Nº 15906/2013-WM RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº 733059/DF RECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS RECORRIDOS: DISTRITO FEDERAL E INSTITUTO CANDANGO DE SOLIDARIEDADE RELATOR: MINISTRO CELSO DE MELLO / STF Recurso Extraordinário. Instituto Candango de Solidariedade. Contrato de Gestão. Necessidade de licitação prévia. Contratação de pessoal para exercer função típica de servidor público, sem a realização de concurso. Inviabilidade. Ofensa à exigência constitucional e aos princípios que regem a Administração Pública. Pelo provimento da iniciativa. Trata-se de recurso extraordinário, manejado com fulcro na alínea a do permissivo constitucional, contra acórdão proferido pela 5ª Turma Cível do TJDFT, nos seguintes termos: CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL AÇÃO CIVIL PÚBLICA CONTRATO DE GESTÃO INSTITUTO CANDANGO DE SOLIDARIEDADE LEGALIDADE TAXA DE
ADMINISTRAÇÃO PREVISÃO LEGAL RECURSO E REMESSA PROVIDOS. - A legislação atualmente em vigor autoriza, no que se refere às atividades das organizações sociais, a terceirização dos serviços públicos, como medida de exceção aos ditames legais e constitucionais que impõe à Administração o dever de licitar. - Apenas no caso de comprovação induvidosa de desvio de finalidade é possível anular-se o contrato de gestão. - A taxa de Administração tem previsão no Contrato de Gestão e visa cobrir as despesas administrativas do Instituto Candango de Solidariedade, não encontrando qualquer vedação na legislação, pois é tida como remuneração pelos serviços administrativos prestados pela entidade sem fins lucrativos. incisos II e XXI, da Carta Política. Na irresignação, o recorrente sustenta contrariedade ao artigo 37, Vêm os autos para a manifestação do custos legis. Prima facie, há que se ter por positivo o juízo de admissibilidade deste extraordinário, porquanto assentes a tempestividade, o prequestionamento, a legitimidade e o interesse recursais. A alegação de desrespeito ao cânone constitucional, por sua vez, reflete densidade 1, pois o debate projeta-se sobre a concreção dos princípios da legalidade e moralidade administrativa. Igualmente presente a repercussão geral, já que a controvérsia traz questão relevante do ponto de vista coletivo, qual seja, a celebração de contratos de 1 Ofensa reflexa ao texto constitucional?. Jus Navigandi, Teresina, ano 14, n. 2405, 31 jan. 2010. Disponível em: texto 25 maio 2010. 2
gestão firmados entre o Poder Público e as organizações sociais mediante a utilização de pessoal não concursado e sem prévia licitação. Ademais, detém potencialidade para gerar múltiplos processos e importância central para garantir a integridade do sistema protetivo. No mérito, o corte extraordinário deve ser provido. Como é cediço, a Lei nº 8.666/93, cumprindo determinação prevista no artigo 175 da Carta Magna, definiu como regra geral e cogente, para a contratação de serviços custeados pelos cofres públicos, no âmbito dos Poderes da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, a precedência da necessária licitação, que traduz exigência de caráter ético-jurídico, destinada a conferir efetividade, dentre outros, aos postulados constitucionais da legalidade, impessoalidade, publicidade, moralidade e eficiência. Embora o artigo 24, XXIV, do referido diploma legal, tenha previsto a dispensa de licitação para a celebração de contratos de prestação de serviços com as organizações sociais, qualificadas no âmbito das respectivas esferas de governo, para atividades contempladas no contrato de gestão (cuja constitucionalidade será decidida no julgamento das ADIs nºs 1943 e 1.923), a dispensa do certame é exceção, a depender da conjugação de pré-requisitos específicos, inderrogáveis e taxativamente enumerados na lei de regência. Vê-se, assim, que, vinculando a prática de atos administrativos e objetivando garantir a correta gestão e manejo dos recursos públicos, tais normas não podem ser afastadas ou ignoradas, pois revelam a própria vontade soberana do povo, traduzida pelo poder constituinte originário e protegida, doravante, pelas sanções e garantias de permanência da ordem constituída. 3
Nesse contexto, cumpre ressaltar, que o Instituto Candango de Solidariedade sequer foi considerado organização social, no âmbito do TJDFT, por não atender aos requisitos fixados na legislação de regência o que, per se, torna a contratação nula. De outra parte, ainda que se considere constitucional a dispensa de processo licitatório, o contrato de gestão firmado entre o Poder Público e as organizações sociais não poderia ser utilizado como forma de burlar a obrigatoriedade do concurso público. Esta, nos termos do artigo 37, inciso II, revela-se como pilar da estrutura administrativa, constituindo meio técnico posto à disposição da Administração para o alcance da probidade, eficiência e aperfeiçoamento do serviço público, ao mesmo tempo em que propicia igual oportunidade a todos os interessados que atendam os requisitos da lei, em homenagem ao princípio da isonomia. In casu, além da ausência de licitação prévia, extrai-se, conforme salientou o il. juízo monocrático, que o contrato de gestão firmado com o Governo do Distrito Federal tem como objeto a prestação de serviços de suporte operacional e administrativo objetivando ampliar a capacidade operacional atual do DMTU/DF, ou seja, eufemisticamente, a finalidade do referido contrato, de forma exclusiva, é a locação de servidores contratados pelo Instituto Candango de Solidariedade no Departamento Metropolitano de Transporte Urbano DMTU/DF, estipendiados com recursos públicos, sem concurso e com pagamento de taxa de administração o que consubstancia afronta aos princípios que norteiam a Administração Pública. 4
Assim, diante da flagrante ilegalidade, acima referida, deve o contrato de gestão ser declarado nulo para todos os efeitos. provimento do recurso. Do exposto, opina o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL pelo Brasília-DF, 12 de abril de 2013. (Autos recebidos neste Gabinete em 01/04/2013) ASD/ASS./AMA/ASS. WAGNER DE CASTRO MATHIAS NETTO Subprocurador-Geral da República 5