Carlos R. Padovani 1 Rosangela C. P. Pontara 2 Joelson G. Pereira 2 RESUMO



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MUDANÇAS RECENTES DE LEITO NO BAIXO CURSO DO RIO TAQUARI, NO PANTANAL MATO-GROSSENSE RECENT CHANGES IN THE LOWER COURSE OF TAQUARI RIVER IN THE PANTANAL, BRAZIL Carlos R. Padovani 1 Rosangela C. P. Pontara 2 Joelson G. Pereira 2 RESUMO Uma das características marcantes do rio Taquari, no curso inferior, é a sua capacidade de deposição de sedimentos, com a formação de um grande leque aluvial que provoca a instabilidade do leito principal, comprometendo a navegação e as atividades econômicas desenvolvidas no local. As mudanças observadas no baixo curso do rio Taquari, entre 1966 e 1997, através da interpretação de imagens de satélite Landsat TM-5 e levantamentos de coordenadas com GPS levaram à constatação da existência de um novo canal principal, que se formou em decorrência do desvio de curso pelo rompimento da margem direita, no local conhecido como Arrombado Zé da Costa. Este novo canal é responsável por 70 % da vazão atual em detrimento da grande redução da descarga no leito antigo. As informações coletadas, além de permitirem a atualização das cartas de drenagem, tornando possível a análise e comparação com mapas anteriores a 1966 podem ser utilizadas, também, na definição de situações de risco para as atividades humanas e na determinação de formas adequadas de manejo e utilização da área. ABSTRACT The Taquari river flows from the Parana Basin Plateaus of Mato Grosso State to the lowland region of Pantanal. The Pantanal Cenozoic Sedimentary Basin is made up of unconsolidated Quaternary sediments deposited over the pre-cambrian basement and showing geological boundary on the east side with rocks of Paleozoic and Mesozoic age from the Parana Basin (figure 1). One can notice that the Taquari river in its upper course has a meandering channel. The sinuosity is decreased very sharply in the middle and lower courses due to intense sediment deposition The consequence of this alluvial sedimentation process can be easily seen in the middle of the river course by several lobes causing an unstable drainage pattern with many points 1 Embrapa Pantanal. E-mail: guara@cpap.embrapa.br 2 Universidade Federal do Mato Grasso do Sul Campus de Corumbá. E-mail: dam@ceuc.ufms.br Boletim Paranaense de Geociências, n. 49, p. 33-38, 2001. Editora da UFPR. 33

of avulsion. like one named Arrombado Zé da Costa (figure 2) which is responsible for 70% of the actual discharge and shifting the main channel course. The subject of this work was to map the lower course changes of the Taquari river that took place from 1966 to 1997 by the Landsat TM-05 satellite images interpretation and GPS data (figure 2). The natural changes in the lower Taquari river, were expressive for 31 years and these changes have been accelerated by the effects of human activities in the area. INTRODUÇÃO O rio Taquari nasce nos planaltos da Bacia do Paraná, no Estado do Mato Grosso, a uma altitude de aproximadamente 850 metros. Após adentrar a Bacia Sedimentar Cenozóica do Pantanal, suas águas sofrem grande redução de velocidade em conseqüência das baixas declividades locais, com a predominância da deposição de sedimentos sobre o transporte e a formação de um grande leque aluvial no seu curso inferior. A bacia hidrográfica do rio Taquari está localizada entre as latitudes de 17 e 20 S e longitudes de 53 e 58 W, apresentando uma área total de aproximadamente 65.000 km 2 (Sema-MS 1992). O seu leque aluvial abrange uma área com cerca de 50.000 km 2, (Braun 1977) correspondendo a 36% da Bacia do Pantanal, que possui a sua porção superior formada por sedimentos inconsolidados, de idade quaternária, assentados sobre o embasa-mento pré-cambriano, e em contato geológico, na sua borda leste, com rochas sedimentares paleozóicas e mesozóicas que integram a Bacia do Paraná (figura 1). Figura 1: Mapa de localização da bacia do rio Taquari, no Pantanal, com a geologia simplificada e indicando o lobo ativo, no baixo curso do rio. Localization map of Taquari basin in the Pantanal, with the simplified geology and showing the active lobo in the lower course of the river. No leque aluvial, o rio pode ser dividido em duas partes em função de suas características morfológicas, o médio e o baixo rio Taquari (Sema 1992, Santos et al. 1993). No médio Taquari, o curso apresenta-se sob a forma de meandros, enquanto que no baixo curso, o padrão de drenagem predominante é o anastomosado. O baixo curso do rio Taquari é ocupado por grandes fazendas de criação de gado e pequenas colônias, que se mantêm da agricultura, pecuária e pesca. A navegação é o meio responsável pelo escoamento da produção das colônias para a cidade de Corumbá, e as abastece, como também aos portos das grandes fazendas. Considerando-se a hipótese de que o baixo curso do rio Taquari é historicamente instável e representa uma área de risco para as atividades humanas, o propósito deste trabalho foi mapear as alterações recentes do seu leito no Pantanal, objetivando utilizar essas informações como subsídio na definição de áreas de risco, importantes para o manejo e utilização dessa região. 34 Boletim Paranaense de Geociências, n. 49, p. 33-38, 2001. Editora da UFPR.

METODOLOGIA As informações da drenagem atual (anos de 1995, 1996 e 1997) foram comparadas com aquelas de 1966, encontradas nas folhas cartográficas DSG, através da sobreposição de dados espaciais em um Sistema de Informação Geográfica (SIG). Para isso, utilizaram-se: 1 - As bases cartográficas SE.21-Y-B-VI (Paraguai-Mirim), SE.21-2-A-IV (Porto Rolon), SE.21-Y-D-III (Albuquerque) e SE.21.Z-C-I (Nhecolândia), do DSG- na escala 1: 100.000, elaboradas no ano de 1966, que foram digitalizadas no sistema de informações geográficas Spring; 2 - Dados de coordenadas geográficas, obtidos com auxílio de GPS ao nível do terreno, no período de 1995 a 1997, rastreando-se os dois cursos principais do baixo rio Taquari, sendo os valores das coordenadas, posteriormente digitados em um editor de textos e transferidos para o banco de dados do Spring; 3 - Imagens de satélite Landsat TM 5, composição colorida das bandas 3, 4 e 5, órbitas 226/ 73A e 226/73C, de 17/09/95 e da órbita 227/ 73B, de 23/08/95, na escala 1: 100.000. A interpretação das imagens foi efetuada em papel apropriado, permitindo a digitalização dos dados. RESULTADOS A geração de quatro cartas de atualização de drenagem, na escala 1: 100.000, a partir da sobreposição de dados obtidos em bases cartográficas de 1966, do levantamento de coordenadas com GPS em 1995, 1996 e 1997 e da interpretação das imagens de satélite de 1995, permitiu a constatação do desvio de leito à partir de dois pontos principais (figura 2): 1 - no local conhecido como Arrombado Zé da Costa (latitude de 18 42 21 S e longitude de 56 56 50 W); 2 - no segundo arrombado, localizado pelas coordenadas 18 47 40 S e 57 01 22 W. À partir desses pontos, os dois novos canais assumem um padrão anastomosado. DISCUSSÃO As mudanças de leito observadas no baixo curso do rio Taquari, num curto espaço de tempo (aproximadamente 30 anos), deixam de ter um interesse apenas acadêmico, à medida em que influenciam diretamente os habitats naturais e as atividades econômicas desenvolvidas no Pantanal. Independentemente da abordagem, prática ou acadêmica, e considerando-se ou não as causas que provocam esta instabilidade, o mapeamento e melhor entendimento de suas modificações passadas são conhecimentos valiosos no manejo do espaço em áreas como estas. Alguns autores (DNOS 1974, Sudeco 1979, Santos et al. 1993, Tucci et al. 1997) afirmaram que o baixo curso do Taquari têm um leito instável, passível de risco para as atividades humanas, principalmente a agropecuária, e que esta característica deve ser bem conhecida para ser manejada racionalmente. Uma das características fluviomorfológicas do baixo curso do Taquari é a perda do poder de erosão e transporte, com predominância da deposição de sedimento (Padovani et al. 1998). Isso provoca instabilidade do leito principal, drenagem divergente, anastomosada em alguns locais, baixa resistência das margens e áreas susceptíveis a inundações variáveis. A instabilidade do rio Taquari neste trecho, aliada às inundações periódicas, influencia diretamente as atividades humanas, como a pecuária, a agricultura de subsistência, a navegação, a pesca e o turismo; influencia também a paisagem, a geomorfologia, a vegetação e a fauna. Os arrombados, que são rompimentos das margens, nas partes onde a água apresenta maior energia ou áreas mais baixas do barranco, formam a cada ano novos canais, inundando extensas áreas. Os fazendeiros locais, há muito tempo, fazem o fechamento destes arrombados manualmente e, mais recentemente, com dragas. Devido à instabilidade do rio, estas medidas acabam sendo apenas paliativas. As mudanças do leito do rio, de forma imprevisível, provocam inundações em algumas áreas e seca em outras, com diferentes conseqüências para a pecuária. As inundações têm reduzido a área de pasto disponível, podendo causar até a morte do gado. Nas áreas que passam a ficar mais secas, o efeito tem sido positivo para a pecuária, permitindo a introdução do gado. Com base nas informações espaciais obtidas neste trabalho, pode-se confirmar os registros contidos na literatura. A instabilidade do rio deixa de ser apenas um fenômeno natural, quando uma das causas, como o aporte de sedimentos, encontra-se intensificada devido ao aumento da erosão no planalto pela atividade agropecuária. As observações de campo evidenciam que a formação de arrombados e novas mudanças de leito surgem a cada ano, indicando que este tipo de fenômeno deverá continuar a ocorrer no futuro, apesar das obras de contenção efetuadas pelos moradores locais. Boletim Paranaense de Geociências, n. 49, p. 33-38, 2001. Editora da UFPR. 35

Figura 2: Baixo curso do rio Taquari, destacando-se as mudanças ocorridas no seu leito, de 1966, (rio Taquari Seco) até 1977. Lower course Taquari river showing the changes that have taken place from. 1966 (rio Taquari Seco) until 1997. 36 Boletim Paranaense de Geociências, n. 49, p. 33-38, 2001. Editora da UFPR.

Com o surgimento do Arrombado Zé da Costa (figura 2), houve o desvio da maior parte das águas para um novo leito, resultando na diminuição da vazão do leito que desemboca no rio Paraguai, próximo ao Porto da Manga. Padovani et al.(1998) quantificaram que 70% da vazão no período de 1995 a 1997 escoavam pelo Arrombado Zé da Costa e apenas 30% pelo leito antigo, dificultando a navegação. O surgimento dessa nova rota também deve ter influenciado a migração dos peixes e, conseqüentemente, a pesca à montante. A instabilidade do rio também provoca um processo dinâmico e intenso de sucessão vegetal. Na região à jusante do Arrombado Zé da Costa, o alagamento provocou a morte de muitas árvores havendo mudança na vegetação da região. Outros processos de sucessão vegetal, de menor escala, ocorrem com a formação e erosão de ilhas no canal do rio. O aumento da erosão hídrica dos solos, a partir da década de 70, devido à má utilização pela agropecuária, aumentou o aporte de sedimentos para o rio Taquari, no Pantanal, e este é um fator que certamente está provocando maior instabilidade e o aumento da freqüência de inundações no seu baixo curso. As inundações também estão associadas à mudança do regime hidrológico dessa região (Galdino et al. 1997). As alterações recentes do leito do rio Taquari têm sido consideradas como uma conseqüência exclusiva e direta do aumento dos processos erosivos ocorridos no planalto adjacente, como divulgado amplamente na imprensa (Correio do Estado 1997, Cerri 1997). Tal fato tem levado à conclusão equivocada de que esse processo não ocorria no passado. Trabalhos anteriores sobre esta região (DNOS 1974, Sudeco 1979, Santos et al.1993, Tucci et al. 1997, mencionaram a instabilidade do baixo curso do rio Taquari, porém, até o momento, não foi realizada uma análise espacial e temporal que considere mapas antigos e fontes de informação espacial recentes, como imagens de satélite e dados de coordenadas, para demonstrar as alterações do curso do rio Taquari ao longo do tempo. Partindo-se do princípio de que o baixo curso do rio Taquari é historicamente instável, o estudo das mudanças ocorridas no seu leito permite uma melhor interpretação da paisagem atual, facilitando o discernimento entre os processos naturais e os de origem antrópica, que atualmente se confundem. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES As mudanças de leito do rio Taquari, no seu baixo curso, entre 1966 e 1997, confirmam a hipótese de instabilidade do rio, que tem influenciado, diretamente, as atividades econômicas na região. As implicações das mudanças de leito para as atividades humanas e o meio ambiente locais indicam a necessidade de que sejam efetuadas análises de mapas antigos, para se avaliar a ocorrência, localização e freqüência dessas mudanças no passado. Desta forma seria possível definir futuras áreas de risco, fazendo-se necessário ampliar essa análise para o médio Taquari, no Pantanal. AGRADECIMENTOS À equipe do Laboratório de Geoprocessamento da Embrapa Pantanal, pela digitalização da base cartográfica. REFERÊNCIAS Braun E.H.G. 1977. Cone Aluvial do Taquari, unidade geomorfológica marcante da planície quaternária do Pantanal. Revista Brasileira de Geografia, 39: 164-167. Cerri C.O. 1997. O berçário do Brasil. Revista Globo Rural, out., 60-78. Correio do Estado 1997. Governo acusado de omisso na questão do Taquari. Correio do Estado, Campo Grande, 22 ago., 6. p. DNOS 1974. Ministério do Interior. Departamento Nacional de Obras e Saneamento. Estudos Hidrológicos da Bacia do Alto Paraguai, Rio de Janeiro, v. 1, 184 p., Anexos. Relatório Técnico. Galdino S., Clarke T., Padovani, C.R., Soriano B.M.A. & Vieira L.M. 1997. Evolução do regime hidrológico na planície do baixo curso do rio Taquari Pantanal. In: Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos, 12, Vit pória Anais, 383-390. Padovani C.R., Carvalho N.O., Galdino S., Vieira L.M. 1998. Deposição de sedimentos e perda de água do rio Taquari no Pantanal. In: Encontro de Engenharia de Sedimentos, 3, Belo Horizonte, Anais, 127-134. Santos A.T., & Crepani E. 1993. Contribuição do Boletim Paranaense de Geociências, n. 49, p. 33-38, 2001. Editora da UFPR. 37

sensoriamento remoto aplicado à geografia no estudo do assoreamento do rio Taquari, Pantanal Mato-Grossense. In: Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto, 7, Curitiba, Anais, 261-266. Sema-MS 1992. Sub-bacia do Taquari. Mato Grosso do Sul: Governo do Estado/Secretaria do Estado de Meio Ambiente. Set., 1992. 18 p. Relatório Técnico. Sudeco 1979. Estudo de Desenvolvimento Integrado da Bacia do Alto Paraguai: Relatório de 1ª fase. Descrição física e recursos naturais. Ministério do Interior. Brasília, T. 2, 235 p., Anexos. Tucci C.E., Risso A., Borges A., Semmelman F., Leão M.I. Lopes M.S. & Marques D.M. 1997. Diagnóstico e preservação. In: BRASIL. Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal. Plano de Conservação da Bacia do Alto Paraguai (Pantanal) - PCBAP. Hidrossedimentologia do Alto Paraguai. Brasília, v. 2, t. 2 - B, p. 659-680. Recebido em 14 jun. 2000. Aceito em 26 jun. 2001. 38 Boletim Paranaense de Geociências, n. 49, p. 33-38, 2001. Editora da UFPR.