INFORMAÇÃO TÉCNICO-JURÍDICA Nº 02/2013-CAOCRIM EMENTA: Roubo majorado pelo emprego de arma de fogo. Apreensão da arma e exame pericial. Desnecessidade para o fim de se comprovar a potencialidade lesiva. Circunstância que pode ser evidenciada por outros meios, tais como: palavra da vítima e depoimento testemunhal. O CENTRO DE APOIO OPERACIONAL CRIMINAL E DA SEGURANÇA PÚBLICA (CAOCrim), com fundamento no art. 33, inciso II, da Lei nº 8.625/93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público) e art. 60, inciso II, da Lei Complementar-GO nº 25/1998 (Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de Goiás), expede a INFORMAÇÃO TÉCNICO- JURÍDICA Nº 02/2013-CAOCRIM, sem caráter vinculativo, aos órgãos de execução do Ministério Público do Estado de Goiás, com atuação na área criminal, fundamentando-se no que se segue: Considerando que ao Ministério Público foi entregue pelo legislador constituinte a nobre missão de defesa da ordem jurídica (art. 127, CF/88); Considerando que o tipo penal descrito no art. 157, 2º, inciso I, do Código Penal estabelece o delito de roubo majorado ou circunstanciado, nos seguintes termos: Art. 157. Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência: Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 10 (dez) anos, e multa. 2º. A pena aumenta-se de um terço até metade: I - se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma; Considerando que acerca do emprego de arma de fogo no crime de roubo formaramse duas correntes, a saber: teoria objetiva e teoria subjetiva ; 1/5
Considerando que, segundo a teoria objetiva, para que haja a incidência da causa de aumento de pena tal como previsto no preceptivo em testilha, deve-se ter em mira o efetivo perigo que o artefato possa trazer à vítima, ou seja, a maior potencialidade de lesão à integridade física e psíquica do sujeito passivo (e não a maior capacidade de amedrontar a vítima), na linha do que ensinam os autores: Alberto Silva Franco, Celso Delmanto, Cezar Roberto Bitencourt, Guilherme de Souza Nucci, etc. Considerando, por outro lado, que, para a teoria subjetiva, a ratio essendi da majorante prevista no art. 157, 2º, inciso I, do Código Penal está no maior potencial de intimidação da vítima, sendo absolutamente irrelevante que o autor se valha de uma arma verdadeira ou de um simulacro para a prática do roubo (em ambas as hipóteses a majorante se faria incidir); Considerando que esse entendimento (teoria subjetiva) contava com o apoio do lendário mestre Nélson Hungria e veio a ser perfilhado pelo Superior Tribunal de Justiça com a edição do verbete sumular nº 174 ( No crime de roubo, a intimidação feita com arma de brinquedo autoriza o aumento da pena ); Considerando, todavia, que sob intensas críticas da corrente favorável ao critério objetivo, o entendimento inicialmente adotado pelo STJ foi modificado, sendo certo que, por ocasião do julgamento do REsp nº 213.054-SP, na sessão de 24/10/2002, a Terceira Seção houve por bem decidir pelo cancelamento da mencionada súmula; Considerando que o entendimento abraçado pelo critério subjetivo foi praticamente extirpado da seara jurisprudencial, notadamente no que importa ao agravamento em razão da utilização de arma de brinquedo ; Considerando, todavia, que sobre os crimes de roubo praticados mediante violência ou grave ameaça exercida com o emprego de arma de fogo (hipótese diversa do roubo com arma de brinquedo, portanto), após alguma oscilação jurisprudencial, o Supremo Tribunal Federal flexibilizou a teoria objetiva 1 para o fim de se pacificar o entendimento pela desnecessidade da 1 Tanto assim o Min. Ricardo Lewandowski, no julgamento do HC nº 115.519, ressaltou que na hipótese [roubo com arma de fogo não apreendida e não periciada], o que interessa ao tipo é que se trata de instrumento apto a incutir profundo temor às vítimas, desestimulando qualquer reação defensiva. 2/5
apreensão da arma de fogo e do exame pericial para a incidência da majorante, desde que estejam presentes nos autos outros elementos que possam comprovar a utilização artefato. Nesse sentido, a decisão do plenário do Supremo Tribunal Federal, publicada no DJ de 04 de junho de 2009, foi paradigmática: ROUBO QUALIFICADO PELO EMPREGO DE ARMA DE FOGO. APREENSÃO E PERÍCIA PARA A COMPROVAÇÃO DE SEU POTENCIAL OFENSIVO. DESNECESSIDADE. CIRCUNSTÂNCIA QUE PODE SER EVIDENCIADA POR OUTROS MEIOS DE PROVA. ORDEM DENEGADA. I - Não se mostra necessária a apreensão e perícia da arma de fogo empregada no roubo para comprovar o seu potencial lesivo, visto que tal qualidade integra a própria natureza do artefato. II - Lesividade do instrumento que se encontra in re ipsa. III - A qualificadora do art. 157, 2º, I, do Código Penal, pode ser evidenciada por qualquer meio de prova, em especial pela palavra da vítima - reduzida à impossibilidade de resistência pelo agente - ou pelo depoimento de testemunha presencial. IV - Se o acusado alegar o contrário ou sustentar a ausência de potencial lesivo da arma empregada para intimidar a vítima, será dele o ônus de produzir tal prova, nos termos do art. 156 do Código de Processo Penal. V - A arma de fogo, mesmo que não tenha o poder de disparar projéteis, pode ser empregada como instrumento contundente, apto a produzir lesões graves. VI - Hipótese que não guarda correspondência com o roubo praticado com arma de brinquedo. VII - Precedente do STF. VIII - Ordem indeferida. (HC 96099, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Tribunal Pleno do STF, DJe-104 de 04-06-2009). 2 Após a orientação plenária acima reproduzida, ambas as cortes do STF passaram a decidir a matéria de maneira uníssona, ou seja, considerando que a circunstância do art. 157, 2º, I, do Código Penal, pode ser evidenciada por qualquer meio de prova, sendo desnecessárias a apreensão e a perícia, em razão de que, exigir uma perícia para atestar a potencialidade lesiva da arma empregada no delito de roubo, ainda que cogitável no plano das especulações acadêmicas, teria como resultado prático estimular o criminoso a desaparecer com ela, de modo que a majorante do art. 157, 2º, I, do Código Penal dificilmente poderia ser aplicada, a não ser nas raras situações em que haja presos em flagrante, empunhando o artefato ofensivo. Significaria, em suma, beneficiálos com a própria torpeza, hermenêutica essa que não se coaduna com a boa aplicação do Direito (excertos do voto do Min. Ricardo Lewandowski, no HC nº 115.519). 2 Seguindo essa trilha, o Tribunal de Justiça de Pernambuco editou a Súmula nº 90, com a seguinte redação: É dispensável a apreensão e o exame de eficiência da arma de fogo, quando o conjunto probatório evidenciar a incidência da qualificadora do art. 157, 2º, inc. I, do Código Penal. 3/5
Nesse exato sentido: HABEAS CORPUS. CRIME DE ROUBO QUALIFICADO. ARMA NÃO APREENDIDA E NÃO PERICIADA. ORDEM DENEGADA. Vigora no Direito brasileiro e no Direito contemporâneo em geral o princípio da livre convicção motivada. O reconhecimento da causa de aumento de pena prevista no art. 157, 2º, I, do Código Penal prescinde da apreensão e da realização de perícia na arma - no caso uma granada -, quando provado o seu uso no roubo por outros meios de convicção. Inteligência dos arts. 158 3 e 167 4 do Código de Processo Penal brasileiro. Precedente do Plenário (HC 96.099/RS). Habeas corpus denegado. (Habeas Corpus nº 108.034/MG, 1ª Turma do STF, Rel. Rosa Weber. unânime, DJe 21.08.2012). PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ROUBO MAJORADO PELO EMPREGO DE ARMA. APREENSÃO E PERÍCIA PARA A COMPROVAÇÃO DE SEU POTENCIAL OFENSIVO. DESNECESSIDADE. CIRCUNSTÂNCIA QUE PODE SER EVIDENCIADA POR OUTROS MEIOS DE PROVA. JURISPRUDÊNCIA DO STF. ORDEM DENEGADA. I - Não se mostra necessária a apreensão e perícia da arma empregada no roubo para comprovar o seu potencial lesivo, visto que essa qualidade integra a própria natureza do artefato. II - Lesividade do instrumento que se encontra in re ipsa. III - A majorante do art. 157, 2º, I, do Código Penal pode ser evidenciada por qualquer meio de prova, em especial pela palavra da vítima - reduzida à impossibilidade de resistência pelo agente - ou pelo depoimento de testemunha presencial. IV - Habeas corpus denegado. (Habeas Corpus nº 115.519/DF, 2ª Turma do STF, Rel. Ricardo Lewandowski. j. 18.12.2012, unânime, DJe 15.02.2013). Considerando que, se o acusado alegar o contrário [que não portava arma de fogo verdadeira] ou sustentar a ausência de potencial lesivo da arma empregada para intimidar a vítima, será dele o ônus de produzir tal prova, nos termos do art. 156 do Código de Processo Penal. (Habeas Corpus nº 108.720/MG, 1ª Turma do STF, Rel. Min. Luiz Fux, unânime, DJe 05.06.2012). É dizer, a qualificadora do art. 157, 2º, inciso I, do Código Penal, pode ser evidenciada por qualquer meio de prova, em especial pela palavra da vítima, ou, ainda, pelo depoimento de testemunha presencial. Considerando, por fim, que a anunciada flexibilização da teoria objetiva promovida pelo STF chegou ao Congresso Nacional que, por meio do Projeto de Lei nº 2.297/11, pretende 3 Art. 158. Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado. 4 Art. 167. Não sendo possível o exame de corpo de delito, por haverem desaparecido os vestígios, a prova testemunhal poderá suprir-lhe a falta. 4/5
promover uma alteração pontual no Código Penal para o fim de repristinar a cancelada Súmula nº 174 do STJ (que deitava raízes sobre a teoria subjetiva), in ipsis litteris: Art. 1º O inciso I, do 2º, do art. 157 do Decreto-Lei nº 2.848, de 1940 Código Penal - passa a vigorar com a seguinte redação: Art. 157. (...) 2º (...) I se a violência ou grave ameaça é exercida com emprego de arma ou simulacro de arma ; O Centro de Apoio Operacional Criminal e da Segurança Pública delibera por INFORMAR aos órgãos de execução do Ministério Público do Estado de Goiás, sem caráter vinculativo, que, na linha da jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal: a) a majorante do art. 157, 2º, inciso I, do Código Penal, pode ser evidenciada por qualquer meio de prova, em especial pela palavra da vítima ou pelo depoimento de testemunhal, não se mostrando necessária a apreensão da arma de fogo e, tampouco, o exame pericial; b) se o acusado alegar o que não portava arma de fogo no momento da ação criminosa ou sustentar a ausência de potencial lesivo da arma empregada para intimidar a vítima, será dele o ônus de produzir tal prova, nos termos do art. 156 do Código de Processo Penal ( A prova da alegação incumbirá a quem a fizer [...] ). Ao ensejo, renovamo-lhes protestos de elevada estima e distinta consideração, colocando-nos à disposição para auxiliá-lo(a) no que for necessário. Goiânia-GO, 28 de junho de 2013 VINÍCIUS MARÇAL VIEIRA Promotor de Justiça Coordenador do CAOCrim RAFAEL SIMONETTI BUENO DA SILVA Promotor de Justiça Integrante do Núcleo de Apoio Técnico do CAOCrim 5/5