ANÁLISE AMBIENTAL DA SUB-BACIA HIDROGRÁFICA DOS ARROIOS JUÁ E CARACOL BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO CAÍ / RS. Maycon Damasceno Mestrando em Geografia pela UFRGS mayconx@gmail.com Dejanira Luderitz Saldanha Profa. do PPG GEA da UFRGS dejanira.saldanha@ufrgs.br 1. Introdução A Geografia desde a sua concepção como ciência tem no espaço geográfico, o seu principal objeto de estudo, o que nos permite analisar a dinâmica existente entre as relações que se estabelecem entre os diferentes grupos sociais, ao longo do tempo, e a sua materialização no espaço. Através de sua evolução histórica, a ciência geográfica contribuiu de forma significativa para a compreensão das conseqüências das ações que o homem como agente atuante e modificador do espaço pode acarretar sobre o ambiente natural, buscando analisar e orientar o seu planejamento com o objetivo de assegurar a preservação do patrimônio natural e cultural. Sobre essa perspectiva, esta pesquisa toma como unidade de análise a Bacia Hidrográfica dos Arroios Juá e Caracol, numa abordagem sistêmica e integrada dos diversos elementos, processos e interações. Pretende, portanto criar condições de um manejo e de um uso correto das potencialidades dos recursos naturais para um desenvolvimento com sustentabilidade. Esse processo viabiliza a qualidade da vida social e também do meio físico. Objetivo principal deste estudo é avaliar e comparar, através da análise de parâmetros ambientais, o nível de intervenção antrópica e a situação ambiental das sub-bacias do Arroio Juá e Caracol, afluentes do Rio Caí, RS. Um dos grandes desafios do homem para a conservação ambiental é concentrar esforços e recursos para a preservação e recuperação de áreas consideradas estratégicas, das quais vários ecossistemas são dependentes. Dentre essas, destacam-se as Áreas de 1
Proteção Permanente (APP s) que tem papel vital dentro de uma bacia hidrográfica por serem responsáveis pela manutenção, preservação e conservação dos ecossistemas ali existentes, (Magalhães Ferreira, 2000). O código Florestal Brasileiro (Lei 4.771/65) que instituiu as APP s já conta com cerca de 40 anos sem que, no entanto, seja bem entendida a finalidade para a qual se destinam essas áreas. As APP s foram criadas para proteger o ambiente natural não se permitindo qualquer alteração no uso de seu solo. Devem, portanto, estarem cobertas pela vegetação original. As técnicas de geoprocessamento e sensoriamento remoto podem auxiliar no planejamento e no controle ambiental. Decisões estratégicas exigem uma grande quantidade de informações que podem ser facilmente analisadas com o uso destas ferramentas, tais como: o uso do solo e a influência do relevo, do clima e da hidrografia nas características físicas e ocupacionais de uma dada região. Está é uma pesquisa em estágio inicial e como tal ainda não permite conclusões a respeito da qualidade ambiental das bacias estudas, mesmo assim, já podemos estabelecer alguns resultados preliminares através do mapeamento do uso e ocupação do solo da área de estudo e seus conflitos frente à legislação ambiental atual. O presente artigo utiliza a geotecnologia para realizar o mapeamento de uso e cobertura do solo, que servirão para mapear e identificar os conflitos de uso do solo nas Áreas de Preservação Permanente ao longo dos cursos d água, tendo em vista a resolução do CONAMA nº 303/2002 e o Código Florestal do Estado do Rio Grande do Sul. Para a aplicação inicial da presente pesquisa, foi utilizada somente a Bacia Hidrográfica do Arroio Juá/RS, desta forma de posse de alguns resultados preliminares podemos estabelecer o mapeamento das áreas de conflito frente à legislação ambiental atual e que servira como padrão para a aplicação na Bacia Hidrográfica do Arroio Caracol/RS. 2. Metodologia de Trabalho A metodologia geográfica da pesquisa propõe uma visão sistêmica proporcionada pela escolha da bacia hidrográfica como unidade de análise. A análise ambiental será estabelecida dando ênfase a geomorfologia e englobando múltiplos fatores - naturais e antrópicos - que contribuem para a conformação da realidade local, sempre na perspectiva de um processo dinâmico e permanentemente ativo. 2
2.1. Localização geográfica da área de estudo A Bacia do Arroio Juá está localizada na região nordeste do estado do Rio Grande do Sul e abrange os municípios de Canela e São Francisco de Paula. Possui uma área de 12487,27 ha e está localizada entre as coordenadas 29 06 36 e 29 15 07 de latitude sul e 50 46 45 e 50 52 39 de longitude oeste, com altitudes que variam entre 200 a 980 metros. O arroio Juá é afluente direito do Rio Caí que por sua vez integra a bacia hidrográfica do Rio Caí. 2.2. Mapeamento do uso do solo Para o mapeamento do uso e cobertura do solo da bacia hidrográfica do Arroio Juá foi utilizada uma imagem do sensor Landsat 5, com resolução espacial de 30 metros, e seis bandas espectrais do espectro refletido desde o visível até o infravermelho de ondas curtas, datada de fevereiro de 2004. O mapa de uso do solo e cobertura vegetal foi gerado através do processo de classificação supervisionada utilizando o algoritmo da Máxima Verossimilhança que exige a definição de um conjunto de amostras de treinamento para cada classe a ser diferenciada na imagem classificada. De acordo com Crósta (1992) o método Maxver, que utiliza a distribuição Gaussiana dos pixels de treinamento, tem como pressuposto a idéia que o usuário conheça a imagem a ser classificada de tal modo que possa definir quantas e quais as classes que sejam mais representativas do uso e cobertura do solo. Para a análise e a definição das amostras das classes de uso e cobertura de solo foi utilizado, neste trabalho, o software ENVI 4.5. As bandas espectrais 4, 3, 2 da composição colorida RGB, foi submetida ao contraste linear obtendo-se um melhor contraste visual entre os diversos alvos da imagem permitindo uma melhor diferenciação dos mesmos. A classificação foi realizada com o conjunto das seis bandas do espectro reflectivo. Foram identificadas 6 (seis) classes de uso e cobertura do solo quais sejam: silvicultura, mata nativa, corpos d água, campos secos, banhados ou campos úmidos e agricultura/solos expostos. Os polígonos das diversas classes foram vetorizados e exportados para o ArcGis 9.3.1 para a identificação e a quantificação das área de preservação permanente e a elaboração dos mapa de uso dos solo, figura 01. 3
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Figura 1 Mapa de uso e cobertura do solo da Bacia Hidrográfica do Arroio Juá. Fonte COMITECAÍ (2007). 2.3. Mapeamento das Áreas de Preservação Permanentes (APP s) As áreas de preservação permanente foram definidas ao longo do curso d água principal do Arroio Juá e seus afluentes. Foi utilizada a operação Buffer Selected Features do software ArcGIS 9.3.1, definindo-se um buffer (distanciamento) de 30 metros de cada lado da drenagem ao longo do leito do arroio. Esse distanciamento foi fundamentado na resolução CONAMA nº 303/2002, Art.3º que cita: constitui Área de Preservação Permanente a área situada em faixa marginal, medida a partir do nível mais alto, em projeção horizontal, com largura mínima de trinta metros, para o curso d água com menos de dez metros de largura, e no Código Florestal (Lei 4.771/1965), que considera essas áreas, cobertas ou não por vegetação nativa; com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico da fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem estar das populações humanas. O resultado constitui-se no mapa de APP s representado pela figura 02. 6
Figura 02 Mapa com a delimitação das APP s ao longo dos cursos d água da Bacia Hidrográfica do Arroio Juá. Fonte COMITECAÍ (2007). 7
1.4. Mapa conflito de Uso nas Áreas de Preservação Permanentes (APP s). Para identificar as áreas de conflito no uso do solo nas APP s foi realizado uma sobreposição ou overlay do mapa de uso e cobertura do solo com o mapa das APP s. Esse procedimento delimitou as áreas onde ocorrem solos antropizados, qualificando e quantificando as áreas que estavam contidas nos limites dos 30m das APP s. 8
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Figura 03 Mapa Conflito de Uso do Solo nas APP s ao longo dos cursos d água da Bacia Hidrográfica do Arroio Juá. Fonte COMITECAÍ (2007). Com base na sobreposição do mapa de uso e ocupação do solo (Figura 1) e do mapa das APP s da bacia (Figura 2) foi considerada sob uso inadequado e/ou conflitante, toda a área com plantio de árvores exóticas (silvicultura), área agrícola e solo exposto que se encontra nas APP s. As áreas ocupadas com vegetação secundária que representam a fragmentação florestal foram consideradas áreas com uso adequado do solo. 3. Resultados e Discussões Com a classificação da imagem multiespectral do satélite Landsat 5 foi possível mapear seis diferentes tipos de uso e cobertura do solo presentes na área em estudo: agricultura/solo exposto, banhado/campo úmido, campo seco, corpo d'água, mata nativa e silvicultura como ilustra a figura 01. As classes de uso e cobertura do solo foram quantificadas, obtendo-se o percentual correspondente a cada classe, como mostra a Tabela 1. Pela distribuição dos usos na bacia pode-se constatar que a maior parte dela está ocupada pela vegetação de mata nativa (55,62%) e áreas de campo (33,94%), o que mostra que a bacia encontra-se ainda bem preservada. Tabela 1 - Quantificação das áreas de ocupação e uso do solo da Bacia Hidrográfica do Arroio Juá. Classes de Uso do Solo Área da Bacia Hidrográfica Área de Conflito na APP's ha % ha % Agricultura / Solo Exposto 484,45 3,88% 21,09 2,21% Banhados / Campo Úmido 101,06 0,81% 7,78 0,81% Campo Seco 4238,47 33,94% 151,87 15,89% Corpo d'água 20,01 0,16% 2,87 0,30% Mata Nativa 6945,37 55,62% 734,87 76,91% Silvicultura 697,71 5,59% 36,98 3,87% Total 12487,07 100,00% 955,46 100,00% 10
No entanto, a existência de áreas cuja ocupação provém da intervenção antrópica na bacia está sinalizada pelo aumento da silvicultura (5,59%) na região. As áreas de preservação permanente foram delimitadas de acordo com as direções encaminhadas pelo Código Florestal Brasileiro (Lei 4.771/65), totalizando uma área mapeada de 955,46 ha indicando que 7,65% da área da Bacia Hidrográfica do Arroio Juá é ocupada por APP s. Foram avaliadas ainda, áreas de uso adequado e áreas de uso inadequado (conflito). Verificou-se que as áreas de uso adequado, ocupadas por vegetação nativa e campos, correspondem a 93,62% da área total de APP s, sendo de significativa importância, pois a maioria desta área está de acordo com o que determina o código florestal. As áreas de conflito de uso do solo (Figura 3) foram consideradas as áreas alteradas por ações antrópicas, constituindo as classes de agricultura, solo exposto e a silvicultura. Essas áreas representam locais de conflito de uso na região. As áreas de preservação permanente de encostas e topo de morros não foram consideradas. 4. Considerações Finais A área deste estudo insere-se no Bioma Mata Atlântica na região nordeste do estado Rio Grande do Sul. Esse bioma tem sua importância reconhecida internacionalmente devido a sua biodiversidade considerada maior que a da floresta amazônica. Estende-se ao longo do litoral brasileiro e já ocupou mais de 40% do território gaúcho. Hoje, esse percentual não passa de 3%, fato que deixa clara a importância de preservação dos fragmentos florestais ainda restantes desse bioma. Com o mapeamento das áreas de conflito de uso na Bacia Hidrográfica do Arroio Juá verificou-se que 6,08ha da área estão ocupados por agricultura, solo exposto e silvicultura denunciando a ação antrópica, desenvolvidas em áreas legalmente protegidas pela legislação ambiental. Esse resultado, se comparado com as áreas próximas, pode ser considerado um estágio primário de ocupação pelo homem sendo, portanto essencial que seja elaborado um planejamento do uso e conservação da área visto que a região em questão é alvo da ação intensiva de crescimento e expansão da atividade de silvicultura. Esta tendência pode provocar uma forte mudança na paisagem. 11
O uso de imagens orbitais, como no caso em questão, do sensor TM do satélite Landsat 5 representa uma ferramenta de suma importância na realização do trabalho. A aquisição sistemática de dados desta natureza permite o mapeamento eficaz, o posterior diagnóstico da Bacia Hidrográfica do Arroio Juá, a possibilidade de contínuo monitoramento, além de ser uma ferramenta essencial para o planejamento do uso do solo desta bacia. 5. Referências CRÓSTA, Processamento Digital de Imagens de Sensoriamento Remoto / Alvaro Penteado Crósta. Campinas, SP: IG/UNICAMP, 1992. FITZ, Paulo Roberto Geoprocessamento sem complicação / Paulo Roberto Fitz. São Paulo: Oficina de Textos, 2008. MAGALHÃES, C.S.; Ferreira, R.M. Áreas de Preservação Permanente em uma Microbacia, Informe Agropecuário, Belo Horizonte. V. 21, n.207, p. 33-39, 2000. LEI Nº. 4.771/65, DE 15 DE SETEMBRO DE 1965. Diário Oficial da União; Código Florestal; Brasília; 1965. COMITECAÍ, Plano de Bacia Bacia Hidrográfica do Rio Caí. Relatório Temático A1 Dinâmica Social. Comitê de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica do Rio Caí, Porto Alegre, 2007. Disponível em: <http://www.comitecai.com.br/plano/download.html>. COMITECAÍ, Plano de Bacia Bacia Hidrográfica do Rio Caí. Relatório Temático A2 Disponibilidade Hídrica. Comitê de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica do Rio Caí, Porto Alegre, 2007. Disponível em: <http://www.comitecai.com.br/plano/download.html>. 12