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AVALIAÇÃO DAS NOÇÕES DE SUSTENTABILIDADE EM TRÊS CURSOS DE ENGENHARIA Eduardo Coutinho de Paula 1, Ricardo Shitsuka 2 1 Mestre em Ciências do Meio Ambiente e Recursos Hídricos, Professor de Ensino Superior, ecoutinho@unifei.edu.br 2 Doutor em Ensino de Ciências e Matemática, Professor de Ensino Superior ricardoshitsuka@unifei.edu.br Data de recebimento: 07/10/2011 - Data de aprovação: 14/11/2011 RESUMO O estudo dos conceitos e a prática da sustentabilidade vêm ganhando crescente importância em todas as áreas do conhecimento. Nos últimos anos, o tema conquistou grande visibilidade na mídia, inclusive na pauta mundial da responsabilidade socioambiental. Entende-se que é de grande relevância que os princípios e a aplicação da sustentabilidade estejam incorporados e integrados ao projeto de engenharia. Qual a percepção dos estudantes de engenharia de diferentes cursos em relação à sustentabilidade? O objetivo da presente pesquisa foi avaliar se há diferenças no conhecimento básico do conceito de sustentabilidade entre três diferentes cursos de engenharia. Realizou-se uma pesquisa exploratória, qualitativa, na qual se comparou dados fornecidos por alunos voluntários respondentes de um curso de engenharia ambiental, um curso de engenharia da computação e um de engenharia de produção. Constatou-se que os alunos de engenharia ambiental apresentaram conceito mais fortemente embasado sobre desenvolvimento sustentável. Vale destacar que embora usados como sinônimo, desenvolvimento sustentável difere do conceito de sustentabilidade. PALAVRAS-CHAVE: Ensino de engenharia; Sustentabilidade; Desenvolvimento Sustentável; Meio ambiente. EVALUATION OF THREE PRINCIPLES OF SUSTAINABILITY IN ENGINEERING COURSES ABSTRACT The study of the concepts and practice of sustainability have been gaining increasing importance in all areas of knowledge. In recent years, the issue gained high visibility in the media, including on the agenda of global environmental responsibility. We believe it is of great importance that the principles and application of sustainability are incorporated and integrated with engineering design. What is the perception of engineer students in relation to sustainability? The aim of this study was to evaluate whether there are differences in basic knowledge of the concept of sustainability among three different engineering courses. We conducted an exploratory, qualitative, in which students compared data provided by voluntary respondents in environmental engineering course, a course in computer engineering and production engineering. It is reported that environmental engineering students presented concept more strongly grounded on sustainable development. It is worth to observe that although used synonymously, sustainable development differs from the concept of sustainability. KEYWORDS: Teaching of engineering; sustainability; sustainable development; ENCICLOPÉDIA BIOSFERA, Centro Científico Conhecer - Goiânia, vol.7, N.13; 2011 Pág. 1084

environmental. INTRODUÇÃO Em todas as áreas do conhecimento, o estudo dos conceitos e a prática da sustentabilidade vêm ganhando crescente importância. Esse tema conquistou grande visibilidade na mídia atual, inclusive na pauta mundial da responsabilidade socioambiental. Há grande relevância e interesse que os princípios e a aplicação da sustentabilidade estejam incorporados e integrados ao projeto de engenharia. Este contexto inspirou os pesquisadores em avaliar a familiaridade de alunos em graduação na engenharia sobre o tema. A atual crise socioambiental, consequência dos padrões de uso de recursos naturais, de produção, consumo e distribuição de renda, com sua influência negativa sobre os ecossistemas e a saúde humana, bem como a questão das mudanças climáticas, têm aquecido o debate público sobre o tema da sustentabilidade. Sustentabilidade indica algo capaz de ser conservável, duradouro, apresentando uma imagem de continuidade. Qual a percepção dos estudantes de engenharia de diferentes cursos em relação à sustentabilidade? Como integrar os conceitos e a prática da sustentabilidade nos projetos pedagógicos dos cursos de formação de engenheiros? O objetivo da presente pesquisa foi avaliar se há diferenças no conhecimento básico do conceito de sustentabilidade entre três cursos de engenharia, a saber, engenharia ambiental, engenharia da computação e engenharia de produção. SUSTENTABILIDADE E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL A concepção de sustentabilidade começou a se formar e difundir junto com o questionamento do estilo de desenvolvimento adotado, os padrões de produção e consumo da sociedade, bem como de distribuição de renda, a exaustão dos recursos naturais e impactos adversos aos ecossistemas e à qualidade de vida das populações. A idéia e a necessidade da sustentabilidade decorrem fundamentalmente de razões éticas: a ética de perpetuação da humanidade e da vida em geral. Segundo MOLES et al. (2008), sustentabilidade é uma situação futura desejável, enquanto desenvolvimento sustentável é o processo pelo qual nos movemos do presente status quo para o futuro desejável. A sustentabilidade está voltada para uma condição desejável e necessita-se do desenvolvimento enquanto processo para alcançar aquela. O grande marco para o desenvolvimento sustentável mundial foi a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro em junho de 1992 (também chamada de Rio 92 e Eco 92 ), na qual foram aprovados uma série de documentos importantes, dentre eles a Agenda 21 Global. Este documento trata de um de um plano de ação mundial para orientar a transformação desenvolvimentista, identificando, em 40 capítulos, 115 áreas de ação prioritária. A Agenda 21 apresenta como um dos principais fundamentos da sustentabilidade o fortalecimento da democracia e da cidadania, por meio da participação dos indivíduos no processo de desenvolvimento, combinando ideais de ENCICLOPÉDIA BIOSFERA, Centro Científico Conhecer - Goiânia, vol.7, N.13; 2011 Pág. 1085

ética, justiça, participação, democracia e satisfação de necessidades. Ao longo da década de 90, o setor empresarial começou a reconhecer a necessidade de incluir a proteção do meio ambiente nas suas atividades e em 1996 a International Organization for Standardizartion (ISO) estabeleceu um conjunto de princípios para o desenvolvimento e implantação de sistemas de gestão ambiental, conhecido como ISO 14001, como contribuição às organizações para a prevenção e a mitigação dos impactos ambientais das suas atividades (ISO 2004). Em termos simplificados, a sustentabilidade é embasada no equilíbrio do tripé sociedade-economia-ambiente. Todavia, é um conceito bastante complexo e implica na consideração de várias dimensões, as quais devem ser contempladas no seu conjunto e de forma interdependente. MOLLISON (1994) apresentou o que pode ser chamado de a ética da sustentabilidade: o cuidado com a Terra, o cuidado com as pessoas, distribuição dos excedentes de produção e limite ao consumo. Isso requer um repensar de valores e dos hábitos de consumo. Na concepção de SACHS (2000), a sustentabilidade comporta cinco aspectos principais, a saber: i) Sustentabilidade Social - melhoria da qualidade de vida da população, equidade na distribuição de renda e de diminuição das diferenças sociais, com participação e organização popular; ii) Sustentabilidade Econômica - públicos e privados, regularização do fluxo dos investimentos, compatibilidade entre padrões de produção e consumo, equilíbrio de balanço de pagamento, acesso à ciência e tecnologia; iii) Sustentabilidade Ecológica - o uso dos recursos naturais deve minimizar danos aos sistemas de sustentação da vida: redução dos resíduos tóxicos e da poluição, reciclagem de materiais e energia, conservação, tecnologias limpas e de maior eficiência com regras para uma adequada proteção ambiental; iv) Sustentabilidade Espacial - equilíbrio entre o rural e o urbano, equilíbrio de migrações, desconcentração das metrópoles, adoção de práticas agrícolas mais inteligentes e não agressivas à saúde e ao ambiente, manejo sustentado das florestas e industrialização descentralizada; v) Sustentabilidade Cultural - respeito aos diferentes valores entre os povos e incentivo a processos de mudança que acolham as especificidades locais. Essa percepção da sustentabilidade em várias dimensões também é compartilhada no presente estudo, considerando-se que é preciso ampliar ainda mais as ideias. SANGUINETTO (2011) concebe que a ciência e a tecnologia poderiam entrar nesse contexto ao se voltarem para o desenvolvimento local sustentável, direcionando pesquisas e produção de conhecimentos implantados por tecnologias acessíveis, ecotecnologias ou tecnologias sociais (que promovem a inclusão social). O autor observa que o ecológico deve preceder ao econômico, sendo este ponto de vista partilhado, no resgate do entendimento de que o primeiro é base para o segundo e não ao contrário, como preconiza a economia tradicional (e hoje considerada como insustentável). Economia por seu turno está bastante relacionada no Brasil com política. Assim, pode-se pensar ainda na Sustentabilidade Política - no caso do Brasil, a evolução da democracia representativa para sistemas descentralizados e participativos, construção de espaços públicos comunitários, maior autonomia dos ENCICLOPÉDIA BIOSFERA, Centro Científico Conhecer - Goiânia, vol.7, N.13; 2011 Pág. 1086

governos locais e descentralização da gestão de recursos (BRASIL, 2006). A implementação de políticas públicas que sejam apoiadas pela população também estão relacionadas à questão da sustentabilidade e esta é possível com a descentralização mencionada. Uma dimensão de Sustentabilidade Ambiental traz a conservação geográfica, o equilíbrio de ecossistemas, a erradicação da pobreza e da exclusão, o respeito aos direitos humanos e integração social. Nesse sentido, esta última abarcaria todas as dimensões anteriores por meio de processos complexos. Um aspecto interessante a ser considerado, é a noção de cidadania ambiental defendida por WALDMAN (2003) para reequilibrar o ambiente de vida para a sociedade. O autor coloca que a difusão do conceito de responsabilidade ambiental é importante, pois é inseparável da noção de cidadania ambiental:... o meio ambiente é um bem coletivo, não podendo a qualquer pretexto, desvincular-se desse paradigma. Desta forma, nada mais coerente do que uma visão abrangente de cidadania, configurada em responsabilidades compartilhadas difundidas nos mais diversos recortes sociais, políticos e econômicos. (p. 555). A chamada responsabilidade ambiental atualmente é parte integrante da ISO 26000, a norma internacional de Responsabilidade Social, que dedica todo um capítulo ao eixo temático Meio Ambiente (BELINKY; COUTINHO DE PAULA, 2008). Outros eixos temáticos da norma são: Direitos Humanos, Práticas de Trabalho, Práticas Operacionais Justas, Desenvolvimento da Comunidade e Questões dos Consumidores. O eixo Governança Organizacional permeia todos os demais. A ISO 26000 foi publicada em novembro de 2010 e em seu conjunto, como guia de diretrizes, está sendo chamada de a norma da sustentabilidade. Essa norma revela-se como um poderoso instrumento para trazer às organizações de todos os tipos e portes a verdadeira incorporação dos princípios e práticas da responsabilidade socioambiental em nível mundial. Segundo MULLER JÚNIOR (2008), a sustentabilidade é a capacidade dos diversos sistemas da Terra, incluindo as economias e sistemas culturais humanos, de sobreviverem e se adaptarem às condições ambientais em mudança. O autor traz os quatro princípios da sustentabilidade, inspirados nas grandes formas que a natureza utiliza para se adaptar e se sustentar por vários bilhões de anos. São eles: biodiversidade, reciclagem de nutrientes e matéria, energia renovável e controle populacional. Por meio desses princípios, podem-se projetar sociedades, economias e produtos, sendo, portanto de vasta aplicação para a engenharia. Estes estudos são importantes para os futuros engenheiros que vão lidar com projetos, máquinas e equipamentos, instalações e fábricas, produtos e enfim realizações humanas nas quais estão presentes os princípios da Física, Química e Matemática. Nas Diretrizes Curriculares o ensino de Ciências do Ambiente se situa entre as disciplinas do denominado núcleo básico: Art. 6º Todo o curso de Engenharia, independente de sua modalidade, deve possuir em seu currículo um núcleo de conteúdos básicos, um núcleo de conteúdos profissionalizantes e um núcleo de conteúdos específicos que caracterizem a modalidade. 1º O núcleo de conteúdos básicos, cerca de 30% da carga horária mínima, versará sobre os tópicos que seguem: I - Metodologia Científica e Tecnológica; ENCICLOPÉDIA BIOSFERA, Centro Científico Conhecer - Goiânia, vol.7, N.13; 2011 Pág. 1087

II - Comunicação e Expressão; III - Informática; IV - Expressão Gráfica; V - Matemática; VI - Física; VII - Fenômenos de Transporte; VIII - Mecânica dos Sólidos; IX - Eletricidade Aplicada; X - Química; XI - Ciência e Tecnologia dos Materiais; XII - Administração; XIII - Economia; XIV - Ciências do Ambiente; XV - Humanidades, Ciências Sociais e Cidadania. 2º Nos conteúdos de Física, Química e Informática, é obrigatória a existência de atividades de laboratório. Nos demais conteúdos básicos, deverão ser previstas atividades práticas e de laboratórios, com enfoques e intensidade compatíveis com a modalidade pleiteada (BRASIL, 2002). Disciplinas do núcleo básico como é o caso da Matemática fazem parte dos cursos de engenharia seja ambiental, de computação ou produção (SHITSUKA; SILVEIRA, 2011). O estudo de um núcleo de disciplinas comuns caracteriza todas as modalidades de engenharia como tendo aspectos comuns que os tornam mais engenheiros do que outras profissões. Entende-se que o tema da sustentabilidade deva ser ensinado em todos os cursos de engenharia, por meio do estudo das Ciências do Ambiente, no item XIV, também existindo a relação com a Cidadania no item XV, e Tecnologia no item XI, como é assegurado nas orientações mencionadas. METODOLOGIA A pesquisa exploratória é um tipo de pesquisa inicial na qual se faz questionamentos por meio de entrevistas e avaliações. (SEVERINO, 2007; YIN, 2011). Este tipo de pesquisa é importante para indicar rumos a serem seguidos em trabalhos posteriores. O presente estudo foi realizado no mês de setembro de 2011 em uma Universidade pública localizada na região sudeste do país, na qual existem os cursos de engenharia ambiental, da computação e de produção. Realizou-se uma pesquisa exploratória com aplicação de questionários e entrevistas em grupos de alunos de engenharia. O grupo entrevistado constou de 42 alunos, sendo 14 do curso de engenharia ambiental, 14 do curso de engenharia da computação e 14 da engenharia de produção. Os estudantes do primeiro grupo eram especificamente do 4 o período, enquanto os do segundo grupo eram compostos por: 8 do 7 o período, 1 do 4 o período e 5 do 2 o período. Os alunos do terceiro grupo eram constituídos por: 6 alunos do 2 o período e 8 do 4 o período do curso de engenharia de produção. O questionário base utilizado nas entrevistas constou de perguntas envolvendo: 1. O curso no qual o aluno estuda; 2. O período no qual o aluno se encontra no curso; 3. Sexo e idade; ENCICLOPÉDIA BIOSFERA, Centro Científico Conhecer - Goiânia, vol.7, N.13; 2011 Pág. 1088

4.1. Você conhece o que é sustentabilidade? ( ) Sim ( ) Não. 4.2. Se sim, defina sustentabilidade. 4.3. Caso positivo, qual o seu grau de conhecimento? Dê uma nota de 1 a 5, (onde 1 = nenhum conhecimento e, 5 = conhecimento máximo). RESULTADOS E DISCUSSÃO Categorizando por tipo de Engenharia O resultado da pesquisa revelou que 100% dos alunos de engenharia ambiental afirmam conhecer o significado da sustentabilidade, dos quais 42,9% atribuíram a si mesmos um nível 5 de conhecimento, numa escala de 1 a 5, no qual 1 representa nenhum conhecimento e 5 conhecimento máximo. Nesse grupo, 28,5% afirmaram um nível 4 de conhecimento, tendo 14,3% dos alunos atribuído a si mesmos um nível 3 de conhecimento, e os 14,3% restantes com nível 2. Na prática, 100% dos alunos entrevistados nesse grupo apresentaram respostas satisfatórias, dos quais 78,6% mencionaram a expressão futuras gerações, que é diretamente vinculada ao conceito de desenvolvimento sustentável. Tal como consagrado no Relatório Brundtland, define-se por desenvolvimento sustentável um modelo econômico, político, social, cultural e ambiental equilibrado, que satisfaça as necessidades das gerações atuais, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazer suas próprias necessidades (CMMAD, 1988). Isso caracteriza a grande familiaridade dos alunos de engenharia ambiental com o conceito de desenvolvimento sustentável. Cabe uma observação de que, a rigor, o conceito de sustentabilidade difere do conceito de desenvolvimento sustentável. No caso dos alunos de engenharia de computação, 64,3% afirmaram desconhecer completamente o que é sustentabilidade. Do grupo de alunos restantes que afirmaram saber o que é sustentabilidade, apenas 20% atribuiu a si mesmo nível 4 de conhecimento, mas não soube responder adequadamente o significado de sustentabilidade. Na prática, do total de alunos de engenharia de computação entrevistados, 28,6% associaram sustentabilidade à relação com o meio ambiente e/ou uso dos recursos naturais. É importante lembrar que o complexo conceito da sustentabilidade é muito mais que aspectos do meio ambiente. Possivelmente, os alunos da engenharia da computação estão mais propensos a pensar e estudar as questões relacionadas à tecnologia da informação, softwares e hardwares, principalmente a programação, as redes de computadores e os sistemas de informação. No caso dos alunos do curso de engenharia da computação, não se observou diferenças entre os alunos do 2 o e 7 o período, indicando que apesar dos anos de estudo a mais, os alunos do 7 o período não apresentaram mais conceitos em relação aos alunos do início do curso. Em relação ao grupo de engenharia de produção, 85,7% afirmaram conhecer o significado de sustentabilidade e na prática responderam satisfatoriamente sobre o conceito. Destes, 41,7% atribuíram a si mesmo nível 3 de conhecimento e 25% atribuíram nível 4. A expressão explícita de futuras gerações constou em 41,7% das respostas, enquanto a associação com o meio ambiente e/ou recursos naturais esteve presente em 83,3% dos questionários. Igualmente ao grupo de graduandos em engenharia ambiental, existe grande familiaridade destes com o conceito de desenvolvimento sustentável. Não foram observadas diferenças nas respostas de ENCICLOPÉDIA BIOSFERA, Centro Científico Conhecer - Goiânia, vol.7, N.13; 2011 Pág. 1089

alunos do 4 o em relação aos do 2 o período. A formação de engenheiros de produção normalmente dá maior ênfase aos processos produtivos, planejamento e gestão, otimização de recursos, sistemas integrados de pessoas, máquinas e informações para produzir bens e serviços. Os alunos do 7 o período de engenharia da computação entrevistados contam com mais que 21 anos, ao passo que os de ambiental contam com até 20 anos, tendo os alunos da engenharia de produção a faixa de idade entre 17 e 21 anos. Na categorização por idade, não foi observada diferenciação das respostas. Por um lado, é de amplo conhecimento que o tema da sustentabilidade invadiu a mídia, em especial nos últimos quatro anos, sendo inclusive usada como marketing verde por grandes empresas e corporações, na onda da chamada responsabilidade socioambiental. Ao mesmo tempo, pode-se perceber que a discussão sobre a sustentabilidade ainda não foi devidamente aprofundada na academia, tomando-se por base a presente pesquisa com alunos de engenharia. Segundo MORIN (2003), fazendo consideração ao papel da Universidade, esta tem uma função ao mesmo tempo conservadora, regeneradora e geradora de novos conhecimentos, devendo adaptar-se às necessidades da sociedade contemporânea, ao mesmo tempo em que mantém viva sua missão transecular de conservar, transmitir e enriquecer o patrimônio cultural universal. Entende-se que certamente uma discussão sobre sociedade, ciência e tecnologia deve ser aprofundada durante a graduação de engenheiros, pois a formação do profissional em engenharia está na aplicação do conhecimento das ciências voltada para a solução de desafios e necessidades da sociedade. Conforme afirmam HOLTZAPLLE e REECE (2006), é essencial mudar o rumo da antiga disputa homem versus natureza. Considera-se que cabe aos engenheiros a importante posição de verdadeira parceria com a natureza, buscando superar os atuais impasses de caráter social, ambiental e econômico que afligem a humanidade. Portanto, há grande relevância de que os princípios e a aplicação da sustentabilidade sejam incorporados e integrados ao projeto de engenharia. Aos engenheiros e engenheiras é fundamental entender o impacto das soluções técnicas em um contexto social, do local, passando pelo regional, ao global. CONCLUSÃO Os alunos do curso de engenharia da computação foram quase unânimes em apresentar seu desconhecimento em relação ao significado de sustentabilidade. No caso dos alunos de engenharia de produção, observou-se o contrário. Considera-se importante que se trabalhe a cidadania em seus diversos aspectos, incluindo a cidadania ambiental e que também vai ao encontro das Leis de Diretrizes e Bases da Educação, lei 9394 de 1996, orientando que a mesma seja trabalhada e ensinada nas escolas, em todos os níveis educacionais. Verificou-se que os alunos da engenharia ambiental e engenharia de produção contam com uma conceituação mais sólida sobre desenvolvimento sustentável em relação aos alunos de engenharia da computação. Este fato é coerente com a natureza dos cursos, ressaltando-se, porém, que, embora muitas vezes usados como sinônimos, o conceito sobre desenvolvimento sustentável é diferente de sustentabilidade. Em outras palavras, o embasamento do segundo deve ENCICLOPÉDIA BIOSFERA, Centro Científico Conhecer - Goiânia, vol.7, N.13; 2011 Pág. 1090

ser aplicado ao planejamento do primeiro. Enfatiza-se ainda que tais conceitos não são ligados estritamente à área ambiental, sendo essencial nos tempos atuais para todos os campos de atuação da engenharia. Nesse contexto, defende-se a ideia da importância de que o processo de formação dos profissionais de engenharia, em todas as suas modalidades, possa atender de modo adequado a demanda de conhecimentos teóricos e práticos da sustentabilidade, sendo fundamental que os projetos de engenharia contemplem a sustentabilidade em todas as suas fases. REFERÊNCIAS AGENDA 21. Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento Sustentável de 1992. Brasília: Câmara dos Deputados, Coordenação de Publicações, 1995. BELINKY, A.; COUTINHO DE PAULA, E. Rede de Cooperação para Sustentabilidade e a construção da norma ISO 26000. IV Simpósio Mineiro de Engenharia Ambiental. Universidade Federal de Itajubá UNIFEI, outubro, 2008. BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Diretrizes Curriculares para os Cursos de Engenharia. Brasília, 2002. BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Secretaria de Políticas para o Desenvolvimento Sustentável. Referências conceituais e metodológicas para gestão ambiental em áreas rurais. Brasília, 2006 CMMAD - COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO. Nosso futuro comum. Rio de Janeiro: Editora FGV, 1988. HOLTZAPPLE, M.T.; REECE, W.D. Introdução à Engenharia. Rio de Janeiro : LTC, 2006. ISO - International Organization for Standardization. ISO 14001 environmental management systems: specification with guidance for use. ISO, Genebra, 2004. MILLER JUNIOR, G. T. Ciência ambiental. [Environmental science: working with the earth. 11th ed (Inglês). Tradução de All Tasks, Revisão técnica de Wellington Braz Carvalho Delitti. 11 ed. 2 reimpr. São Paulo: Cengage Learning, 2008. MOLES, R., FOLEY, W, MORRISSEY, J., O REGAN, B. Practical appraisal of sustainable development Methodologies for sustainability measurement at settlement level. Environmental Impact Assessment Review 28: 144 165; 2008. MOLLISON, B. Introdução à Permacultura. Tyalgum, Austrália: Tagari Publications. 2a Edição, 1994. Edição brasileira: Rede Brasileira de Permacultura. MORIN, E. A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. 8ª edição. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003. ENCICLOPÉDIA BIOSFERA, Centro Científico Conhecer - Goiânia, vol.7, N.13; 2011 Pág. 1091

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