DIAGNÓSTICO E DETERMINAÇÃO MICROBIOLÓGICA DA MASTITE EM REBANHOS BOVINOS LEITEIROS NOS TABULEIROS COSTEIROS DE SERGIPE

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Transcrição:

226 OLIVEIRA, A. A. de et al. DIAGNÓSTICO E DETERMINAÇÃO MICROBIOLÓGICA DA MASTITE EM REBANHOS BOVINOS LEITEIROS NOS TABULEIROS COSTEIROS DE SERGIPE Am a u ry Ap o l o n i o d e Ol i v e i r a, 1 Cr i s t i a n o Ba r r o s d e Me l o 2 e Hy m e r s o n Co s ta Az e v e d o 3 1. Pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Tabuleiros Costeiros amaury@cpatc.embrapa.br 2. Professor doutor da Universidade de Brasília 3. Pesquisador-A da Embrapa, Tabuleiros Costeiros RESUMO Com objetivo de determinar a ocorrência da mastite e a relação microbiológica entre os testes laboratoriais e auxiliares realizados de campo, foram acompanhados dois rebanhos bovinos leiteiros por dezoito meses e coletadas 893 amostras de leite. Procedeu-se a exames clínicos dos úberes, ao teste da caneca telada e ao Califórnia Mastitis Test (CMT). Isolaram-se Staphylococcus aureus em 196 (21,95%) amostras, Staphylococcus sp. Coagulase Negativa (SCN) em 104 (11,65%), Streptococcus agalactiae, em 67 (7,50%), Streptococcus sp. Esculina Positivos (ESCPOS) em 20 (2,24%), Streptococcus sp. Esculina Negativos (ESCNEG) em 29 (3,25%), leveduras em uma (0,11%) e Corynebacterium sp. em dezesseis (1,68%) amostras. No total, foram isolados 433 microrganismos, sendo que 350 (39,19%) amostras de leite foram negativas e em 110 (12,32%) amostras não foram possíveis o isolamento e a identificação. De todos os microrganismos isolados, os contagiosos apresentaram maior frequência, quando comparados à reação positiva pelo CMT. O exame CMT mostrou-se importante no diagnóstico presuntivo, exigindo, no entanto, uma análise microbiológica periódica do rebanho. PALAVRAS-CHAVE: Bovino leiteiro, diagnóstico, mastite, Tabuleiros Costeiros. ABSTRACT DIAGNOSIS AND MICROBIOLOGICAL DETERMINATION OF THE MASTITIS IN DAIRY CATTLE HERDS FROM TABULEIROS COSTEIROS REGION IN SERGIPE STATE, BRAZIL Aiming to determine the occurrence of the mastitis and the microbiological relationhip between the lab tests and the auxiliary tests which are done in the field, two cattle herds were studied for 18 months and 893 milk samples were collected. The udders were clinically examined, and the milk was tested using the strip cup test and the California Mastitis Test (CMT). The Staphylococcus aureus was isolated in 196 (21.95%) samples, the coagulase-negative Staphylococcus sp. (SCN) in 104 (11.65%), the Streptococcus agalactiae in 67 (7.50%), the esculin-positive Streptococcus sp. (ESCPOS) in 20 (2.24%), the esculin-negative Streptococcus sp. (ESCNEG) in 29 (3.25%), leavenings in one (0.11%) and the Corynebacterium sp. in 16 (1.68%) samples. In the total, 433 microrganisms were isolated, 350 milk samples were negative and in 110 (12.32%) samples the isolation and identification were not possible. Out of all the isolated microrganisms, the contagious were more frequent, when compared to the positive reaction for the CMT. The CMT test showned to be important in the presuntive diagnose, demanding, however, a periodic microbiologic analyses of the herd. KEY WORDS: Dairy cattle, mastitis, diagnostic, mastitics, Tabuleiros Costeiros.

Diagnóstico e determinação microbiológica da mastite em rebanhos bovinos leiteiros nos tabuleiros... 227 INTRODUÇÃO A produção de leite no Brasil tem se expandido nas diversas regiões, em virtude da implantação de alguns avanços tecnológicos verificados no setor. No Nordeste, mais particularmente em Tabuleiros Costeiros, tais avanços vêm ocorrendo de forma muito gradual, tornando essa região cada vez mais dependente da importação de produtos lácteos. Essa lenta expansão tem sido motivada, entre outros fatores, pela mastite bovina, o mais importante problema de ordem sanitária e cuja prevalência nos rebanhos nacionais varia entre 11% e 58% (BRITO & BRITO, 1996). Os últimos estudos realizados em municípios dos Tabuleiros Costeiros de Sergipe mostraram uma prevalência da infecção da ordem de 25,4% (OLIVEIRA et al., 1982), sendo considerada muito elevada, dada a caracterização genética do rebanho estudado para esta pesquisa. A mastite bovina é um processo inflamatório complexo da glândula mamária, decorrente da interação entre animal, agente microbiano e meio ambiente e, basicamente, pode ser classificada em dois tipos: a mastite clínica e a mastite subclínica. A mastite clínica é caracterizada por alterações visíveis no quarto mamário e/ou no leite (PEREI- RA et al., 2001). A subclínica necessita de exames específicos para a sua identificação (PHILPOT & NICKERSON, 1991). A introdução de medidas racionais de controle da mastite requer investigações sistemáticas visando ao reconhecimento, à avaliação e à interpretação dos fatores epidemiológicos mais importantes (BRAND et al., 1988). Os programas de controle dessa enfermidade estão plenamente identificados com essa tendência (MARKUS- FELD, 1993), com uma preocupação que é comum no que diz respeito aos aspectos da produção de leite, com ênfase na higiene e terapia. Além disso, trata-se de procedimentos práticos, econômicos, eficientes e de alcance desejável (BECK et al., 1992). De acordo com RADOSTITS et al. (2007), o exame microbiológico do leite é o método padrão para o diagnóstico da mastite bovina. A realização desse procedimento, em todos os quartos mamários individualizados, é o melhor método de conhecer o estado do rebanho no que diz respeito à referida infecção. Assim, o presente trabalho teve como objetivo determinar a ocorrência da mastite bovina nos rebanhos dos Tabuleiros Costeiros de Sergipe e sua relação entre os testes laboratoriais e auxiliares processados no campo para o diagnóstico da citada enfermidade. MATERIAL E MÉTODOS Foram estudados dois rebanhos leiteiros especializados, localizados nos municípios de Nossa Senhora das Dores e Santa Rosa do Lima, região dos Tabuleiros Costeiros, de Sergipe, cada um deles, inicialmente, com pelo menos vinte vacas. Colheram-se amostras de leite de todo o plantel em produção. No decorrer dos trabalhos, os rebanhos foram sendo reduzidos, dadas a venda e a produção leiteira abaixo do esperado. Um dos rebanhos avaliados teve seu rebanho gradualmente reduzido, chegando a apenas sete vacas de alta linhagem na produção de leite. O grau de sangue dos rebanhos era variável de ½ holandês/zebu até animais puros por origem. O processo de ordenha era feito manualmente, duas vezes ao dia. O trabalho foi realizado num período de dezoito meses, tendo iniciado com a aplicação de questionário, adaptado da Embrapa Gado de Leite, relativo ao manejo geral, para coleta de dados sobre a produção do rebanho. Seguiu com o preenchimento de fichas individuais, para determinação dos problemas existentes com as fêmeas em lactação. As fêmeas em lactação eram monitoradas mensalmente, por meio de exames clínicos das glândulas mamárias, exames laboratoriais e de campo. Realizou-se a coleta de leite na ordenha da tarde de todos os quartos mamários sadios e dos clinicamente doentes. No momento da ordenha, após o processo preconizado de higiene e desinfecção das tetas, fez-se uso do teste de Tamis (caneca telada), para determinação da mastite clínica, e do California Mastitis Test (CMT), para a determinação da mastite subclínica. Em seguida, coletaram-se cerca de 10 ml de leite em frasco estéril com tampa rosqueável, sendo colocados

228 OLIVEIRA, A. A. de et al. em caixa isotérmica com gelo e encaminhados ao Laboratório de Microbiologia no Centro de Pesquisa Agropecuária dos Tabuleiros Costeiros (CPATC), da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), em Aracaju, Sergipe, onde permaneceram em refrigerador, para a realização do isolamento e da identificação bacteriana, de acordo com BRITO & BRITO (1999). RESULTADOS E DISCUSSÃO Das 893 amostras de leite colhidas foram isolados 433 microrganismos, cuja descrição está apresentada na Tabela 1. Em relação aos microrganismos isolados, registraram-se os seguintes resultados: 196 (21,95%) amostras de Staphylococcus aureus; 104 (11,65%) de Staphylococcus sp. Coagulase Negativa (SCN); 67 (7,50%) de Streptococcus agalactiae; 29 (3,25%) de Streptococcus sp. Esculina Negativos (ESCNEG); 20 (2,24%) de Streptococcus sp. Esculina Positivos (ESCPOS); 16 (1,68%) de Corynebacterium sp e uma (0,11%) amostra de levedura. Cento e dez amostras de leite (12,32%) estavam contaminadas, não sendo possível a diferenciação dos microrganismos cultivados, e em 350 (39,19%) amostras não se isolou nenhum microrganismo. De todos os microrganismos isolados, os contagiosos apresentaram maior frequência, quando comparados à reação positiva pelo CMT, e os S. aureus tiveram uma frequência de isolamento de 70%, correspondendo a 133 amostras isoladas, sendo encontrados em todas as coletas realizadas (Tabela 2). Esse fato revela a presença consideravelmente mais acentuada de microrganismos contagiosos em sistemas de produção precários de higiene. TABELA 1. Resultados de exames microbiológicos e sua relação com o escore de CMT estratificado e com mastite clínica, em Sergipe, 2002 2003 Neg. I + ++ +++ M. Clín. Total Staphylococcus aureus 57 20 39 36 38 6 196 S C N 45 17 22 11 8 1 104 Streptococcus agalactiae 13 6 19 12 16 1 67 ESCPOS 5 3 6 3 2 1 20 ESCNEG 8 3 4 5 7 2 29 Corynebacterium sp. 8 1 3 2 1 1 16 Leveduras 0 0 0 1 0 0 1 Amostras contaminadas 70 9 17 10 3 1 110 Sem crescimento 313 12 10 6 7 2 350 Total 519 71 120 86 82 15 893 SCN= Staphylococcus sp. Coagulase Negativa; ESCPOS= Streptococcus sp. Esculina positivos; ESCNEG= Streptococcus sp. Esculina Negativos; Neg.= negativo; I= inconclusivo; M. Clín.= mastite clínica. Identificação: + (reação ligeiramente coagulada e viscosa); ++ (reação medianamente coagulada e em viscosa) e +++ (reação fortemente coagulada e gelatinosa). O diagnóstico de campo da mastite clínica foi de 1,68%. O nível de infecção pode ser considerado elevado, como relatado por outros autores, principalmente considerando-se a genética dos rebanhos, cuja participação de sangue zebuíno foi de até 50%, e o pequeno número de vacas na ordenha. A baixa frequência de microrganismos do gênero Corynebacterium pode estar associada também ao uso de medidas adequadas de higienização das tetas no processo de coleta de amostras de leite. Observando-se, na Tabela I, as reações positivas do CMT em uma, duas e três cruzes e sua relação com o número de microrganismos isolados, pode-se verificar uma correlação entre elas de 55,82%, superior aos observados por MULLER et al. (1978) e COSTA et al. (1996), cuja correspondência entre os dois métodos foi, respectivamente, 43,4% e 51,2%.

Diagnóstico e determinação microbiológica da mastite em rebanhos bovinos leiteiros nos tabuleiros... 229 TABELA 2. Relação do isolamento de microrganismos causadores de mastite e a reação ao (CMT), em Sergipe, 2002 2003 Quarto mamário Quarto mamário Total C/ CMT - (%) C/ CMT + (%) S. aureus 57 30% 133 70% 190 SCN 45 44% 58 56% 103 S. agalactiae 13 20% 53 80% 66 ESCPOS 5 26% 14 74% 19 ESCNEG 8 30% 19 70% 27 Corynebacterium 8 53% 7 47% 15 Levedura 0 0 1 100% 1 Contaminadas 70 64% 39 36% 109 Sem crescimento 313 90% 35 10% 348 Total 519 359 878 SCN= Staphylococcus sp. Coagulase negativa; ESCPOS= Streptococcus sp. Esculina positivos; ESCNEG= Streptococcus sp. Esculina negativos; CMT= Califórnia Mastitis Test. De uma maneira geral os isolamentos realizados apresentam semelhança com aqueles encontrados na mastite bovina em outras regiões. A variação do nível de infecção pode estar relacionada com os múltiplos fatores de manejo aplicados nos rebanhos estudados. LANGENEGGER et al. (1970) e HARROP et al. (1975), em trabalhos realizados em bacias leiteiras do Rio de Janeiro e de Pernambuco, observaram maior ocorrência nos isolamentos de S. aureus (53,1 e 59,27%) e S. agalactiae (24,7% e 14,1%), respectivamente, em animais com distúrbios lácteos revelados ao exame do CMT. MULLER et al. (1978) observaram uma infecção de 18,3% para S. aureus e 12,8% para bactérias do gênero Streptococcus a partir de amostras de leite com problemas clínicos e subclínicos de mastite. Também NADER FILHO et al. (1985) verificaram índices maiores causados por S. aureus (52,1%) e S. agalactiae (15,5%). Outros autores encontraram índices elevados de microrganismos causadores de mastites, havendo, no entanto, uma diferença nos achados referentes ao gênero Streptococcus. OLIVEIRA et al. (1982), em estudos realizados também em bacia leiteira de Sergipe, detectaram a infecção de 26,1 % de quartos mamários infectados com S. aureus e de 9,4 % com Streptococcus uberis, numa região cuja média de produção era inferior a três litros de leite por vaca ao dia. Os estudos realizados por FERREIRO (1981) na zona da mata de Minas Gerais mos- traram também S. aureus com maior ocorrência (30,49%), seguido pelo Streptococus epidermides (16,09%) e S. agalactiae (11,82%). LANGONI et al. (1991), avaliando 702 amostras de leite, observaram elevados índices dos S. aureus (31,56%) e S. epidermides (30,18%). COSTA et al. (1995), em estudo epidemiológico envolvendo 877 amostras de leite de vacas positivas à mastite clínica, em propriedades dos estados de Minas Gerais e São Paulo, obtiveram os seguintes achados: 34,09% para Staphylococcus sp.; 28,05% para Streptococcus sp. e 21,77% para Corynebacterium. BRITO et al. (1999), em testes realizados em Minas Gerais, verificaram uma infecção de 31,6% para o gênero Staphylococcus, sendo S. aureus com 19,2%. S. agalactiae foi encontrado em 6,9% de um total de 13,09% do gênero Streptococcus. Na Tabela 2 são apresentados os resultados microbiológicos comparados às reações positivas e negativas do CMT. Embora se observe um padrão elevado de relação entre o CMT (reações incompleta e positiva) e os testes laboratoriais, no caso de S. aureus de 70,9% e de S. agalactiae de 80,6%, essa relação nem sempre foi alta, considerando-se o elevado índice microbiológico em relação ao CMT negativo, principalmente quando se tratou de microrganismos com baixo número de isolamento e identificação. Estudos realizados por BRITO et al. (1999) apresentaram resultados com certa semelhança por microrganismo identificado, embora estes autores tenham trabalhado com um número

230 OLIVEIRA, A. A. de et al. de amostras mais elevado. A média de relação do CMT/identificação laboratorial foi de 71%, idêntico aos achados de COSTA et al. (1996). Neste caso é de fundamental importância que este teste seja incorporado aos sistemas produtivos, graças a sua eficácia na detecção da mastite subclínica. CONCLUSÕES A ocorrência da infecção subclínica de mastite pode ser considerada alta, tanto pelo método CMT quanto pelo microbiológico. O exame CMT mostrou-se importante no diagnóstico presuntivo, exigindo, no entanto, uma análise microbiológica periódica do rebanho, principalmente em decorrência do registro de S. aureus, SCN e S. agalactiae, que apresentaram frequência mais elevada. REFERÊNCIAS BECK, H. S.; WISE, W. S.; DODD, F. H. Cost benefit analysis of bovine in the UK. Journal of Dairy Research, v. 59, p. 449-460, 1992. BRAND, A; KNOTTENBELT, D. C.; HILL, F.W.G. An integratede udder health programme for dairy herds. The Veterinary Annual, v. 28, p. 49-55, 1988. BRITO, J.R.F.; BRITO, M.A.V.P. Produção científica brasileira sobre mastite bovina. In: BRITO, J.R.F.; BRESSAN, M. (Ed.). Controle integrado da mastite bovina. Juiz de Fora: Embrapa/CNPGL, 1996. p. 68-96. BRITO, M.A.V.P.; BRITO, J.R.F.; RIBEIRO, VEIGA, V. M. O. Padrão de infecção intramamária em rebanhos leiteiros: exame de todos os quartos mamários das vacas em lactação. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, Belo Horizonte, v.1, n. 2, p. 1-10, 1999. COSTA, B.O.; MELVILLE, P.A.; RIBEIRO, A.R.; VIANI, F. C.; OLIVEIRA, P.J. Mastite bovina: CMT versus microbiológico. A Hora Veterinária, v. 15, p. 53-54, 1996. COSTA, E. O.; BENITES, N. R.; MELVILLE, P. O.; PAR- DO, R. B.; RIBEIRO, O. R.; WATANABE, E. T. Estudo etiológico da mastite clínica bovina. Revista Brasileira de Medicina Veterinária, v.17, n. 4, p. 156-158, 1995. FERREIRO, L. Mastite bovina: causas e conseqüências na produção e qualidade do leite do gado mestiço da microrregião de Juiz de Fora, MG. Coronel Pacheco: Embrapa- CNPGL, 1981. 8 p. (Embrapa CNPGL. Circular Técnica, 3). HARROP, M. H. V.; PEREIRA, L. J. G.; BRITO, J. R. F.; MELLO, A. M. B. Incidência de mastite bovina na bacia leiteira da zona do agreste meridional de Pernambuco. Pesquisa Agropecuária Brasileira, Série Veterinária, v. 10, p. 65-67, 1975. LANGENEGGER, J.; COELHO, N. M.; LANGENEGGER, C. H.; CASTRO, R. P. Estudo da incidência da mastite bovina na bacia leiteira do Rio de Janeiro. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v. 5, p. 437-440, 1970. LANGONI, H.; PINTO, M.P.; DOMINGUES, P. F.; LIS- TONI, F.J.P. Etiologia e sensibilidade bacteriana da mastite bovina subclínica. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, v. 43 n. 6, p. 507-515, 1991. MULLER, E. E.; HUMMING NETO, O.; SOUZA JÚNIOR, J.M.; MARQUES, F. A. C.; MACUCO, A.L.; GIACO- METTI, W. D. Estudo da prevalência da mastite bovina. SEMINA, v.1. n. 1, 1978. MARKUSFELD, O. Epidemiological methods in integrated herd health programs. Acta Veterinaria Scaninovica. Suppl., v. 89. p.61-67, 1993. NADER FILHO, A.; SCHONCKEN-ITURRINO, R.P.; ROSSI JÚNIOR, O.D.; CEMBRANELLI, E. M. Prevalência e etiologia da mastite bovina na região de Ribeirão Preto, São Paulo. Pesquisa Veterinária Brasileira, v. 5, n. 2, p. 53-56,1985. OLIVEIRA, A.A.; PEDREIRA, P.A.S.; ALMEIDA, M.F.S. Determinação da mamite bovina nas regiões leiteira do Estado de Sergipe. Aracaju: Embrapa-UEPAE, 1982. 4 p. (Embrapa-UEPAE de Aracaju). PEREIRA, A R.; MACHADO, P. F.; SARRÍES, G. A. Contagem de células somáticas e características produtivas de vacas da raça holandesa em lactação. Science Agrícola, v. 58, n. E, p.1-1- 2, 2001. PHILPOT, W. N.; NICKERSON, S. C. Mastitis: counter attack. Naperville: Babson Bros., 1991. 150 p. RADOSTITS, O.M.; GAY, C.C.; HINCHCLIFF, K.W; CONSTABLE, P.D. Veterinary medicine: a textbook of the diseases of cattle, horses, sheep, pigs and goats. 10 nd ed.. Philadelphia: Saunders Elsevier, 2007. 2156 p. Protocolado em: 27 set. 2007. Aceito em: 15 ago. 2008.