Material Teórico DIREITO DO IDOSO. Aula 4. Crimes Contra o Idoso. Conteudista Responsável: Profª Marlene Lessa. cod IdosoCDS1110_a04



Documentos relacionados
Crimes do Estatuto do Idoso /03 Prof. Marcelo Daemon

AULA EMERJ ESTATUTO DO IDOSO PROFESSORA CRISTIANE DUPRET

FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL. ART. 230 CF. EXPRESSÃO DE AÇÃO AFIRMATIVA.

LEI Nº , DE 1º DE OUTUBRO DE 2003.

O ESTATUTO DO IDOSO AMPLIOU O CONCEITO DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO?

1.5 Abrigo em entidade Abrigo temporário Competência para aplicação das medidas de proteção...165

Estatuto do Idoso: Lei nº , de 1º de outubro de Título I Disposições Preliminares.

DIREITO PENAL IV TÍTULO VI - CAPÍTULO II DOS CRIMES SEXUAIS CONTRA O VULNERÁVEL. Prof. Hélio Ramos

QUAIS SÃO OS DIREITOS DAS PESSOAS COM EPIDERMÓLISE BOLHOSA? Inclusão escolar, social e no trabalho

NOÇÕES GERAIS DE PARTE GERAL DO CP E CPP ESSENCIAIS PARA O ENTENDIMENTO DA LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL

RESPONSABILIDADE PROFISSIONAL

PÓS GRADUAÇÃO PENAL E PROCESSO PENAL Legislação e Prática. Professor: Rodrigo J. Capobianco

Legislação Penal Especial Lei de Tortura Liana Ximenes

PROJETO DE LEI N.º 62/XIII

CRIMES CONTRA A PESSOA

DA RESPONSABILIDADE CIVIL E PENAL DE ESCOTISTAS E DIRIGENTES INSTITUCIONAIS

Art Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime: Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa.

CRIMES CONTRA A HONRA. (continuação)

Direito Penal. Art. 130 e Seguintes

VIOLÊNCIA CONTRA a pessoa IDOSa

PÓS GRADUAÇÃO PENAL E PROCESSO PENAL Legislação e Prática aula 1. Professor: Rodrigo J. Capobianco

07/09/2012 DIREITO PENAL III. Direito penal III

BuscaLegis.ccj.ufsc.br. Injúria racial. Gilbran Queiroz de Vasconcelos. 1. Considerações iniciais

MATÉRIA: LEI Nº 8.429/92 PROFESSOR: EDGARD ANTONIO NÍVEL SUPERIOR

Direito Penal. Penas privativas de liberdade. Dosimetria da pena privativa de liberdade Noções gerais. Prof.ª Maria Cristina

Concurso Público de Provas para ingresso na carreira de ESCRIVÃO DE POLÍCIA EP-1/2010

A EQUIPE DO DIREITO CONCENTRADO ESTÁ COM VOCÊ!

1. Questões Prova - Escrivão PC PR

DECRETO-LEI Nº 2.848/1940 CÓDIGO PENAL

CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO (continuação)

LEI Nº , DE 7 DE AGOSTO DE 2009


Direito Penal. Lei de crimes hediondos. Parte 1. Prof.ª Maria Cristina

Presidência da República Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos

VIOLÊNCIA SEXUAL E TIPOS PENAIS QUADRO-RESUMO ABUSO SEXUAL NO CÓDIGO PENAL - CP

O idoso e a violência doméstica no Brasil: punição aos agressores, uma questão de justiça social

ART. 136 MAUS-TRATOS expor tipo misto alternativo crime de forma vinculada a) Privação de alimentos ou cuidados indispensáveis

PROVA DE LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA

I mprobidade Administrativa

MINISTÉRIO DA JUSTIÇA GABINETE DO MINISTRO. PORTARIA n, de 08 de fevereiro de 2007

Direito Penal. Roubo e Extorsão

Altera dispositivos do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 Código Penal, em especial do seu Título VI. O Congresso Nacional decreta:

DIREITO ELEITORAL. Crimes Eleitorais Parte 2. Prof. Karina Jaques

Lição 2. Periclitação da Vida e da Saúde

Crimes contra o Patrimônio Receptação

BuscaLegis.ccj.ufsc.br

Crimes Contra a Família

07/09/2012 DIREITO PENAL IV. Direito penal IV

LEI BRASILEIRA DA INCLUSÃO (Estatuto da Pessoa com Deficiência) (Lei nº /2015)

Direito Penal. Crimes Contra a Família. Professor Joerberth Nunes.

Crimes Contra a Família

Direito Penal. Lei de crimes hediondos. Parte 2. Prof.ª Maria Cristina

EXCLUSÃO DE ATO DOLOSO E OS CUSTOS DE DEFESA NO D&O

Direito Penal. Extorsão e Extorsão Mediante Sequestro

1.8.3 Consumação e tentativa, Sujeitos ativo e passivo, Causas de aumento de pena, Crime de menor potencial ofensivo, 209

Direito Penal Material de Apoio Professor Antonio Pequeno.

CRIMES CONTRA A LIBERDADE INDIVIDUAL

CEM CADERNO DE EXERCÍCIOS MASTER. Processo Penal. Período:

TEMA: Aumento das Penas e Crime Hediondo para Corrupção de Altos Valores (arts. 5º, 3º e 7º do PL) MEDIDA 3 (Versão 05/11/16 às 10:40)

PARTE ESPECIAL crimes contra a pessoa integridade corporal

Sugestão apresentada pela Comissão Especial da ANPR. Inserção de uma parágrafo segundo no artigo 108 para incluir o seguinte dispositivo:

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PROCURADORIA REGIONAL ELEITORAL NO RIO GRANDE DO SUL

COMISSÃO DE SEGURANÇA PÚBLICA E DE COMBATE AO CRIME ORGANIZADO. Projeto de Lei da Câmara nº 3131/2008 (Projeto de Lei do Senado nº 88/2007)

CÂMARA DOS DEPUTADOS COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO E JUSTIÇA E DE CIDADANIA

LENOCÍNIO E TRÁFICO DE PESSOAS

TRÍADE: MENOR, IDOSO E MULHER. ANÁLISE CRÍTICA DOS ESTATUTOS DE PROTEÇÃO AOS HIPOSSUFICIENTES

Legislação Penal Crimes ambientais Crimes de preconceito Terrorismo Tortura

Direito Penal. Ação Penal Pública no crime de lesão corporal. Prof.ª Maria Cristina

DIREITO PENAL. Crimes decorrentes de preconceito de raça ou cor. Lei nº 7.716/1989. Parte 2. Prof.ª Maria Cristina.

CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL

Aspectos jurídicos da Violência intra e extra familiar contra crianças. as e adolescentes INSTITUTO WCF LAÇOS DA REDE

PROVA OBJETIVA DA POLÍCIA FEDERAL DELEGADO DE POLÍCIA QUESTÕES DE DIREITO PENAL QUESTÃO 58

LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL

Presidência da República Subchefia para Assuntos Jurídicos

DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

AULA 2 16/02/11 DOS CRIMES CONTRA A PESSOA

LEIS PENAIS ESPECIAIS

Direito Penal. Homicídio

O Princípio do Non Bis In Idem no Âmbito do Processo Administrativo Sancionador

PROJETO DE LEI N.º 7.352, DE 2014 (Do Sr. Assis Melo)

Bianca, Brenda, Cleison, Débora, Peterson, Rafael

Crimes Contra a Administração Pública

Direitos e Garantias do Idoso

A Reforma do Código Penal Brasileiro ACRIERGS 2012

ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA

Ponto 9 do plano de ensino

Legislação Penal ECA E. do Desarmamento E. Idoso E. do Torcedor

Estatuto do Idoso. Título I - Disposições Preliminares

TJ - SP Direito Penal Dos Crimes Praticados Por Funcionários Públicos Emerson Castelo Branco

CRIMES CONTRA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA (PARTE II).

stj LUCIANA LIMA DO AMARAL LARA DA TUTELA DO IDOSO NO DIREITO PENAL BRASILEIRO

Juizados Especiais. Aula 13 ( ) Vinicius Pedrosa Santos (magistrado e professor) vinipedrosa@uol.com.br.

Transcrição:

Material Teórico DIREITO DO IDOSO Aula 4 Crimes Contra o Idoso Conteudista Responsável: Profª Marlene Lessa cod IdosoCDS1110_a04 1

Introdução Nossa aula tratará do Direito do Idoso na esfera do crime. Conheceremos algumas condutas que, praticadas contra os idosos, são tão graves que autorizam a incidência de responsabilidade na órbita penal, muito embora a doutrina aponte que a intenção do legislador era trabalhar mais com o fato de inibir condutas contra o idoso, do que impor penas muitíssimo severas aos infratores. A doutrina da proteção integral modificou tipos penais constantes do Código Penal para alcançar especificamente o idoso, ademais, criou figuras inexistentes e os expressou no Estatuto (o que chamamos de novatio legis - nova lei - incriminadora). Esta implementação de tipos penais autônomos fecha o conjunto de pilares do microssistema de proteção ao maior de 60 anos. A tutela da vida, integridade corporal, saúde, liberdade, honra, imagem e patrimônio do idoso são a razão da delimitação dos tipos penais que estudaremos a seguir. Lembrando que o art. 95 do Estatuto determina que os crimes ali definidos são de ação penal pública incondicionada e, portanto, não são aplicáveis as regras do Código Penal (nos arts. 181 e 182 1 ) para os tipos incriminadores que ali são realizados contra o idoso. Outro fator a ser destacado é a questão da agravante genérica. Por força do próprio Código Penal, quando o idoso é vítima de crime e este fato não caracteriza imputação de maior pena, há incidência da agravante: Art. 61 - São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime: II ter o agente cometido o crime: h) contra criança, maior de 60 (sessenta) anos, enfermo ou mulher grávida; Vamos então aos tipos incriminadores do Estatuto do Idoso... 1 DISPOSIÇÕES GERAIS CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO Art. 181 - É isento de pena quem comete qualquer dos crimes previstos neste título, em prejuízo: I - do cônjuge, na constância da sociedade conjugal; II - de ascendente ou descendente, seja o parentesco legítimo ou ilegítimo, seja civil ou natural. Art. 182 - Somente se procede mediante representação, se o crime previsto neste título é cometido em prejuízo: I - do cônjuge desquitado ou judicialmente separado; II - de irmão, legítimo ou ilegítimo; III - de tio ou sobrinho, com quem o agente coabita. 2

Discriminação por Motivo de Idade Art. 96. Discriminar pessoa idosa, impedindo ou dificultando seu acesso a operações bancárias, aos meios de transporte, ao direito de contratar ou por qualquer outro meio ou instrumento necessário ao exercício da cidadania, por motivo de idade: Pena reclusão de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa. 1 o. Na mesma pena incorre quem desdenhar, humilhar, menosprezar ou discriminar pessoa idosa, por qualquer motivo. 2 o. A pena será aumentada de 1/3 (um terço) se a vítima se encontrar sob os cuidados ou responsabilidade do agente. O objeto jurídico (a proteção da lei) é a tutela dos direitos da pessoa idosa, no particular aspecto da proteção à sua liberdade individual (art 10, 1º), necessária ao exercício da cidadania. O sujeito ativo (infrator) é qualquer pessoa, mas para ser sujeito passivo (vítima) é exigida a qualidade de idoso (idade igual ou superior a 60 anos). O tipo objetivo delimita a conduta de discriminar, impedir, dificultar. Nas palavras de Eduardo Medeiros Cavalcanti 2 : partindo de sua natureza pejorativa, discriminar evidencia a diferença, a distinção, a separação. A conduta (de discriminar, de impedir, de dificultar) deve ser realizada com fatores efetivamente relacionados, porém exemplificativos: a operações bancárias aos meios de transporte ao direito de contratar ao exercício da cidadania As figuras de desdenhar, humilhar e menosprezar, o idoso, por qualquer motivo, são equiparadas, ou seja, o agente responderá pelas mesmas penas do art. 96 caput. Um elemento normativo, ou seja, um fator que exige interpretação, está presente no tipo penal: discriminação por motivo de idade. Então a caracterização do crime depende da configuração da intenção do agente em prejudicar ou agir contra o idoso, por sua condição de ser mais velho, enfim, pela idade. A consumação se dá com a efetiva discriminação, pela prática das condutas típicas, sendo aumentada a pena se o agente é quem cuida ou se responsabiliza pelo idoso. 2 Pinheiro, Naide Maria. Estatuto do Idoso Comentado. Op. Cit. p. 532. 3

Omissão de Socorro a Idoso Art. 97. Deixar de prestar assistência ao idoso, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, em situação de iminente perigo, ou recusar, retardar ou dificultar sua assistência à saúde, sem justa causa, ou não pedir, nesses casos, o socorro de autoridade pública: Pena detenção de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa. Parágrafo único. A pena é aumentada de metade, se da omissão resulta lesão corporal de natureza grave, e triplicada, se resulta a morte. O objeto jurídico (a proteção da lei) é preservar a incolumidade do idoso, quando possível, nos mesmos moldes da tutela no crime de omissão de socorro usual. Visa exigir solidariedade de quem pode presta-la. O sujeito ativo (infrator) é qualquer pessoa, mas para ser sujeito passivo (vítima) é exigida a qualidade de idoso (idade igual ou superior a 60 anos). O tipo objetivo delimita 3 formas de conduta omissiva (abstenção): Deixar de prestar, recusar ou não pedir assistência ao idoso. As ações comissivas são: retardar ou dificultar sua assistência. O crime pode levar à lesão corporal ou morte do idoso se a omissão foi causada pelo agente (ex. agente machucou o idoso) ou se ele tinha o dever jurídico de atender o idoso (ex. enfermeiro, médico, etc). 4

Abandono de Idoso Art. 98. Abandonar o idoso em hospitais, casas de saúde, entidades de longa permanência, ou congêneres, ou não prover suas necessidades básicas, quando obrigado por lei ou mandado: Pena detenção de 6 (seis) meses a 3 (três) anos e multa. O objeto jurídico (a proteção da lei) é também preservar vida ou a saúde de pessoa idosa, impedindo o desamparo e o desprezo dos mais experientes. O sujeito ativo (infrator) é qualquer pessoa, mas para ser sujeito passivo (vítima) é exigida a qualidade de idoso (idade igual ou superior a 60 anos). O tipo objetivo delimita a conduta omissiva (abstenção): Deixar de prover as necessidades básicas do idoso e a conduta comissiva implica abandono, repudio, ou desamparo. O crime exige que o local seja hospital, casa de saúde ou tipo congênere, já que se o idoso for colocado na rua ou em locais ainda mais devassados, poderá ser tipificado outro crime. 5

Maus-Tratos a Idoso Art. 99. Expor a perigo a integridade e a saúde, física ou psíquica, do idoso, submetendo-o a condições desumanas ou degradantes ou privando-o de alimentos e cuidados indispensáveis, quando obrigado a fazê-lo, ou sujeitando-o a trabalho excessivo ou inadequado: Pena detenção de 2 (dois) meses a 1 (um) ano e multa. 1º Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave: Pena reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos. 2º Se resulta a morte: Pena reclusão de 4 (quatro) a 12 (doze) anos. Temos as mesmas observações, nos maus tratos a idoso, quanto ao objeto jurídico, sujeito ativo e passivo, dos demais crimes comentados. Mas, neste artigo, a conduta é expor a perigo, periclitar, colocar em risco o idoso. O crime ocorre pela submissão do idoso a condições degradantes, mediante a privação de alimentos e cuidados indispensáveis para manutenção de sua vida. A sujeição a trabalho excessivo ou inadequado também se insere no tipo penal. Para o crime de maus tratos se costuma dizer que a consumação ocorre com a mera exposição do sujeito passivo ao perigo de dano, mas outras figuras podem aparecer. São elas condutas qualificadas pelo resultado: se dos maus tratos resulta lesão corporal de natureza grave ou morte. 6

Outros Crimes Art. 100. Constitui crime punível com reclusão de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa: I obstar o acesso de alguém a qualquer cargo público por motivo de idade; II negar a alguém, por motivo de idade, emprego ou trabalho; III recusar, retardar ou dificultar atendimento ou deixar de prestar assistência à saúde, sem justa causa, a pessoa idosa; IV deixar de cumprir, retardar ou frustrar, sem justo motivo, a execução de ordem judicial expedida na ação civil a que alude esta Lei; V recusar, retardar ou omitir dados técnicos indispensáveis à propositura da ação civil objeto desta Lei, quando requisitados pelo Ministério Público. O tipo penal descreve várias possibilidades de alguém oferecer limitação ao direito do idoso e, por isso, o legislador busca punir com pena de 6 meses a 1 ano, o infrator que embaraça a efetivação destes direitos. Quem responde ao crime do art. 100 do Estatuto pode se valer de transação penal ou qualquer outro acordo efetivado nos juizados especiais, pelo menor potencial ofensivo retratado no artigo. No art. 101, a pena aplicada é cabível ao agente que pratica dolosamente estas condutas: Art. 101. Deixar de cumprir, retardar ou frustrar, sem justo motivo, a execução de ordem judicial expedida nas ações em que for parte ou interveniente o idoso: Pena detenção de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa. A ordem retratada no artigo é judicial, proveniente de Magistrado ou de Tribunal, seja em ação civil, penal, etc., nos mais diversos procedimentos existentes. A doutrina explicita que os verbos aqui tratados como crimes envolvem o deixar de cumprir, ou seja, desobedecer ou não realizar a determinação judicial. Retardar é demorar, adiar, atrasar a realização do que ordenado judicialmente. Frustrar é impedir que aconteça, não propiciar o resultado esperado (Comentado, Estatuto do Idoso, op. Cit. p. 575). 7

Quando se trata de procedimento fiscalizatório cujo titular é o Ministério Público ou outra autoridade, o Estatuto dedica um artigo ao crime envolvido: Disposições Finais e Transitórias Art. 109. Impedir ou embaraçar ato do representante do Ministério Público ou de qualquer outro agente fiscalizador: Pena reclusão de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa. Outro crime que possui muito destaque, pela ousadia com que é cometido, está tipificado no art. 102 do Estatuto: Art. 102. Apropriar-se de ou desviar bens, proventos, pensão ou qualquer outro rendimento do idoso, dando-lhes aplicação diversa da de sua finalidade: Pena reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos e multa. Verifica-se no tipo penal que a pena é mais grave, uma vez que aqui a conduta do criminoso está voltada para o patrimônio do idoso e seu sustento. A intenção, por meio de ação ou de omissão do agente, é modificar a propriedade e a posse dos valores destinados ao idoso, fazendo com que a vítima não tenha condições de utilizar os recursos a que tem direito. Este crime pode ser cumulado com outros previstos no Código Penal. Neste caso o Ministério Público ofertará a denúncia com base nos dados fáticos que a situação apresentar. Ligado ao patrimônio do idoso, há outro crime que pode ser estudado em paralelo com o tipo penal anterior estamos tratando do art. 104 do Estatuto: Art. 104. Reter o cartão magnético de conta bancária relativa a benefícios, proventos ou pensão do idoso, bem como qualquer outro documento com objetivo de assegurar recebimento ou ressarcimento de dívida: Pena detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos e multa. Quando o idoso possui compromissos financeiros a serem pagos, pode ocorrer a situação de um interessado ficar em poder do cartão bancário ou outro documento do idoso. Este fato é corriqueiro e leva a saques forçados, apropriação de dinheiro, uso indevido, coação, entre outras condutas praticadas contra o maior de sessenta anos. O crime é simplesmente reter o cartão ou documento. A intenção é ter acesso ao valor destinado ao idoso, razão pela qual o Ministério Público é o guardião deste tipo de ação penal. 8

Outro crime que visa atingir o patrimônio do idoso e também a sua integridade física está previsto no Estatuto, art. 103: Art. 103. Negar o acolhimento ou a permanência do idoso, como abrigado, por recusa deste em outorgar procuração à entidade de atendimento: Pena detenção de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa. No caso em tela, o abrigo do idoso em entidade de assistência é recusado porque se pretende ter acesso aos bens e patrimônio do maior de sessenta anos, por concessão de uma procuração ao dirigente ou responsável pela unidade. Assim, o sujeito ativo, neste crime, é o responsável pelo estabelecimento. O crime se caracteriza com a simples omissão: negar o acolhimento ou com a ação de: negar a permanência do idoso. Basta a simples negativa, no ato omissivo ou comissivo, para a consumação se operar. Outros delitos interligados a este estão nos artigos 106, 107 e 108 do Estatuto: Art. 106. Induzir pessoa idosa sem discernimento de seus atos a outorgar procuração para fins de administração de bens ou deles dispor livremente: Pena reclusão de 2 (dois) a 4 (quatro) anos. Art. 107. Coagir, de qualquer modo, o idoso a doar, contratar, testar ou outorgar procuração: Pena reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos. Art. 108. Lavrar ato notarial que envolva pessoa idosa sem discernimento de seus atos, sem a devida representação legal: Pena reclusão de 2 (dois) a 4 (quatro) anos. Todos estes crimes envolvem a conduta de fazer com que o idoso seja forçado a abrir mão da administração de seu patrimônio para pessoas interessadas em transferir a titularidade dos bens do maior de sessenta anos. Nos crimes tratados, o abuso é claro, uma vez que a possibilidade do idoso gerir seus atos é afastada ilegalmente. 9

Depreciação Injuriosa Art. 105. Exibir ou veicular, por qualquer meio de comunicação, informações ou imagens depreciativas ou injuriosas à pessoa do idoso: Pena detenção de 1 (um) a 3 (três) anos e multa. O crime de depreciação injuriosa visa combater desgastes sobre a imagem do idoso, coibindo condutas que atentem contra a dignidade e respeito para com os maiores de sessenta anos. Mesmo que tais práticas sejam veiculadas através de propaganda. Veja um caso prático que ocorreu em 2005: Em 10 de janeiro de 2005 SENHOR PRESIDENTE (da Instituição de Auto-Regulamentação Publicitária) Na oportunidade em que cumprimento Vossa Excelência, levo a seu conhecimento que, por força de representação ofertada pela Excelentíssima Deputada Federal Zulaiê Cobra Ribeiro, instaurou-se perante este Gaepi - Grupo de Atuação Especial de Proteção ao Idoso, o Protocolado suso referenciado, tendo em vista propaganda televisiva de produto da Cervejaria Primo Schincariol. Da análise do conteúdo da aludida propaganda, nota-se claramente que seu conteúdo desrespeita os mais comezinhos direitos dos cidadãos, sobretudo dos idosos, na exata medida em que aparecem em franca situação secundária em relação aos demais participantes da matéria, revelando situação de menosprezo, de inferioridade, de humilhação, ordem depreciativa aos cidadãos da terceira idade. A hipótese se confronta com principio constitucional dos direitos e garantias fundamentais (*), bem como de regra geral do Estatuto do Idoso (**), além de configuradores, em tese, de tipos penais previstos no Código de Defesa do Consumidor (***) e Estatuto do Idoso (****). Dessa forma, e considerando o elevado senso de justiça norteador dessa Egrégia Instituição de Auto-Regulamentação, no azo solicita-se a Vossa Excelência sejam tomadas IMEDIATAS providências tendentes à suspensão da precitada propaganda, restabelecendo-se o direito dos idosos quanto ao respeito de sua dignidade, sem prejuízo da tomada de medidas legais cabíveis. Aproveito a oportunidade para apresentar a Vossa Excelência protestos de elevada estima e distinta consideração. EDSON ALVES COSTA 120º. Promotor de Justiça Criminal, integrante do Gaepi Grupo de Atuação Especial de Proteção ao Idoso (São Paulo). 10

Código Penal Em virtude do Estatuto do Idoso algumas modificações acerca de tipificações em crimes foram introduzidas no Código Penal. Vamos apenas cita-las para melhor compreensão do alcance da lei de proteção do idoso, posto que os artigos já estão vigentes desde 2003: Homicídio matar alguém: Art. 121. 4º - No homicídio culposo, a pena é aumentada de 1/3 (um terço), se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, ou se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as conseqüências do seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante. Sendo doloso o homicídio, a pena é aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (quatorze) ou maior de 60 (sessenta) anos. Abandono de incapaz Art. 133. Abandonar pessoa que está sob seu cuidado, guarda, vigilância ou autoridade, e, por qualquer motivo, incapaz de defender-se dos riscos resultantes do abandono: Pena - detenção, de seis meses a três anos. Aumento de pena 3º - As penas cominadas neste artigo aumentam-se de um terço: III se a vítima é maior de 60 (sessenta) anos. Injúria Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro: Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa. 3 o Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência: Pena - reclusão de um a três anos e multa. Sequestro e cárcere privado Art. 148 - Privar alguém de sua liberdade, mediante sequestro ou cárcere privado: Pena - reclusão, de um a três anos. 1º - A pena é de reclusão, de dois a cinco anos: I - se a vítima é ascendente, descendente, cônjuge ou companheiro do agente ou maior de 60 (sessenta) anos; II - se o crime é praticado mediante internação da vítima em casa de saúde ou hospital. Extorsão mediante sequestro Art. 159 - Seqüestrar pessoa com o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem, como condição ou preço do resgate: Pena - reclusão, de oito a quinze anos. 1 o Se o sequestro dura mais de 24 (vinte e quatro) horas, se o seqüestrado é menor de 18 (dezoito) ou maior de 60 (sessenta) anos, ou se o crime é cometido por bando ou quadrilha. Pena - reclusão, de doze a vinte anos. Abandono material Art. 244. Deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do cônjuge, ou de filho menor de 18 (dezoito) anos ou inapto para o trabalho, ou de ascendente inválido ou maior de 60 (sessenta) anos, não lhes proporcionando os recursos necessários ou faltando ao pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada; deixar, sem justa causa, de socorrer descendente ou ascendente, gravemente enfermo: Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos e multa, de uma a dez vezes o maior salário mínimo vigente no País. 11

Legislação Especial O amparo ao idoso na órbita criminal também se amplia para outras leis. A Lei das Contravenções Penais (Decreto-Lei no 3.688, de 3 de outubro de 1941) foi modificada na seguinte infração: Vias de Fato - Art. 21. Praticar vias de fato contra alguem: Pena prisão simples, de quinze dias a três meses, ou multa, de cem mil réis a um conto de réis, se o fato não constitue crime. Parágrafo único. Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) até a metade se a vítima é maior de 60 (sessenta) anos. Outra lei importantíssima é a Lei de Tortura (Lei no 9.455, de 7 de abril de 1997), que também concede atenção especial ao idoso: Tortura Art. 1º Constitui crime de tortura: I constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental: a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa; b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa;c) em razão de discriminação racial ou religiosa;ii - submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo.pena - reclusão, de dois a oito anos. 1º Na mesma pena incorre quem submete pessoa presa ou sujeita a medida de segurança a sofrimento físico ou mental, por intermédio da prática de ato não previsto em lei ou não resultante de medida legal. 4º Aumenta-se a pena de um sexto até um terço: II se o crime é cometido contra criança, gestante, portador de deficiência, adolescente ou maior de 60 (sessenta) anos.... Assim, finalizamos a questão do idoso e a legislação que lhe concede amparo específico. 12