O TRABALHO ESCRAVO HISTÓRICO E CONTEMPORÂNEO

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Transcrição:

O TRABALHO ESCRAVO HISTÓRICO E CONTEMPORÂNEO Laís Videira AMBROSIO 1 Sérgio Tibiriçá AMARAL 2 RESUMO: A abolição da escravatura existe, porém, é possível ver o homem sendo escravo do trabalho na contemporaneidade. O trabalho em condições análogas à escravidão é a problemática encontrada nessa temática e essa prática não pode e nem poderia existir. Nesse ínterim entre a norma e a prática, deve haver maior fiscalização e valorização da classe trabalhadora, uma vez que tudo o que é consumido pelo homem vem do trabalho de outros homens. Palavras-chave: Escravismo. Abolição. Trabalho escravo. Escravidão contemporânea. 1 INTRODUÇÃO No primeiro tópico abordou-se o trabalho como o meio com o qual as pessoas utilizam para ganhar dinheiro e consequentemente sustentar suas famílias, o que o torna necessário para a sobrevivência do homem. Quando este trabalho se 1 Discente do 1º ano do curso de Direito das Faculdades Integradas Antônio Eufrásio de Toledo de Presidente Prudente. laisvideira@unitoledo.br. 2 Graduação de bacharel em direito na Faculdade de Direito de Bauru - Instituição Toledo (1981), mestre em Direito das Relações Públicas pela Universidade de Marília (1998); especialista em interesses difusos e coletivos pela Escola Superior do Ministério Público de São Paulo(1999) e mestre em Sistema Constitucional de Garantias pela Instituição Toledo de Ensino (2003). Doutor em Sistema Constitucional de Garantias (2011). Professor titular de Teoria Geral do Estado da FDPP das Faculdades Integradas Antônio Eufrásio de Toledo; Professor de Direito Internacional Público e Direitos Humanos da mesma instituição; coordenador da graduação da Faculdade de Direito de Presidente Prudente (Toledo-PP); professor da pós-graduação do Curso de Direito Civil e Processo Civil das Faculdades Integradas Antônio Eufrásio de Toledo; Professor do Programa de Pós- Graduação da Instituição Toledo de Ensino(ITE) - Mestrado e Doutorado em Sistema Constitucional de Garantias; membro do conselho editorial da Revista Intertemas (Presidente Prudente) e da Revista Intertemas Eletrônica; professor convidado da Pontifícia Universidade Católica do Paraná e professor orientador da Especialização em Direito Público da Universidade Estadual de Londrina ;membro do Conselho Científico da Revista Argumenta, do programa de mestrado da Faculdade de Direito do Norte Pioneiro(Universidade Estadual do Norte do Paraná) e do Conselho Editorial da Revista IMES- USCS Direito (Universidade Municipal de São Caetano do Sul); membro não residente da Asociación Colombiana de Derecho Procesal Constitucionale; e atuando principalmente nos seguintes temas: direitos fundamentais, liberdade religiosa, Supremo Tribunal Federal, direitos humanos, direitos fundamentais de informação e direito civil, coordenador do Grupo de Pesquisa e Iniciação Científica da Toledo "Estado e Sociedade", com publicações, no Brasil, Argentina, Colômbia, México e Europa e diretor e fundador da Associação Mundial de Justiça Constitucional. sergio@unitoledo.br. Orientador do trabalho.

torna forçado, imposto e obrigatório é que nos questionamos: um novo tipo de trabalho escravo em pleno século XXI. Não são admissíveis torturas morais, psicológicas e físicas a um ser humano subordinado em busca de um salário, mas que por diversas razões passa a ser explorado em seu trabalho. Usando o método histórico no segundo tópico e seguintes, discorreu-se também sobre o trabalho forçado e um novo tipo de trabalho escravo em pleno século XXI. O problema surpreende, pois apesar do mundo contar com tantos avanços tecnológicos e científicos, aonde tantas informações novas chegam a cada segundo, é possível encontrarmos cidadãos trabalhando em condições análogas ao de escravos. A sociedade como um todo se cega e não volta os olhares para esses homens, que estão no corte de cana; nas multinacionais que implantam sedes em países onde a mão de obra é baixa, mas a exploração é alta; nas oficinas de costura em que estrangeiros são aliciados por uma propaganda enganosa de proposta de emprego; enfim, no mundo globalizado os seres humanos só pensam no capital, e passam por cima de quem seja para alcançar seus objetivos. Através do método dedutivo e indutivo trouxemos esta temática nos tópicos seguintes, que deve ser discutida e valorizada, pois tudo o que o homem consome vem do trabalho de alguém. A discussão está inserida no dia a dia e não deve haver um enclave em tal. Abordaremos todos estes elementos que conglobam o tema a fim de sanar algumas dúvidas e esclarecer alguns fatos. 2 CONCEITO HISTÓRICO A problemática do trabalho não é nova no Brasil, mas a Constituição de 1988 estabeleceu como princípio basilar dos direitos fundamentais a dignidade da pessoa humana. Apesar disso, a eficácia social da Lei Maior muitas vezes não consegue acabar com a exploração da mão de obra, devido a séculos de trabalho escravo e até mesmo trabalho infantil.

A exploração econômica da colônia Brasil teve como base a cultura da cana e a produção de açúcar, de que os lusos já detinham a tecnologia e possuíam as condições para produzir os equipamentos necessários aos engenhos. 3 Como os índios não se adaptaram ao trabalho, durante o período colonial e até mesmo no Império, os portugueses que tinham colônias na África, se valeram dos escravos. Assim, negros eram escravizados trazidos da África, como já era feito nos países europeus, e os patrões os faziam de suas propriedades, os vendiam, os trocavam, enfim, utilizavam do trabalho destes homens para suas plantações, construções e serviços em geral, como nos diz Carlos Romero Vieira Nina, (2010, p. 63): O tráfico negreiro trouxe para o Brasil milhões de africanos, na condição de escravos. Eles rasgaram as matas, lavraram o solo e fizeram a colheita dos produtos tropicais exportáveis; trabalharam nas minas, nos engenhos, nos portos e nas casas. A burguesia portuguesa e brasileira era a portadora de capital, e entre os seus bens estavam os escravos, a classe trabalhadora. Os negros africanos trazidos eram acorrentados e torturados, tinham uma jornada exaustiva e condições degradantes de trabalho, chegando até a ficar sem comida caso não obedecessem às ordens do patrão. O escravismo tem início no ano de 1500 e durou até 1888, ano em que surgiu a Lei Áurea, que proibia a posse de um ser humano sobre outro como sua propriedade, ou seja, a escravidão no Brasil durou 358 anos. Todavia, a partir da libertação, os negros passaram a trabalhar em condições similares aos escravos, para garantir moradia e alimentação, pois não estavam preparados para exercer outros ofícios que não fosse o trabalho braçal, que passou a ganhar concorrência com presença de imigrantes. 2.1 O Abolicionismo 3 Femenick, op. cit., p 314. apud trabalho escravo contemporâneo no Brasil.

As tentativas para acabar com a escravidão foram muitas, por vários anos de luta, como a Lei do Ventre Livre, criada em 1871 que concedia liberdade para os filhos de escravos que nascessem após sua promulgação; a Lei dos Sexagenários, criada em 1885 que libertava os escravos com mais de 65 anos 4, que não tinham mais condições físicas de realizar as atividades que os patrões os propunham. Mas finalmente, no século XIX, no dia 13 de maio de 1888 foi sancionada a Lei Áurea (Lei Nº 3.353), que concedia a liberdade para todos os escravos do País, libertando-os assim de seus patrões do engenho, tal lei foi assinada pela Princesa Isabel que era regente do Brasil na época. (...) o inconformismo dos oprimidos materializado em gestos como fugas, suicídios, assassinatos, rebeliões, demonstra o peso que os escravos teriam em sua própria libertação. A abolição não pode ser reduzida a um ato de brancos. 5 É possível observar que o fim escravidão se deu com a pressão da população abolicionista, que se sentia inconformada com tanta atrocidade dos patrões sob seus escravos e com as lutas dos subordinados que cansaram de tanto servir a seus homens e ser cada vez mais oprimidos. Apesar de libertos, os escravos passaram a servir de mão de obra barata e foram explorados pela classe dominante, pois não tinham qualificação e poucos sabiam alguns ofícios. Além disso, havia um racismo muito grande e outras dificuldades devido ao analfabetismo dos negros e outras questões sociais, tanto que os negros começaram a ocupar as favelas da capital federal, o Rio de Janeiro. As mulheres buscaram colocações como empregadas domésticas, enquanto que os homens além da agricultura buscaram trabalhos braçais. Atualmente, muitas são as políticas desenvolvidas para acabar de vez com esse mal, como a falta de emprego e o analfabetismo, como as do Deputado Luiz Alberto Silva dos Santos, Autor do Projeto de Lei Complementar 217/2001, que cria o Fundo Nacional para o Desenvolvimento de Ações Afirmativas, Projeto integrado ao texto do Estatuto da Igualdade 6, que são políticas públicas voltadas para as comunidades negras, como as quotas nas universidades federais que buscam maior inserção do negro na sociedade. Mas, naquele período, as 4 <http://www.historiadobrasil.net/abolicaodaescravatura/> 5 PINSKY, 2001, p. 94 6 <http://www.deputadoluizalberto.com.br/institucional/perfil>

dificuldades eram enormes e havia demasiado racismo, que nos dias atuais é crime tipificado em lei. 3 DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS Nas letras da lei, a dignidade, a moralidade e os valores sociais da pessoa humana são protegidos e resguardados entre os direitos fundamentais. Como na Constituição Federal de 1888 que em seu artigo 1º traz a dignidade da pessoa humana e fundamentos sociais de trabalho e nos seus direitos fundamentais, em seu art. 5, a proibição de tratamento desumano, degradante ou cruel. Em comentário à análise legal sobre o assunto, assim dispõe o Ministério do Trabalho e Emprego: (...) a legislação brasileira tutela de forma objetiva a dignidade da pessoa humana, os direitos humanos, a igualdade de pessoas, os valores sociais do trabalho e a proibição da tortura e de tratamento desumano ou degradante. O conceito de trabalho em condição análoga à de escravo, bem como sua vedação no território nacional, decorrem dos preceitos da Constituição Federal, como se vê em seus artigos 1 II e IV, 4º - II, 5º - III e XXIII, 160 III e VII, e 186 III e IV. 7 artigo 149: O Código Penal, por outro lado, prevê crime para o escravismo em seu Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão da dívida contraída com o empregador o preposto: pena reclusão, de dois a oito anos, e multa, além de pena correspondente à violência. Bem, o que fica claro nas palavras do renomado professor Luiz Régis Prado em seu material didático sobre crime de tortura: Observa-se que, apesar de a Constituição da República Federativa do Brasil estabelecer, como um dos objetivos fundamentais, a promoção do bem de todos sem a nódoa do preconceito racial e quaisquer outras formas de discriminação o (art. 3º, IV), e inserir, no art. 5º, inciso XLII, a 7 <http://portal.mte.gov.br/data/files/8a7c816a350ac88201350b7404e56553/combate%20trabalho% 20escravo%20WEB.PDF>

imprescritibilidade e inafiançabilidade do crime de racismo, é inegável que algumas raças, no Brasil, não obstante a acentuada miscigenação, sofrem preconceito da raça dominante. O crime de racismo visa coibir qualquer tipo de segregação racial, visto que a raça não deve ser um elemento de exclusão. Em nível internacional, desde que Norberto Bobbio em sua obra A era dos direitos falou em três gerações de direitos, a titularidade dos direitos de fraternidade são o gênero humano, independente de raça, credo, etnia ou quaisquer outros critérios. Fica claro, portanto, que é necessário punir essas atitudes no meio social. A Declaração Universal dos Direitos Humanos nos traz em seu artigo I que todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidades e direitos. No seu artigo IV que ninguém será mantido em escravidão ou servidão, a escravidão e o tráfico de escravos serão proibidos em todas as suas formas e em seu artigo V que ninguém será submetido à tortura, nem tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante. Os tratados internacionais de direitos humanos e a lei nacional infraconstitucional, obedecendo a Constituição põe a salvo todos estes dispositivos, todavia, muitos são os casos de trabalho escravo na contemporaneidade. 4 O TRABALHO ESCRAVO NA CONTEMPORANEIDADE O trabalho escravo no século XXI é um fato e dizer que ele foi erradicado é hipocrisia, pois dados da Organização das Nações Unidas revelam sua existência, bem como as autoridades brasileiras reconhecem a presença de bolivianos, peruanos e outros trabalhando na capital paulista em condições precárias e que configuram trabalho escravo. O fato é que não há mais compra e venda, tráfico de trabalhadores, mas sim aliciamento enganoso para trabalhos em condições análogas as de escravos. Foram criadas normas mais rígidas para que o crime não fosse praticado. Mas pelo visto, isto não fez com o que quem o praticasse parasse com tal ato, pois falta uma efetiva fiscalização e uma política do Estado para coibir tais atos, pois os números comprovam, ou seja, as estatísticas deixam claro que a exploração

do homem pelo homem é persistente. Vejamos alguns números sobre o trabalho escravo: - Desde 1995, quando o governo federal criou o sistema público de combate a esse crime, mais de 42 mil pessoas foram libertadas do trabalho escravo no Brasil; - No mundo, a estimativa da OIT é que sejam, pelo menos, 12 milhões de escravos; - Na zona rural, as principais vítimas são homens, entre 18 e 44 anos. Na zona urbana, há também uma grande quantidade de sul-americanos, principalmente bolivianos. Nos bordéis, há mais mulheres e crianças nessas condições; - Dos libertados entre 2003 e 2009, mais de 60% eram analfabetos ou tinham apenas o quarto ano incompleto. Ou seja, eram adultos que não estudaram quando crianças. 8 Como elaborado por Jairo Lins de Albuquerque Sento-Sé (2001, p.27) Nesta esteira, poderíamos conceituar o trabalho escravo contemporâneo, na zona rural, como sendo aquele em que o empregador sujeito o empregado a condições de trabalho degradantes, inclusive quanto ao meio ambiente em que irá realizar a sua atividade laboral, submetendo-o, em geral, a constrangimento físico e moral, que vai desde a deformação do seu consentimento ao celebrar o vínculo empregatício, passando pela proibição imposta ao obreiro de resilir o vínculo quando bem entender, tudo motivado pelo interesse mesquinho de ampliar os lucros às custas da exploração do trabalhador. Os casos mais frequentes hoje no Brasil são de sul-americanos, bolivianos, peruanos e paraguaios principalmente, que são aliciados para trabalhar com costura. Todos os dias passam pelas rodovias do Oeste Paulista, por Presidente Prudente inclusive, trabalhadores que serão explorados em confecções na capital paulista. São oferecidas a eles falsas propostas de emprego, quando na verdade caem em uma escravidão por dívida. São obrigados a trabalhar em jornadas de 12 horas, em condições precárias ou mais e ainda são ameaçados pela falta de documentos. Trata-se de um novo tipo de escravidão contemporânea. 4.1 A Escravidão Por Dívida 8 < http://www.trabalhoescravo.org.br/conteudo/tres-mentiras-sobre-o-trabalho-escravo >

A escravidão por dívida ou truck system ocorre da seguinte forma, trabalhadores, com baixa qualificação profissional são aliciados de forma enganadora por propostas de empregos convidativas, tendo desde o contrato de passagens até a moradia e a alimentação pagas pelos aliciadores. Seduzidos por tamanha ilusão acabam aceitando-as sem saber o que realmente os espera. Uma dívida se acumula e eles são obrigados a trabalhar cada vez mais para tentar sanar a mesma, o que não ocorre, pois quanto mais dias passam, mais a dívida aumenta. O que ocorre é que, quando estes trabalhadores chegam ao seu local de trabalho, descobrem que já há uma dívida com seus patrões, uma vez que, tudo o que o mesmo consumiu ou vai consumir deve ser pago, e pago em forma de trabalho. Por falta de opções em seus respectivos países, muitos bolivianos e peruanos são recrutados com essas falsas promessas, mas mesmo sendo explorados, conseguem mais dinheiro do que em seus países de origem. A Procuradoria Regional do Trabalho 7ª Região na Coordenadoria Nacional de Combate ao Trabalho Escravo (CONAETE) dispõe: O trabalho forçado se caracteriza quando o empregador, usando de ameaça, mantém os empregados em sua propriedade, e lhes vende produtos (alimentos e vestuário) por preços elevados. Os empregados, tendo em vista os altos valores, jamais conseguem saldar suas dívidas, sendo impedidos de deixar as propriedades. As jornadas de trabalho são exaustivas e precárias as condições do ambiente de trabalho, tais como: alojamento inadequado, falta de fornecimento de boa alimentação e água potável; falta de fornecimento de equipamentos de trabalho e de proteção. É imprescindível ressaltar que casos de truck system são comuns e estão mais perto do que imaginamos. Oficinas de costura são o principal local onde esses trabalhadores são obrigados a trabalhar por uma dívida injusta. Muitos bolivianos vem para o Brasil na ilusão de melhorarem de vida e acabam caindo nesta armadilha. 5 CONCLUSÃO Cabe salientar que, apesar de existirem dispositivos legais garantidores dos direitos fundamentais no tocante às condições de trabalho, o Brasil ainda

convive com a exploração do ser humano. Trata-se de uma grave violação aos direitos humanos, pois são condições semelhantes aos dos escravos. A Constituição, a Consolidação das Leis do Trabalho e os tratados internacionais de direitos humanos trazem direitos e garantias aos trabalhadores, e inclusive aos estrangeiros. Mas, apesar da previsão de condutas proibitivas para quem contrata trabalhadores e direitos para os que trabalham, ainda falta uma política efetiva de fiscalização e de combate a pratica o trabalho escravo. Relatos são o que não faltam de casos do crime e as fiscalizações comprovam a prática usual, em confecções especialmente. Em suma, o poder de fiscalização está nas mãos do Governo Federal, pois são os possuidores dos recursos necessários para que haja punição para o crime e a efetivação dos direitos humanos. Uma das maneiras de prevenção para o trabalho escravo seria a de investimentos na educação, em conjunto com a fiscalização nos locais de trabalho e ainda a punição dos empresários. No Brasil, isto não ocorre, visto que, os subordinados geralmente tem um grau baixo de formação, o que acarreta na falta de opção de emprego para os mesmos e na desinformação de seus direitos como cidadãos, enquanto que alguns empregadores aproveitam a falta de fiscalização e as punições brandas, para continuar uma prática desleal nas relações trabalhistas. As oportunidades de emprego e a valorização salarial seriam necessárias, a fim de evitar fraudes, em especial quando da presença de estrangeiros. Uma democracia precisa assegurar condições mínimas de existência para todos, pois o caput do artigo 5º garante dentro do princípio da igualdade, que todos, brasileiros e estrangeiros são titulares de direitos dentro das variadas relações, entre elas as trabalhistas. Temos que combater esse novo tipo de escravidão contemporânea. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS E FONTES BRASIL, Decreto-Lei n. 2.848. Código Penal. Brasília: Senado, 1940. BRASIL, Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 1988.

BRASIL, Manual de Combate ao Trabalho e Condições Análogas de Escravo. Brasília, MTE, 2011. Disponível em <http://portal.mte.gov.br/data/files/8a7c816a350ac88201350b7404e56553/combat e%20trabalho%20escravo%20web.pdf>. Acessado em 18/08/13 FEMENICK, op. cit. P. 314 apud Trabalho Escravo Contemporâneo no Brasil, Márcia Aparecida Bueno da Silva Sarno, Suzana Prioste, Vânia Aparecida Passarelli de Mezenes. Faculdades Integradas Antônio Eufrásio de Toledo, Presidente Prudente, 2009. NINA, Carlos Homero Vieira. Escravidão ontem e hoje. Brasília, 2010. ONU, Declaração Universal dos Direitos Humanos. Adotada e proclamada pela resolução 217 A (III) da Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948. Disponível em: <http://portal.mj.gov.br/sedh/ct/legis_intern/ddh_bib_inter_universal.htm> Acessado em 23/04/13. PRADO, Luiz Régis. Crime de Tortura Material Didático. Disponível em <http://www.professorregisprado.com/material%20didatico/power%20point%20cri ME%20DE%20TORTURA.pdf> Acessado em 18/08/13. PINSKY, Jaime. Escravidão no Brasil. São Paulo, 2001. SANTO-SÉ, Jairo Lins de Albuquerque. Trabalho escravo no Brasil na atualidade. São Paulo: LTr, 2001.. Abolição da escravatura no Brasil Resumo. Disponível em: <http://www.historiadobrasil.net/abolicaodaescravatura/>. Acessado em 18/08/2013.. Coordenadoria Nacional de combate ao trabalho escravo. Disponível em: <http://www.prt7.mpt.gov.br/atuacao_trab_escravo.htm>. Acessado em 25/04/13. Deputado Luiz Alberto Perfil. Disponível em < http://www.deputadoluizalberto.com.br/institucional/perfil>. Acessado em 18/08/2013.. Perguntas e respostas sobre o trabalho escravo. Disponível em: <http://www.trabalhoescravo.org.br/conteudo/tres-mentiras-sobre-o-trabalhoescravo>. Acessado em 22 de abril de 2013.