Estado Refrativo em Crianças com Retinopatia da Prematuridade Tratada com Laser e/ou Bevacizumab

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Transcrição:

Oftalmologia - Vol. 40: pp.127-131 Artigo Original Estado Refrativo em Crianças com Retinopatia da Prematuridade Tratada com Laser e/ou Bevacizumab Mário Ramalho 1, Fernando Vaz 2, Cristina Santos 1, Inês Coutinho 1, Catarina Pedrosa 1, Mafalda Mota 1, Graça Pires 2, Susana Teixeira 3 1 Interno do Serviço de Oftalmologia, Hospital Prof. Dr. Fernando Fonseca, EPE 2 Assistente Hospitalar do Serviço de Oftalmologia, Hospital Prof. Dr. Fernando Fonseca, EPE 3 Assistente Hospitalar Graduado do Serviço de Oftalmologia, Hospital Prof. Dr. Fernando Fonseca, EPE Resumo Objectivo: Relatar o estado refrativo em prematuros que desenvolveram retinopatia da prematuridade em estadio 3+ e que foram tratados na nossa instituição. Material e Métodos: Estudo retrospetivo com 24 prematuros em que o tratamento foi de monoterapia Laser, monoterapia bevacizumab ou combinação de Laser + bevacizumab. Em nove prematuros o tratamento num olho foi com monoterapia Laser e no outro olho foi com monoterapia bevacizumab. Obteve-se a refração por esquiascopia após cicloplegia. Resultados: Nos olhos tratados com monoterapia Laser (n=11) o equivalente esférico foi de - 4.55 D ± 5.68, nos olhos tratados com monoterapia bevacizumab (n=24) o equivalente esférico foi de +0.92 D ± 1.86, nos olhos tratados com combinação de Laser e bevacizumab (n=10) o equivalente esférico foi de -7.70 D ± 3.16. A diferença média do equivalente esférico entre a monoterapia Laser e a monoterapia bevacizumab foi de 5.46 D (p < 0.01). A diferença média do equivalente esférico entre a combinação de Laser e bevacizumab e a monoterapia bevacizumab foi de 8.62 D (p < 0.01). Nos 9 prematuros com monoterapia Laser num olho e monoterapia bevacizumab no outro olho, verificou-se que no olho que fez tratamento com Laser o equivalente esférico foi de -3.89 D ± 5.71 e no olho que fez tratamento com bevacizumab o equivalente esférico foi de +0.39 D ± 2.42, diferença média de 4.28 D (p=0.55). Conclusões: Nos olhos que receberam tratamento com Laser verificou-se uma maior percentagem de miopia e alta miopia do que nos olhos tratados com bevacizumab. Palavras-chave Retinopatia da prematuridade, anti-vegf, Laser, anisometropia. ABSTRACT Purpose: Report the refractive status in preterm infants that developed retinopathy of prematurity in stage 3+ and were treated in our institution. Material and Methods: Retrospective study with 24 preterm infants in which the treatment was Laser monotherapy, bevacizumab monotherapy or Laser + bevacizumab combination. In nine preterm infants the treatment was Laser monotherapy in one eye and bevacizumab monotherapy in the fellow eye. The refraction was obtained with cycloplegic retinoscopy. Results: In the eyes treated with Laser monoteraphy (n=11) the spherical equivalent was - 4.55 D ± 5.68, in the eyes treated with bevacizumab monoteraphy (n=24) the spherical equivalent was Vol. 40 - Nº 2 - Abril-Junho 2016 127

Mário Ramalho, Fernando Vaz, Cristina Santos, Inês Coutinho, Catarina Pedrosa, Mafalda Mota, Graça Pires, Susana Teixeira +0.92 D ± 1.86, In the eyes treated with Laser and bevacizumab combination (n=10) the spherical equivalent was -7.70 D ± 3.16. The mean difference of the spherical equivalent between Laser monoteraphy and bevacizumab monoteraphy was 5.46 D (p < 0.01). The mean difference of the spherical equivalent between Laser and bevacizumab combination and bevacizumab monoteraphy was 8.62 D (p < 0.01). In the 9 preterm infants with Laser monoteraphy in one eye and bevacizumab monoteraphy in the fellow eye, in the eye with the Laser the spherical equivalent was -3.89 D ± 5.71 and in the eye with the bevacizumab the spherical equivalent was +0.39 D ± 2.42, mean difference of 4.28 D (p=0.55). Conclusions: In the eyes that receveid Laser treatment there was a higher percentage of myopia and high myopia when comparing with bevacizumab. Key-words Retinopathy of prematurity, anti-vegf, Laser, anisometropia. INTRODUÇÃO A retinopatia da prematuridade (ROP) é uma das principais causas de cegueira infantil e os prematuros desenvolvem frequentemente erros refrativos e estrabismo, tal como alterações a nivel da acuidade visual, sensibilidade ao contraste, estereopsia, campimetria, acomodação e percepção visual 1,2. Existe uma prevalência aumentada de miopia e alta miopia nos prematuros que se correlaciona com a severidade da ROP e o peso ao nascer 3-5 e com a realização de tratamento ablativo (crioterapia ou Laserterapia). Paradoxalmente, na miopia dos prematuros com ou sem ROP, os olhos tem comprimento axial normal ou discretamente diminuido, e a miopia relaciona-se com a paragem de desenvolvimento a nivel do segmento anterior, com maior curvatura corneana e espessura do cristalino 6-8. O estudo da crioterapia na retinopatia da prematuridade (CRYO-ROP) estabeleceu os beneficios do tratamento na ROP grave na redução da cegueira 9, e o uso da fotocoagulação Laser através da oftalmoscopia indireta tornou-se uma alternativa eficaz à crioterapia, com menor morbilidade e fácil acesso a retina, tendo sido considerado nas últimas décadas como o tratamento gold-standard para a ROP grave 10-13. O Laser provoca menos miopia que a crioterapia, ainda assim e de acordo com a extensão da área avascular a tratar, pode induzir miopia e alta miopia. O papel do factor de crescimento vascular endotelial (VEGF) emergiu como um fator chave na neovascularização e permeabilidade vascular na ROP e o uso dos agentes anti-vegf na ROP veio revolucionar o seu tratamento, principalmente nos casos em que o uso do Laser era impossibilitado por rubeosis iridis ou hemovitreo 14-15. O bevacizumab é um anticorpo monoclonal humanizado que inibe a actividade biológica do VEGF e tem sido largamente usado em patologias da retina em adultos, o seu uso em crianças, nomeadamente em prematuros com ROP mantém-se controverso, com a dose ideal e efeitos oculares e sistémicos a longo prazo ainda por determinar 16-17. No estudo BEAT-ROP um grupo de 150 prematuros com retinopatia da prematuridade em estadio 3+ foram distribuídos aleatoriamente para receberem bevacizumab intravítreo ou terapia Laser, concluindo que o bevacizumab tinha um beneficio significativo para a zona I mas não para a zona II1 8. Estudos recentes mostram uma menor prevalência de miopia e alta miopia em olhos tratados com anti-vegf em comparação com tratamento Laser 19-21. O objetivo do nosso estudo é caracterizar o estado refrativo de prematuros que desenvolveram retinopatia da prematuridade na zona I ou zona II em estadio 3+ e que foram tratados com bevacizumab ou fotocoagulação Laser. MATERIAL E MÉTODOS Neste estudo retrospetivo, não aleatorizado, foram incluídos prematuros diagnosticados com ROP que receberam tratamento na nossa instituição entre 2007 e 2012 e com pelo menos uma posterior avaliação da refração. As crianças foram rastreadas para ROP se o seu peso ao nascer fosse inferior ou igual a 1500 gramas ou tivessem idade gestacional inferior ou igual a 32 semanas. O primeiro rastreio foi feito com uma idade após o nascimento de 4 a 6 semanas e o seguimento posterior de acordo com as guidelines conjuntas da Academia Americana de Oftalmologia, Academia Americana de Pediatria e Associação Americana para a Oftalmologia Pediátrica e Estrabismo 22. A ROP foi 128 Revista da Sociedade Portuguesa de Oftalmologia

Estado Refrativo em Crianças com Retinopatia da Prematuridade Tratada com Laser e/ou Bevacizumab Quadro 1 Distribuição dos doentes pelas diferentes modalidades de tratamento. Monoterapia Laser (n=11) Combinação Laser + bevacizumab (n=10) Monoterapia bevacizumab (n=24) / 4 / 7 5 / 6 15 / 9 Idade Gestacional 25,76 ± 2,15 26,17 ± 2,52 25,67 ± 1,43 Peso ao Nascer 772,27 ± 159,25 948,00 ± 318,71 771,00 ± 167,54 Equivalente Esférico - 4,55 ± 5,68-7,70 ± 3,16 + 0,92 ± 1,86 Idade de Av. da Ref. 2,33 ± 1,83 4,61 ± 1,48 1,82 ± 0,95 Miopia / Alta Miopia 6 / 4 0 / 10 4 / 0 Idade Gestacional Expressa em meses; Peso ao Nascer Expresso em gramas; Equivalente Esférico Expresso em dioptrias ; Idade de Avaliação da Refração Expressa em anos; Miopia Equivalente esférico entre -0,25 D e -5,00 D; Alta Miopia Equivalente esférico igual ou inferior a -5,00 D. classificada de acordo com os critérios internacionais para a classificação da ROP 23. Os critérios para o tratamento foram a presença de doença tipo 1 de acordo com o ETROP 24. Nos olhos com doença agressiva posterior (ROP-AP) ou com contraindicação para anestesia geral foi realizada injecção intravitrea de bevacizumab. Um total de 45 olhos de 24 crianças foram incluídos no estudo e os tratamentos efetuados foram de monoterapia Laser, monoterapia bevacizumab ou combinação de Laser + bevacizumab (Quadro 1). A dose de bevacizumab intravitreo foi de 0.625 mg (0.025 ml). Em nove prematuros a ROP tipo 1 apresentava-se em zona I num olho e zona 2 no olho adelfo, tendo-se optado por tratamento com monoterapia Laser no olho em zona 2 e por monoterapia bevacizumab no olho em zona 1. A refração foi obtida por esquiascopia após cicloplegia. Os dados foram obtidos de forma retrospetiva com base nos dados clínicos obtidos na consulta. A análise estatística foi efetuada através do programa IBM SPSS Statistics Version 21. As variáveis contínuas foram descritas como média (± desvio padrão). A comparação das variáveis quantitativas entre os diferentes grupos foi feita através do test t de Student não emparelhado. Considerámos 0.01 como valor de p significativamente estatístico. RESULTADOS Nos olhos tratados com monoterapia Laser (n=11) o equivalente esférico foi de - 4.55 D ± 5.68, nos olhos tratados com combinação de Laser e bevacizumab (n=10) o equivalente esférico foi de -7.70 D ± 3.16 e nos olhos tratados com monoterapia bevacizumab (n=24) o equivalente esférico foi de +0.92 D ± 1.86 (gráfico 1). Fig. 1 Gráf. 1 Equivalente esférico dos diferentes grupos, divididos por tipo de tratamento. Vol. 40 - Nº 2 - Abril-Junho 2016 129

Mário Ramalho, Fernando Vaz, Cristina Santos, Inês Coutinho, Catarina Pedrosa, Mafalda Mota, Graça Pires, Susana Teixeira A diferença média do equivalente esférico entre a monoterapia Laser e a combinação de Laser e bevacizumab foi de 3.15 D (p = 0.14), a diferença média entre a monoterapia Laser e a monoterapia bevacizumab foi de 5.46 D (p < 0.01). A diferença média do equivalente esférico entre a combinação de Laser e bevacizumab e a monoterapia bevacizumab foi de 8.62 D (p < 0.01). Na monoterapia Laser 55% apresentavam miopia (entre -0,25 D e -5,00 D) e 36% apresentavam alta miopia (miopia igual ou em maior grau do que -5,00 D), na combinação de Laser e bevacizumab, 100% dos doentes apresentavam alta miopia e na monoterapia bevacizumab nenhum doente apresentava alta miopia, 17% apresentava miopia e 83% apresentavam emetropia ou hipermetropia. Nos 9 prematuros com monoterapia Laser num olho e monoterapia bevacizumab no olho adelfo, verificou-se que no olho que fez tratamento com Laser a média do equivalente esférico foi de -3.89 D ± 5.71 e no olho que fez tratamento com bevacizumab a média do equivalente esférico foi de +0.39 D ± 2.42, diferença média de 4.28 D (p=0.55). No quadro 2 encontram-se as médias de diferentes variáveis consoante o tratamento efetuado. CONCLUSÕES Encontrámos maior percentagem de miopia e alta miopia na monoterapia Laser e na combinação de Laser e bevacizumab do que na monoterapia bevacizumab, o que está de acordo com Geloneck et al. e Bjorn Harder et al., não existindo nenhum estudo, do nosso conhecimento, que diga o contrário. Alguns autores referem que a prevalência aumentada de miopia e alta miopia nos prematuros se correlaciona com a severidade da ROP e o peso ao nascer 3-5, são também vários os autores que relacionam este aumento com a modalidade e extensão do tratamento ablativo. Na terapia com Laser, as percentagens de miopia e alta miopia relatadas variam entre 26,1 e 80,4% e entre 1,4 e 31,5% respetivamente 3,12,25. Na terapia com bevacizumab as percentagens de miopia e alta miopia relatadas variam entre 17 e 47,5% e entre 6 e 10%, respetivamente 20,21. Existe dificuldade na comparação dos diferentes estudos devido ao grande número de variáveis que podem influenciar o estado refrativo, nomeadamente, a idade gestacional, o peso ao nascer, severidade da doença, idade de avaliação da refração e quantidade de Laser administrado, de facto, Geloneck et al. referem que a miopia era tanto maior, quanto maior a aplicação de Laser, aumentando em média -0,14 D por cada 100 marcações de Laser 19. A grande limitação do nosso estudo prende-se com a idade de avaliação da refração ser diferente entre os diferentes grupos, podendo induzir algum viés na interpretação dos dados. Importa referir que para os 9 prematuros com tratamento diferente em cada olho (um olho tinha ROP em zona 1 e o outro em zona 2) se pode presumir que o Laser é indutor de miopia, uma vez que os olhos tratados com Laser se encontravam com ROP em zona 2, menos grave e por isso menos indutora de miopia do que a ROP em zona 1 3-5, no entanto, não é estatisticamente significativo (p=0,55), provavelmente devido a ser uma amostra pequena. Os nossos achados realçam a necessidade da escolha de uma modalidade de tratamento não indutora de anisometropia, assim como um seguimento próximo das crianças com ROP tratadas ou não, no sentido de evitar morbilidade ocular e ambliopia. Bibliografia 1. Rodrigues J, Vaz F, Santos MJ, Ribeiro F, Teixeira S. Alterações da refração e motilidade na população de prematuros do HFF rastreada para ROP. Oftalmologia 2003; 27:51-55. 2. Li M, Hsu SM, Chang YS, Shih MH, Lin YC, Lin CH et al. Retinopathy of prematurity in southern Taiwan: a 10-year tertiary medical center study. J Formos Med Assoc 2013; 112:445-453. 3. Quinn GE, Dobson V, Davitt BV, Hardy RJ, Tung B, Pedroza C et al. Early Treatment for Retinopathy of Prematurity Cooperative Group. Progression of myopia and high myopia in the early treatment for retinopathy of prematurity study: findings to 3 years of age. Ophthalmology 2008; 115:1058-1064. 4. Chen TC, Tsai TH, Shih YF, Yeh PT, Yang CH, Hu FC, et al. Longterm evaluation of refractive status and optical components in eyes of children born prematurely. Invest Ophthalmol Vis Sci 2010; 51:6140-6148. 5. Hsieh CJ, Liu J, Huang J, Lin K. Refractive outcome of premature infants with or without retinopathy of prematurity at 2 years of age: A prospective controlled cohort study; Kaohsiung J Med Sci 2012; 28:204-211. 6. Chui T, Bissig D, Berkowitz B, Akula J. Refractive Development in the ROP Rat. Journal of Ophthalmology 2012; Volume 2012:15 pages. 7. Beri S, Malhotra M, Dhawan A, Garg R, Jain R, D souza P. A neuroectodermal hypothesis of the cause and relationship of myopia in retinopathy of prematurity. J Pediatr Ophthalmol Strabismus 2009;46:146-50. 8. Garcia-Valenzuela E, Kaufman L. High Myopia 130 Revista da Sociedade Portuguesa de Oftalmologia

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