A INTERNALIZAÇÃO DOS TRATADOS INTERNACIONAIS NA LEGISLAÇÃO INTERNA DO BRASIL



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Transcrição:

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO A INTERNALIZAÇÃO DOS TRATADOS INTERNACIONAIS NA LEGISLAÇÃO INTERNA DO BRASIL VALDIR JOSÉ DA SILVA FILHO Itajaí (SC), novembro de 2008.

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO A INTERNALIZAÇÃO DOS TRATADOS INTERNACIONAIS NA LEGISLAÇÃO INTERNA DO BRASIL VALDIR JOSÉ DA SILVA FILHO Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientadora: Professora MSc. Márcia Sarubbi Lippmann Itajaí, 21 de novembro de 2008.

AGRADECIMENTO A todos que contribuíram à realização deste trabalho, do singelo ao mais diligente aporte.

DEDICATÓRIA Consagro este trabalho a todos que possam se beneficiar da pesquisa doravante desempenhada.

TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo. Itajaí, 21 de novembro de 2008. VALDIR JOSÉ DA SILVA FILHO Graduando

PÁGINA DE APROVAÇÃO A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí UNIVALI, elaborada pelo graduando Valdir José da Silva Filho, sob o título A Internalização dos Tratados Internacionais no Direito Interno do Brasil, foi submetida em 21 de novembro de 2008 à banca examinadora composta pelas seguintes professoras: Márcia Sarubbi Lippmann (Presidente), Queila Jaqueline Nunes Martins (Examinadora), e aprovada com a nota ( ). Itajaí, 21 de novembro de 2008. Professora MSc. Márcia Sarubbi Lippmann Orientadora e Presidente da Banca Professor MSc. Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia

ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS Carta Magna Constituição da República Federativa do Brasil CC/1916 Código Civil Brasileiro de 1916 CC/2002 Código Civil Brasileiro de 2002 CDI CIJ CF CRFB/88 DI DIP DIPr EC LC LICC ONU STF STJ TJ Comissão de Direito Internacional Corte Internacional de Justiça Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 Direito Internacional Direito Internacional Público Direito Internacional Privado Emenda Constitucional Lei Complementar Lei de Introdução ao Código Civil Organização das Nações Unidas Supremo Tribunal Federal Superior Tribunal de Justiça Tribunal de Justiça

ROL DE CATEGORIAS Rol de categorias que o Autor considera estratégicas à compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais. Direito Internacional É o direito que tem por objetivo a solução das questões de caráter internacional, assim ditas por que nelas há interesse de pessoas (físicas ou jurídicas) de países diferentes. Definem-no, assim, como o conjunto de princípios e regras concernentes aos interesses superiores da sociedade humana, na interdependência dos Estados. Pertence ao ramo do Direito, dito de externo. 1 Direito Internacional Privado O Direito Internacional Privado dedica-se à disciplina que estuda o conflito de leis no espaço 2, compreende-se pelo complexo de preceitos reguladores das relações de ordem privada da sociedade internacional. 3 Direito Internacional Público Fundado nos tratados ou nos usos internacionais, ordena as relações entre Estados e organizações internacionais. 4 Ordenamento jurídico nacional É um conjunto de normas jurídicas que mantém relações particulares entre si. 5 1 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. Atual. Nagib Slaibi Filho e Gláucia Carvalho. 24.ed. Rio de Janeiro, 2004. p.472. 2 AMORIM, Edgar Carlos de. Direito Internacional Privado. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p.5. 3 SILVA, op. cit., p.472. 4 REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público: curso elementar. 8.ed. Ver. E atual. São Paulo: Saraiva, 2008. p.3.

Tratado Internacional Tratado significa um acordo internacional regido pelo Direito Internacional e celebrado por escrito. 6 5 BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico. Tradução de Maria Celeste C. J. Santos. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1999. p.31. 6 Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados entre Estados e Organizações Internacionais ou entre Organizações Internacionais, de 21 de maio de 1986. Disponível em : http://www2.mre.gov.br/dai/dtrat.htm. Acesso: 06 de agosto de 2008.

SUMÁRIO RESUMO... XI INTRODUÇÃO... 1 CAPÍTULO 1... 3 DO DIREITO INTERNACIONAL... 3 1.1 TERMINOLOGIA... 3 1.2 HISTÓRIA... 4 1.2.1 ANTIGÜIDADE... 4 1.2.2 IDADE MÉDIA... 6 1.2.3 IDADE MODERNA... 7 1.2.4 IDADE CONTEMPORÂNEA... 8 1.3 NATUREZA DA NORMA JURÍDICA INTERNACIONAL... 9 1.4 FUNDAMENTO... 10 1.5 RELAÇÃO ENTRE O DI E O DIREITO INTERNO... 11 1.5.1 DUALISMO EXTREMADO E DUALISMO MODERADO... 11 1.5.2 MONISMO COM SUPREMACIA DO DI... 12 1.5.3 MONISMO COM SUPREMACIA DO DIREITO INTERNO... 13 1.6 PERSONALIDADE INTERNACIONAL... 13 1.6.1 ESTADOS... 14 1.6.2 RECONHECIMENTO DE ESTADO E DE GOVERNO... 14 1.6.3 ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS... 16 1.7 FONTES... 16 1.7.1 TRATADOS... 17 1.7.2 COSTUME... 18 1.7.3 PRINCÍPIOS GERAIS DE DIREITO... 19 1.7.4 ATOS UNILATERAIS... 20 1.7.5 DECISÕES DAS ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS... 20 1.8 DOMÍNIO PÚBLICO INTERNACIONAL... 21 CAPÍTULO 2... 23 DOS TRATADOS E CONVENÇÕES INTERNACIONAIS... 23 2.1 CONCEITO... 23 2.2 TERMINOLOGIA... 25 2.3 CLASSIFICAÇÃO DOS TRATADOS... 25 2.4 CONDIÇÕES DE VALIDADE DOS TRATADOS... 28 2.4.1 CAPACIDADE DAS PARTES CONTRATANTES... 28 2.4.2 HABILITAÇÃO DOS AGENTES SIGNATÁRIOS... 29 2.4.3 CONSENTIMENTO MÚTUO... 33 2.4.4 OBJETO LÍCITO E POSSÍVEL... 34 2.5 EFEITOS DE TRATADO SOBRE TERCEIROS ESTADOS... 35

2.6 RATIFICAÇÃO, ADESÃO E ACEITAÇÃO DE TRATADO... 37 2.7 REGISTRO E PUBLICAÇÃO DE TRATADO... 39 2.8 INTERPRETAÇÃO DE TRATADOS... 40 2.9 APLICAÇÃO DE TRATADOS SUCESSIVOS SOBRE A MESMA MATÉRIA... 42 2.10 NULIDADE, EXTINÇÃO E SUSPENSÃO DE APLICAÇÃO DE TRATADOS... 43 2.10.1 NULIDADE... 44 2.10.2 EXTINÇÃO E SUSPENSÃO DE APLICAÇÃO DE TRATADOS... 45 CAPÍTULO 3... 47 A INTERNALIZAÇÃO DOS TRATADOS INTERNACIONAIS NA LEGISLAÇÃO INTERNA DO BRASIL... 47 3.1 RETROSPECTO DOS POSICIONAMENTOS ADOTADOS PELO BRASIL... 47 3.2 A INTERNALIZAÇÃO DOS TRATADOS INTERNACIONAIS... 52 3.3 CONTEXTUALIZAÇÃO DOS TRATADOS INTERNACIONAIS NO ORDENAMENTO JURÍDICO INTERNO DO BRASIL... 57 3.3.1 OS TRATADOS INTERNACIONAIS SOB VISTA DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL... 58 3.3.2 A HIERARQUIA DO TRATADO INTERNACIONAL NA LEGISLAÇÃO INTERNA DO BRASIL... 61 3.3.3 TRATADOS INTERNACIONAIS DE NATUREZA TRIBUTÁRIA... 62 3.3.4 TRATADOS INTERNACIONAIS DE NATUREZA DE DIREITOS HUMANOS... 63 CONSIDERAÇÕES FINAIS... 66 REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS... 68

RESUMO O direito internacional, através dos tratados internacionais, cada vez mais influencia as decisões Estatais seja no âmbito interno ou externo. Cooperação mútua, busca pela uniformização de regras de direitos ou deveres entre países com celebração de tratados multilaterais. Acordos de um ramo de comércio exterior entre dois Estados por meio de tratados bilaterais. Organizações internacionais, que num passado não longínquo não eram capacitadas a celebrar tratados. Enfim, são várias as formas que o direito internacional se manifesta em nosso diaa-dia. Ao passo que para ter força legislativa interna, e assim, o tratado internacional fundamentar decisões no âmbito doméstico do país signatário, há se de respeitar normas nacionais que positivam o modo pelo qual o tratado internacional é internalizado no ordenamento jurídico interno. É neste foco que o presente estudo tem como objetivo investigatório elucidar, através de análise legislativa, jurisprudencial e doutrinária, a internalização dos tratados internacionais no direito interno do Brasil, começando pela origem do direito internacional, com subseqüente análise dos tratados internacionais, para compreender-se de maneira contextualizada como e por que é assim procedida a internalização dos tratados internacionais no ordenamento jurídico interno do Brasil. O objetivo institucional é a obtenção do Título de Bacharel em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí UNIVALI.

INTRODUÇÃO O presente estudo monográfico tem por objeto a internalização dos tratados internacionais no ordenamento jurídico do Brasil. Objetiva-se contextualizar o tratado internacional na legislação interna brasileira - da origem à positivação -, bem como examinar sua força normativa perante a legislação interna. Para tanto, principia se, no Capítulo 1, breve abordagem sobre o Direito Internacional, sua origem, divisão, natureza jurídica, fontes e características. No Capítulo 2, estudar-se-á a principal fonte do direito internacional: os tratados e as convenções internacionais, para angariar o embasamento legal necessário ao estudo da internalização dos tratados no ordenamento jurídico brasileiro no capítulo subseqüente. No Capítulo 3, tratar-se-á efetivamente do processo de internalização dos tratados internacionais no ordenamento interno do Brasil, isto é, após analisar o direito internacional, conhecer sua principal fonte, o tratado internacional; este será introduzido ao ordenamento jurídico nacional, isto é, estudar-se-á como é transposta a norma externa no âmbito doméstico. Encerrar-se-á a monografia com as Considerações Finais, na qual serão apresentados os pontos conclusivos destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre a internalização dos tratados internacionais na legislação interna brasileira. seguintes hipóteses: Para a presente monografia foram levantadas as

2 O Brasil adota a teoria monista para suas relações entre direito internacional e direito interno. O tratado internacional passa a vigorar no plano interno a partir da assinatura. O tratado internacional pode possuir tanto força de lei ordinária quanto de lei complementar. Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase de Investigação foi utilizado o Método Indutivo, na Fase de Tratamento de Dados o Método Cartesiano, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente Monografia é composto na base lógica Indutiva. Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa Bibliográfica.

CAPÍTULO 1 DO DIREITO INTERNACIONAL 1.1 TERMINOLOGIA O Direito Internacional, conjunto de princípios e regras concernentes aos interesses superiores da sociedade humana, na interdependência dos Estados 1, já recebeu, ao longo de sua história, diversas terminologias. A começar pelos romanos, que utilizavam a expressão ius gentium (do latim direito das gentes ou direito dos povos ), por Isidoro de Sevilha e Samuel Pufendorf. O termo utilizado por Francisco de Vitória era ius inter gentes (do latim direito entre as gentes ou entre os povos ). 2 A expressão international law foi usada por Jeremy Bentham, em sua obra "An Introduction to the Principles of Morals and Legislation", que, quando lançada na França, a tradução que o francês Étienne Dumont usou foi droit international, que por sua vez influenciou diversas traduções subseqüentes, até mesmo a adotada no Brasil: Direito Internacional". 3 O Direito Internacional divide-se em público e privado, sendo que o Direito Internacional Privado dedica-se à disciplina que estuda o conflito de leis no espaço 4, já o Direito Internacional Público, 1 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. Atual. Nagib Slaibi Filho e Gláucia Carvalho. 24.ed. Rio de Janeiro, 2004. p.472. 2 MONSERRAT FILHO, José. O que é direito internacional. 3.ed. São Paulo: Brasiliense, 1986. p.18. 3 MONSERRAT FILHO, op. cit., p.18. 4 AMORIM, Edgar Carlos de. Direito Internacional Privado. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p.5.

4 muitas vezes sinônimo da terminologia Direito Internacional, ordena as relações entre Estados 5. O presente estudo monográfico ater-se-á tão somente ao Direito Internacional Público, notadamente por ser esta a divisão do Direito Internacional que engloba o estudo dos Tratados Internacionais. 1.2 HISTÓRIA Aos olhos da doutrina: O direito internacional é tão antigo quanto à civilização em geral: ele é uma conseqüência necessária e inevitável de toda a civilização. 6 A citação em epígrafe norteia que o direito internacional surge paralelo ao desenvolvimento das civilizações. Neste sentido, à medida que na antiguidade, tribos e clãs de povos diferentes começaram a se civilizar, tão logo surgiram às primeiras aparições do ius inter gentes. De acordo como as civilizações ficavam mais complexas, também suas relações externas tornaram-se, e o direito as acompanhou. 1.2.1 Antigüidade O direito internacional não possui marco inicial reconhecido por unanimidade pelos estudiosos deste ramo do direito. Há quem se baseie no tratado mais antigo registrado: o celebrado entre Lagash e Umma, cidades da Mesopotâmia, relativo à fronteira comum, ou o tratado conhecido como o mais famoso da Antigüidade remota: o de Kadesh, concluído entre Ramsés II do Egito e Hatusil III dos hititas no século XIII a.c. 7 5 REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público: curso elementar. 8.ed. Ver. E atual. São Paulo: Saraiva, 2008. p.3. 6 SEITENFUS, Ricardo. Introdução ao Direito Internacional Público. Ricardo Seitenfus, Deisy Ventura. 3.ed. Ver. Ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003. p.21. 7 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. 2.ed. São Paulo: LTr, 2004. p.55.

5 O doutrinador Almicar de Castro 8 preceitua que a Roma Antiga, ao longo de quase toda a sua história, não se considerava sujeita a um direito internacional distinto do seu direito interno, o que se explica pelo predomínio da chamada Pax romana: Em direito romano não se encontra indício desse ramo do direito, conquanto a apreciação dos fatos anormais se operasse por forma diversa da que era reservada aos fatos formais. Os romanos, a princípio, só reconheciam como positivo o seu ius civile. O direito romano era civil, no sentido tradicional deste adjetivo: só se destinava a cidadãos romanos. O ius gentium, que alguns apontam como indício de um direito internacional romano, era, na essência, um direito romano aplicado a estrangeiros por um magistrado romano, o pretor peregrino. 9 Segundo indica o estudioso He Moon Jo 10, o direito internacional surgiu na Europa, em suas palavras: [...] a opinião que prevalece no estudo do DI é a de que este surgiu na Europa, no período seguinte à Paz de Vestfália (the Peace of Westphalia, 1648), que pôs fim à Guerra dos Trinta Anos (Thirty Years War). Não obstante o doutrinador José Dalmo 11 assim reza: Afirmaram os internacionalistas, durante três séculos, haver o Direito das Gentes sido criado por Hugo Grócio, em 1625, com a publicação do seu tratado De Jure Belli ac Pacis. Brown Scott provou, muito depois, que essa paternidade cabia ao Padre Franceiso Vitória e dataria de 1539: leitura 8 CASTRO, Amilcar de. Direito Internacional Privado. 6.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p.107. 9 CASTRO, op. cit., p.107. 10 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. 2.ed. São Paulo: LTr, 2004. p.55. 11 MATOS, José Dalmo Fairbanks Belfort de. Manual de direito internacional público. São Paulo: Saraiva: EDUC, 1979. p.27.

6 da Relectio de Potestate Civile, proferida na Universidade de Salamanca. É notória a diversidade de correntes que empregam o marco inicial do direito internacional a diversos fatos e pessoas, sendo improvável filiar-se a uma corrente e desprezar a outra, mesmo porque não é este o foco do presente estudo. Neste sentido, resta compreender os motivos de cada doutrina. 1.2.2 Idade Média Com a crescente expansão dos transportes marítimos, a Idade Média presenciou o desenvolvimento da Igreja Católica, a qual conseguiu este feito justamente pelo fato de ter o transporte marítimo se maximizado, o que formou uma comunidade católica na Europa. 12 A grande influência da igreja contribuiu para o desenvolvimento do direito internacional. A arbitragem das relações internacionais era feita pelo papa, e este poderia até mesmo autorizar um Chefe de Estado a não cumprir um tratado, como indica o doutrinador Joaquim da Silva Cunha 13 : O poder era exercido pelo monarca e pelo papa numa comunidade cristã, misturando-se, em perfeita combinação, política e religião. Alguns dos marcos mais importantes deste período foram, dentre outros, o desenvolvimento de regras que disciplinam o direito de paz e direito de guerra, o conceito de guerra justa e guerra injusta, a limitação das atividades não-humanitárias na guerra, algumas regras sobre tratados e arbitragem, regras de diplomacia como função de diplomatas e sistema de consulado. Os principais contribuintes para estes 12 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. 2.ed. São Paulo: LTr, 2004. p.55. 13 CUNHA, Joaquim da Silva. Direito Internacional Público: Introdução e Fontes. 5.ed. Coimbra: Almedina, 1993. p.103.

7 conceitos foram Santo Ambrósio, Santo Agostinho e São Tomás de Aquino. 14 Dois pontos nascidos sob o foco das novas regras era que os tratados medievais eram garantidos com a troca de reféns, e a primeira missão diplomática de caráter permanente foi estabelecida por Milão e Florença. 1.2.3 Idade Moderna O eminente jurista He Moon Jo 15 reza que foram vários os acontecimentos que contribuíram para uma nova visão do direito internacional: Ao fim da Idade Média, a sociedade internacional encontrava-se em meio a mudanças marcantes, como a Renascença, a desintegração de religiões, a descoberta dos novos continentes e a revolução industrial. Os eventos acima citados motivaram a queda do sistema medieval e a diminuição do poder do papa. No período da Idade Moderna surgiu o direito internacional tal como conhecemos hoje. Novas noções de Estado nacional e soberania estatal, conceituadas pelo tratado Paz de Vestfália, em 1648, que resultou em Estados reconhecendo seu próprio direito como o maior na hierarquia, tornando-os soberanos, e, a Europa começara a adotar uma organização política baseada na idéia de que a cada nação corresponderia um Estado (Estado-nação). 16 Neste sentido, o jurista Hildebrando Accioly afirma que: 14 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. 2.ed. São Paulo: LTr, 2004. p.56. 15 JO, op. cit., p.56. 16 Texto em inglês in (http://www.hillsdale.edu/dept/history/documents/war/17e/1648- westphalia.htm). Acesso em 06 de agosto de 2008.

8 [...] a rigor, só se pode falar em direito internacional a partir dos tratados de Vestfália ou da obra de Hugo Grocius. 17 Uns dos principais teóricos do período moderno são Francisco de Vitória e Hugo Grócio, este último que se baseava na teoria do direito natural. Sua principal obra jurídica Do direito da guerra e da paz" teve grande importância no desenvolvimento da noção de Guerra Justa. 18 1.2.4 Idade Contemporânea O período da Idade Contemporânea foi inaugurado pela Revolução Francesa, quando fora enfatizado o conceito de nacionalidade. A influência do papa já houvera enfraquecido, visto que seus poderes passaram a não serem mais conhecidos como divinos. Deuse início a um período de fortes reivindicações populares. O Congresso de Viena em 1815 foi um importante impulso para o direito internacional, na medida em que apontou na direção da internacionalização de grandes rios, declarou a neutralidade perpétua da Suíça, pela primeira vez adotou uma classificação para os agentes diplomáticos e proibiu o tráfico de negros. 19 Começava a surgir o DI moderno, a criação dos primeiros organismos internacionais com vistas à regular assuntos transnacionais, a proclamação da Doutrina Monroe e a primeira das Convenções de Genebra, dentre inúmeras outras iniciativas. 20 O século XX foi palco de grandes acontecimentos no DI, agora moderno. Foram criados vários organismos internacionais, como 17 ACCIOLY, Hildebrando. Manual do direito internacional público. Hildebrando Accioly, G. E. do Nascimento e Silva. 14.ed. São Paulo: Saraiva, 2000. p.5. 18 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. 2.ed. São Paulo: LTr, 2004. p.56. 19 CASTRO, Amilcar de. Direito Internacional Privado. 6.ed. Rio de Janeiro: Forense. 2005. p.125. 20 JO, op. cit., p.57.

9 a Sociedade das Nações, e posteriormente a Organização das Nações Unidas, a codificação do DI com a Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados e a Convenção sobre Direito do Mar, a proliferação de tratados nascidos na necessidade de acompanhar o intenso intercâmbio internacional do mundo contemporâneo. 21 1.3 NATUREZA DA NORMA JURÍDICA INTERNACIONAL A fim de defender as atuações dos Estados nas relações internacionais, insurge-se a teoria da soberania. De acordo com esta teoria política (desenvolvida no século XVI por Jean Bodin [1530-1596] e Thomas Hobbes [1588-1679]) foi ela quem sustentou a formação e a manutenção do Estado Novo nos séculos XVI e XVII. O Estado é dotado de soberania, e esta se manifesta de duas maneiras, segundo o âmbito de aplicação: na vertente interna de aplicação da soberania, o Estado encontra-se acima dos demais sujeitos de direito, constituindo-se na autoridade máxima em seu território. Na vertente externa, por outro lado, o Estado está em pé de igualdade com os demais Estados soberanos que constituem a sociedade internacional. 22 Ambas vertentes, no âmbito de aplicação da soberania do Estado, também acorrem quando da natureza da norma jurídica, no sentido de que se de direito interno ou de direito internacional. No direito interno, a norma emana do Estado ou é por este aprovada, logo, o Estado impõe a ordem jurídica interna e garante a sanção em caso de sua violação. Já no DI, diferentemente, os Estados são juridicamente iguais, portanto não existe uma entidade central e superior ao conjunto de Estados, com a prerrogativa de impor o cumprimento da ordem jurídica internacional e de aplicar uma sanção por sua violação. Neste caso são os próprios Estados que produzem, entre eles, a norma 21 ACCIOLY, Hildebrando. Manual do direito internacional público. Hildebrando Accioly, G. E. do Nascimento e Silva. 14.ed. São Paulo: Saraiva, 2000. p.14. 22 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. 2.ed. São Paulo: LTr, 2004. p.66.

10 jurídica que lhes será aplicada (celebração de um tratado), o que constitui uma relação de coordenação. 23 Discute-se a existência de hierarquia nas normas de direito internacional, ou seja, se uma norma seria superior a outra. No entanto a pesquisa apontou que a grande parte dos estudiosos entende que inexiste hierarquia. Os conceitos de ato ilícito e de sanção existem no DI, mas sua aplicação difere-se do direito interno. Na ausência de uma entidade supra-estatal, a responsabilidade internacional e a conseqüente sanção contra um Estado dependem da ação coletiva dos demais Estados vinculados a norma. 1.4 FUNDAMENTO Existem várias correntes doutrinárias acerca do fundamento do DI, ou seja, a origem da sua obrigatoriedade. Segundo o doutrinador Accioly: [...] para vários conceituados autores o estudo do fundamento não faz parte do direito internacional propriamente dito. Seja como for, ao DIP não interessam os motivos reais, econômicos, políticos, sociológicos ou históricos, mas apenas as razões jurídicas que explicam o motivo de sua aceitação pelo homem. 24 As referidas razões jurídicas mencionadas pelo autor são explicadas por várias doutrinas, sendo que de todas conseguiu-se extrair e dividir duas correntes: voluntaristas e positivistas. A primeira está ligada ao direito positivo, sendo que a obrigatoriedade decorre da 23 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. 2.ed. São Paulo: LTr, 2004. p.66. 24 ACCIOLY, Hildebrando. Manual do direito internacional público. Hildebrando Accioly, G. E. do Nascimento e Silva. 14.ed. São Paulo: Saraiva, 2000. p.16.

11 vontade dos próprios Estados. Já a segunda a obrigatoriedade é baseada em razões objetivas, ou seja, acima da vontade dos Estados. 25 O doutrinador Rezek defende a doutrina identificada no consentimento, tradicionalmente expresso no princípio pacta sunt servanda (em latim, os acordos devem ser cumpridos): um Estado é obrigado no plano internacional apenas se tiver consentido em vincular-se juridicamente. Neste sentido traduz-se que no âmbito de uma organização internacional, por exemplo, os Estados estão obrigados a aceitar uma decisão que lhes for contrária apenas se tiverem acordado previamente esta forma decisória. 26 1.5 RELAÇÃO ENTRE O DI E O DIREITO INTERNO A possibilidade de conflito entre o direito interno de um Estado e o direito internacional, ou seja, qual das duas ordens jurídicas deve prevalecer, é estudada pela doutrina em três teorias 27 : Dualismo extremado ou moderado: o DI e o direito interno são completamente independentes e a validade da norma de um não depende do outro; Monismo com supremacia do DI: a ordem jurídica é uma só, mas as normas de direito interno devem ajustar-se ao DI; e Monismo com supremacia do direito interno: o inverso do anterior. 1.5.1 Dualismo Extremado e Dualismo Moderado Segundo a doutrina dualista: 25 ACCIOLY, Hildebrando. Manual do direito internacional público. Hildebrando Accioly, G. E. do Nascimento e Silva. 14.ed. São Paulo: Saraiva, 2000. p.16. 26 REZEK, José Franciso. Direito Internacional Público: curso elementar. 10.ed. Ver. E atual. São Paulo: Saraiva, 2005. p.3. 27 REZEK, op. cit., p.4.

12 O direito internacional e o direito interno de cada Estado são sistemas rigorosamente independentes e distintos, de tal modo que a validade jurídica de uma norma interna não se condiciona à sua sintonia com a ordem internacional. 28 Ou seja, a norma internacional deve primeiramente ser transformada em norma de direito interno, pelo Estado, incorporando-a ao seu ordenamento jurídico interno. Sendo que o dualismo extremado exige para tanto edição de lei, enquanto o dualismo moderado exige somente aprovação congressional e promulgação. Nesta doutrina não existe a possibilidade de conflito entre DI e direito interno. 1.5.2 Monismo com Supremacia do DI A segunda teoria, formulada por Kelsen, Verdross, Duguit e outros 29, assim como a terceira teoria, do monismo com supremacia do direito interno, não reconhece a existência de duas ordens jurídicas independentes: [...] sustenta a unicidade da ordem jurídica sob o primado do direito internacional, a que se ajustariam todas as ordens internas. Afirmam existir apenas uma única ordem jurídica, na qual o DI é considerado superior ao direito interno. Da mesma forma que a teoria Dualista, não é possível o conflito entre o DI e o direito interno, pois prevalece o DI. 28 REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público: curso elementar. 10.ed. Ver. E atual. São Paulo: Saraiva, 2008. p.4. 29 REZEK, op. cit., p.4.

13 1.5.3 Monismo com Supremacia do Direito Interno Com raízes no hegelianismo 30, esta teoria entende que o Estado é dotado de soberania absoluta e que, portanto, somente se sujeita a um sistema jurídico que emane de si próprio: [...] o direito nacional de cada Estado soberano, sob cuja ótica a adoção dos preceitos do direito internacional aparece como uma faculdade discricionária. O DI seria a continuação do direito interno, aplicado às relações exteriores do Estado. Há possibilidade de conflitos entre a norma interna e externa. desta monografia. A teoria adotada no Brasil estudar-se-á no Capítulo 3 1.6 PERSONALIDADE INTERNACIONAL É sujeito de direito internacional público [...] toda entidade jurídica que goza de direitos e deveres internacionais e que possua a capacidade de exercê-los 31 : os Estados (aqui acrescenta-se a Santa Sé e o Vaticano) e as organizações internacionais. A título de separação de disciplinas, lembra-se que ao direito internacional privado é que pertencem os demais sujeitos: pessoa jurídica de direito público interno, de direito privado e a pessoa física. 32 Tradicionalmente acrescentam-se a Santa Sé e o Vaticano como sujeitos do direito internacional público. Alguns estudiosos afirmam que o indivíduo também seria modernamente um sujeito de DI, 30 REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público: curso elementar. 10.ed. Ver. E atual. São Paulo: Saraiva, 2008. p.4. 31 ACCIOLY, Hildebrando. Manual do direito internacional público. Hildebrando Accioly, G. E. do Nascimento e Silva. 14.ed. São Paulo: Saraiva, 2000. p.64. 32 MATOS, José Dalmo Fairbanks Belfort de. Manual de direito internacional público. São Paulo: Saraiva: EDUC, 1979. p.56.

14 ao argumento de que diversas normas internacionais criam direitos e deveres para as pessoas naturais. 33 1.6.1 Estados Os Estados nacionais são os principais sujeitos de DI, seja do ponto de vista histórico ou funcional, já que é por sua iniciativa que surgem outros sujeitos de DI, como as organizações internacionais. Nas palavras de Hee Moon Jo, O estado é o participante mais ativo nas relações legais internacionais. 34 São elementos indispensáveis à existência do Estado e, em conseqüência, à sua personalidade internacional: população, território, governo e capacidade para manter relações com os sujeitos do direito internacional. Conjunta-se necessariamente a soberania, isto é, o direito exclusivo do Estado de exercer a autoridade política suprema sobre o seu território e sobre a sua população. 35 1.6.2 Reconhecimento de Estado e de Governo O reconhecimento de Estado é um ato unilateral, expresso ou tácito, pelo qual um Estado constata a existência de outro Estado na ordem internacional, dotado de soberania, de personalidade jurídica internacional e dos demais elementos constitutivos do Estado. É indispensável para que o novo Estado se relacione com seus pares na comunidade internacional. 36 33 MATOS, José Dalmo Fairbanks Belfort de. Manual de direito internacional público. São Paulo: Saraiva: EDUC, 1979. p.56. 34 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. 2.ed. São Paulo: LTr, 2004. p.191. 35 GAMA, Ricardo Rodrigues. Introdução ao direito internacional. Campinas: Bookseller, 2002. p.48. 36 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Direito Internacional Público. 8.ed. São Paulo: Biblioteca Jurídica Freitas Bastos, 1986. p.291.