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1 Introdução Smear layer é o nome dado ao material depositado nas paredes dentinárias, toda vez que a dentina é cortada por brocas ou limas endodônticas (Figura 1). A dentina humana é, estruturalmente, formada por túbulos e composta, aproximadamente, por 70% de material inorgânico (principalmente a hidroxiapatita), 10% de água e 20% de material orgânico (principalmente o colágeno). As características do smear layer formado durante o tratamento endodôntico vão depender de diversos fatores, como: a anatomia do canal radicular, os tipos de instrumentos utilizados no tratamento, o estado da polpa, a presença de contaminação microbiana e os produtos químicos utilizados para facilitar o debridamento (Cohen & Burns, 2000). De acordo com Mader et al. (1984), o smear layer encontrado na superfície das paredes dentinárias do canal radicular, apresenta aproximadamente 1-2 µm de espessura e pode penetrar até 40 µm para o interior dos túbulos dentinários. Essencialmente, o smear layer é uma camada de material lamacento, de estrutura não homogênea, fracamente aderido às paredes do canal radicular, composto de partículas orgânicas e inorgânicas, proteínas coaguladas, tecido pulpar, saliva, células sangüíneas e, em canais infectados, bactérias e fungos (Gulabivala et al. 2005). A B Figura 1: Imagens de dentina humana através de microscopia eletrônica de varredura. A) túbulos dentinários; B) túbulos dentinários cobertos pelo smear layer.

17 Moss et al. (2001) realizaram uma pesquisa com o objetivo de descobrir qual a conduta da comunidade endodôntica dos Estados Unidos em relação ao smear layer. Eles observaram que a maior parte dos estudantes de odontologia e de endodontia não realiza habitualmente a remoção do smear layer, apesar da maioria dos professores universitários indicarem esse procedimento antes da obturação do canal radicular. Esse estudo demonstra a controvérsia existente na endodontia sobre esse tema. Desde que McComb & Smith (1975) observaram, pela primeira vez, o smear layer nas paredes do canal radicular, surgiram duas correntes na endodontia com opiniões controversas sobre o assunto. Uma corrente defende a permanência do smear layer recobrindo a superfície das paredes dentinárias antes do procedimento de obturação do canal radicular. Esses profissionais se apoiam em estudos como o de (Michelich et al., 1980), que afirma que essa camada atua como uma barreira física para bactérias e seus subprodutos, dificultando a penetração desses agentes infecciosos na dentina. A outra corrente defende a remoção do smear layer principalmente para evitar a ocorrência da microinfiltração, ou seja, a recontaminação do canal radicular após a obturação, causada pela invasão microbiana nos espaços existentes entre as paredes dentinárias e o material obturador (Mader et al., 1984; White et al., 1984; Sen et al., 1995). A microinfiltração pode ocorrer por motivos biológicos ou técnicos que envolvem o tratamento endodôntico. A tridimensionalidade do canal radicular é uma questão crítica para o sucesso do tratamento, e levou Schilder a introduzir há aproximadamente 30 anos, dois conceitos indissociáveis que são a base da terapia endodôntica bem sucedida: limpeza e modelagem e obturação tridimensional (Schilder, 1967). Limpeza e modelagem tem como objetivo obter um sistema de canais radiculares totalmente limpo, livre de restos orgânicos e inorgânicos, e preparado adequadamente para receber a obturação. Geralmente, o primeiro objetivo não é alcançado devido à complexidade do sistema de canais radiculares, que pode apresentar istmos, deltas apicais e canais laterais, impedindo o contato direto das substâncias químicas com o material contaminado. Assim, a obturação tridimensional visa selar, dentro desse sistema, quaisquer irritantes que não possam ser removidos durante os procedimentos de limpeza e modelagem, além de eliminar todas as possíveis vias de infiltração. Torabinejad et al. (2002) analisaram as implicações clínicas do smear layer, e salientaram a importância de

18 sua remoção baseada em diversas investigações que comprovaram a influência desses aspectos citados no sucesso do tratamento endodôntico. Biologicamente, a permanência do smear layer nas paredes dentinárias, além de abrigar bactérias viáveis, serve como fonte de substrato para que elas entrem em atividade e proliferem (Byström & Sundqvist, 1981; Akpata & Blechman, 1982; Williams & Goldman, 1985; Meryon et al., 1986). Tecnicamente, essa camada pode representar uma barreira intermediária, impedindo o íntimo contato entre as paredes dentinárias e o material de obturação, interferindo na adesão e na penetração dos cimentos endodônticos nos túbulos dentinários. Além disso, a infiltração da obturação pode ocasionar a dissolução do smear layer e/ou sua desintegração por ação de enzimas bacterianas. Esses fatores, sozinhos ou combinados, podem resultar nos vazios da obturação responsáveis pela microinfiltração, ocasionando a contaminação da superfície dentinária e, conseqüentemente, o fracasso do tratamento endodôntico (Mader et al., 1984; Sen et al., 1995; De-Deus et al., 2002; Zhender, 2006). Outra questão de controvérsia relacionada ao smear layer é o modo pelo qual ele deve ser removido, já que diversos métodos, como utilização de substâncias quelantes, ultra-som e laser, e diferentes protocolos têm sido sugeridos. Na mesma pesquisa citada anteriormente, Moss et al. (2001) também observaram a contradição existente entre os profissionais que responderam positivamente à questão da remoção do smear layer. Porém, dentre os procedimentos utilizados, a aplicação do EDTA, uma substância quelante, foi o método de escolha da maioria. As substâncias quelantes são ácidos fracos, capazes de capturar íons metálicos. Foram introduzidas na medicina como antídoto para o gás venenoso de arsênico durante a I Guerra Mundial (1914). Os quelantes tornam o íon metálico muito menos reativo quimicamente, produzindo um complexo que é solúvel em água, permitindo assim, que o íon entre na corrente sangüínea e seja excretado sem causar danos ao organismo (Patrick, 2006). No canal radicular, quando inicialmente o quelante é introduzido, uma pequena solubilização de fosfato de cálcio, um componente mineral da dentina, pode ser observada (Hülsmann et al., 2003). Os íons cálcio são então incorporados às moléculas do quelante formando complexos estáveis. A reação química continua até a saturação da solução quelante, que interrompe o processo (Lopes & Siqueira 1999). Assim, os agentes

19 quelantes foram introduzidos na endodontia com o objetivo de ajudar a preparação de canais radiculares estreitos e calcificados e remover o smear layer (McComb & Smith, 1975; Hülsmann et al., 2003; Gulabivala et al. 2005). Após a II Guerra Mundial, a medicina se confrontou com um grande número de marinheiros incapacitados ao trabalho pelo envenenamento com a tinta utilizada para repintar os cascos dos navios de guerra. Foi nessa época que o ácido etileno-diamino-tetracético (EDTA) foi introduzido para o tratamento desses profissionais contaminados (Hülsmann et al., 2003). Hahn & Reygadas (1951) foram os primeiros a relatar a desmineralização em tecidos dentais duros pelo EDTA. Entretanto foi Nygaard-Øtsby (1957), que introduziu o uso dos agentes quelantes na Endodontia. Ele observou que a aplicação do EDTA causava uma zona desmineralizada em amostras de dentina radicular que atingia até 50 µm após 24-48 horas de exposição. A partir desse estudo diversas investigações científicas foram realizadas com objetivo de compreender melhor o mecanismo de ação do EDTA, avaliar o efeito de diferentes concentrações e associações na remoção do smear layer e na desmineralização dentinária (Patterson, 1963; Lewinstein & Grajower, 1981; Lopes & Siqueira, 1999; Verdelis et al., 1999; Kawasaki et al., 1999; Coli et al., 1999; Hülsmann et al., 2002; Hülsmann et al., 2003; O Conell et al., 2000; Serper & Çalt, 2002; Perez & Rouqueyrol-Pourcel, 2005). Além do EDTA e suas associações, outros ácidos e substâncias têm sido propostos sugerindo melhor capacidade de remoção do smear layer e menos danos à matriz dentinária (Loel, 1975; Kaufman et al., 1978; Çalt & Serper, 2000; Cruz-Filho et al., 2001; Torabinejad et al., 2003). A primeira observação do smear layer nas paredes dentinárias do canal radicular foi realizada por McComb & Smith (1975). Essa análise só foi possível devido a utilização da microscopia eletrônica de varredura, pois o smear layer é uma camada muito fina, solúvel em ácido e se solubiliza durante o processamento histológico para análise em microscopia óptica por luz transmitida. O Microscópio Eletrônico de Varredura tradicional (MEV) é um equipamento versátil, que permite a obtenção de informação estrutural e química das amostras. A interação de um feixe de elétrons com a amostra, gera partículas e radiação que podem ser usadas para formar uma imagem ampliada em até 10 5 vezes. Outra propriedade importante do MEV é a profundidade de foco, que permite a observação de amostras com alterações de relevo na superfície. Apenas

20 para efeito comparativo, um excelente microscópio óptico (utilizando um aumento de 1000X), apresentará uma profundidade de campo da ordem de 0,25 µm, ou seja, entre 27 e 160 menor do que o MEV pode alcançar (Goldstein, 1984). Dessa forma, a grande maioria dos estudos utiliza a microscopia eletrônica de varredura para observar as paredes dentinárias do canal radicular, pois além de um exame detalhado da microestrutura do smear layer e da dentina, é possível obter uma visão com perspectiva tridimensional, evidenciando o relevo. Os estudos presentes na literatura, que avaliam a qualidade de limpeza do sistema de canais radiculares através do MEV, demonstram resultados conflitantes, o que abre precedentes para algumas críticas. Primeiramente, alterações na superfície dentinária podem ser causadas pela utilização do alto vácuo no MEV e pelo recobrimento da amostra com material condutor (metalização) necessário para a interação com o feixe de elétrons emitido pelo microscópio. O segundo aspecto está relacionado ao caráter subjetivo da seleção de regiões da dentina para a análise. A metalização da amostra não permite a sua observação antes e após o ataque ácido. Como a dentina e o smear layer podem apresentar diferentes composições e características em um mesmo dente, e até mesmo em regiões muito próximas, fica a critério do operador a eleição da região que julgar mais adequada. Isso impede a observação do verdadeiro efeito da substância quelante em uma determinada região da dentina. Outro aspecto importante é a ausência da quantificação dos resultados, pois as análises são realizadas, geralmente, por scores. O sistema de scores é uma classificação por observadores calibrados, qualificando as imagens capturadas no MEV em relação à presença ou ausência de debris, smear layer e orifícios de túbulos dentinários expostos. Esse sistema pode apresentar 3, 4, 5 ou até 7 níveis de classificação dependendo do estudo. O sistema de scores impede uma comparação real entre os estudos, além de depender da avaliação subjetiva dos observadores, que mesmo sendo calibrados, podem apresentar opiniões diferentes de uma mesma imagem (Gulabivala et al. 2005). Até hoje, o tempo ideal de ataque ácido da dentina para a remoção do smear layer permanece desconhecido. Zehnder (2006), em uma extensa revisão de literatura sobre as substâncias irrigantes do canal radicular, sugere um protocolo de irrigação, porém não indica o tempo que as substâncias quelantes devem permanecer no canal. De acordo com Goldberg & Spielberg (1982), o melhor

21 efeito do EDTA só pode ser observado após 15 minutos de aplicação na dentina. Contudo, McComb & Smith (1975) afirmaram que esse quelante deveria ser deixado no canal por 14 horas. Eldarrat et al. (2004) relataram que a remoção do smear layer ainda é uma observação clínica subjetiva e sugeriram a utilização de espectroscopia para observação da capacidade de remoção do smear layer. Assim, atualmente, não existe um consenso sobre os efeitos de cada substância, seus respectivos tempos de aplicação e a forma de interrupção do ataque ácido da dentina com o objetivo de remover o smear layer. O estudo de De-Deus (2004) analisou quantitativamente os efeitos de substâncias quelantes (ácido cítrico 10%, EDTA e EDTAC) na dentina. A avaliação da microdureza dentinária revelou maior capacidade do EDTA para a desmineralização dentinária, e o ácido cítrico a menor. Outra técnica utilizada foi a microscopia de ponta de prova, na qual, através de um microscópio de força atômica (AFM), imagens do ataque ácido in situ são capturadas. A análise dessas imagens, ao contrário da microdureza, demonstraram efeitos agressivos do ácido cítrico na superfície dentinária e maior capacidade de desmineralização em relação ao EDTA. Outro procedimento importante utilizado nesse mesmo estudo foi o Processamento e Análise Digital de Imagens (PADI). O PADI é realizado através de softwares especializados que realizam operações matemáticas com os pixels das imagens digitais, com o objetivo de melhorar a sua qualidade e extrair as informações quantitativas de interesse. Assim, medições complicadas podem ser realizadas com alta precisão e rapidez, o que representa um grande progresso nas análises quantitativas de imagens microscópicas. Contudo, as imagens obtidas pelo AFM apresentaram algumas distorções que dificultaram esse tipo de análise. Na última década, o desenvolvimento de hardware e software para computação tem contribuído para as grandes mudanças observadas na caracterização microestrutural de materiais. A Microscopia Digital é a integração entre um microscópio e um computador para captura digital de imagens, automação do microscópio e processamento e análise de digital de imagens. Em um caso particular dessa técnica, chamado de microscopia co-localizada, uma coleção de imagens de uma amostra é obtida em um grande número de posições nos eixos x-y, em diferentes tempos experimentais. No intervalo de cada tempo experimental a amostra pode ser removida do microscópio para a realização de

22 qualquer tipo de modificação na sua superfície. Assim, as mudanças na amostra podem ser acompanhadas através do tempo para as mesmas posições x,y, fornecendo à avaliação um caráter longitudinal. O presente estudo surgiu com o propósito de utilizar a microscopia digital co-localizada para avaliar o efeito das substâncias quelantes sobre a dentina, tendo em vista a contradição existente na literatura sobre esse tema.