1 Introdução. EA072 Prof. Fernando J. Von Zuben DCA/FEEC/Unicamp. Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 1



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Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) Aspectos Funcionais e Organizacionais Baseado em Notas de Aula da disciplina de pós-graduação IA353 Redes Neurais (FEEC/Unicamp) 1 Introdução... 2 2 O Sistema Nervoso... 3 2.1 Níveis de Organização no Sistema Nervoso... 8 2.1.1 Neurônios e Sinapses... 9 2.1.2 Redes, Camadas e Mapas... 22 2.2 Base Biológica e Física da Aprendizagem e Memória... 29 3 Referência bibliográfica... 31 Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 1 1 Introdução como o cérebro processa informações? Como ele é organizado? Quais são os mecanismos envolvidos no funcionamento cerebral? essas são apenas algumas das perguntas mais desafiadoras para a ciência. o cérebro é especialista em desempenhar funções como reconhecimento de padrões, controle motor, percepção, inferência, intuição, adivinhações, etc. Entretanto, o cérebro também é preconceituoso, lento, impreciso, realiza generalizações incorretas e, acima de tudo, é geralmente incapaz de explicar suas próprias ações (embora este seja um requisito cultural e não funcional). os neurônios são considerados como as unidades básicas de processamento do cérebro. de modo análogo, modelos simplificados dos neurônios biológicos constituem as unidades básicas de processamento das redes neurais artificiais (RNAs). Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 2

os neurônios biológicos estão conectados uns aos outros através de conexões sinápticas. Acredita-se que a capacidade das sinapses serem moduladas é a principal base para todos os processos cognitivos, como percepção, raciocínio e memória. sendo assim, algumas informações adicionais sobre neurônios, sinapses e organização estrutural são importantes para o projeto de RNAs. 2 O Sistema Nervoso todos os organismos multicelulares possuem algum tipo de sistema nervoso, cuja complexidade e organização varia de acordo com o tipo de animal. mesmo os vermes, lesmas e insetos são capazes de adaptar seu comportamento e armazenar informações em seus sistemas nervosos. o sistema nervoso é responsável por dotar o organismo, através de entradas sensoriais, de informações sobre o estado dos ambientes externo e interno. Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 3 a informação de entrada é processada, comparada com o conhecimento já adquirido e transformada em ações apropriadas e/ou absorvidas sob a forma de novo conhecimento. Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 4

Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 5 Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 6

anatomicamente, o sistema nervoso possui duas divisões principais: sistema nervoso central (encéfalo, medula espinhal e meninges) e sistema nervoso periférico (as demais partes constituintes e que estão fora do crânio e da coluna vertebral). encéfalo: cérebro, cerebelo e bulbo. o sistema nervoso central é protegido por caixas ósseas e capas, ou membranas, chamadas de meninges. As meninges são membranas, que juntas formam uma boa proteção para o sistema nervoso central. Na verdade são 3 as membranas que protegem o sistema nervoso central: a externa, que fica em contato com os ossos da caixa óssea se chama dura-máter, a intermediária é a aracnóide e a interior, que fica em contato com os órgãos mais delicados, é a pia-máter. É importante ressaltar que entre a aracnóide e a pia-máter corre o líquido cefalorraquidiano, o líquor. Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 7 2.1 Níveis de Organização no Sistema Nervoso os níveis de organização do sistema nervoso são geralmente definidos de forma empírica. sendo assim, apenas algumas estruturas particularmente interessantes ao estudo das RNAs serão discutidas aqui. o sistema nervoso pode ser organizado em diferentes níveis: moléculas, sinapses, neurônios, camadas, mapas e sistemas. uma estrutura facilmente identificável no sistema nervoso é o neurônio, o qual realiza processamento de sinais. dependendo das condições de operação, os neurônios são capazes de gerar um sinal, mais especificamente um potencial elétrico, que é utilizado para transmitir informação a outras células. Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 8

h N etwork of neurons N euron Brain Synapse 2.1.1 Neurônios e Sinapses os neurônios utilizam uma variedade de mecanismos bioquímicos para o processamento e transmissão de informação, incluindo os canais iônicos. Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 9 os canais iônicos permitem um fluxo contínuo de entrada e saída de correntes (elétricas), a liberação de neurotransmissores e a geração e propagação de potenciais de ação. o processo de transmissão de sinais entre neurônios é fundamental para a capacidade de processamento de informação do cérebro. uma das descobertas mais relevantes em neurociência foi a de que a efetividade da transmissão de sinais pode ser modulada, permitindo que o cérebro se adapte a diferentes situações. a plasticidade sináptica, ou seja, a capacidade das sinapses sofrerem modificações, é o ingrediente chave para o aprendizado da maioria das RNAs. os neurônios podem receber e enviar sinais de/para vários outros neurônios. os neurônios que enviam sinais, chamados de neurônios pré-sinápticos ou enviadores, fazem contato com os neurônios receptores ou pós-sinápticos em regiões especializadas, denominadas de sinapses. Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 10

Dendrites Synaptic clefts Axon Axon hillock M ielin sheath Cell body (som a) a sinapse é, portanto, a junção entre o axônio de um neurônio pré-sináptico e o dendrito ou corpo celular de um neurônio pós-sináptico (ver figura acima). a capacidade de processamento de informação das sinapses permite que elas alterem o estado de um neurônio pós-sináptico, eventualmente gerando um pulso elétrico, denominado potencial de ação, no neurônio pós-sináptico. Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 11 logo, um neurônio pode ser visto como um dispositivo capaz de receber estímulos (de entrada) de diversos outros neurônios e propagar sua única saída, função dos estímulos recebidos e do estado interno, a vários outros neurônios. existem diversos mecanismos envolvidos na transmissão de informação (sinais) entre neurônios. Como os neurônios são células encapsuladas por membranas, pequenas aberturas nessas membranas (canais) permitem a transferência de informação entre eles. os mecanismos básicos de processamento de informação são baseados no movimento de átomos carregados, ou íons: os neurônios habitam um ambiente líquido contendo uma certa concentração de íons, que podem entrar ou sair do neurônio através dos canais. um neurônio é capaz de alterar o potencial elétrico de outros neurônios, denominado de potencial de membrana, que é dado pela diferença do potencial elétrico dentro e fora do neurônio. Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 12

quando um potencial de ação chega ao final do axônio, ele promove a liberação de neurotransmissores (substâncias químicas) na fenda sináptica, os quais se difundem e se ligam a receptores no neurônio pós-sináptico. esta ligação entre neurotransmissores e receptores conduz à abertura dos canais iônicos, permitindo a entrada de íons na célula. A diferença de potencial resultante apresenta a forma de um pulso elétrico. estes pulsos elétricos se propagam pelo neurônio pós-sináptico até o corpo celular, onde são integrados. A ativação do neurônio pós-sináptico irá se dar apenas no caso do efeito resultante destes pulsos elétricos integrados ultrapassar um dado limiar (threshold). alguns neurotransmissores possuem a capacidade de ativar um neurônio enquanto outros possuem a capacidade de inibir a ativação do neurônio, levando este neurônio pós-sináptico a um estado de repouso. Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 13 a sinapse é uma fenda entre os terminais pré-sináptico e pós-sináptico, medindo ~20 nm. Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 14

Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 15 Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 16

neurotransmissores putativos: serotonina, endorfina, dopamina, etc. Ao todo, são mais de 30 compostos orgânicos. o mal de Parkinson, por exemplo, é atribuído a uma deficiência de dopamina. Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 17 Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 18

a ativação de um neurônio é também denominada de spiking, firing, ou disparo de um potencial de ação (triggering of an action potential). Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 19 passos envolvidos no estabelecimento e extinção do potencial de ação: 1. em uma célula em repouso, a parte externa da membrana é mais positiva que a parte interna, havendo mais íons de potássio dentro da célula e mais íons de sódio fora da célula. 2. pela ação dos neurotransmissores na sinapse, íons de sódio se movem para dentro da célula, causando uma diferença de potencial denominada potencial de ação. Com esta entrada de íons de sódio, o interior da célula passa a ser mais positivo que o exterior. 3. em seguida, íons de potássio fluem para fora da célula, restaurando a condição de interior mais negativo que exterior. 4. com as bombas de sódio-potássio, é restaurada finalmente a condição de maior concentração de íons de potássio dentro da célula e maior concentração de íons de sódio fora da célula. segue-se um período refratário, durante o qual a membrana não pode ser estimulada, evitando assim a retropropagação do estímulo. Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 20

bombas de sódio e potássio: os íons sódio que haviam entrado no neurônio durante a despolarização, são rebombeados para fora do neurônio mediante o funcionamento das bombas de sódio e potássio, que exigem gasto de energia. para cada molécula de ATP empregada no bombeamento, 3 íons de sódio são bombeados para fora e dois íons de potássio são bombeados para dentro da célula. Esta etapa ocorre após a faixa azul da figura anterior. Neurônio periférico Neurônio do córtex Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 21 2.1.2 Redes, Camadas e Mapas os neurônios podem ter conexões de sentido positivo (feedforward) e/ou de sentido negativo (feedback) com outros neurônios, ou seja, as conexões podem ter um único sentido ou podem existir conexões nos dois sentidos (de propagação direta e de retropropagação). diversos neurônios interconectados geram uma estrutura em rede conhecida como rede neural. por exemplo, em um milímetro cúbico de tecido do córtex, existem aproximadamente 10 5 neurônios e 10 9 sinapses. um agrupamento de neurônios interconectados pode exibir comportamentos complexos e uma capacidade de processamento de informação que não pode ser predita observando-se cada neurônio individualmente. características marcantes das redes neurais são a representação distribuída de informação e seu processamento paralelo. Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 22

redes neurais com arquiteturas específicas são incorporadas em estruturas maiores capazes de realizar tarefas ainda mais complexas. muitas áreas do cérebro apresentam uma organização laminar de neurônios. Lâminas são camadas de neurônios em contato com outras camadas. um dos arranjos mais comuns de neurônios é uma estrutura bi-dimensional em camadas. O exemplo mais conhecido deste tipo de estrutura é o córtex humano. em geral os neurônios do córtex estão organizados em camadas distintas, que são sub-divididas em camada de entrada, camadas intermediárias ou escondidas e camada de saída. a camada de entrada recebe os sinais sensoriais ou de entrada, a camada de saída envia sinais para outras partes do cérebro e as camadas intermediárias recebem (enviam) sinais de (para) outras camadas do córtex. Isso significa que as camadas intermediárias nem recebem entradas diretamente e nem produzem saída do tipo motora, por exemplo. Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 23 o córtex corresponde à superfície externa do cérebro: uma estrutura bidimensional com vários dobramentos, fissuras e elevações. diferentes partes do córtex possuem diferentes funções (ver figura abaixo). Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 24

Reconstrução computadorizada da destruição do cérebro de Phineas Gage por uma barra de ferro no ano de 1848. Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 25 um princípio organizacional importante em vários sistemas sensoriais e motores é o mapa topográfico. por exemplo, neurônios em áreas visuais do córtex estão arranjados topograficamente, no sentido de que neurônios adjacentes possuem campos de recepção visual adjacentes e, coletivamente, eles constituem um mapa da retina. Obs: como neurônios vizinhos se ocupam de representações similares, mapas topográficos constituem uma forma parcimoniosa de organização do cérebro (há economia de conexões, por exemplo). a organização estrutural em redes, mapas topográficos e camadas são todos casos especiais de um princípio mais geral: a exploração das propriedades estruturais e espaço-temporais para o processamento e armazenagem de informação. Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 26

ouvindo palavras lendo palavras falando palavras pensando em palavras Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 27 Presença de vias de comunicação no cérebro Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 28

2.2 Base Biológica e Física da Aprendizagem e Memória o sistema nervoso está continuamente sofrendo modificações e atualizações. Virtualmente todas as suas funções, incluindo percepção, controle motor, regulação térmica e raciocínio, são modificadas por estímulos. observações comportamentais permitiram verificar graus de plasticidade do sistema nervoso: existem mudanças rápidas e superficiais, mudanças lentas e profundas, e mudanças mais permanentes (porém, ainda modificáveis). em geral, efeitos globais são resultantes de alterações locais nos neurônios. existem diversas formas de modificação em uma rede neural: dendritos podem ser criados, assim como podem ser eliminados; alguns dendritos e o axônio podem se esticar ou ser encolhidos permitindo ou evitando, respectivamente, a conexão com outras células; novas sinapses podem ser criadas ou sofrerem alterações; sinapses também podem ser removidas; todo neurônio pode sofrer regeneração ou pode morrer; novos neurônios podem ser gerados e incorporados ao sistema nervoso. Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 29 toda esta vasta gama de adaptações estruturais pode ser convenientemente condensada simplesmente referindo-se às sinapses, pois estas modificações envolvem a modulação sináptica de forma direta ou indireta. Sendo assim, a aprendizagem via modulação sináptica é o mecanismo mais importante para as redes neurais, sejam elas biológicas ou artificiais. a modulação sináptica poderá depender de mecanismos de adaptação de neurônios individuais e de redes neurais como um todo. assim como a aprendizagem, a memória também é resultado de um processo adaptativo das sinapses. Ela é causada por variações da eficiência sináptica de alguns neurônios como resultado da atividade neural. essas alterações resultam em caminhos novos ou facilitados de desenvolvimento e transmissão de sinais através dos circuitos neurais. Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 30

na verdade, um dos resultados de um processo de aprendizagem é a criação de um padrão de conexões sinápticas específico como resposta aos estímulos recebidos de uma determinada experiência sensorial. note, portanto, que a diferença entre aprendizagem e memória é sutil: a aprendizagem pode ser vista como o processo adaptativo que resulta em uma mudança da eficiência e estrutura sináptica, enquanto a memória pode ser interpretada como o resultado desse processo adaptativo. 3 Referência bibliográfica Arbib, M.A. (ed.) The Handbook of Brain Theory and Neural Networks, The MIT Press, 1998. Dayan, P., Abbot, L.F. Theoretical Neuroscience: Computational and Mathematical Modeling of Neural Systems, The MIT Press, 2001. Wilson, R.A., Keil, F.C. (eds.) The MIT Encyclopedia of the Cognitive Sciences, The MIT Press, 2001. Tópico 1.1: Introdução às Redes Neurais Artificiais (Parte II) 31