Casas antigas contam a história de Paranaguá numa viagem pelo turismo arquitetônico Conhecida como cidade portuária do litoral do Paraná, Paranaguá é também o abrigo de um dos mais ricos acervos do patrimônio arquitetônico dos séculos XIX e XX. Acervo que tem atraído um número cada vez maior de visitantes interessados em conhecer um pouco da história da região, contada pelas ruas estreitas de pedras, nas grossas paredes das casas e palecetes de época e também por quem é apaixonado pelo casario à beira do Rio Itiberê. São pelo menos 400 imóveis entre restaurados e em processo de restauração inspirados principalmente na arquitetura luso-brasileira. Casas de amplas janelas e portas, de muitos afrescos e de uma beleza inigualável. Quem confirma é o arquiteto do Departamento de Patrimônio Histórico de Paranaguá Luiz Marcelo Bertoli de Mattos. Especialista em conservação e restauração de monumentos e sítios históricos, ele deixou Curitiba, sua cidade natal, para se dedicar a essa memória viva de Paranaguá e hoje ele mesmo mora em uma casa histórica conhecida como Casa Santo Antônio. Fiz meu curso de especialização em conservação e restauração de monumentos ainda em 1993, conta o arquiteto. E já naquela época o tema tese com que trabalhei foi um programa de recuperação do sítio histórico de Paranaguá. De lá para cá, o trabalho vem sendo desenvolvido numa parceria entre o município, o Estado e o IPHAN (Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional). Estamos desenvolvendo uma série de projetos de revitalização e requalificação urbana dos espaços, inclusive com a concessão de incentivos fiscais para que os proprietários de imóveis particulares também sejam estimulados a restaurar suas casas. A paisagem como recompensa Proprietário do simpático Hostel Continente, o único da cidade, o português Adelino Moreira foi um dos investidores que bem aproveitou o estímulo do programa, usufruindo de descontos no IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano). O hostel funciona onde antes ficava um antigo sobrado em alvenaria de pedra do século XIX que estava praticamente destruído. O restauro foi total, mas hoje os hóspedes internacionais, assim como o próprio Adelino, desfrutam de uma das mais belas paisagens de Paranaguá, à beira do Rio Itiberê, repleta de embarcações que fazem os passeios pela Baía. Fiz o investimento pelo Banco do Brasil, por intermédio do Sebrae que não empresta dinheiro, mas orienta os empresários na busca por financiamentos com as melhores taxas de mercado, lembra. A primeira vez que vim para Paranaguá foi em 1969, mas só fiquei alguns meses. Depois acabei voltando e me apaixonei pela Rua da Praia. Montei um mercadinho onde fiquei 23 anos e em 1993 descobri esse prédio. A restauração foi bastante complexa e demorada, mas hoje, com a bandeira Hostel, tenho um bom fluxo de hóspedes, principalmente estrangeiros. Recebo de alemães a italianos, de japoneses a australianos, mas todos com reservas antecipadas. Na reforma, que levou vários anos, foi mantida toda a fachada original, assim como as amplas janelas em madeira. Patrimônio Preservado Quem anda pelas ruas estreitas e simpáticas de Paranaguá, se surpreende com a quantidade de obras. Mas nem sempre foi assim. Durante um longo tempo, as casas não receberam atenção
até que no final de 1990 foi decretado o tombamento da arquitetura histórica de Paranaguá. O que podemos ver é o melhor da arquitetura luso-brasileira, ou seja, a arquitetura com características portuguesas adequadas à cultura e aos costumes locais, explica Luiz Marcelo Bertoli de Mattos. A cidade toda tem uma arquitetura urbana portuguesa. As ruas são orgânicas, seguindo a topografia local. Por isso, essa malha complicada e ao mesmo tempo tão agradável. Ruas estreitas, com muitas bifurcações, pracinhas, igrejas, mas que nos permitem apreciar todo esse patrimônio. Quem anda por Paranaguá deve andar sem pressa. Isso por que, numa mesma rua, é possível ver casas de diferentes épocas, passando do colonial para o neoclássico, do neoclássico para o eclético e do eclético para o art deco em perfeita harmonia. Cada época arquitetônica conta uma história. Conta os desejos, comportamentos, aspectos econômicos e morais de um período. São como livros de pedra. Por isso, o segredo da restauração está em conhecer os padrões técnico-construtivos da época e a própria história. Mata-fome, Café e Cultura Local Saindo do Hostel Continente e passando por vários outros pequenos hotéis e pousadas instalados em casas e sobrados históricos, numa caminhada agradável, chega-se ao popular Mercado do Café. Como o próprio nome indica, lugar de um bom café, só que muito bem acompanhado. É lá, no mercado, que se pode provar a melhor banana encapada da região ou então o popular mata-fome. E tudo isso em meio a um cenário mais que centenário. O prédio do mercado é um dos bons exemplos da arquitetura eclética. Nós abrimos das 7 às 18 horas, conta Guaracy Maristany, o popular Cica, dono de um dos pontos do mercado. Mas antigamente, os comerciantes abriam às 3 horas da manhã. Isso para atender o pescador que vinha para Paranaguá para vender o seu peixe. Como não tinham geladeira, eles precisavam chegar
cedo e não podiam ficar sem um cafézinho. Talvez, seja naquele tempo que tenha surgido o mata-fome, um dos mais pedidos até hoje. Na verdade, um bolo de fubá com muita erva-doce, coco e uma boa passada de manteiga, que concorre com outras delícias como a própria banana encapada, bolinhos de camarão e de aipim, pastéis fritos na hora e pratos à base de muito peixe, camarão e mariscos. Outra atração do mercado? O fandango, representante mais típico do patrimônio cultural da região. Uma dança sobre tamancos de madeira e ao som de instrumentos artesanais, como a rabeca. Todo o primeiro sábado do mês é armado aqui o tablado para o fandango, explica o Cica. Das nove da noite até as três da manhã, o mercado fica cheio de gente para ver e dançar com os grupos Pé de Ouro, Mestre Basílio, Mestre Romão, Mestre Eugênio e Mandiquera. Até o nosso prefeito vem bater tamanco, garante. E é no intervalo entre uma música e outra que também aparecem as boas histórias de Paranaguá. Uma delas lembrada e recontada por Guaracy. Paranaguá é conhecida como a terra dos apelidos, começa o contador. Todo mundo que vem para cá, volta para casa com um apelido. Pois não é que um curitibano apostou com outro que vinha para cá e saía sem nenhum? Ele veio para Paranaguá e ficou uma semana trancado num quarto do antigo Hotel Palácio. Não saía para nada, que era não pegar apelido. Só olhava, de vez em quando, pela janela. Quando decidiu voltar para Curitiba, desceu e pediu a conta. O recepcionista gritou para um colega: O amigo, veja a conta do Seu Cuco aí prá nós. E aí ficou o apelido do homem na janela: Seu Cuco. Hoje em dia é cada vez maior o número de pessoas que aderem ao chamado turismo arquitetônico,comenta Patrícia Albanez, gestora de projeto de turismo, da Regional Centro Sul do Sebrae/PR. Não há como não se encatar por esse tipo de atrativo turístico que, quando bem preservado, conta toda uma
história da região visitada. No Sebrae, temos um grande interesse por essa área, e procuramos sempre divulgá-la, seja por meio de fotos ou outros materiais. Paranaguá tem se destacado como destino por seu sítio histórico, não apenas o que diz respeito ao casario, mas à própria tradição cultural. O fandango é, não só hoje, mas sempre, uma riqueza própria daquela região, que também precisa ser divulgado e preservado para não ser esquecido. Serviço: Hostel Continente Adelino Moreira (41) 3423-3224 Mercado do Café Guaracy Maristany (41) 3424-9354 e (41) 9204-5330 Departamento de Patrimônio Histórico de Paranaguá (41) 3420-2959 Adelino Moreira Hostel Continente (41) 3423-3224 Luiz Marcelo Bertoli de Mattos Arquiteto do Departamento de Patrimônio Histórico de Paranaguá (41) 9959-6496 e 3420-2959 Guaracy Maristany, Cica (41) 3424-9354 e (41) 9204-5330 Sebrae/PR Unidade de Marketing e Comunicação Leandro Donatti 3330-5895 Por dentro dos estilos arquitetônicos da Paranaguá Histórica Algumas ruas que não podem deixar de serem visitadas: Rua General Carneiro ou Rua da Praia, como é conhecida Rua XV Rua Conselheiro Sinimbú Estilos: Colonial Construção sem muitos ornamentos, datadas dos séculos XVIII e XIX, antes da chegada de D. João VI ao Brasil. Período em que se forçava para que o Brasil permanecesse com características de colônia. Neoclássico Prédios com detalhes e colunas, arquitetura ampla, que chegam juntamente com D. João VI. Eclético Representa a total mistura de estilos. É o período do rebuscamento total. Perdura do final do século XIX até a
segunda década do século XX. Reúne afrescos, relevos, arcos e vários outros elementos. Taipa de pilão Em Paranaguá, ainda é possível encontrar casas nesse estilo. A estrutura é de barro socado em pilão e pau a pique bambus secos e troncos secos, cozidos para dar maior resistência.