BIOECOLOGIA DOS CRUSTÁCEOS DECÁPODOS: PROPOSTA PARA AMBIENTALIZAÇÃO DE CURRÍCULO

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Transcrição:

Volume 2 Número 1 BIOCOOGIA DOS CRUSTÁCOS DCÁPODOS: PROPOSTA PARA AMBINTAIZAÇÃO D CURRÍCUO Jorge MANZONI 1 & Fernando D INCAO 2 1 18ª CR, Colégio stadual emos Júnior, Benjamim Constant, 373, Rio Grande, RS; -mail: jdmanzoni@terra.com.br 2 Departamento de Oceanografia, aboratório de Crustáceos Decápodos, FURG, Rio Grande, RS; -mail: docdinca@furg.br RSUMO: sse artigo propõe de forma sistêmica subsídios de conteúdos essenciais para uma educação ambiental crítica e criativa no ensino da bioecologia dos crustáceos decápodos com as espécies: Farfantepenaeus paulensis (camarão rosa), Callinectes sapidus (siri azul) e Neohelice granulata (caranguejo) devido à importância econômica e ecológica das espécies na região estuarina da agoa dos Patos-RS e da necessidade de conexão entre os saberes técnico científico universitário e o cotidiano empírico comunitário, pois os textos didáticos geralmente abordam a bioecologia da fauna de outras regiões do Brasil e do mundo não contemplando a biodiversidade local. ssa contribuição para práticas inovadoras no sistema educacional local salienta os ciclos de vida, a exploração em épocas impróprias e a destruição dos ambientes naturais, possibilitando assim a interação e integração dos aspectos sócio-econômicos na conservação da biodiversidade dos crustáceos decápodos do estuário. Palavras-chave: educação ambiental, bioecologia, crustáceos decápodos, agoa dos Patos. Os artrópodos são animais com apêndices corporais articulados (artro = articulados + podo= pé ). Suas mais de 1.000.000 de espécies correspondem a 70 ou 80% de todo o reino animal revelando, portanto, um grande sucesso evolutivo (Brusca & Brusca, 1990). A Classe Crustacea compreende cerca de 38 mil espécies, que demonstram ótima adaptação ao ambiente aquático, embora algumas vivam bem em terra úmida, caso dos tatuzinhos de jardim. As espécies tipicamente aquáticas têm grande diversidade de formas, modo de vida e habitat: existem siris em águas rasas; caranguejos em buracos na areia e marismas; cracas fixadas sobre rochas, cascos de navios e corpos de baleias; camarões e lagostas no fundo mar; baratinhas-da-praia correndo sobre rochas na zona das marés; microcrustáceos compondo o plâncton marinho e de água doce (Ruppert & Barnes, 1994). A Ordem Decapoda contém os bem conhecidos camarões, lagostins, lagostas e caranguejos. Incluindo alguns dos maiores e mais especializados crustáceos. Os 8.500 decápodos descritos representam quase um terço das espécies conhecidas do grupo. A maioria dos decápodos é de ambiente marinho, mas os lagostins, alguns camarões, poucos anomuros e muitos caranguejos invadiram a água doce. xistem alguns caranguejos anfíbios e terrestres (Barnes, 1984). Alguns decápodos são de grande importância econômica para a pesca artesanal da cidade do Rio Grande, como o siri-azul Callinectes sapidus, e o camarão-rosa Farfantepenaeus paulensis que é a espécie de maior importância econômica e social capturada pela pesca artesanal no estuário da agoa dos Patos (D Incao, 1985). O aboratório de Crustáceos Decápodos do Departamento de Oceanografia da Fundação Universidade Federal do Rio Grande (DOC) possui um grande acervo técnico científico sobre crustáceos, tais como, o camarão-rosa Farfantepenaeus paulensis, o siri-azul Callinectes sapidus, e o caranguejo Neohelice granulata (Figura 1), além de desenvolver diversas pesquisas sobre a biologia destas espécies.

14 J. Manzoni & F.D Incao A B Figura 1. Foto das espécies estudadas; A Neohelice granulata; B Farfantepenaeus paulensis; C Callinectes sapidus; (Fonte: aboratório de Crustáceos Decápodos, DOc - FURG) C CRSCIMNTO MUDA Os processos fisiológicos de muda são iguais em todos os crustáceos. Os intervalos de crescimento podem ser divididos em: intermuda (período entre as mudas), pré-muda (período logo anterior às mudas) e pós-muda (período posterior às mudas). Diferentemente de vários grupos de crustáceos, o Callinectes sapidus continua a crescer e a mudar mesmo depois de alcançar a maturidade sexual, mas em taxas muito pequenas. Já nas fases iniciais do desenvolvimento (zoea, megalopa e juvenis) as mudas são muito mais freqüentes e com uma variação em tamanho muito grande. Os períodos de muda são muito perigosos para qualquer crustáceo, deixando-o fraco e frágil, pois grande parte de sua energia é transferida para este processo. Mas também é um período muito importante, pois é nesse período de muda das fêmeas que ocorre o acasalamento. No caso do C. sapidus, durante todo este tempo da muda de uma fêmea madura, o macho se mantém segurando-a e protegendo-a, esperando o momento certo para acasalar-se. m um estudo de crescimento o tamanho dos organismos é medido pela largura da carapaça (c), que pode ser feita com um paquímetro medindo a distância entre as extremidades dos espinhos laterais da carapaça, podendo-se identificar classes de tamanhos para ambas as espécies na agoa dos Patos. As fases de desenvolvimento são: Fases larvais: no caso do C. sapidus são marinhas não ocorrendo dentro do estuário enquanto que na espécie H. granulata ocorrem em águas salobres no interior do estuário. Passam por grandes modificações morfológicas. A fase larval tem o nome de zoea, apresenta alguns subestágios de desenvolvimento. Fases pós-larvais: ocorrem após a muda para a megalopa e consistem em duas fases imaturas (megalopa e juvenil) e uma matura (adulto). Da fase imatura para a matura ocorre a muda de puberdade, onde as mudanças sexuais são claramente visíveis. Nesta fase o crescimento é diferenciado para ambos os sexos, sendo os machos geralmente mais desenvolvidos que as fêmeas.

Bioecologia dos crustáceos decápodos: proposta para ambientalização... 15 CICO D VIDA D Callinectes sapidus e Neohelice granulata Na costa do Oceano Atlântico, o siri-azul ocorre em lagunas, deltas de rios e regiões oceânicas adjacentes, desde a costa leste dos stados Unidos até a Venezuela. Na costa norte da América do Sul a espécie não está presente das Guianas até o litoral baiano no Brasil. Volta a estar presente na costa da Bahia até o norte da Argentina (Melo, 1996). O acasalamento ocorre em regiões rasas dos estuários. O macho transfere para a fêmea os espermatóforos, geralmente no início do verão. Com o aporte de água mais salgada no estuário, os machos migram para o norte da agoa dos Patos (D Incao, comunicação pessoal). As fêmeas, já com massa ovígera no abdome, migram em direção à saída do estuário ou áreas oceânicas adjacentes para a desova, que ocorre do final de novembro até março e se realiza principalmente no lado oeste dos Molhes da Barra (Figura 2). A massa ovígera apresenta, inicialmente uma coloração amarelo ouro que progride para marrom escuro conforme se adianta o desenvolvimento embrionário. m estudos de laboratório, a uma temperatura constante de 26ºC e salinidade de 32 os ovos levaram quinze dias para eclodir (D Incao, comunicação pessoal). Após, aproximadamente 40 dias da eclosão, tem-se um juvenil de siri com 2,5 cm de largura. Do ovo eclode diretamente uma larva zoea, e antes de chegar à juvenil, passa por sete a oito estágios de zoe e um estágio de megalopa (D Incao, comunicação pessoal). O desenvolvimento larval ocorre nas águas da plataforma continental (Heukelem, apud ee, 1999). ZONA COSTIRA MGAOPAS STUÁRIO OCANO P Á G ZOAS MGAOPAS I C O S JUVNIS MACHOS ADUTOS ACASAAMNTO MACHOS + FÊMAS Poluição Predação Mort. natural PSCA ARTSANA OVOS FÊMAS D M R S A Figura 2: Ciclo de vida do siri azul Callinectes sapidus; (Fonte: aboratório de Crustáceos Decápodos, DOc - FURG) As megalopas retornam ao estuário no final do verão e no outono. Os juvenis dispersamse no estuário e seus tributários, onde crescem tornando-se adultos, principalmente em áreas com vegetação aquática submersa (Heukelem apud ee, 1999). Após 300 dias da eclosão os siris têm a largura média de 10 cm que seria o tamanho de um adulto. Assim, podemos dizer que a idade de primeira maturação situa-se em torno dos 300 dias de vida. Para alcançar este tamanho, o siri sofre de 18 a 20 mudas, não levando em conta as sofridas durante sua fase planctônica. Após a desova, as fêmeas retornam ao estuário e os machos descem novamente para a zona estuarial reiniciando o ciclo (D Incao, comunicação pessoal). A espécie Neohelice granulata tem seu ciclo de vida todo no interior do estuário. A espécie

16 J. Manzoni & F.D Incao está distribuída na costa da América do Sul desde o Rio de Janeiro (Brasil) até a Patagônia (Argentina), formando populações numerosas nos marismas e mangues. Vivem no supra e mediolitoral, cavando tocas em substratos lamosos. A reprodução da espécie na agoa dos Patos ocorre entre os meses de novembro a março. Machos e fêmeas permanecem nas marismas durante todo o processo. Apenas as fêmeas, durante o período final de incubação dos ovos, permanecem fora das tocas, imersas. Os ovos eclodem quando a salinidade ambiental torna-se mais elevada com o ingresso de águas marinhas nos estuários (D Incao et al., 1993). O desenvolvimento da espécie passa pelos mesmos estágios dos demais caranguejos. CICO D VIDA DO CAMARÃO ROSA Farfantepenaeus paulensis M RAÇÃO À COSTA GAÚCHA As espécies de Farfantepenaeus apresentam adultos e juvenis em áreas separadas. Os juvenis estão nos estuários e os adultos em mar aberto. Isso leva estas espécies a apresentarem dois movimentos migratórios principais: o primeiro, das larvas e pós-larvas levadas pelas correntes marinhas da zona de reprodução para os estuários e baías; o segundo, depois de crescerem e atingirem o estágio de pré-adultos, dos estuários para as zonas de reprodução no mar. Os camarões (Penaeioidea), independentemente da espécie, apresentam as seguintes fases larvais, na ordem em que ocorrem: nauplio, protozoé, mísis e pós-larva. A figura 3 mostra um esquema de ciclo de vida do camarão-rosa. ZONA COSTIRA STUÁRIO OCANO PÓSARVA Poluição Predação Mort. natural MISIS PROTOZOA NAUPIUS P Á G I C O JUVNIS Pesca artesanal RPRODUTORS ADUTOS Pesca industrial OVOS D M R S A Figura 3: Ciclo de vida do camarão rosa Farfantepenaeus paulensis; (Fonte: aboratório de Crustáceos Decápodos, DOc - FURG) Como não são conhecidas áreas de reprodução no oceano frente ao Rio Grande do Sul, a hipótese mais provável é que as pós-larvas vêm povoar nossas lagoas costeiras a partir da reprodução de adultos de Santa Catarina. A distância a ser percorrida pelas larvas e pós-larvas para chegarem até a agoa dos Patos parece ser muito grande, mas verificou-se que a velocidade de deslocamento das águas costeiras é suficiente para permitir a chegada em tempo hábil. A velocidade de deslocamento da água é de 16 a 36 milhas náuticas por dia o que significaria um tempo de 11 a 24 dias para uma larva chegar. Neste momento as correntes costeiras têm direção de norte para sul. ste fato é perfeitamente compatível com o tempo gasto para uma larva atingir o

Bioecologia dos crustáceos decápodos: proposta para ambientalização... 17 estágio de pós-larva, para penetrar nos estuários. Verificou-se que, durante quase todo ano, o sentido das correntes tem direção sul. Nas lagoas costeiras do estado desenvolvem-se populações abundantes que são pescadas artesanalmente. Portanto toda a pesca no Rio Grande do Sul é realizada sobre juvenis e sub-adultos. O crescimento nas zonas de criação é muito rápido. m torno de três a quatro meses atingem o tamanho mínimo permitido para a pesca (90 mm de comprimento total). Uma característica da pesca na agoa dos Patos tem suas explicações no ciclo de vida da espécie. As fases planctônicas dependem da corrente marinha para seus deslocamentos. As póslarvas dependem da penetração de água salgada nos estuários para também fazerem sua entrada implicando nas flutuações anuais que sofrem as safras em sua abundância na agoa dos Patos, pois recebe grande aporte de águas continentais, o fluxo de água marinha depende da incidência de ventos do quadrante sul e da pluviosidade para penetrar no estuário (D Incao, 1991). m anos de chuvas muito abundantes, nos meses antecedentes à época de penetração maior de pós-larva (setembro a dezembro), a vazão de água doce é tão forte que impede a penetração de água salgada (D Incao, 1991). Com isto o número de pós-larvas de camarão-rosa que penetram o estuário é pequeno e a safra é baixa. Os estudos mostram que após 4 a 5 meses de idade, os camarões iniciam sua migração para o mar. Alguns indivíduos, no entanto, podem permanecer no estuário durante o inverno. São aqueles camarões de grande porte que são pescados em dezembro na agoa dos Patos e que são geralmente os maiores da safra. CONSIDRAÇÕS FINAIS A disponibilização de informações acerca da bioecologia das espécies abordadas de forma sistêmica neste artigo oportuniza um trabalho de educação ambiental crítica e criativa tanto para o ensino formal quanto informal, abordando a bioecologia, o desenvolvimento e os ciclos reprodutivos das espécies Farfantepenaeus paulensis, Callinectes sapidus e Neohelice granulata numa perspectiva cidadã e ecopedagógica referenciada por Manzoni (2005) oportunizando assim, a construção do sujeito ecológico e seu projeto de sociedade sustentável embasado na conexão do conhecimento científico teórico e aplicado desenvolvido no âmbito das universidades, além do conhecimento comunitário regional e suas relações com o senso comum. O desenvolvimento, as relações tróficas e os ciclos reprodutivos abordam de maneira sistêmica e cidadã de educação para conservação, minimizando assim a pressão antrópica sobre as espécies Farfantepenaeus paulensis, Callinectes sapidus e Neohelice granulata a partir de um processso educativo capaz de combater eficazmente a desinformação, a exploração em épocas impróprias, a destruição dos ambientes naturais e os aspectos sócio-econômicos. Desta forma, procura-se minorar pela educação ambiental os aspectos negativos na preservação e manutenção da biodiversidade dos crustáceos decápodos da região estuarina da agoa dos Patos. RFRÊNCIAS BIBIOGRÁFICAS BARNS, R.S.K. 1984. Zoologia dos invertebrados. ivraria Roca, São Paulo, 1.179p. BRUSCA, C.R. & BRUSCA, G.I. 1990. Invertebrados. Sinauer Associates Inc., Massachusetts, 922p. D INCAO, F. 1985. Camarões de alto valor comercial do Rio Grande do Sul. Cadernos da Pesca, SUDP - Departamento de Pesca da Secretaria de Agricultura/RS,10p. D INCAO, F. 1991. Pesca e Biologia de Penaeus paulensis na agoa dos Patos, RS. Atlântica, Rio Grande, 13(1):159-169. D INCAO, F; SIVA, K.G.; RUFFINO, M.. & BRAGA, A.C. 1990. Hábito alimentar do caranguejo Chasmagnathus granulata Dana, 1851 na Barra do Rio Grande, RS (Decapoda, Grapsidae). Atlântica, Rio Grande, 12(2):85-93. D INCAO, F; RUFFINO, M..: SIVA, K.G.; BRAGA, A.C. & MARQUS,.H.C.1993. Crescimento de Chasmagnathus granulata Dana, 1851 em uma marisma do estuário da agoa dos Patos, RS

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