INTRODUÇÃO. FIEP BULLETIN - Volume 85 - Special Edition - ARTICLE I - 2015 (http://www.fiepbulletin.net)



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A PARTICIPAÇÃO DO PROFISSIONAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA EM UM NÚCLEO DE APOIO A SAÚDE DA FAMÍLIA: PROTAGONISMO PROFISSIONAL ALÉM DA APLICAÇÃO DE ATIVIDADE FÍSICA INTRODUÇÃO JEFERSON SANTOS JERÔNIMO Universidade Federal do Rio Grande do Sul Residência Integrada Multiprofissional em Saúde Mental Coletiva Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil jefersonsj@yahoo.com.br Estudiosos afirmam que desde a criação do primeiro curso de Educação Física no Brasil em 1931 se observa uma tendência à formação na área da saúde (GUARDA; MARIZ; SILVA, 2009), com a inclusão do curso nesta área no ano de 2000 (HALLAL et al., 2007) e com implementação da Política nacional de promoção da saúde em 2006 (BRASIL, 2006), a qual preconiza entre suas ações específicas a promoção de práticas corporais e atividades físicas como uma ação de promoção da saúde em nível populacional dentro do Sistema Único de Saúde (SUS), a área da saúde pública vem se tornando um campo fértil de atuação profissional para educadores físicos. Nesse sentido, os Núcleos de Apoio a Saúde da Família (NASF) são um campo de atuação desses profissionais. Os NASF foram criados pela Portaria GM nº 154 de 2008 com o objetivo de apoiar, ampliar, aperfeiçoar a atenção e a gestão da saúde na Atenção Básica, contribuindo com a inserção da Estratégia Saúde da Família (ESF) na rede de serviços de atenção primária à saúde dentro do SUS. Esses núcleos se constituem por equipes multiprofissionais compostas por no mínimo cinco profissionais de formação universitária - NASF 1 e por no mínimo três profissionais NASF 2 - podem compor essas equipes: psicólogo, assistente social, farmacêutico, fisioterapeuta, fonoaudiólogo, médico ginecologista, profissional da educação física, médico homeopata, nutricionista, médico acupunturista, médico pediatra, médico psiquiatra e terapeuta ocupacional. (BRASIL, 2009). Entretanto, a temática saúde pública ainda causa certo estranhamento no meio acadêmico de algumas graduações em Educação Física. Estudo realizado por Jerônimo; Rech e Domingues (2013), demonstrou que a percepção de estudantes de graduação, tanto no curso de licenciatura, quando de bacharelado, acerca de espaços de atuação profissional ainda é um tanto quanto limitada, principalmente no que se refere aos NASF, muito embora a literatura demonstre que a temática saúde está presente no currículos das graduações. Estudo realizado em 12 cursos de Educação Física do estado do Paraná demonstrou que mesmo no curso de Licenciatura há componentes curriculares que abordam o tema saúde, tendo nos títulos das disciplinas a palavra saúde ou promoção da saúde (BRUGNEROTTO; SIMÕES, 2009). Contudo, a formação desses profissionais, quanto ao tema saúde pública ainda é discutível. Nesse contexto, as residências multiprofissionais em saúde configuram-se como importantes espaços de formação. Nesse sentido, a Faculdade de Educação, a Faculdade de Enfermagem e o Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, através do Núcleo de Educação, Avaliação e Produção Pedagógica em Saúde (EducaSaúde), desde 2005 coordena a Residência Integrada Multiprofissional em Saúde Mental Coletiva, a qual tem entre seus cenários de prática um NASF (CECCIM, 2006). O objetivo deste artigo é apresentar as percepções de um profissional de Educação Física, acerca de sua participação, através da Residência Integrada Multiprofissional em Saúde Mental Coletiva coordenada pelo EducaSaúde da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, em um Núcleo de Apoio à Saúde da Família no município de Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil.

MÉTODO Estudo qualitativo com abordagem metodológica da pesquisa ação, na qual através da observação participante foram coletadas as percepções do pesquisador sobre sua participação/intervenção como residente do EducaSaúde da Universidade Federal do Rio Grande do Sul no Núcleo de Apoio à Saúde da Família - Cruzeiro, no município de Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil. A participação neste cenário de prática ocorreu de abril a novembro de 2014, dois dias por semana em turno integral e as vivências foram registradas em um diário de campo para posterior análise. RESULTADOS E DISCUSSÃO O NASF Cruzeiro iniciou-se em 2011 e sua equipe atual é composta por seis profissionais: um assistente social, uma nutricionista, duas fisioterapeutas, uma médica psiquiatra, uma médica ginecologista, os quais dão cobertura a cinco unidades ESF totalizando nove equipes. Como residente pude intervenção em duas frentes de ação: como profissional e como profissional/residente/estudante. A visão externa que a residência oferece a partir de uma figura híbrida trabalhador/estudante, possibilitou um diagnóstico tanto da equipe do NASF quanto do território no qual a equipe realiza o apoio matricial. A partir dessa visão panorâmica equipe/território, pude observar dois tipos de demandas: uma externa ao NASF relativa às diretrizes do apoio matricial, territorialização e inserção das unidades ESF na rede de saúde e outra demanda interna, que por sua vez se divide em duas linhas de ação: uma referente ao planejamento das ações no território (demanda intraequipe) e referente à relação da equipe com a gerência/gestor do distrito de saúde. Após o diagnóstico, os trabalhos se deram nestas duas linhas de ação: junto à comunidade com acompanhamento de diferentes atores da equipe multiprofissional do NASF dentro da lógica do apoio matricial colocada por Campos e Domitti (2007), buscando a ampliação da clínica, melhora na interação entre as equipes matriciadas, superação da visão biomédico centrada na consulta individual e do excesso de medicalização, através do trabalho interdisciplinar e de sistemas de co-gestão abordando temas como acolhimento, territorialização, empoderamento dos sujeitos atendidos pela rede de serviços de saúde e dos trabalhadores da rede. A equipe do NASF Cruzeiro desenvolve diferentes ações no território de sua área de abrangência: consultas compartilhadas; visitas domiciliares; participação nas reuniões de equipe das unidades matriciadas, discussão de casos, rodas de terapia comunitária; além de desenvolver ações junto a gerencia distrital como planejamento e aplicação de capacitações de Agentes Comunitários de Saúde, acompanhamento dos sujeitos atendidos pela rede de saúde e das principais demandas em saúde no distrito, através da participação em equipes de monitoramento/vigilância em saúde, participação em reuniões do conselho gestor e em reuniões dos conselhos de saúde, locais e distrital. Todo esse processo coloca o NASF Cruzeiro, ainda em formação, em uma situação de tensionamentos, entre as demandas do território e as demandas exigidas pela gerência do distrito, gerando a referida situação de dois tipos de demandas: uma externa, no território (papel do NASF) e outra interna referente à relação hierárquica colocada pela gestão do distrito. Esse cenário de tensão também é demonstrado por Silva et al. (2012), ao elencar as diferentes situações de trabalho vivenciadas por profissionais da atenção básica de São Paulo e suas perspectivas em relação ao trabalho dos NASF e que de fato pude observar nos processos de trabalho da equipe do NASF Cruzeiro, ou seja, trabalhar no sentido de

potencializar a integralidade do cuidado, agindo diretamente na cultura biomédica de encaminhamentos e medicalização desnecessárias. No entanto, também pude observar e intervir mais diretamente na relação entre equipe NASF Cruzeiro e gestão distrital, no sentido de tentar empoderar a equipe para estimular a reflexão crítica junto à gestão a cerca de processos avaliativos quantitativos que não refletem a efetividade, nem a qualidade das ações desenvolvidas pela equipe, dificuldade que também é relatada por Silva et al. (2012). A dificuldade em identificar papel, constituição, funcionamento, relação com a equipes de ESF e interdisciplinaridade (SILVA et al., 2012), vivenciada pela equipe do NASF Cruzeiro compromete a noção de apoio matricial acarretando em falta de tempo para implementar ações amplas no território, uma vez que muito do tempo da equipe é destinado à ações demandas pela gerencia distrital em uma espécie de cobrança por uma produção que a meu ver não corresponde as diretrizes dos NASF (BRASIL, 2009), o que coloca a equipe em uma espécie de linha de produção burocrática aproximando o serviço público de saúde à lógica do capital privado do mínino custo e máxima produção - minimax - o que inclusive pode comprometer a saúde mental desses trabalhadores (BERNARDO et al., 2011, p.9). Em relação ao trabalho do Educador físico nos NASF, a literatura demonstra que sua atuação é concentrada em ações específicas dentro de seu núcleo profissional como grupos de atividade física com exercícios de alongamentos, força muscular, caminhadas, coordenação motora e atividades lúdicas. Os profissionais afirmam que há pouca informação sobre saúde pública na graduação, porém o trabalho em equipe possibilita ações coletivas na comunidade com envolvimento de um grande número de participantes, em alguns casos, mais de noventa sujeitos. Por outro lado, os autores afirmam que há necessidade de aumentar a cobertura a partir de novos direcionamentos (SOUZA; LOCH, 2011). Talvez ações fora do núcleo profissional de formação? Nesse sentido, como salienta Scabar; Pelicioni e Pelicioni (2012), a atual configuração do SUS exige profissionais com perfil, entre estes os de Educação Física, que contemplem a superação da perspectiva da ação individualizada e fragmentada que coloca os sujeitos, usuários da rede de saúde em uma situação passiva (pacientes) a esperara da consulta individual e da medicação. Os autores resaltam que esse perfil está proposto pelas Diretrizes Cirriculares Nacionais, entretanto tal política ainda está em implementação nos cursos de Educação Física, além de ser escasso na literatura estudos que demonstrem a participação do educador físico no SUS. Dessa forma, a participação no NASF Cruzeiro, através da Residência Integrada Multiprofissional em Saúde Mental Coletiva do EducaSaúde, como uma figura híbrida trabalhador/estudante possibilitou a extrapolação do núcleo profissional da Educação Física com a implementação de ações dentro da equipe do NASF através de discussões em rodas de conversa sobre inter/transdisciplinariedade, campo e núcleo de saberes, problematizando espaços de circulação dos sujeitos (a cidade) atendidos pela rede de saúde, seus artefatos de produção de sentidos e culturas e escuta e acolhimento das singularidades. Discussão inerente a qualquer profissional da saúde independente do núcleo de formação (CECCIM, 2006, p.2). Nesse sentido, Campos (2000), com muita propriedade levanta temas para discussão abordando as relações entre campo de trabalho e núcleo de formação profissional da saúde coletiva, apresentando uma proposta dialética o autor sugere irmos além da estrutura que é colocada, extrapolar o núcleo de formação e assumir uma posição de transcendência e transversalidade e a partir da clínica ampliada observar os sujeitos e os processos de saúde/doença para além do viés biológico, mas também como uma construção sociohistórica em uma perspectiva de promoção da saúde como potencializador de histórias de vida pautadas no território, na comunidade.

CONCLUSÃO A participação na equipe do Núcleo de Apoio a Saúde da Família - Cruzeiro - através da Residência Integrada Multiprofissional em Saúde Mental Coletiva do EducaSaúde de fato possibilitou uma atuação além do núcleo específico da Educação Física, o que condiz com a Política Nacional de Promoção da Saúde, a qual coloca as práticas corporais e atividades físicas como fatores de promoção à saúde, que vai ao encontro das diretrizes para os NASF e das Diretrizes Curriculares Nacionais. Portanto, considerando as perspectivas de desenvolvimento do Sistema Único de Saúde e o perfil que se espera dos profissionais essa participação teve reverberações importantes, tanto para o pesquisador/trabalhador/residente/estudante quanto para a equipe, que pode observar e vivenciar a experiência de um educador físico que pode e deve estar além de seu núcleo de formação profissional, buscando a integralidade dos sujeitos atendidos pela rede de saúde, através clínica ampliada, da superação do viés biomédico, da consulta individualizada, farmacologização, medicalização e da inter/transdisciplinariedade. Nesse sentido, os NASF podem ser considerados como espaços de protagonismo profissional, além do núcleo específico de formação profissional da Educação Física. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BERNARDO, M. H. et al. Ainda sobre a saúde mental do trabalhador. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, São Paulo, v.36, n.123, p.8-11, 2011. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Política nacional de promoção da saúde Brasília: Ministério da Saúde, 2006. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Cadernos de Atenção Básica; n. 27 Brasília: Ministério da Saúde, 2009. BRUGNEROTTO, F. SIMÕES, R. Caracterização dos currículos de formação profissional em Educação Física: um enfoque sobre saúde. Physis Revista de Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 19, n. 1, p. 149-172, 2009. CAMPOS, G. W. S. Saúde pública e saúde coletiva: campo e núcleo de saberes e práticas Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v.5, n.2, p.219-230, 2000. CAMPOS, G. W. S.; DOMITTI, A. C. Apoio matricial e equipe de referência: uma metodologia para gestão do trabalho interdisciplinar em saúde. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v.23, n.2, p.399-407, fev, 2007. CECCIM, R. B. Residência Integrada Multiprofissional em Saúde Mental Coletiva: formação em área profissional da saúde na modalidade educação pós-graduada em serviço. V Congresso Internacional de Saúde Mental e Direitos Humanos e I Fórum Social de Saúde Coletiva, Universidad Popular de las Madres de La Plaza de Mayo, Buenos Aires, Argentina, v.1, n.1, p.1-7, 2006.

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