerâmicas de BTO medidas a C. Os números ao lado dos pontos marcados correspondem ao logaritmo da freqüência de medida. A resposta elétrica é caracterizada pela presença de dois semicírculos que correspondem às duas regiões microestruturais da cerâmica e que aparecem deconvoluídos na Figura 4, possibilitando avaliar as contribuições de grão e contorno de grão separadamente. Nesta Figura, também é apresentada a curva total ajustada. Os efeitos de polarização de eletrodo que apareceram apenas na região de baixas freqüências não foram considerados neste estudo. Os números ao lado dos pontos marcados nos semicírculos nas Figuras 3 e 4 correspondem ao logaritmo da freqüência de medida. Os valores de R e de C foram obtidos através do ajuste utilizando-se o modelo de circuitos equivalentes apresentado na Figura 4. Z'' (Ω.cm) 8 4 Experimental Ajuste - grão Ajuste - contorno de grão Ajuste - total BTO7sp measured at C 2 4 3 2 4 8 Z' (Ω.cm) Figura 4: Semicirculos deconvoluidos para a amostra mais porosa, BTO7sp, medida a C. Os números ao lado dos pontos marcados correspondem ao logaritmo da freqüência de medida.

Denise J. Santos, Luciara B. Barbosa, Zélia S. Macedo., Scientia Plena, 481, 29 A condutividade (σ' ac ) do BTO foi determinada a partir do ajuste do diagram complexo de impedância, no qual, o diâmetro do semicírculo nos dá os valores de resistividade do sistema ρ = 1/σ' ac. Observou-se que a condutividade elétrica do BTO é termicamente ativada e o parâmetro que determina o grau de variação da condutividade com a temperatura é a energia de ativação. Este parâmetro foi determinado através do diagrama de lnσ vs. 1/T, como mostra a Figura, que apresenta comportamento de acordo com a equação de Arrhenius ( E a kt ) σ = σ e. Nesta equação, σ é o fator pré-exponencial, k = 8,17.1-7 ev/k é a constante de Boltzmann, e E a e T representam, respectivamente, a energia de ativação e a temperatura absoluta. Os valores de condutividade elétrica para a região do grão corroboram os resultados já relatados para o monocristal [4]. A região do contorno de grão apresentou condutividade mais baixa, principalmente para as amostras menos densas, devido à porosidade e à área efetiva de contornos de grão que é levemente maior nas amostras mais porosas. As energias de ativação foram calculadas a partir do ajuste linear dos diagramas de Arrhenius para temperaturas acima e abaixo de 4 C. Optamos por esse procedimento uma vez que a reta apresentava uma mudança de inclinação em torno desse valor de temperatura. Obtivemos valores de energia de ativação de 1eV para as amostras porosas, coincidindo com os valores encontrados para o monocristal[4]. Entretanto as amostras mais densas apresentaram um valor superior a 1eV, que pode estar relacionado ao surgimento de um novo mecanismo de condução. log σ (S.cm)-1-3 4 4 3 3 monocristal -4 - - -7-8 T( C) BTO7sp-grão BTO7sp-grão BTO8sp-grão BTO7sp-C.grão BTO7sp-C.grão BTO8sp-C.grão Ajuste linear -9 1, 1,2 1,4 1, 1,8 1/T (K -1 ) Figura : Ajustes dos diagramas de Arrhenius para todas as amostras BTO7sp, BTO7sp e BTO8sp para a região do grão e contorno de grão. A Figura mostra o gráfico da parte real da permissividade elétrica em função da freqüência para diversas temperaturas. Os valores de permissividade foram obtidos das medidas de impedância através da relação 1 S ε* = i ωε Z * = ε ' + iε '' l O gráfico mostra uma dispersão na permissividade na região de baixas freqüências. Esse desvio se deve ao acúmulo de carga na região do contorno de grão, de modo que o campo elétrico age no sólido não apenas por reorientação dipolar, mas também por movimento dos portadores de carga. Essa dispersão aumenta para medidas a altas temperaturas, para as quais o número de portadores disponíveis é maior. (2)

Denise J. Santos, Luciara B. Barbosa, Zélia S. Macedo., Scientia Plena, 481, 29 ε' BTO8sp 4 C 1 4 4 C C C C 1 3 C 1 2 1 2 1 3 1 4 1 1 f (Hz) Figura : Permissividade real ε em função da freqüência para a amostra de BTO sinterizada a 8 C sem patamar de temperatura, medida a diferentes temperaturas. Os valor da permissividade relativa (ε ) encontrado para uma freqüência de 1 khz é ε=43 a 4 C, e cresce ligeiramente até ε=2 à medida que a amostra é aquecida até C, mantendose praticamente constante acima desta temperatura, como mostrado na Figura 7. Este resultado está em ótima concordância com o valor ε= relatado por Stepanov and Petrov [13], para o monocristal. 1KHz BTO8sp ε' ε' 4 4 4 7 T ( C) Figura 7: Permissividade real (ε ) em função da temperatura, para a amostra de BTO sinterizada a 8 C sem patamar a uma freqüência de 1KHz.

Denise J. Santos, Luciara B. Barbosa, Zélia S. Macedo., Scientia Plena, 481, 29 7 4. CONCLUSÕES O método de síntese de estado sólido utilizado neste trabalho apresentou resultado satisfatório possibilitando a obtenção da fase desejada Bi 12 TiO 2. Foram produzidas cerâmicas com densidades diferentes, possibilitando o estudo da contribuição da microestrutura no comportamento elétrico. Durante o estudo por espectroscopia de impedância observamos que as amostras apresentaram freqüências de relaxação bastante próximas, resultando numa superposição dos semicírculos referentes ao grão e ao contorno de grão. Esta característica foi bastante marcante nas amostras mais densas. Entretanto foi possível fazer uma deconvolução destes semicírculos nas amostras mais porosas, nas quais pudemos verificar as contribuições de cada microregião separadamente. A permissividade relativa apresentou um comportamento dispersivo na região de baixas freqüências, devido à condutividade apresentada por este material. Foi obtido um valor de permissividade relativa ε=2 nas amostras aquecidas até C. Este valor está em ótima concordância com o valor de ε=, relatado na literatura para o monocristal. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem ao CNPQ, CAPES, POSGRAP e FAPITEC-SE pelo apoio financeiro. 1. I.V. Kityk, A. Majchrowski, B. Sahraoui, Optics and Lasers in Engineeering, 43, 7-83 (2). 2. J. Zÿ mija, M.T. Borowiec, A. Majchrowski, H. Szymczak, T. Zayarnyuk, Crystal Engineering (22) 273 282 3. W. Feng, Yao, Hong Wang, X. Hong Xu, X. Feng Cheng, Ji Huang, S. Xia Shang, X. Na Yang, Min Wang, Applied Catalysis A: General, 243, 18-19 (23). 4. S. Lanfredi, J.F. Carvalho, A.C. Hernandes, Journal of Applied Physics, 88, (2).. Z. S. Macedo, Journal of Applied Physics, 12, 341 (27).. S. Lanfredi, and M.A.L. Nobre, Applied Physics Letters, 8, 8191 (2). 7. X. Shihong, S. Wenfeng, Y. Jian, S. Jianwei, C. Mingxia, Materials Science and Engineering B, 137, 18-111, (27). 8. Z.S. Macedo, C.R. Ferrari, A.C. Hernandes, Journal of the European Ceramic Society, 24, 27-274 (24). 9. Z.S. Macedo, M.H. Lente, J.A. Eiras, A.C. Hernandes, Journal of Physics: Condensed Matter, 1, 2811-2818 (24) 1. D. Jonhson, software Zview v.2, 3d, Scribner Associates, Inc., 2. 11. C.O. Paiva, Santos. p.43-, 2. 12. A. K. Jonscher, Nature, v. 27, p. 73-78, 1977. 13. S.I. Stepanov, and M.P. Petrov, edited by P. Günter and J.P. Huignard (Springer, Berlin, 1998), p. 23.