Artigo Cultive sua saúde através das plantas medicinais: uma experiência na Unidade de Saúde Monte Fátima Terezinha Pelachini Farias (fatimapelachini@gmail.com), Adriana da Paz Mendonça, Thiago Cherem Morelli. Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis Resumo A Educação Popular em Saúde realizada através de integração entre comunidade, unidade de saúde e parcerias constitui-se num processo coletivo de aprendizado proporcionando o crescimento integral dos envolvidos e estabelece a relação dialética da teoria e prática e promove o pensamento crítico sobre a realidade. O Grupo de Plantas Medicinais da Unidade de Saúde Monte Cristo desenvolve encontros e estudos de plantas medicinais reunindo profissionais da unidade, comunidade e parceiros como o projeto Revolução dos Baldinhos e a ONG CEPAGRO. Tem como objetivo o resgate do saber popular e promover o uso das plantas medicinais como recurso terapêutico de forma segura e eficaz. Dentre os resultados destacamos a formação de um grupo consistente e o aprofundamento do conhecimento sobre as plantas medicinais, bem como a sensibilização da Unidade de Saúde e dos seus profissionais. Palavras-chave: Saúde, Educação em Saúde, Plantas Medicinais Conhecendo A Experiência Pensar e discutir sobre a educação em saúde como instrumento de ação dos profissionais que fazem parte da Equipe Saúde da Família na Atenção Primária é uma prática sempre atual, que não se esgota em si e se traduz num contexto de trabalho ao qual, enquanto profissionais e educadores estamos inseridos. Acrescentar e poder partilhar de ideias e ideais no campo da educação e saúde fortalece o sentido participativo, reforçando especialmente o processo de internalização do conhecimento através da realidade vivenciada por todos envolvidos. O presente trabalho relata a experiência da Unidade de Saúde do Monte Cristo do Município de Florianópolis/SC no processo de Educação Popular em Saúde que envolve o conhecimento e resgate das Plantas Medicinais como recurso terapêutico eficaz na prática e no cotidiano da Unidade de Saúde bem como estabelece relação com a comunidade e ONGs. Este trabalho desenvolvido com as plantas medicinais reúne um processo coletivo que integra as Equipes de Saúde da Família da Unidade, a comunidade e a parceria com Projeto Revolução dos Baldinhos e CEPAGRO (Centro de Estudos e Promoção da Agricultura de Grupo). O bairro Monte Cristo está localizado na porção continental do município de Florianópolis, às margens da rodovia SC 282. Considerada como uma comunidade de risco social tem como característica populacional grande número de pessoas de baixa renda e migradas de municípios do interior de Santa Catarina e de outros estados brasileiros. 50
A educação em saúde constitui-se num processo coletivo de aprendizado proporcionando o crescimento integral dos envolvidos. Estabelece a relação dialética da teoria e prática e promove o pensamento crítico sobre a realidade. Ninguém educa ninguém, ninguém se educa a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo 1. Conforme Alves 2, dentre os modelos de educação em saúde, o modelo dialógico conforma-se à proposta da integralidade uma vez que favorece o reconhecimento dos usuários enquanto sujeitos portadores de saberes sobre o processo saúde-doença-cuidado e de condições concretas de vida. Nesta mesma direção, este modelo contribui para uma apreensão mais abrangente das necessidades de saúde dos sujeitos e na humanização da ação educativa, tornando-as mais sensíveis a seus destinatários. No Brasil, cerca de 82% da população brasileira utiliza produtos à base de plantas medicinais nos seus cuidados com a saúde 3. Ignorar esse conhecimento é desrespeitar o saber popular e não reconhecer o potencial das plantas medicinais como recurso terapêutico eficaz e seguro. A Política de Práticas Integrativas e de Plantas Medicinais do Ministério da Saúde 4 proporciona e estabelece uma relação horizontal no conhecimento, valorizando e permitindo uma ação conjunta e integrada com os elementos chaves neste processo de promoção da saúde. Estabelece troca de experiências e conhecimento entre os integrantes da equipe e desses com o saber popular. Tal política tem por objetivo incorporar e implementar as Práticas Integrativas e Complementares no SUS, na perspectiva da prevenção de agravos e da promoção e recuperação da saúde, com ênfase na atenção primária, voltada ao cuidado continuado, humanizado e integral em saúde; e garantir à população brasileira o acesso seguro e o uso racional de plantas medicinais e fitoterápicos. Historicamente, na Unidade de Saúde do Monte Cristo, com alguns profissionais que já trabalharam na Unidade havia a proposta de constituir um grupo e horto de plantas medicinais em conjunto com a comunidade. A partir da implementação da Política de Práticas Integrativas na Secretaria Municipal de Saúde foram realizadas as oficinas de plantas medicinais em 2012 e 2013 com a comunidade com a participação de membros da Comissão de Práticas Integrativas da Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis. Ao final do ano de 2013 houve a integração e parceria dos trabalhos com projeto Revolução do Baldinhos e CEPAGRO. Diante da necessidade de estabelecer vínculo de compromisso e corresponsabilidade com a população foi criado e concretizado o Grupo de Plantas Medicinais - Cultive sua saúde através das plantas medicinais (Foto I e II). O grupo tem como objetivo proporcionar a compreensão e o conhecimento sobre o conceito ampliado de saúde, plantas medicinais e cuidado, bem como integrar comunidade do Monte Cristo com o Centro de Saúde, ampliar a utilização das plantas medicinais como recurso terapêutico eficiente e eficaz, desenvolver um horto de plantas medicinais didático na Unidade para divulgação aos pacientes e servir como um espaço de real promoção de saúde e interação social entre os indivíduos. 51
Cultive sua saúde através das plantas medicinais: uma experiência na Unidade de Saúde Monte Foto 1 Grupo de Plantas medicinais do CS Monte Cristo Foto 2 Grupo de Plantas medicinais do CS Monte Cristo A iniciativa deste trabalho com Plantas medicinais e constituição do horto didático iniciou há aproximadamente um ano e meio. São realizados encontros mensais com a participação em média de 20 a 25 pessoas, entre profissionais, Agentes Comunitários de Saúde, integrantes do projeto Revolução dos Baldinhos, CEPAGRO e comunidade. Nos encontros há o estudo aprofundado de 4 plantas medicinais diferentes (Foto III). 52
Foto 3 Momento de estudo das Plantas Medicinais Grupo do CS Monte Cristo Neste processo de desenvolvimento do conhecimento, são envolvidos os diferentes saberes na identificação da planta medicinal, suas características e especificidades, indicações, efeitos e toxicidade, modo de uso e dosagem. As plantas medicinais são escolhidas e trazidas in natura como mudas pelos próprios participantes do grupo. Após o estudo das plantas medicinais, iniciam as atividades práticas como o desenvolvimento do canteiro e plantio das mudas (Foto IV). Para tanto, são fornecidos terra e adubo pelos integrantes do projeto Revolução dos Baldinhos. Neste momento do plantio se reforça aspectos agronômicos das plantas. Também é realizado um lanche coletivo, com alimentos saudáveis e o acompanhamento de um chá. 53
Foto 4 Momento do Plantio das mudas de Plantas Medicinais Foram realizados encontros de organização e discussão do grupo e encontros de estudos e aprofundamento sobre as plantas medicinais. Foram plantadas 18 espécies diferentes. Estes canteiros possibilitam a identificação das plantas medicinais com os usuários que são atendidos pela Unidade de Saúde e comunidade. Foi realizado também visita do grupo à experiência da Pastoral da Saúde e Associação Vida Verde no Saco Grande/Florianópolis. São muitos os resultados obtidos pelo grupo, sendo que cada participante deixa um pouco de si e de sua história neste processo. Após um ano de trabalho, os relatos dos pacientes e profissionais da saúde, bem como a formação de um grupo sólido comprovam os resultados positivos do grupo. Revela-se por parte de todos os envolvidos um trabalho de parceria, que passa por uma relação interativa, dialógica com o outro sujeito na compreensão de responsabilidades e na construção do conhecimento integral. Os resultados a serem ressaltados são: o processo educativo como ponto de partida de conquista e interiorização do conhecimento, o fortalecimento das relações dos que integram o projeto; as parceiras 54
estabelecidas com a ONG CEPAGRO e com Revolução dos Baldinhos; os estudos desenvolvidos das plantas medicinais; as respostas na promoção da saúde dos participantes no uso das plantas medicinais com mais segurança segundo relatos informais dos próprios participantes; o diálogo estabelecido entre comunidade e Centro de Saúde e o horto didático de plantas medicinais. O despertar do interesse por parte das Equipes de Saúde da Família com relação ao uso das plantas medicinais e a utilização do horto para orientação dos pacientes sobre as plantas. Dentro desse processo, a construção desse saber aliado à prática de educação popular redimensiona a lógica biomédica de atuação dos profissionais da saúde. 5 Não em um sentido de romper com o conhecimento médico clínico tradicional, mas em um direcionamento para uma nova prática em saúde que seja humanizada, crítica, reflexiva e que atue compreendendo os indivíduos de maneira integral, respeitando o saber popular. 6 Muitos são os desafios na concretização de um trabalho que carrega em seu cerne a paixão por esta didática que permite a formação do pensar, do interagir e de futuros cidadãos possuidores de um conhecimento vivenciado e que possibilita a análise crítica e uma consciência transformadora. O grupo de Plantas Medicinais do Monte Cristo é um caminho no resgate do saber popular por parte da Atenção Primária em Saúde e de seu papel transformador na sociedade. Referências 1. Freire, Paulo. Conscientização: teoria e prática da libertação uma introdução ao pensamento de Paulo Freire. São Paulo: Moraes, 1980. 2. Alves VS. Um modelo de educação em saúde para o Programa Saúde da Família: pela integralidade da atenção e reorientação do modelo assistencial. Interface ComuM Saúde Educ. 2004. 3. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Práticas integrativas e complementares: plantas medicinais e fitoterapia na Atenção Básica/Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Brasília : Ministério da Saúde, 2012. 156 p. : il. (Série A. Normas e Manuais Técnicos) (Cadernos de Atenção Básica ; n. 31) 4. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no SUS - PNPIC-SUS / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. - Brasília : Ministério da Saúde, 2006. 92 p. - (Série B. Textos Básicos de Saúde) 5. Cutulo LRA. Estilo de pensamento em educação médica: um estudo do currículo do curso de graduação em medicina da UFSC. [Tese]. Florianópolis: CCE-Universidade Federal de Santa Catarina; 2001. 6. Da Ros MA. A ideologia nos cursos de medicina. In: Marins JJN, Rego S, Lampert JB, Araújo JGC (Orgs.). Educação médica em transformação: instrumentos para a construção de novas realidades. São Paulo: Hucitec, 2004. p. 224-244. 55