NONA CÂMARA CÍVEL Apelação nº 0015111-07.2009.8.19.0001 Apelante: JOÃO CAMPOS DA SILVA Apelado: ESTADO DO RIO DE JANEIRO Relator: Desembargador ROBERTO DE ABREU E SILVA AÇÃO ORDINÁRIA. LEGITIMIDADE DO ESTADO PARA FIGURAR NO PÓLO PASSIVO DA DEMANDA. PESSOA PORTADORA DE DOENÇA CRÔNICA- Transtorno Orgânico de Personalidade, alteração significativa de comportamento, e Epilepsia. Reside em Manguinhos e se trata no bairro Saúde utilizando transporte ferroviário. NECESSÁRIO DESLOCAMENTO MUNICIPAL E/OU INTERMUNICIPAL UTILIZANDO VALE-SOCIAL. CONCESSÃO. DEVER DO ESTADO. PRECEDENTES DESTE EG. TJRJ. Os documentos juntados aos autos comprovam que o autor é portador de doença crônica, demandando tratamento médico regular, situação que se amolda às exigências normativas para a concessão do benefício pretendido, em conformidade com o Decreto nº 36.992 de 25 de fevereiro de 2005, que regulamenta a Lei nª 4.510/2005, disciplinadora da matéria. Ressalte-se que a Constituição Federal de 1988, ao assegurar a todos o direito à saúde (art. 196) estabelece para o Estado (lato sensu) em formato incondicional o dever de promoção, proteção e recuperação da saúde. Assim, o direito à saúde, amplo e irrestrito, tem amparo no principio constitucional fundamental da dignidade da pessoa humana, sendo dever do ente público zelar pela sua observância. PROVIMENTO DO RECURSO. Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Apelação nº 0015111-07.2009.8.19.0001, A C O R D A M os Desembargados que compõem a Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, em DAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do voto do relator. Decisão unânime. V O T O Integra-se ao presente o relatório constante dos autos. Conheço e admito o recurso, tendo em vista a presença dos pressupostos de admissibilidade. Trata-se de ação, ajuizada sob o rito ordinário, por JOÃO CAMPOS DA SILVA em face do ESTADO DO RIO DE JANEIRO, objetivando a concessão de gratuidade de justiça em transporte coletivo intermunicipal. 1 - E
Aduz que reside no bairro de Manguinhos, é portador de Transtorno Orgânico de Personalidade alteração significativa de comportamento, além de Epilepsia e faz uso de trem e ônibus para realizar tratamento ambulatorial no Centro Psiquiátrico do Rio de Janeiro, localizado no bairro Saúde. Afirma que não tem recursos para arcar com os custos de transporte e requer, por isso, a concessão do vale-social em conformidade com a Lei Estadual nº 4.510/2005. Acrescenta, ainda, que já possuía o vale-social do Governo do Estado do Rio de Janeiro, concedido às pessoas portadoras de doença crônica, no entanto, ao expirar a validade do documento, não foi possível a sua renovação, diante do indeferimento do pedido na via administrativa. Antecipação de tutela deferida às fls. 26. Decisão preclusa. O Estado, em sua defesa, alegou ilegitimidade passiva porque a hipótese dos autos não se refere a transporte intermunicipal uma vez que a residência do autor e o Centro Psiquiátrico em que realiza o tratamento situam-se, ambos, no Município do Rio de Janeiro. O d. Juízo Monocrático, reconhecendo a ilegitimidade do réu para figurar no pólo passivo da demanda, julgou improcedente o pedido (art. 269, I, do CPC) e condenou o autor nas custas, taxa judiciária e honorários advocatícios de 10% (dez por cento) do valor da causa, observado o artigo 12 da Lei nº 1.060/50, tornando sem efeito a antecipação de tutela deferida (fls. 75/76). Recurso de apelação do autor (fls. 82/86) pugnando pela reforma do julgado. Aduz, em síntese, que: a) a Lei Estadual 4.510/2005 e o Decreto 36.992/05 asseguram isenção do pagamento de tarifa nos serviços de transporte intermunicipal e intramunicipal, este sob a administração estadual, para pessoas portadoras de deficiência e para pessoas portadoras de doença crônica de natureza física ou mental, cuja interrupção no tratamento possa acarretar risco de vida; b) o apelante é morador de Manguinhos e trata-se em unidade pública de saúde localizada no bairro da Saúde, utilizando o TRANSPORTE FERROVIÁRIO, para locomover-se ao local do tratamento, cuja administração compete ao Estado do Rio de Janeiro; c) Contrarrazões às fls. 91/96. O Ministério Público junto ao 1º grau limitou-se a analisar a admissibilidade do recurso (fls. 98/99) e a d. Procuradoria de Justiça opina pelo provimento do recurso. Dispõe o art. 4º da Lei Estadual nº 4.510/2005 que: O vale social será emitido em favor das pessoas portadoras de deficiência e 2 - E
das pessoas portadoras de doença crônica de natureza física ou mental que exijam tratamento continuado e cuja interrupção possa acarretar risco de vida, que necessitem, para a sua terapia, do uso dos serviços convencionais de transportes intermunicipais de passageiros, ou intramunicipais sob administração estadual, observadas as definições previstas em lei ou regulamento. Assim, afigura-se incontestável a legitimidade do Estado do Rio de Janeiro para figurar no pólo passivo da demanda. A seguir, passa-se a análise do mérito recursal. Regulamentando aquela lei, o Decreto 37.920 de 05 de julho de 2005 estabelece que é atribuição da Secretaria de Estado de Transportes a emissão da Carteira de Passe Especial aos beneficiários do vale-social, verbatin: Art. 1º Todos os beneficiários de Vale Social receberão uma Carteira de Passe Especial, emitida pela Secretaria de Estado de Transportes, que lhes assegurará os direitos previstos na Lei nº 4.510, de 13/01/2005. Os documentos juntados aos autos comprovam que o autor (apelante) é portador de doença crônica, demandando tratamento médico regular, situação que se amolda às exigências normativas para a concessão do benefício pretendido, em conformidade com o Decreto nº 36.992 de 25 de fevereiro de 2005, que regulamente a Lei nª 4.510/2005. Art. 3.º Aos portadores de doença crônica, de natureza física e/ou mental, que apresentem, comprovadamente, necessidades de deslocamento através de transporte rodoviário intermunicipal, metroviário, ferroviário ou aquaviário sob administração estadual, será concedido o vale social exclusivamente para realização de tratamentos médicos ou medicamentosos, de forma freqüente, continuada e sem interrupção em ambientes hospitalares, bem como para aquisição de medicamentos em órgão público de saúde. Ressalte-se que a Constituição Federal de 1988, ao assegurar a todos o direito à saúde (art. 196 1 ) estabelece para o Estado (lato sensu) de maneira incondicional, o dever de promoção, proteção e recuperação da saúde. Assim, o direito à saúde, amplo e irrestrito, tem amparo no principio constitucional fundamental da dignidade da pessoa humana, sendo dever do ente público zelar pela sua observância. 1 Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação 3 - E
Ressalte-se, como bem asseverou a d. Procuradoria de Justiça (fls. 117) o direito do apelante encontra-se também albergado pela Lei Estadual nº 3.650/2001, em seus arts. 1º e 2º que admite a isenção de tarifa de transporte inclusive ferroviário e municipal, quando a doença crônica possa acarretar agravamento ao estado de saúde do indivíduo. Confira-se: Art. 1º - Fica assegurado aos portadores de doenças crônicas, de natureza física ou mental, e de deficiências, que exijam tratamento continuado e/ou diário, e cuja interrupção possa acarretar risco de vida e/ou agravamento do estado de saúde, bem como dificuldades de locomoção reconhecida, e que necessitem para sua terapia ou tratamento o uso dos serviços de transportes coletivos de passageiros a isenção do pagamento das tarifas, mediante apresentação do PASSE ESPECIAL DE PORTADORES DE DOENÇAS CRÔNICAS E DE DEFICIÊNCIAS. Art. 2º - Para efeito desta Lei consideram-se transportes coletivos de passageiros, o transporte sobre ônibus, trens, metrôs e barcas, no âmbito municipal e intermunicipal. Logo, direito do apelante ao transporte gratuito até o Centro Psiquiátrico do Rio de Janeiro para se submeter ao tratamento de saúde de que necessita tem garantia constitucional e não pode ser restringido. Neste sentido é o entendimento deste E. Tribunal de Justiça: AGRAVO INTERNO. Decisão monocrática que negou seguimento ao recurso e manteve a sentença em sede de reexame necessário. Concessão do Vale Social. Agravado portador de doença crônica, que preenche os requisitos para sua obtenção. Legitimidade do Estado para a concessão do "Vale Social", quer intermunicipal, quer intramunicipal. Decisão correta, que se mantém. DESPROVIMENTO DO RECURSO 0294056-58.2008.8.19.0001 - APELACAO / REEXAME NECESSARIO DES. CELSO FERREIRA FILHO - Julgamento: 17/07/2012 - DECIMA QUINTA CAMARA CIVEL Processual Civil. Agravo de Instrumento. Vale Social. Doença crônica. Lei 4510/05. Benesse que inclui o transporte intermunicipal e o transporte no âmbito interno dos municípios. Tratamento de saúde. Preliminar de ilegitimidade passiva aduzida pela concessionária de transporte público. A legitimidade exclusiva do órgão estatal Secretaria de Estado de Transportes - em conceder tal benefício. Art. 1 do Decreto 37.920/2005 que regulamentou a Lei Estadual 4510/05. Obrigação do Estado em conceder o vale social que advém de mandamentos constitucionais, bem como da preocupação 4 - E
jurídica atual em se conceder eficácia máxima às normas constitucionais. Reforma da decisão recorrida. Precedentes desta E. Corte. Recurso a que se dá parcial provimento, na forma do artigo 557 1º-A do Código de Processo Civil 0022844-90.2010.8.19.0000 - AGRAVO DE INSTRUMENTO - DES. MARILIA DE CASTRO NEVES - Julgamento: 20/08/2010 - DECIMA CAMARA CIVEL (grifo do relator) Por tais fundamentos, voto no sentido de dar provimento ao recurso para julgar procedente o pedido autoral, condenando o Estado do Rio de Janeiro a conceder ao autor, no prazo de 48 h, o vale-social pleiteado, sob pena de multa diária de R$ 100,00, isentando-o, porém, do pagamento das custas e honorários advocatícios. Rio de Janeiro, 18 de junho de 2013. Desembargador ROBERTO DE ABREU E SILVA Relator 5 - E