II-341 - PRODUÇÃO MAIS LIMPA NA INDUSTRIA DE PETRÓLEO: O CASO DA ÁGUA PRODUZIDA NO CAMPO DE CARMÓPOLIS/SE. André Luís de Oliva Campos (1) Engenheiro Químico - Universidade Federal de Sergipe. Mestre em Hidráulica e Saneamento - EESC-USP. Doutor em Hidráulica e Saneamento - EESC-USP. Pesquisador DCR Universidade Tiradentes (UNIT) Thaynara Santana Rabelo Aluno do Curso de Engenharia Ambiental (UNIT). Bolsista de Iniciação Científica da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Sergipe (FAP-SE) Rodrigo Oliveira Santos Aluno do Curso de Engenharia Ambiental (UNIT). Bolsista de Iniciação Científica da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Sergipe (FAP-SE) Rosana Fialho Lopes Vieira de Melo Engenheira Química - Universidade Federal da Bahia. Mestre em.engenharia Química -PEQ/COPPE/UFRJ Doutora em Engenharia Química -PEQ/COPPE/UFRJ. Professora Tempo Integral da Universidade Tiradentes Endereço (1) : R.Francisco Rabelo Leite, 990 - casa 08, Bairro Atalaia CEP: 49.037-240 - Aracaju, SE - Tel. (79) 243 2742 E-mail: andrelocampos@uol.com.br RESUMO A industria de extração de petróleo, ciente da crescente preocupação com o meio ambiente, do surgimento de novas leis e resoluções ambientais mais restritivas procura se enquadrar dentro das novas exigências. Para tanto, um dos pontos cruciais a serem atacados é a questão da água produzida, que é subproduto da extração do petróleo, a qual vem aumentando gradativamente seu volume à medida que os poços vão envelhecendo e que novos poços são perfurados. Água produzida é a fase líquida que é co-produzida num poço de produção junto com a fase de óleo e/ ou gás durante uma operação normal de produção. Esta água é composta, principalmente, por produtos químicos tóxicos, sais inorgânicos e metais pesados, os quais dificultam seu tratamento e disposição final. Apesar de ultimamente a água produzida ser reinjetada em poços de produção para aumentar a pressão dos mesmos, esta água ainda não apresenta qualidade desejada para reinjeção, o que se torna um problema de disposição a se resolver, visto que a Petrobras não mais lança seus efluentes nos rios da região. O presente trabalho objetiva destacar a atenção que deve ser dada ao manejo da água produzida, visando sua minimização e melhoria da qualidade no campo petrolífero da Petrobras em Carmópolis-SE, dando ênfase à etapa de perfuração de poço para produção de óleo, e sugerir mudanças com base na metodologia de produção mais limpa. PALAVRAS-CHAVE: Petróleo, Água Produzida, Produção mais limpa, Tratamento. INTRODUÇÃO O petróleo tem forte presença na sociedade de consumo do mundo atual, conforme mostra a grande quantidade de produtos industrializados que contêm insumos ou são produzidos diretamente a partir dessa matéria-prima e seus derivados. Contudo, a preocupação da população e dos órgãos ambientais com os impactos da atividade petrolífera no meio ambiente e na qualidade de vida vem crescendo cada vez mais. Quanto menos poluidora e mais compromissada com a questão ambiental, maior o reconhecimento social que a empresa terá. Nesse contexto, a produção mais limpa apresenta oportunidades de tornar os processos produtivos das empresas de petróleo mais eficientes e menos prejudiciais ao meio ambiente, além de propiciar a redução nos custos de produção. Um dos principais problemas associados à atividade de extração de petróleo é a chamada água produzida (AP), que é o efluente resultante dos processos de separação nas estações coletoras e de tratamento existentes nos campos de produção de petróleo. Para tanto, um dos pontos cruciais a serem atacados é o manejo e disposição da água produzida. A maior parte do volume gerado durante a extração de óleo e gás é constituída de água produzida, que é levada à superfície numa emulsão junto com o óleo e o gás. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 1
Esta água conhecida como água conata ou água da formação e transforma-se água produzida quando o reservatório é produzido e estes líquidos são trazidos à superfície. A água produzida está contida em um reservatório com o hidrocarboneto e é produzida à superfície com o óleo cru ou o gás natural (Veil et al., 2004). Além da água de formação, a água produzida pode vir da água injetada na formação através dos poços de injeção a fim de alcançar, por aumento de pressão e diminuição de viscosidade, uma maior recuperação de óleo (recuperação secundária), água oriunda da condensação de gás injetado, com o mesmo propósito anterior; e de água proveniente de vários tratamentos químicos empregados nos poços durante a perfuração e a produção (Wiedeman, [s.d]). Os constituintes químicos da água produzida variam de formação para formação, de poço para poço. Fonseca (1999) e Ayres and Parker (2001) afirmam que, geralmente, a água produzida contém uma variedade considerável de poluentes orgânicos tóxicos, metais pesados, além de quantidades exorbitantes de sais inorgânicos. Com esse potencial poluidor digno de atenção, o descarte e o manejo da água produzida precisa ser realizado de maneira bastante criteriosa. No município de Carmópolis, no Estado de Sergipe, há um grande campo petrolífero terrestre ( onshore ) considerado a quarta maior reserva de óleo do país. Segundo Petrobras UN-SEAL (2005), o campo apresenta uma produção média diária de 27.000 m 3 /d de água. A água produzida em Carmópolis, que antes era despejada no rio Riachão, proporcionando grandes preocupações ambientais, agora tem parte de seu destino na re-injeção e outra parte segue por dutos para a Companhia Vale do Rio Doce CVRD, que reusa a água em seus processos industriais. Contudo, a necessidade de injeção de água na formação tende a aumentar à medida que o potencial petrolífero da formação decresce, o que acarreta uma maior geração de água produzida e a necessidade de mais capacidade de tratamento para a re-injeção. Em Carmópolis, na estação Bonsucesso, a água para a re-injeção é tratada, mas sua capacidade de tratamento está no limite, com o risco do processo produtivo sofrer paradas freqüentes, já que a água produzida não mais pode ser descartada no Rio Riachão nem em nenhum outro corpo d água da região. Além disso, algumas vezes a água tratada para re-injeção não apresenta os requerimentos mínimos necessários, causando paradas de produção. Para completar o problema, existe a entrada desnecessária de água pluvial no sistema de tratamento de Bonsucesso, contribuindo para a sobrecarga do mesmo. Essa água entra na linha através de calhas abertas presentes nas áreas de limpeza de tubos e hastes (Estação de Desparafinação). No presente trabalho, aplicou-se a metodologia de produção mais limpa (SENAI.RS, 2003) à água produzida no campo de Carmópolis. São apresentados os resultados da investigação da linha percorrida pela água produzida, desde a sua produção até a re-injeção, passando pelas estações de separação água-óleo, pela estação de desparafinação e pela estação de tratamento de efluentes de Bonsucesso. São apontados os pontos possíveis de melhoria na etapa de perfuração de um poço, de forma a minimizar o surgimento de problemas do tipo fim-de-tubo. MATERIAIS E MÉTODOS A metodologia utilizada na realização do trabalho consistiu num diagnóstico do processo de produção da água produzida, através de estudos dos fluxogramas existentes e de acompanhamento in-loco de todo o percurso da AP. Foram realizadas avaliações desde a perfuração do poço, produção do óleo, bombeamento do óleo dos poços de produção para as estações satélite (cuja função é unir várias linhas de transporte de óleo em uma só linha que vai para as estações de separação água-óleo), estações de separação água-óleo, passando pelo tratamento desta água até reinjeção da mesma para pressurização de poços de produção. Um esquema do processo estudado é apresentado na figura 1. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 2
Poço de produção Desparafinação Poço de produção Satélite Separação água-óleo Estação de tratamento Bonsucesso Refinaria Poço de produção CVRD Água doce Satélites de injeção Vapor Poços de injeção Água e óleo Água produzida Vapor óleo Óleo e água produzida Água residuária Figura 1: Fluxograma geral da produção de óleo no Campo de Carmópolis A partir da análise, decidiu-se concentrar o trabalho na etapa de perfuração de poço para extração de óleo. A perfuração é feita através de uma sonda e os fragmentos das rochas são removidos continuamente através de um fluido de perfuração ou lama. O fluido é injetado por bombas para o interior da coluna de perfuração através da cabeça de injeção, ou swivel, e retorna á superfície através do espaço anular formados pelas paredes do poço e a coluna. No campo em estudo, são realizadas aproximadamente 60 perfurações de poços por ano. Os fluidos de perfuração são misturas complexas de sólidos, líquidos, produtos químicos e, por vezes, até gases. Do ponto de vista químico, eles podem assumir aspectos de suspensão, dispersão coloidal ou emulsão, dependendo do estado físico dos componentes (LIMA apud SOUZA, 2002). Foi avaliado um poço de perfuração com profundidade de 942m, onde foram verificados os possíveis pontos de melhoria do sistema aplicando a metodologia de produção mais limpa. Neste trabalho, focou-se as análises nos fluidos de perfuração à base de água e nos processos que utilizam água durante a perfuração. A água utilizada na perfuração é obtida através do bombeamento de rios ou poços, mas sofre não sofre nenhum tratamento e é determinada apenas a sua salinidade. Essa água é armazenada em tanques e utilizada, principalmente, para resfriamento dos motores e para preparação dos fluidos de perfuração. A água utilizada para o resfriamento dos motores é bombeada dos tanques para os motores, depois é resfriada e volta ao sistema de resfriamento dos motores em circuito fechado. Já a água utilizada para a preparação dos fluidos é destinada a misturadores onde são adicionadas substancias para depois ser injetada no poço. (figura 2). ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 3
Radiadores Rio Bomba Reservatório Bomba Misturadores Estação Bonsucesso Dique Energia Águas residuais Fluidos de Figura 2: Captação da água de rio passando pelos radiadores e misturadores até seu destino final. A injeção de fluidos é composta por duas fases. Na primeira fase, são adicionados fluidos de perfuração e aditivos. Nesta fase, todo este material é perdido no poço ou vai para o dique construído especialmente para acondicionar temporariamente os rejeitos da perfuração, ou seja, nada é reaproveitado (Figura 3). Insumos Cascalhos Misturadores Bomba Poço Dique Estação Bonsucesso Energia Fluidos de Águas residuais Figura 3: Fluxograma da fase I de perfuração de poço de petróleo. A segunda fase possui outros tipos de fluidos que têm várias funções, tais como o equilíbrio de pressão entre o poço e a superfície, a adequação da viscosidade, a redução do atrito entre as ferramentas de perfuração e o solo, entre outras. Nessa fase a profundidade do poço estudado variou de 262 metros a 942 metros e os fluidos utilizados são para se evitar inibir a interação da rocha com o fluido de perfuração que está passando. Nesta fase há uma recuperação parcial dos fluidos de perfuração, e a parte não recuperada também vai para o dique (figura 4). ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 4
Insumos Misturadores Bomba Poço Separador Dique Estação Bonsucesso Energia Águas residuais Fluidos de Figura 4. Fluxograma da fase I de perfuração de poço de petróleo. RESULTADOS DISCUSSÃO Durante a operação de perfuração do poço estudado, foram captados na faixa de 100.000 litros de água de rio para serem utilizadas nos radiadores dos motores da sonda de perfuração e na composição dos fluidos de perfuração. À água de rio que não vai para o resfriamento de motores precisa ser adicionado sal junto com outros fluidos de perfuração de maneira que durante o processo exista um equilíbrio osmótico entre os fluidos e a formação, evitando a erosão da mesma. Como alternativa de Produção mais Limpa, visando minimização do consumo de recursos naturais, como a água do rio, e a reciclagem interna da água produzida tratada, propõe-se a análise da viabilidade técnica, econômica e ambiental da substituição da água utilizada no preparo dos fluidos de perfuração por água produzida tratada. Esta substituição levaria ao reaproveitamento de aproximadamente 0,1% da água produzida anual que atualmente é tratada em Bonsucesso, além de uma redução de 6000m 3 /ano de captação de água dos rios da região. Esta alternativa está em estudo e estão sendo analisadas as características da água produzida tratada em Bonsucesso, para comparação com as propriedades da água de preparo do fluido de perfuração. Além disso, analisando a segunda fase da perfuração do poço estudado (com profundidade de 920 metros), percebeu-se que há uma perda de 40% de todo o fluido inicialmente produzido. Foi realizado estudo sobre a mudança do sistema de tratamento dos cascalhos minimizando a quantidade de fluido a ser descartada, reaproveitando-se o fluido para outras perfurações e ainda minimizando o grau de contaminação dos rejeitos do dique e a sobrecarga de estação de Bonsucesso. Após a elaboração dos fluxogramas e do conhecimento do processo de perfuração do poço, tabelas de entrada e saída foram elaboradas, listando as principais matérias-primas, produtos e verificando as possibilidades do minimização (tabela 1). ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 5
Tabela 1: Categorias dos subprodutos, resíduos, efluentes e emissões Categorias I II III IV V VI Consumo de recursos naturais Matérias-primas e insumos não utilizados Produtos não comercializados Impurezas e substâncias secundárias nas matérias-primas Subprodutos e resíduos inevitáveis Subprodutos e resíduos não desejados Materiais auxiliares usados Refrigeração de Motores Perdas durante o processo Listagem dos principais sub-produtos, resíduos, efluentes e emissões. I II III IV V VI Fluido de perfuração da fase I Fluido de perfuração da fase II Óleo Cascalho Energia elétrica Após ter descoberto os pontos a serem combatidos, uma tabela nova foi construída onde foram descritos os problemas e/ou as oportunidades, bem como os planos de ação e as barreiras e necesidades de uma produção mais limpa. Subprodutos, resíduos, efluentes e consumos Oportunidades e ou problemas Tabela 2: Plano de Produção mais limpa Plano de ação, estratégias e ou opções Fluido de Aproveitamento da água produzida perfuração da fase Obtenção de um fluido a que já possui um alto teor de sal I base de água feito com a necessário para fluido de perfuração água produzida Fluido de perfuração da fase II Óleo Cascalho Melhoria no sistema de recuperação do fluido Diminuição do consumo de água doce Maior recuperação do óleo Aproveitamento para construção civil; Encapsulamento. Utilização de centrífugas capazes de aumentar a recuperação do fluido e diminuir a contaminação do dique Reutilização da água produzida tratada para fabricação de fluido de perfuração Modificação do processo de tratamento de Bonsucesso Melhoria na remoção dos contaminantes do cascalho Barreiras e necessidades Melhoria da qualidade da água produzida; testes de formulação do novo fluido Relação custo / benefício poderá ser inviável Melhoria da qualidade da água produzida tratada: testes de formulação novo fluido. Custo da implantação Testes de resistência do novo material CONCLUSÕES Os resultados parciais desse trabalho apontam para a viabilidade técnica das mudanças sugeridas, embora a análise completa ainda esteja em andamento, o que levará a redução no consumo de água captada dos rios que cortam a região, além de minimizar a carga que é tratada na estação Bonsucesso. Contudo, será necessário ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 6
ainda o estudo da viabilidade econômica antes da implementação efetiva de tais mudanças. A tendência crescente de cobrança pelo uso da água e o aumento do rigor da legislação ambiental levam a crer que a viabilidade econômica perderá importância relativa com o passar do tempo e estudos de P+L serão uma rotina importante em qualquer indústria, incluindo a indústria de petróleo.. AGRADECIMENTOS Os autores gostariam de agradecer a PETROBRAS, UNIT, FAS-SE, FUNTEC, MCT e CNPq. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. SOUZA, J. B. de S.; LIMA, V. L. (2002). Avaliação das Técnicas de Disposição de Rejeitos da Terrestre de Poços de Petróleo. Salvador, BA,. Dissertação (conclusão de curso de especialização). Universidade Federal da Bahia, UFBA. 2. FONSECA, R. M. R. (1999). A importância do aproveitamento da água resultante da produção de petróleo. Aracaju, 90pp, Monografia (Especialização em Engenharia Sanitária e Ambiental) - Universidade Federal de Sergipe. 3. AYRES, R. C.; PARKER, M. (2001). Produced Water Waste Mangement: Technical Report Canadian Association of Petroleum Producers. 4. SENAI.RS (2003). Implementação de Programas de Produção mais Limpa. Porto Alegre, Centro Nacional de Tecnologias Limpas SENAI-RS/UNIDO/INEP, 2003. 42 p. il. 5. VEIL, J. A.; PUDER, M. G.; ELLCOCK, D.; REDWEIIK,, Jr.. R. J. (2004). A White Paper Describing Produced water From Production of Crude Oil, Natural Gas, and Coal Bed Methane. U.S. Department of Energy National Energy Technology Laboratory. 6. WIEDEMAN, A. (s.d.). Regulation of Produced Water by the U.S. Environmental Protection Agency. Injeção de Água: Artigos Selecionados, Petrobras. 7. PETROBRAS UN-SEAL (2005). Petroleo Brasileiro Unidade de Negócios Sergipe Alagoas. Relatório Interno. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 7