Reportagens Televisivas e Estigmas Sociais: As Representações da Arte em Questão

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Transcrição:

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA DE COMUNICAÇÕES E ARTES Reportagens Televisivas e Estigmas Sociais: As Representações da Arte em Questão Relatório Final de Iniciação Científica Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica / PIBIC Bolsista: Sofia Franco Guilherme Orientadora: Profa. Dra. Rosana de Lima Soares Agosto 2013

Prof. Dra. Rosana de Lima Soares Orientadora Sofia Franco Guilherme Bolsista 2

ÍNDICE I. INTRODUÇÃO... 5 II. OBJETIVOS... 6 III. METODOLOGIA... 7 1. Pesquisa bibliográfica... 7 2. Escolha do o material de análise... 8 IV. ANÁLISES TEÓRICAS... 11 1. Questões do jornalismo cultural... 11 2. Por que o Homer não se interessa por cultura?... 14 3. Em busca de uma definição de Cultura... 16 4. Comunicação e discurso nas mídias... 18 V. RESULTADOS DA ANÁLISE DA AMOSTRAGEM... 20 1. Levantamento das reportagens... 20 2. Amostragem selecionada... 22 3. Estrutura e linguagem das reportagens... 25 4. Discursos presentes nas reportagens... 28 5. Relação texto-imagem... 30 6. Fontes de informação... 31 VI. CONCLUSÕES... 33 VII. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS... 35 3

ÍNDICE DE GRÁFICOS Gráfico 1: Total de reportagens culturais no ano de 2012... 9 Gráfico 2 Número de reportagens culturais em cada telejornal por mês... 10 Gráfico 3: Número de reportagens por temática em cada telejornal... 20 Gráfico 4: Reportagens por temática no Jornal da Cultura... 22 Gráfico 5: Proporção de Temáticas no Jornal do SBT... 23 Gráfico 6: Proporção de temáticas no Jornal da Record... 23 Gráfico 7: Proporção de temáticas no Jornal Hoje... 24 Gráfico 8: Proporção de temáticas no Jornal Nacional... 24 Gráfico 9: Fontes de informação das reportagens por temática... 32 ÍNDICE DE TABELAS Tabela 1: Relação texto-imagem na reportagem sobre Morte... 30 4

I. Introdução Os discursos disseminados pela mídia têm papel importante na formação de uma opinião pública e, consequentemente, são capazes de incluir ou excluir formas de produção artística no gosto popular. Este é o tema desta pesquisa de Iniciação Científica que está vinculada à pesquisa Mídias Audiovisuais e Estigmas Sociais Sutileza e Grosseria da Exclusão, desenvolvida pela Profa. Dra. Rosana de Lima Soares desde 2003, com o apoio do CNPq (bolsa produtividade em pesquisa). A pesquisa se volta ao estudo das produções midiáticas em diversos formatos, englobando discursos ficcionais ou referenciais. O projeto maior tem como eixo teórico-metodológico a crítica e desconstrução do conceito de representação midiática, e como objeto de estudo os discursos audiovisuais de caráter referencial que tratam dos estigmas sociais. Nesta pesquisa o recorte escolhido é o discurso jornalístico, na forma de reportagens televisivas, que tem como tema central assuntos de cultura e artes. Para reconhecer qual é o espaço reservado para a cultura no telejornalismo diário buscaremos, num primeiro momento, levantar as reportagens televisivas do tema escolhido exibidas no ano de 2012 nos principais jornais da TV aberta do Brasil. No segundo momento faremos uma análise de algumas destas reportagens para entender de que forma a cultura é representada neste espaço da mídia. A primeira etapa da pesquisa pode ser dividida em dois momentos: o inicio das leituras a partir da pesquisa bibliográfica e a coleta de dados para a amostragem. No primeiro momento foi realizada a pesquisa bibliográfica. A partir das leituras iniciadas redefinimos as linhas mais gerais do projeto e o recorte a ser utilizado para o levantamento de reportagens e constituição de uma amostragem na próxima etapa. No segundo momento fizemos a coleta de dados baseados no recorte determinado. Escolhemos trabalhar com os principais telejornais da TV aberta brasileira, pois o objetivo é compreender como a cultura e representada a para 5

a população geral, que não possui conhecimento prévio ou procura se informar sobre este tema especificamente, como seria o público alvo de um programa mais especializado. Os canais de TV fechada estão disponíveis para um público restrito, com poder aquisitivo melhor, pois é preciso ser assinante de alguma operadora de televisão. As emissoras abertas são as que alcançam a maior parte do público de diferentes classes sociais, e, portanto, tem uma audiência bastante diversificada. O telejornalismo diário se propõe a trazer os principais acontecimentos do dia para a população geral, de forma rápida e clara, e não tendo a obrigatoriedade que os impressos têm de trazer uma editoria cultural, muitas vezes deixam estas notícias em segundo plano, ou fora da edição. Porque estas matérias estão ausentes e quando elas aparecem foi um dos questionamentos centrais para o desenvolvimento da pesquisa. As reportagens exibidas nos telejornais Jornal Nacional, Jornal Hoje, Jornal da Record, Jornal do SBT e Jornal da Cultura, foram recuperadas por meio do acervo disponível no site das respectivas emissoras. Depois de coletadas elas foram classificadas de acordo com as temáticas centrais abordadas dentro do grande tema cultura. De cada temática levantada foi escolhida uma reportagem para a análise baseada nos conceitos de análise do discurso e considerando as especificidades do dispositivo audiovisual. Vale ressaltar que, no campo do jornalismo especialmente o televisivo a editoria de cultura ocupa lugar pouco representativo, sendo muitas vezes diluída em programas de variedades, ou tratada em programas voltados a essa temática específica. II. Objetivos O objetivo deste projeto é realizar uma pesquisa e análise teórica sobre as relações entre aceitação e consumo de produtos culturais e sua presença na mídia, especificamente, na televisão. Será observada como a questão da estigmatização social se revela no processo de decisão dos temas culturais que aparecerão na mídia televisiva. Também verificaremos qual a posição ocupada pela editoria de cultura no telejornalismo diário brasileiro. 6

inicias: A partir deste objetivo maior foram feitos os seguintes questionamentos A ausência de reportagens televisivas sobre cultura e arte é real? Quais são os temas relacionados à arte que aparecem no telejornalismo brasileiro? O que é considerado arte pelos telejornais? Qual é o lugar que estas matérias ocupam no telejornal? De que forma os temas de cultura são abordados nas reportagens televisivas? III. Metodologias 1. Pesquisa bibliográfica No primeiro momento foi realizada a pesquisa bibliográfica. Os autores foram selecionados no sentido de construir um embasamento sobre o jornalismo cultural e uma definição para o tema cultura e arte trabalhada ao longo da pesquisa. A partir das leituras iniciadas definimos o recorte a ser utilizado para o levantamento de reportagens e constituição de uma amostragem na próxima etapa. Para chegarmos ao nosso objeto de pesquisa decidimos utilizar um conceito mais abrangente de cultura e arte, pois restringi-lo poderia resultar em uma falta de objetos a serem analisados mais tarde. Este conceito foi construído através das leituras selecionadas durante a pesquisa bibliográfica. Os textos principais utilizados neste processo foram: A cultura no Plural de Michel de Certeau, para produzir um conceito mais amplo de cultura, e O poder simbólico de Pierre Bourdieu sobre a criação de um campo artístico e os critérios de apreciação das obras. A respeito dos estigmas também será lida uma bibliografia mais geral para mais tarde relacionarmos este conceito com os temas culturais e artísticos encontrados. Sobre as questões específicas do jornalismo cultural, a principal referência foi o livro de Daniel Piza, Jornalismo Cultural, que coloca alguns dos dilemas enfrentados por este campo do trabalho jornalístico. No entanto, a maior parte dos textos referentes a esta temática são voltados para as mídias 7

impressas, que tem uma dinâmica um pouco diferente, principalmente por produzirem cadernos diários voltados para assuntos de cultura e variedades. Sobre o telejornalismo cultural, há uma carência de bibliografia, por isso utilizamos as questões apontadas para o impresso como guia pra apontar problemáticas voltadas para o meio audiovisual. 2. Escolha do material de análise Para decidir quais seriam os programas de televisão dos quais viria a amostragem pensamos nos que teriam a maior audiência, e, portanto maior visibilidade e mais poder de legitimação e representação dos temas tratados: É por conta da visibilidade que as mídias assumem um papel crucial como disciplina e controle, portanto, como promotoras/mantenedoras de escalas de valores, como vigilantes (Gomes, 2003: 77). Escolhemos trabalhar com os principais telejornais da TV aberta brasileira, que têm alcance nacional e tratam de diversos temas da sociedade voltados a um público mais amplo. Assim, poderemos compreender como a cultura é representada para a população geral, que não possui conhecimento prévio ou nem procura se informar sobre este tema especificamente, como seria o público alvo de um programa mais especializado. As reportagens exibidas nos telejornais Jornal Nacional, Jornal Hoje, Jornal da Record, Jornal do SBT e Jornal da Cultura, foram recuperadas por meio do acervo disponível no site das respectivas emissoras. Como podemos perceber pelo próprio nome destes jornais, eles representam a voz do canal em que são exibidos e se pretendem com alto grau de credibilidade para o público, sendo assim um local de legitimação para os fatos neles apresentados. Todos são exibidos nacionalmente, e exceto o Jornal Hoje, são exibidos no horário nobre da televisão. A decisão de incluir o Jornal Hoje no material pesquisado foi feita para que tivéssemos o parâmetro de um programa exibido em um horário alternativo e considerado mais leve do que os jornais noturnos. Como a Globo é a emissora de maior audiência no jornalismo, com o Jornal Nacional, escolhemos outro jornal desta rede, também exibido nacionalmente. 8

O Jornal Nacional foi criado em 1969, estrategicamente posicionado entre duas telenovelas, um gênero de grande audiência desde então, para ser um programa de prestígio da Rede Globo. O JN tinha o segundo maior público de telejornalismo mundial na década de 80 do século XX, e sempre teve influência considerável sobre a opinião pública (SILVA, 1985: 40). A coleta dos dados foi realizada através dos sites oficiais das emissoras de televisão pesquisadas. Os sites da Rede Globo, Record e SBT possuem ferramentas de busca que permitem a filtragem de reportagens veiculadas em seus telejornais por meio de palavras-chave, separando cada reportagem por título e temas, além de identificar palavras do texto de apresentação inserido no vídeo. A exceção ao método utilizado foi a TV Cultura, pois o formato de seu site permite apenas que busquemos as edições em blocos separados, sendo que os vídeos são postados com os blocos inteiros de cada dia que o Jornal da Cultura foi ao ar. Portando para o levantamento quantitativo desta emissora em especial foi necessário assistir a todas as edições do Jornal da Cultura do ano de 2012 online, e coletar as reportagens que correspondiam ao tema cultura e arte, proposto nesta pesquisa. 250 200 150 100 50 Total de reportagens culturais no ano de 2012 166 69 86 58 214 Jornal Nacional Jornal Hoje Jornal da Record Jornal do SBT Jornal da Cultura 0 Gráfico 1: Total de reportagens culturais no ano de 2012 9

60 Número de reportagens culturais em cada telejornal por mês 50 40 30 20 10 0 Jornal Nacional Jornal Hoje Jornal da Record Jornal do SBT Jornal da Cultura Gráfico 2 Número de reportagens culturais em cada telejornal por mês Para a segunda etapa da pesquisa foram selecionadas algumas das reportagens recolhidas no levantamento do ano de 2012. Nos propusemos a analisá-las a partir das teorias de análise do discurso levando em conta as especificidades do discurso audiovisual. Com o objetivo de compreender como os programas de telejornalismo abordam os temas de cultura e arte, foram escolhidas matérias que têm como tema central artistas e produções culturais da atualidade. Para ilustrar as diversas representações existentes foi feita a análise de reportagens jornalísticas em diferentes telejornais e das diversas categorias temáticas organizadas, de acordo com o levantamento realizado na primeira etapa. A amostragem foi constituída de modo não aleatório, selecionando reportagens televisivas voltadas à temática proposta neste projeto para estabelecer, entre elas, pontos de consonância e dissonância a fim de apontar suas temáticas, recorrências, formatos e modos de enunciação. Ao final, pretendemos apresentar um quadro representativo não apenas da produção jornalística televisiva voltada à arte, bem como às relações entre estigmas sociais e produção cultural. A seleção das reportagens que constituem a amostragem foi feita de modo que cada uma das temáticas levantadas estivesse representada por uma 10

reportagem. Além disso, nos preocupamos em manter um equilíbrio quantitativo entre os telejornais e escolher matérias das temáticas que fossem mais recorrentes em cada um deles. Houve a preocupação em selecionar objetos que abordassem diferentes formas de expressão artística, para que pudéssemos abranger a cultura de forma mais ampla. As teorias de análise do discurso são o instrumento principal na interpretação dos objetos. Para isso lemos Patrick Chareaudeau e Dominique Maingueneau, que trabalham com noções mais gerais sobre o discurso das mídias e encaminharam a forma de leitura da amostragem. Como aportes metodológicos para estudar tevê, em especial os telejornais, foram utilizados textos de pesquisadores do audiovisual. A referência inicial é o livro A televisão levada a sério de Arlindo Machado. O autor se propõe a estudar o jornalismo como um gênero televisivo, abordando sua forma de enunciação, ao invés da politicidade de seus conteúdos. Desta maneira ele propõe formas de estrutura narrativa do telejornal, que serviram como base para nossas análises da amostragem. IV. Análises teóricas 1. Questões do Jornalismo Cultural O jornalismo cultural como um todo ainda precisa definir sua posição dentro da atividade e levanta algumas questões sobre a função das reportagens de cultura e do jornalista cultural. O jornalismo cultural deve ser opinativo? Fazer o papel de serviço, disponibilizando uma agenda dos eventos do momento? Ser composto de críticas e resenhas? O que há para ser feito, além disso? Em seu livro Jornalismo Cultural, Daniel Piza discute algumas destas questões se voltando principalmente para as mídias impressas. No entanto, estas discussões podem ser deslocadas também para as mídias audiovisuais, como é a nossa proposta com esta pesquisa. Daniel Piza inicia seu livro resgatando a história do jornalismo cultural e destacando o papel central da crítica para esta atividade. A crítica é claro continua a ser a espinha dorsal do jornalismo cultural. Ele comenta que os 11

críticos eram pessoas reconhecidas que exerciam forte influência tanto no público como nos artistas. No caso brasileiro, Paulo Francis é citado como um bom exemplo de comentarista cultural, pois contaminava seus leitores com seu gosto pela arte. Muitos nostálgicos afirmam que o jornalismo cultural não é mais o mesmo e que a prevalência de assuntos como celebridades e sucessos de audiência mostra que os críticos não possuem a mesma influência sobre o sucesso de uma obra. Nos anos 90, o peso das reportagens opinativas diminuiu e o espaço passou a ser ocupado por uma agenda passiva dos eventos culturais. No entanto, Piza acredita na possibilidade de reconquistar um pouco desta influência atualmente: Há espaço para recuperar parte desta influência, pois o bombardeio de dados e informações da era eletrônica criou uma carência ainda maior de análises e comentários, que suplementem argumentos, perspectivas e contextos para o cidadão desenvolver um senso crítico e conectar as disciplinas (PIZA, 2011: 32). Em uma época onde os produtos culturais se tornam cada vez mais acessíveis para o público, o jornalismo desempenha uma função central na difusão destes. Por isso precisa ter um olhar sem preconceitos e fazer a seleção dos fatos reportados utilizando senso crítico. Segundo Piza, os jornalistas não tem conseguido exercer esse papel com clareza e eficácia, por estar em crise quanto aos critérios de avaliação das obras (IDEM, 2011: 45). Uma das questões enfrentadas pelo jornalismo cultural é a divisão entre o que seria cultura e o que seria entretenimento. Este estigma em torno de certas formas de produção cultural, como se eles fossem menos importantes, é prejudicial. De acordo com Piza, isso ocorre porque cultura é associada à intelectualidade inalcançável por grande parte da população, o que faz com que temam a cultura. O autor comenta que os jornalistas tem a capacidade de pegar uma obra de sucesso na audiência e tratá-la de forma mais profunda mostrando que há mais nela do que os consumidores percebem inicialmente. Também podem 12

reportar temas considerados complexos demais de uma maneira que o público compreenda: Temas ditos eruditos podem ser tratados com leveza, sem populismo; e temas ditos de entretenimento podem ser tratados com sutileza, sem elitismo (PIZA, 2011: 58). O que os veículos devem levar em conta na hora de selecionar o que será divulgado é seu leitor ou espectador. Cada publicação da imprensa tem um público-alvo e deve se concentrar em falar com ele, sem abrir mão de tentar contribuir com sua formação, com a melhoria de seu repertório (PIZA, 2011: 47). O equilíbrio entre assuntos nacionais e internacionais nas edições é mais uma dificuldade enfrentada pelos jornais. No mundo globalizado de hoje é importante ver que a cultura se interpenetra para se manter viva e ativa, portanto os fatos do exterior também tem relevância no país. No entanto, não podemos olhar para a cultura de fora e virar as costas para as obras produzidas aqui no Brasil, ou tratá-las com menos prestígio. Um tema discutido por Daniel Piza sobre os jornais impressos que pode ser transferido para o telejornalismo é a diferença no tom e abordagem dos assuntos entre os cadernos culturais publicados diariamente e os suplementos especiais que saem semanalmente. Podemos estabelecer um paralelo dessas duas modalidades com os telejornais diários e os programas de nicho, respectivamente. Nos segundos cadernos as matérias são mais superficiais, valorizando as celebridades, e suas reportagens se tornam cada vez mais releases dos eventos. Essa abordagem se parece com aquela dada pelos telejornais diários, que ainda possuem mais uma desvantagem por não terem uma editoria cultural obrigatória todos os dias, como o impresso. Já os suplementos especiais do impresso tendem a trazer análises mais aprofundadas, tratando de temas ligados à erudição (PIZA, 2011: 53). Este tratamento voltado para um público iniciado nos assuntos culturais é esperado pelos programas de televisão especialmente sobre cultura, que tem este público alvo. Por ter suas análises voltadas para os meios impressos, Daniel Piza destaca a diferença destes da TV, por serem capazes de maior aprofundamento e argumentação (PIZA, 2011: 47). Mas precisamos pensar em 13

maneiras que a TV possa tentar trabalhar com as questões culturais de forma critica e profunda também, deixando de lado o preconceito em torno deste meio, considerado menos sério e equilibrado. 2. Por que o Homer não se interessa por cultura? Este estigma do telespectador foi retirado da afirmação de William Bonner de que o Jornal Nacional é produzido pensando em um público que tem o perfil do patriarca do seriado de TV norte-americano Os Simpsons. Um homem que assiste à televisão e simplesmente assimila o que vê, sem criticidade alguma. A comparação foi feita em novembro de 2005, durante uma visita de professores universitários aos estúdios da Rede Globo. De acordo com o professor da Universidade de São Paulo, Laurindo Lalo Leal Filho, em relato para a Carta Capital, Bonner teria dito que o telespectador é como Homer porque tem dificuldade de entender notícias complexas e pouca familiaridade com siglas como BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). No dia 06 de dezembro do mesmo ano, a Folha de S. Paulo divulgou uma nota do jornalista em que ele diz que não pensou no personagem de maneira preconceituosa. William Bonner explicou que o exemplo foi dado por Homer representar um pai de família, um trabalhador conservador, sem curso superior, que após uma jornada de trabalho, quer ter acesso às notícias mais relevantes do dia de forma clara e objetiva. Em contraposição a este estereótipo podemos utilizar a pesquisa de Lins da Silva e os trabalhos de Arlindo Machado. Segundo Arlindo Machado, em seu livro A televisão levada a sério, as abordagens políticas a respeito dos programas de TV falham ao presumirem que os espectadores, que são os leitores dos meios audiovisuais, são ingênuos e reproduzem acriticamente a opinião dos programas. Machado afirma, citando Dominique Wolton, que a significação no telejornal é função do contexto cognitivo ou sociocultural do processo de interpretação, razão por que ela sempre transborda de qualquer intenção. (MACHADO, 2000: 100). Desta forma o mesmo telejornal pode ser interpretado diferentemente por espectadores variados, de acordo com seus valores e ideologias além de suas 14

estratégias perceptivas ou cognitivas. O telespectador tem autonomia suficiente para selecionar o que é apresentado no fluxo televisual. Em sua pesquisa, Carlos Eduardo Lins da Silva não tem a pretensão generalizante, mas sim o objetivo de mostrar que nem todos os trabalhadores brasileiros telespectadores do Jornal Nacional aceitam as mensagens deste meio de forma passiva e sem senso crítico, desde que haja outra fonte para compor sua representação da realidade. Não havendo o monopólio da representação do real, qualquer pessoa pode ser crítica diante da TV (SILVA, 1985: 135). As mídias selecionam o que será apresentado ao público por motivos externos a ela, mas também por motivos internos a máquina midiática. Segundo Patrick Charaudeau pode-se falar de automanipulação das mídias sob a pressão de suas próprias representações (CHARAUDEAU, 2012: 258). A instância midiática lida com as representações de seu público e com as representações de si mesma, sendo que estas representações de si mesma podem se estender as suas rubricas. O jornal será dividido e organizado para se encaixar na identidade construída para si pela máquina midiática. A divisão de um jornal em editorias é um exemplo do processo de classificação presente na vida social. Tal processo está ligado ao estabelecimento de identidades e diferenças. Segundo Tomaz Tadeu da Silva, A identidade e a diferença são criações sociais e culturais (SILVA, T. T., 2000: 76). As identidades são produzidas em um contexto social a partir da diferenciação de suas características das de outras identidades, portanto diferença e identidade são inseparáveis. As identidades são disputadas e dependem de relações de poder para se estabelecerem. Na disputa pela identidade está envolvida uma disputa mais ampla por outros recursos simbólicos e materiais da sociedade (SILVA, T. T., 2000: 81). No caso da identidade de uma editoria no telejornalismo o recurso envolvido nesta disputa é o espaço e o tempo de exibição das matérias que correspondem a esta rubrica na edição diária do jornal. 15

A divisão do espaço midiático em rubricas remete à reconstrução do espaço público operada pelas mídias. As editorias do jornalismo, por exemplo, correspondem aos diversos campos de pensamento da opinião pública em que a informação cultural é o espaço reservado para as discussões sobre o campo artístico, suas produções e atores. (CHARAUDEAU, 2012: 145). Na televisão as divisões temáticas se dão de forma temporal, ou seja, a hierarquia das reportagens de acordo com suas rubricas pode ser percebida pela ordem de apresentação e número de vezes que uma notícia aparece além do tempo de exibição reservado para ela na edição do telejornal. Sendo assim, podemos considerar aqui a disputa por reconhecimento da identidade da editoria de cultura no telejornal. A cultura pode ser considerada como um tema estigmatizado dentre as editorias do telejornalismo. Pelo levantamento feito, o número de matérias encontradas surpreendeu, pois esperamos um número muito pequeno, mas ainda assim a quantidade encontrada é muito inferior a de outras editorias. A sensação de ausência de matérias culturais no telejornalismo diário pode ser um exemplo de como a editoria de cultura ocupa lugar pouco representativo, sendo muitas vezes diluída ao longo do ano. Por este ponto de vista, a editoria de cultura pode carregar o estereótipo de ser menos importante, fútil, e, portanto, servir para ocupar espaço quando não houver outros fatos mais importantes de serem noticiados naquele dia. Outro possível estereótipo é de que a cultura, se fosse discutida com mais profundidade crítica, não seria compreendida pelo telespectador médio dos jornais. Esta visão elitista enxerga a cultura como um tema complexo e mistura o estigma do público com um estereótipo dos temas culturais. 3. Em busca de uma definição de Cultura A construção do conceito de cultura e arte utilizado nesta pesquisa foi feita pensando de forma que não restringisse o nosso objeto de pesquisa, já reduzido por natureza. Por isso buscamos definições mais amplas e abrangentes de cultura, que a vissem de forma plural e sem preconceitos. 16

Em A Cultura no Plural, Michel de Certeau afirma que a cultura é plural, ou seja, não existe uma definição de Cultura e sim várias culturas que convivem. Ele visa o intercâmbio entre o popular e o intelectual, sendo que uma forma de cultura não é superior à outra, todas elas possuem seu valor e sua função. Ele ainda destaca que a cultura tomada no singular é extremamente prejudicial para a criatividade. Como apontado por Certeau, o termo cultura pode ser empregado em diferentes situações e em cada uma delas designar um significado. Entre os selecionados pelo autor, os que mais se aproximam da abordagem utilizada nesta análise são as que seguem. Um patrimônio das obras que devem ser preservadas, difundidas e com relação ao qual nos situamos, e dentro disso as criações e criadores que devem ser promovidos. Também o conjunto de mitos, comportamentos e instituições que compõe um quadro de referências próprio de uma sociedade, diferenciando-a das demais. Ou ainda um sistema de comunicação, que organiza os significados e a mídia (CERTEAU, 1995: 194). Mas não é porque a cultura pode ser encontrada em diversas formas e locais de uma sociedade que qualquer atividade humana pode ser reconhecida como tal. Para que sejam verdadeiramente consideradas como cultura é necessário que as práticas sociais tenham significado para o sujeito que as pratica (CERTEAU, 1995: 141). O que faz a arte ser considerada arte, e se diferenciar das outras produções? Sobre a questão da legitimidade conferida às formas de expressão cultural humana e seus produtores podemos utilizar as teorias de Pierre Bourdieu a respeito da criação do campo artístico. Segundo Bourdieu (2001), através da Academia e de instituições que intermediam o acesso à cultura são criadas divisões das formas de representação do mundo que são legítimas ou não. Sendo assim, cria-se um estereótipo das produções artísticas aceitas pelos produtores e consumidores de cultura. Concretamente a produção dos produtores de que o Estado, através das instituições encarregadas de controlar o acesso ao corpo, detém o monopólio, toma forma de um processo de certificação ou, se se prefere, de consagração pelo qual os produtores são instruídos aos seus próprios olhos e aos olhos 17

de todos os consumidores legítimos, como produtores legítimos, conhecidos e reconhecidos por todos (BOURDIEU, 2001: 276). A mídia está entre as instituições com autoridade legitimadora na atualidade. Por isso, as reportagens televisionadas, ao selecionarem certas formas de produção cultural para serem apresentadas ao público, estão contribuindo para que estas sejam aceitas e, portanto, consumidas pela população. O valor artístico de uma produção e seu sentido não estão definidos no produto em si, ou em seu produtor, mas no campo artístico que se constrói, conforme a teoria de Bourdieu. O conjunto de agentes e obras, críticos, produtores, consumidores e intermediários que se interessam por arte ou vivem dela, e que lutam por uma representação do real, colaboram para a criação de valor e sentido das obras e artistas (BOURDIEU, 2001: 290). Os conceitos de beleza e outras categorias usadas para compreender e admirar diferentes formas de produções culturais estão ligadas ao contexto histórico e social tanto da produção quanto da apreciação de tal obra. Essas noções estéticas tomam diferentes sentidos em diferentes períodos da história, de acordo com as revoluções artísticas que ocorrem. (BOURDIEU, 2001: 292) 4. Comunicação e discurso nas mídias Para estabelecermos os parâmetros da análise discursiva a ser realizada sobre as reportagens que constituem a amostragem desta pesquisa utilizamos como referência as propostas de Patrick Charaudeau em seu livro O Discurso das Mídias. O modelo de análise se baseia na concepção do ato comunicacional como uma troca entre a instância de produção e a instância de recepção onde deve haver uma cointencionalidade para que o sentido se produza, pois o receptor precisa reconhecer a estruturação feita pelo produtor dos signos e formas da linguagem utilizada. Desta forma são instituídos três lugares de importância na máquina midiática o lugar da produção, representado pelo 18

produtor de informação, o lugar da recepção, representado pelo consumidor da informação, e o produto midiático. (CHARAUDEAU, 2012). A instância de produção envolve as práticas profissionais condicionadas pelas relações socioeconômicas da empresa midiática (espaço externoexterno) e as condições de produção da informação, onde são tomadas as decisões a respeito de como o produto será realizado (espaço externo-interno) de acordo com os efeitos que pretendem produzir no público. No entanto, o produtor não tem garantia de que os efeitos pretendidos corresponderão àqueles realmente produzidos no receptor (CHARAUDEAU, 2012: 26). O lugar das condições de recepção é divido em interno-externo e externo-externo. O primeiro é o espaço do receptor ideal, um leitor modelo imaginado pela instância produtora para ser o alvo do produto comunicacional. O segundo é o espaço do receptor real, público consumidor da informação que a interpreta conforme suas circunstâncias de leitura. O lugar do produto midiático concretizado, objeto das análises realizadas nesta pesquisa, é o local onde o discurso esta configurado como texto, verbal ou não. Como explicitado anteriormente, os sentidos pretendidos pelos produtores e os sentidos realmente produzidos nos receptores não são necessariamente coincidentes. Portanto a análise do produto, neste caso das reportagens televisivas, é um exame dos possíveis interpretativos, baseado no estudo das estruturas encontradas na amostragem e nos discursos de representação circulantes nas instâncias de produção e recepção. As mídias são atuantes nas dinâmicas e construção do espaço público onde contribuem na constituição de discursos circulantes. Os discursos circulantes são as somas dos enunciados que definem a sociedade e por meio dos quais os sujeitos de uma comunidade se reconhecem. Dentre as características do discurso circulante, ligadas às funções da representação, a que se relaciona com a nossa questão é sua função de regulação do cotidiano social, que direciona os hábitos de certo grupo social, incluindo as formas de cultura consumidas por seus integrantes. (CHARAUDEAU, 2012: 118). 19