AVALIAÇÃO DE TOXICIDADE DE EFLUENTE INDUSTRIAL EM BIODIGESTOR ANAERÓBIO ATRAVÉS DO TESTE DE ATIVIDADE METANOGÊNICA ESPECÍFICA



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Transcrição:

AVALIAÇÃO DE TOXICIDADE DE EFLUENTE INDUSTRIAL EM BIODIGESTOR ANAERÓBIO ATRAVÉS DO TESTE DE ATIVIDADE METANOGÊNICA ESPECÍFICA Hélio Rubens Victorino Imbimbo (*) SABESP Bacharel em Ciências Biológicas formado pelo Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (USP); Mestre em Ecologia no Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (USP); atua como Biólogo na Divisão de Engenharia de Desenvolvimento Operacional da Unidade de Negócios de Tratamento de Esgotos da SABESP. Sueli Harumi Kakinami Walm Ambiental Endereço (*) : Rua Hugo Valter Puschnick, 29 Mooca, São Paulo - Cep: 03128-080- Brasil tel: 55 (11) 3388-6562 fax: 55 (11) 3388-6580 - e-mail: helioimbimbo@sabesp.com.br RESUMO Algumas substâncias, em quantidades moderadas ou excessivas podem causar danos à digestão anaeróbia e as bactérias podem sofrer inibição do seu metabolismo diante de sua presença. A inibição em qualquer uma das etapas provoca interrupção do processo podendo chegar a um colapso do digestor. Uma forma de investigar se um composto poderá ou não provocar inibição no processo de digestão é realizar um ensaio de determinação da atividade metanogênica específica (ATME). Sua finalidade é avaliar a capacidade das bactérias em converter substrato orgânico a metano e gás carbônico, a partir de quantidades préestabelecidas de biomassa (gssv) e de substrato (gdqo), sob condições ambientais controladas. O objetivo deste trabalho é investigar a ocorrência de inibição do processo de digestão anaeróbia nos digestores da Estação de Tratamento de Esgotos Barueri, em decorrência da adição de lodo proveniente da indústria química produtora de epóxi, polióis e látex. O teste consiste de reatores anaeróbios inoculados com lodo digerido e submetidos ao efluente testado para avaliação do seu potencial inibitório. O sistema é composto por um reator anaeróbio, um gasômetro e uma coluna volumétrica de leitura. Foram montados dois conjuntos de reatores, um inoculado com a concentração do lodo digerido recomendada pelo teste (1,2 g SSV/L) e outro simulando a concentração de operação do biodigestor. A alimentação foi através de batelada e foram utilizados três tipos de alimento: solução padrão de ácidos orgânicos voláteis; lodo afluente ao biodigestor; e esse mesmo lodo acrescido do lodo proveniente da industria. Os reatores que receberam lodo teste não apresentaram fase Lag, assim como os reatores que foram alimentados apenas com lodo afluente ao biodigestor, indicando que o substrato foi prontamente metabolizado. O lodo da empresa química, nas proporções estabelecidas no teste, não afetou a caracterização do lodo, não provocou inibição do metabolismo das bactérias anaeróbias, além de não alterar a concentração de metais pesados. Palavras Chave: biossólidos, toxicidade, metano, efluentes industriais, biodigestor. INTRODUÇÃO O processo de digestão anaeróbia produz estabilização da matéria orgânica, redução de organismos patogênicos e do volume do lodo, melhoria da desidratação e em alguns casos possibilita o uso do lodo na agricultura. Devido ao seu baixo custo operacional, este tipo de tratamento é amplamente difundido no mundo, sendo utilizado por muitas indústrias para o tratamento de seus efluentes (Jordão e Pessoa, 1995). De forma simplificada, a digestão anaeróbia é considerada um processo de dois estágios; no primeiro a matéria orgânica é convertida a ácidos voláteis, como por exemplo, ácido acético. Nesta etapa as bactérias são facultativas ou estritamente anaeróbias, conhecidas genericamente por bactérias acidogênicas. No segundo estágio, os ácidos voláteis produzidos por estas bactérias servem de substrato para as 1

metanogênicas. Estas, por fim convertem os ácidos orgânicos em produtos finais gasosos como gás carbônico e metano. Algumas substâncias, em quantidades moderadas ou excessivas podem causar danos à digestão anaeróbia, entre elas os metais pesados, sulfetos, amônia dissolvida, ácidos voláteis não ionizados e cianetos. As bactérias podem sofrer inibição do seu metabolismo diante da presença de uma ou mais substâncias citadas acima. A inibição em qualquer uma das etapas provoca interrupção do processo podendo chegar a um colapso do digestor. Como a taxa de crescimento das bactérias anaeróbias é muito lento, o controle do processo e adição de lodo industrial deve ser cautelosa, pois a recuperação do sistema, em caso de inibição será extremamente lenta. Uma forma de investigar se um composto poderá ou não provocar inibição no processo de digestão é realizar um ensaio de determinação da atividade metanogênica específica (ATME). Sua finalidade é avaliar a capacidade das bactérias em converter substrato orgânico a metano e gás carbônico, a partir de quantidades pré estabelecidas de biomassa (gssv) e de substrato (gdqo), sob condições ambientais controladas, permitindo avaliar o comportamento da biomassa perante a presença de compostos potencialmente inibidores (Chernicharo e col.,1997). Segundo Dolfing e Bloemen (1985) a medição de produção de metano é muito mais apropriada para a determinação da atividade metanogênica, comparada à redução de substrato. A sensibilidade da comunidade bacteriana do biodigestor pode responder de modo diferenciado a determinado substrato. A estação de tratamento de esgotos de Barueri (ETE-Barueri) está em operação a mais de uma década, recebendo efluente predominantemente doméstico, porém com contribuição industrial efetiva. O objetivo deste trabalho é investigar se ocorre inibição do processo de digestão anaeróbia nos digestores das ETE-Barueri, em decorrência da adição de lodo proveniente da indústria química produtora de epoxi, polióis e látex, seus efluentes são tratados biologicamente gerando lodo, cuja proposta é enviar 10m 3 diários à esses digestores. MATERIAIS E MÉTODOS Para a montagem do ensaio, foi solicitado à empresa uma coleta composta, retirando-se alíquotas de mesmo volume a cada duas horas, por um período de 24 horas. O material coletado foi analisado no Laboratório da ETE Barueri, onde determinou-se os parâmetros necessários à montagem do ensaio, como sólidos, DQO e densidade. O lodo coletado ficou sob refrigeração até a montagem do ensaio. A montagem do ensaio baseou-se no método descrito pela Universidade de Wageningen (IHE/WAU, 1991), Holanda. O teste consiste de reatores anaeróbios inoculados com lodo digerido e submetidos a outros compostos para avaliação do seu potencial efeito inibitório. O sistema é composto por um reator anaeróbio, um gasômetro e uma coluna volumétrica de leitura. Ambos, o reator e o gasômetro consistem de balões de vidro de dois e três litros respectivamente (Fig. 1). Foram montados dois conjuntos de reatores, sendo que um deles foi inoculado com lodo digerido com concentração de 1,2 g SSV/L reator, conforme recomendação do método original, e outro conjunto foi inoculado com lodo digerido com concentração de 13,3 g SSV/ L reator, simulando as condições dos biodigestores da ETE-Barueri. Os reatores foram alimentados, em duplicata, com três diferentes tipos de substrato, são eles: solução padrão de ácidos orgânicos voláteis (AOV), composta pelos ácidos acético, propiônico e butírico; lodo afluente aos biodigestores (LA); e esse mesmo lodo acrescido de lodo teste (LT), além de reatores que não recebem alimento, denominados BRANCO. Além dos substratos, foram adicionadas soluções de macro e micro-nutrientes para não ocorrer inibição por depleção de nutrientes. A alimentação dos reatores foi feita apenas no início do teste (batelada) simulando um tempo de retenção hidráulica de 19 dias. Ambos os conjuntos de reatores tiveram o ph corrigido para 7,0, e durante todo o período do teste permaneceram imersos em banho-maria a 35 + 1 C, com duas agitações diárias. Na TABELA 1 pode-se verificar a nomenclatura adotada para os reatores, com respectivos substratos e volumes de lodo adicionados. Os gasômetros correspondiam a balões contendo solução de hidróxido de sódio, com concentração de 30 g/l. Cada gasômetro esta ligado a um reator por meio de mangueiras de látex. Entre o gasômetro e o reator há uma cápsula de vidro contendo cal sodada que, assim como o hidróxido de sódio tem a função 2

de reter o gás carbônico. O volume de metano produzido era lido por deslocamento de solução em proveta graduada de 500mL, duas vezes ao dia, por um período de vinte dias. Do volume obtido, descontou-se o metano produzido pelo branco, correspondente a respiração endógena, e converteu-se a metano seco em condições normais de temperatura e pressão (CNTP), e em seguida, obteve-se o equivalente a este volume em DQO de metano. Os valores de DQO foram representados graficamente em função do tempo, para determinação da ATME. A Figura 2 ilustra os sistemas montados. Figura 1- Esquema de montagem do ensaio. TABELA 1 - Volumes utilizados na montagem do ensaio, indicando os valores programados para concentração do inóculo, concentração de substrato e carga específica. Reator Lodo digerido (ml) Substrato (ml). H 2 O (ml) Vol. Nutriente (ml). Conc. inóculo (gssv/l) Conc. substrato (gdqo/l) Carga específica Tipo de substrato 1 A/B 171 48,5 1.776 4 1,2 2,15 1,79 AOV 2 A/B 171 104,8 1.720 4 1,2 2,15 1,79 LA 3 A/B 171 103 1.713 4 1,2 2,15 1,79 LA+LT 4 171 1.825 4 1,2 0 BRANCO 5 A/B 1.888 104,8 7,2 13,3 2,15 0,16 LA 6 A/B 1.888 103 13,3 2,15 0,16 LA+LT 7 1.888 112 13,3 0 BRANCO AOV= solução de ácidos voláteis; LA= lodo afluente ao digestor; LT= lodo teste 3

Figura 2- Sistemas montados, visualizando-se o banho-maria, gasômetro e coluna de leitura de gás. RESULTADOS Os valores acumulados dos volumes de metano obtidos foram convertidos a metano seco, em condições normais de temperatura e pressão (CNTP), a valores de DQO e representados graficamente em função do tempo (Fig. 3). Para a obtenção da ATME, toma-se o trecho da curva de maior inclinação, determina-se o seu coeficiente angular (Fig. 4) e divide-se pela concentração do inóculo no início do teste (1,2 gssv/l). O tempo em horas deve ser convertido a dia (Chernicharo, 1997) 2,40 2,00 Metano - valores médios dos volumes acumulados convertidos MÉDIA 1 A/B MÉDIA 2A/B MÉDIA 3 A/B MÉDIA 5 A/B MÉDIA 6 A/B METANO (g DQO/L) 1,60 1,20 0,40 0 50 100 150 200 250 300 350 TEMPO (h) Figura 3: Volumes médios acumulados de metano convertidos (DQO, CNTP), para os Reatores 1, 2 e 3. 4

METANO (g/dqo/l) 1,50 1,20 0,90 0,60 0,30 0,64 0,32 0,16 0,64 0,32 0,16 Reator 1A y = 0,0111x - 0,4255 0 50 100 150 200 Reator 2A y = 66x - 0,0105 Reator 3A y = 7x - 0,0288 2,00 1,60 1,20 0,40 0,60 0,36 0,24 0,12 0,64 0,32 0,16 Reator 1B y = 0,0113x - 0,3251 0 50 100 150 200 Reator 2B y = 63x - 0,0184 Reator 3B y = 68x - 0,0314 TEMPO (h) Figura 4: Representação gráfica dos trechos selecionados da curva de metano para obtenção do coeficiente de inclinação da reta. Os valores da Atividade Metanogênica Específica são obtidos através da divisão do coeficiente angular das retas pela concentração do inóculo, convertendo-se o tempo para dia. Os valores médios obtidos entre as réplicas encontram-se na TABELA 2. TABELA 2 Valores médios de ATME nos reatores, durante o ensaio. REATORES ATME (g DQO CH4 /g SSV.L.d) 1 A/B 0,224 + 28 2 A/B 0,129 + 42 3 A/B 0,138 + 28 A partir dos valores de metano convertidos à DQO, e como é conhecida a DQO do substrato, podemos determinar a taxa de conversão de substrato à metano. Os valores obtidos encontram-se na TABELA 3. 5

TABELA 3: Valores médios da taxa de conversão de DQO a metano, durante o ensaio. REATORES TAXA DE CONVERSÃO (%) 1 A/B 83,9 2 A/B 56,7 3 A/B 45,4 5 A/B 48,0 6 A/B 38,9 A finalidade do ensaio é verificar se ocorre inibição do metabolismo bacteriano, previamente ao recebimento do lodo na planta em escala real. Caso não seja detectada a inibição, a ETE tratará esse lodo, que após a digestão e desidratação terá como disposição final um aterro sanitário que recebe resíduos de Classe 2 (não inertes), de acordo com a Norma ABNT 10004. Em função do destino do lodo, a adição do lodo proveniente da indústria não pode alterar significativamente a caracterização do dolo digerido, caso contrário sua classificação perante a normatização, impossibilitando sua disposição no aterro atualmente utilizado. Para avaliar se as características do lodo foram modificadas, optou-se por fazer uma análise de metais ao término do ensaio, para os reatores 5 A/B e 6 A/B. Os resultados encontram-se na TABELA 4, juntamente com valores convencionais de metais dos digestores da ETE BARUERI. TABELA 4: Concentrações de metais nos reatores 5 A/B e 6 A/B. METAL (mg/l) REATORES Ag Cu Cd Cr Fe Mn Ni Pb Zn 5 A/B 1,59 19,63 0,37 17,9 605,0 5,32 9,73 6,25 54,0 6 A/B 1,82 19,55 0,38 17,15 603,0 5,28 9,44 5,89 54,6 Referência:* 1,92 20,84 0,4 17,45 611,0 4,69 9,35 5,76 63,4 * Concentrações convencionais de metais para os digestores da ETE BARUERI. DISCUSSÃO E CONCLUSÕES Conforme mostra a TABELA 2, os valores da atividade metanogênica específica para os reatores que continham o lodo teste (LA+LT) foi 38,4 % inferior ao valor obtido para a solução padrão de ácidos orgânicos voláteis (AOV), e 6,5 % superior aos reatores que receberam apenas substrato convencional, ou seja, o lodo afluente aos digestores (LA). Os reatores que receberam solução AOV (Fig. 3), apresentaram uma pequena fase Lag, correspondendo ao tempo que as bactérias levaram para se aclimatar ao substrato. Uma vez aclimatadas, a conversão do substrato a metano foi intensa, atingindo 83,9 % durante o ensaio. Os reatores 3A e 3B (LA+LT) não apresentaram fase Lag, assim como os reatores que foram alimentados apenas com LA (2A/B), indicando que não deve ter ocorrido inibição por parte do lodo teste, uma vez que o substrato foi prontamente metabolizado. O fator de conversão de DQO a metano dos reatores 2A/B e 3A/B foram 56,7% e 45,4% respectivamente; significativamente inferiores ao valor obtido pelos reatores que continham solução AOV. Esta diferença deve-se, provavelmente, à degradação mais lenta dos substratos dos reatores 2A/B e 3A/B, se comparados ao substrato dos reatores 1A/B, que já estavam prontos para serem convertidos a metano. Devido à semelhança do comportamento entre os reatores 2A/B e 3A/B, além da inexistência de uma fase Lag para estes reatores, deduz-se que o lodo testado não provocou inibição do metabolismo das bactérias anaeróbias. Os dados apresentados na TABELA 4 evidenciam que a adição do lodo teste (LT), 6

nas proporções estabelecidas no teste, não afetou a caracterização do lodo no que diz respeito à concentração de metais pesados, uma vez que a análise do lodo não mostrou diferenças significativas entre as amostras de lodo dos reatores 5A/B e 6A/B. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CETESB 1995 Legislação Estadual Controle de poluição ambiental do Estado de São Paulo. São Paulo: CETESB, Série Documentos 300p. CHERNICHARO, C. A. L. 1997 Princípios do tratamento biológico de águas residuárias Reatores anaeróbios. Belo Horizonte:. UFMG 1ª ed vol. 5, 246pp CHERNICHARO, C. A. L; Borges, ª M., Mesquita, L. C. P.& Dias, A. M.ª 1997 Desenvolvimento de um respirômetro automatizado para avaliação da atividade microbiana. Engenharia Sanitária e Ambiental 2(3):120-126. DOLFING, j. & BLOEMEN, G.B.M. 1985 Activity measurements as a tool to characterize the microbial composition of methanogenic environments. Journal of Microbiological Methods 4:1-12 IHE/WHU 1991 International course on anaerobic waste water treatment Anaerobic Lab Work. Wageningen: WAU,, 49pp. JORDÃO, E. P. & PESSOA, C.A., 1995 Tratamento de esgotos domésticos. Rio de Janeiro: ABES 3ª ed. 720pp. ABNT, 1987 Resíduos sólidos - Classificação NBR10004 3p+ane 7