3º Congresso Ibéroamericano sobre betão auto-compactável Avanços e opórtunidades Madrid, 3 e 4 de Dezembro de 2012 Caracterização reológica e mecânica de concretos leves autoadensáveis T. M. Grabois Programa de Engenharia Civil, COPPE, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil. R. D. Toledo Filho Programa de Engenharia Civil, COPPE, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil. G. C. Cordeiro Laboratório de Engenharia Civil, Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, Brasil. RESUMO O presente trabalho apresenta os resultados de um estudo experimental sobre o comportamento reológico e mecânico de concretos leves autoadensáveis (CLAA). Duas classes de CLAA foram produzidas, uma contendo apenas agregados graúdos leves e outra com agregados graúdos e miúdos leves. O agregado leve utilizado na composição dos concretos foi a argila expandida, comercialmente disponível no Brasil. Avaliou-se as propriedades do concreto no estado fresco, através de ensaios tradicionais como o espalhamento de tronco de cone, espalhamento com o cone invertido, funil V e teor de ar aprisionado. A segregação e uniformidade da distribuição dos agregados ao longo dos corpos de prova foram avaliadas através de fotografias das seções transversais das amostras. Além das propriedades no estado fresco foram também determinadas propriedades no estado endurecido, como massa específica, resistência à compressão e módulo de elasticidade das diferentes misturas estudadas. Os resultados indicaram que para as diferentes classes de CLAA produzidas o diâmetro de espalhamento esteve entre 600 e 700 mm e o tempo de escoamento no funil V foi inferior a 25 segundos. Os concretos apresentaram valores de massa específica entre 1700 e 1800 kg/m³ com valores de resistência à compressão numa faixa de 35 a 37 MPa e módulo de elasticidade em torno de 20 GPa. PALAVRAS-CHAVE: concreto leve autoadensável; agregado leve; caracterização. 1.- INTRODUÇÃO A utilização de concreto estrutural leve ao longo dos anos vem sendo, cada vez mais, adotada em inúmeros projetos e aplicações devido ao seu bom comportamento mecânico e durabilidade [1]. O desenvolvimento do concreto autoadensável (CAA) facilitou a execução de estruturas de concreto que passaram a depender menos da qualidade da mão-de-obra devido à sua capacidade de autocompactação, mesmo nos cantos mais 411
Caracterização reológica e mecânica de concretos leves autoadensáveis estreitos e difíceis de preenchimento dos moldes estruturais, sem a necessidade de adensamento [2]. Diversas características, tanto no que se refere ao comportamento no estado fresco quanto no endurecido, dos concretos leves autoadensáveis (CLAA) proporcionam vantagens na produção deste material em comparação aos concretos de massa específica convencional [3]. No caso particular dos CLAA algumas características podem ser destacadas: redução no peso próprio das estruturas e consequentemente nas cargas sobre as fundações e nos custos finais; redução da poluição sonora no entorno das construções devido à ausência de vibração; excelentes propriedades térmicas e acústicas através da redução da condutividade térmica, redução da massa específica e elevada porosidade dos agregados leves; aumento da resistência ao fogo; excelente acabamento das superfícies devido à sua fluidez, capacidade de adensamento e preenchimento das formas; redução dos custos de transportes, no caso de estruturas pré-fabricadas. [3, 4, 5, 6, 7, 8]. Pesquisas voltadas para a caracterização de concreto leve autoadensável são relevantes devido ao conhecimento ainda restrito sobre suas propriedades. O concreto leve autoadensável é uma técnica recente que propõe a prática, já consagrado na indústria da construção, de redução do peso em estruturas de concreto através da utilização de agregados leves em conjunto à tecnologia contemporânea do concreto autoadensável. Nesse contexto, este trabalho tem por objetivo produzir duas matrizes de CLAA com massa específica entre 1700 e 1800 kg/m³ utilizando agregados leves de argila expandida e investigar o comportamento destes concretos no estado plástico, no que diz respeito à sua capacidade de fluidez e desempenho de autocompactação, e no estado endurecido, avaliando a resistência mecânica sob esforços de compressão e o módulo de elasticidade. 2.- MATERIAIS E METODOLOGIA DE PRODUÇÃO DOS CONCRETOS 2.1.- Materiais Os materiais utilizados na pesquisa foram: cimento Portland de alta resistência inicial (CPV ARI), cinza volante, argila expandida na fração graúda (AE1506) e miúda (AE0500), areia natural quartzosa, aditivo superplastificante (SP) à base de éter policarboxilato, agente modificador de viscosidade (VMA) e água. Os materiais finos foram caracterizados segundo ensaios de granulometria via analisador a laser e massa específica por picnômetro à gás hélio (He). A caracterização dos agregados foi realizada de forma a determinar sua granulometria por peneiramento mecânico e massa específica e absorção de água segundo as normas ABNT NBR NM52 [9] e NBR NM53 [10], respectivamente. Porém, para o caso da argila expandida, uma adaptação aos ensaios de absorção e massa específica foi adotada, e pode ser encontrada com mais detalhes em [11]. Algumas propriedades dos materiais constituintes estão apresentadas na Tabela 1 e suas curvas granulométricas estão na Fig. 1. 412
T. M. Grabois, R. D. Toledo Filho, G.C. Cordeiro Materiais Tabela 1. Caracterização dos materiais constituintes do CLAA Massa específica [kg/m³] Absorção-24hs [%] D máx [mm] CPV ARI 3208,6 - - Cinza volante 2404,7 - - Areia 2667,9 1,4 2,36 AE0500 1541,4 6,45 4,75 AE1506 956,4 13,95 12,5 Figura 1. Curvas granulométricas dos materiais constituintes dos CLAA 2.2.- Produção dos CLAA Os concretos foram dosados com cimento Portland e cinza volante (30% em massa) como materiais cimentícios. Para ambas as classes de concretos leves autoadensáveis, os agregados graúdos adotados foram, em sua totalidade, de argila expandida (AE1506). As duas classes foram nomeadas de acordo com o material constituinte que as diferenciou, o agregado miúdo. Uma classe foi dosada com 100% de areia natural quartzosa (CLAA1000) e a outra com 70% de areia e 30% de argila expandida na fração miúda (AE0500), denominada de CLAA7030. A relação água-material cimentício (a/mc) da mistura CLAA1000 foi de 0,36 e a relação água-cimento (a/c) foi de 0,51, enquanto que, para a classe CLAA7030 as relações (a/mc e a/c) foram de 0,42 e 0,60, respectivamente. É importante ressaltar que, apesar dos constituintes serem praticamente os mesmos e as propriedades almejadas para os concretos também, as duas classes apresentaram dosagens completamente distintas, conforme apresentado na Tabela 2. 413
Caracterização reológica e mecânica de concretos leves autoadensáveis Tabela 2. Composição dos CLAA em kg/m³ Materiais [kg/m³] Misturas CPV Cinza Areia AE0500 AE1506 Agua SP VMA ARI volante CLAA1000 357 153 702-371 180,8 12,9 - CLAA7030 329 141 545 234 275 188,5 8,9 0,01 2.3.- Metodologia de caracterização dos CLAA As propriedades dos CLAA no estado fresco foram determinadas através de ensaios de espalhamento (slump flow test), espalhamento com o cone invertido, fluidez com o funil V e teor de ar aprisionado. A determinação da massa específica (γ) dos concretos foi realizada de acordo com ensaio de absorção total de água por imersão, prescrito pela ABNT NBR 9778 [12], em corpos-de-prova cilíndricos com 100 mm de diâmetro e 100 mm de altura, após 28 dias de cura úmida. A resistência à compressão uniaxial e o módulo de elasticidade dos concretos produzidos foram determinados segundo as prescrições da ABNT NBR 5739 [13], utilizando corpos-de-prova cilíndricos de 100 mm de diâmetro e 200 mm de altura. Os concretos foram avaliados após 1, 3, 7 e 28 dias de cura. Aos 28 dias, além da carga de ruptura, o comportamento tensão versus deformação foi obtido com emprego de transdutores elétricos (LVDT), para medição dos deslocamentos longitudinais, acoplados à região central dos corpos-de-prova. 3.- CARACTERIZAÇÃO DOS CLAA 3.1.- Propriedades no estado fresco Os dados obtidos experimentalmente para caracterização dos CLAA no estado fresco estão apresentados na Tabela 3. Os valores de espalhamento de tronco de cone, na posição original e invertida, indicaram comportamento satisfatório para as misturas CLAA1000 e CLAA7030 e estiveram compreendidos entre 600 mm e 750 mm. Nos ensaios com o funil V, assim como nos resultados de espalhamento, o comportamento dos concretos leves autoadensáveis foi atendido, onde ambos os concretos apresentaram tempo de escoamento inferior a 25 segundos. Estes resultados indicaram comportamento de elevada fluidez e viscosidade nos CLAA sem apresentar nenhum tipo de segregação, conforme apresentado nas imagens da Fig. 2. Além disso, os resultados apresentados estão de acordo com estudos anteriores [3, 5, 7] para diferentes misturas de concretos leves autoadensáveis. 414
T. M. Grabois, R. D. Toledo Filho, G.C. Cordeiro Tabela 3. Propriedades dos CLAA no estado fresco Espalhamento Misturas Tronco de cone mm] Cone invertido ([mm] Funil V [s] Teor de ar [%] CLAA1000 670 650 23 2,0 CLAA7030 620 675 16 2,1 (a) (b) (c) (d) Figura 2. Ensaios de espalhamento de tronco de cone para os concretos: (a) e (b) CLAA1000; (c) e (d) CLAA7030 3.2.- Propriedades no estado endurecido Os concretos CLAA1000 e CLAA7030 apresentaram valores de massa específica iguais a 1764 e 1749 kg/m³, respectivamente. Seções transversais de corpos-de-prova cilíndricos das diferentes misturas também foram analisadas e, com as imagens da Fig. 3, pode-se observar a distribuição uniforme dos agregados leves por toda a amostra confeccionada e a ausência de segregação, já constatada na discussão das propriedades no estado fresco. 415
Caracterização reológica e mecânica de concretos leves autoadensáveis (a) (b) Figura 3. Seções transversais dos corpos-de-prova cilíndricos: (a) CLAA1000; e (b) CLAA7030 A evolução da resistência à compressão em função do tempo de cura é apresentada na Fig. 4a, indicando que as duas matrizes leves apresentaram valores elevados de resistência à compressão nas primeiras idades. Neste caso, ambas as misturas apresentaram resistência em torno de 25 MPa com apenas 1 dia de cura, o que equivale a cerca de 70% da resistência alcançada aos 28 dias. Além disso, de acordo com a análise de variância (ANOVA), ao nível de 5% de probabilidade, não houve diferenças significativas com relação à resistência obtida pelas diferentes classes de CLAA em nenhuma das idades avaliadas. Os concretos produzidos neste trabalho podem ser classificados de acordo com o ACI 213R [1], como concretos leves estruturais, pois apresentaram valores de resistência à compressão aos 28 dias bem superiores aos 17 MPa estabelecidos pelo guia do ACI e massa específica inferiores a 1920 kg/m³. Curvas típicas tensão versus deformação, obtidas após 28 dias de cura, são apresentadas na Fig. 4b. Para os resultados de módulo de elasticidade (E) e deformação de pico (ε u ) as diferenças não foram significativas, os valores médios (± desvio padrão) de E foram 21,4 (± 1,3) e 22 (± 1,2) GPa para os concretos CLAA1000 e CLAA7030, respectivamente, enquanto que os resultados de ε u foram 1941(± 142) e 1936 (± 99) με. Observou-se ainda que as misturas CLAA 1000 e CLAA 7030 apresentaram, respectivamente, comportamento linear elástico de cerca de 58 e 62% da carga máxima de ruptura, maiores do que os resultados obtidos em concretos de massa específica convencional de mesma classe de resistência, que de acordo com [14] apresentam desvio da linearidade entre 30 e 50% da carga de ruptura do material, onde as microfissuras da zona de transição na interface aumentam de comprimento, de abertura e em quantidade. Este comportamento ocorre, provavelmente, em função dos valores de módulo de elasticidade dos agregados leves, serem mais próximos aos valores de E da argamassa. Além disso, este tipo de agregado é capaz de promover uma melhor ligação com a argamassa devido à superfície rugosa e o seu interior poroso [15, 16]. 416
T. M. Grabois, R. D. Toledo Filho, G.C. Cordeiro (a) (b) Figura 4. Resistência à compressão: (a) evolução da resistência em função do tempo; (b) curvas típicas tensão versus deformação aos 28 dias de cura As imagens da Fig. 5 ilustram o modo de ruptura dos CLAA, onde se observou que a ruptura ocorreu através dos agregados leves de argila expandida. Percebeu-se, assim, que neste caso a zona de transição entre as fases permaneceu integra, provavelmente, em função da melhor ligação matriz cimentícia agregado leve poroso. A literatura técnica [17, 18] aponta que o modo de ruptura típico dos concretos leves é diferente do encontrado em concretos convencionais de mesma classe de resistência, se assemelhando ao modo de fratura encontrado em concretos de alta resistência de massa específica convencional. Em concretos com agregados leves a matriz cimentícia é, normalmente, mais resistente do que os agregados e o colapso do concreto ocorrerá quando a argamassa não for mais capaz de suportar carregamento com superfície de ruptura ocorrendo através dos agregados, enquanto que em concretos convencionais as partículas dos agregados são mais resistentes do que a matriz e a fratura incidirá ao redor do agregado, propiciando o descolamento entre as fases. 417
Caracterização reológica e mecânica de concretos leves autoadensáveis (a) (b) 4.- CONCLUSÕES (c) (d) Figura 5. Modo de ruptura dos corpos-de-prova submetidos à esforços de compressão uniaxial: (a) e (b) CLAA1000; (c) e (d) CLAA7030 Com base nos resultados apresentados concluiu-se, de forma geral, que os agregados leves de argila expandida adotados na confecção das misturas permitiram a produção de matrizes de elevada fluidez e plasticidade no estado fresco, assim como em concretos autoadensáveis com agregados de massa específica convencional. As elevadas propriedades reológicas obtidas no estado fresco estiveram associadas a teores de ar aprisionado em torno de 2% e também à distribuição homogênea dos agregados leves de argila expandida por toda a matriz cimentícia, sem a existência de segregação, o que possibilitou classifica-los como concretos leves autoadensáveis. Aos 28 dias de cura a resistência à compressão das duas classes de concretos leves autoadensáveis apresentou valores em torno de 35 MPa e os resultados alcançados para o módulo de elasticidade estiveram entre 21 e 22 GPa. Além disso, ambas as misturas 418
T. M. Grabois, R. D. Toledo Filho, G.C. Cordeiro desenvolvidas obtiveram massa específica inferior a 1800 kg/m³ e se encontraram classificadas na faixa de concretos leves estruturais, definida pelo ACI 213R-03. Além disso, os CLAA apresentaram valores de resistência à compressão acima de 20 MPa após 1 dia de cura em função do cimento de alta resistência inicial adotado e sua evolução se mostrou coerente até os 28 dias de cura úmida. O comportamento elástico linear em torno de 60% da carga de ruptura, apresentado pelos CLAA, foi superior ao encontrado em concretos de massa específica convencional de mesma classe de resistência. A ruptura se deu através dos agregados leves, uma vez que a zona de transição na interfase permaneceu integra e a argamassa foi, provavelmente, mais resistente do que o agregado. REFERÊNCIAS [1] AMERICAN CONCRETE INSTITUTE - Guide for Structural Lightweight Aggregate Concrete. ACI Committee 213R-03, 2003. Detroit: American Concrete Institute. [2] OKAMURA, H.; OUCHI, M. - Self-Compacting Concrete. Journal of Advanced Concrete Technology. Japan Concrete Institute, 2003. v. 1, pp. 5-15. [3] TOUTANJI, H., PIERCE K., NOUMOWE A. - Mix design and Strengh Performance of Lightweight Self-consolidating Concrete: 5th International RILEM Symposium on Self-Compacting Concrete. Ghent: RILEM Publications SARL, 2007. 831-838. [4] COLLEPARDI, M., BORSOI A., COLLERPARDI S., TROLI R. - Recent Developments of Special SCC's. Proceedings of Seventh CANMET/ACI International Conference on Recent Advances in Concrete Technology. Las Vegas: 2004. 1-18. [5] SHI, C.; WU, Y. - Mixture Proportioning and Properties of Self-Consolidating Lightweight Concrete Containing Glass Powder. ACI Materials Journal, 2005. 355-363. [6] HWANG, C.; HUNG, M. - Durability Design and Performance of Self-consolidating Lightweight Concrete. Construction and Buildng Materials: Elsevier, 2005. 619-626. [7] WU, Z., ZHANG Y., ZHENG J., DING Y. - An Experimental Study on the Workability of Self-compacting Lightweight Concrete. Construction and Building Materials: Elsevier, 2008. 2087-2092. [8] COSTA, H., JÚLIO E., LOURENÇO J. - Formulação e Caracterização de Betões Estruturais de Agregados Leves Auto-compactáveis. 2º Congresso Ibérico sobre betão auto-compactável. Guimarães: BAC, 2010. [9] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS - Agregado miúdo: Determinação da massa específica e massa específica aparente. NBR NM 52, 2003. Rio de Janeiro. 419
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