CRIMINOLOGIA CRÍTICA E ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO: breves considerações



Documentos relacionados
Palavras chave: Direito Constitucional. Princípio da dignidade da pessoa humana.

Noções Básicas de Direito para Servidores Públicos: Aspectos Práticos

DÉCIMA SÉTIMA CÂMARA CÍVEL

Soma dos direitos creditórios R$ ,00 Diferencial (ou deságio) (R$ 4.000,00) Ad Valorem (R$ 500,00) IOF (R$ 500,00) Valor líquido R$ 95.

DEVERES DOS AGENTES PÚBLICOS

Projeto de Lei do Senado Federal nº, de 2005

TRATADOS INTERNACIONAIS E SUA INCORPORAÇÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO 1. DIREITOS FUNDAMENTAIS E TRATADOS INTERNACIONAIS

CONTEÚDO PROGRAMÁTICO

Ética Profissional e os Desafios de Concretizar Direitos no Sistema Penal. Marco Antonio da Rocha

BuscaLegis.ccj.ufsc.br

NOÇÕES DE DIREITO CONSTITUCIONAL

A instrumentalidade do Processo Judicial Tributário

BuscaLegis.ccj.ufsc.Br

PARAMETROS DO ESTRITO CUMPRIMENTO DE DEVER LEGAL

VI Seminário de Pós-Graduação em Filosofia da UFSCar 20 a 24 de setembro de 2010

SUSPENSÃO DO PROCESSO NO DIREITO PENAL TRIBUTÁRIO PORTUGUÊS

Interpretação do art. 966 do novo Código Civil

Tema DC - 01 INTRODUÇÃO DO ESTUDO DO DIREITO CONSTITUCIONAL RECORDANDO CONCEITOS

A PROTEÇÃO E OS DIREITOS HUMANOS DO IDOSO E A SUA DIGNIDADE

PONTO 1: Teoria da Tipicidade PONTO 2: Espécies de Tipo PONTO 3: Elementos do Tipo PONTO 4: Dolo PONTO 5: Culpa 1. TEORIA DA TIPICIDADE

JURISPRUDÊNCIA RESUMO: Palavras-Chave: Jurisprudência Direito - Decisões

Vedação de transferência voluntária em ano eleitoral INTRODUÇÃO

COMISSÃO DE RELAÇÕES EXTERIORES E DE DEFESA NACIONAL. MENSAGEM N o 479, DE 2008

ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Classificação da pessoa jurídica quanto à estrutura interna:

A PRISÃO PREVENTIVA E AS SUAS HIPÓTESES PREVISTAS NO ART. 313 DO CPP, CONFORME A LEI Nº , DE 2011.


PENAS ALTERNATIVAS E O DIREITO PENAL MILITAR

As decisões intermédias na jurisprudência constitucional portuguesa

O professor que ensina matemática no 5º ano do Ensino Fundamental e a organização do ensino

A Responsabilidade civil objetiva no Código Civil Brasileiro: Teoria do risco criado, prevista no parágrafo único do artigo 927

Posse e Usucapião Extraordinária

EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS E EDUCAÇÃO ESPECIAL: uma experiência de inclusão

POLÍTICA GERAL PARA PREVENÇÃO A LAVAGEM DE DINHEIRO

EDUCAÇÃO AMBIENTAL E O ESTADO DE DIREITO DO AMBIENTE 1. Domingos Benedetti Rodrigues 2.

ABANDONO INTELECTUAL DE FILHO E A INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS

Direito em Ação, Brasília, v.11, n.1, jul./dez. 2013

PROFESSORES: Selma Santana, Gamil Föppel, Thaís Bandeira e Fábio Roque SEMESTRE DE ESTUDO: 2º Semestre

ECONOMIA SOLIDÁRIA, RENDA DIGNA E EMANCIPAÇÃO SOCIAL 1

PERFIL EMPREENDEDOR DOS APICULTORES DO MUNICIPIO DE PRUDENTÓPOLIS

COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO E JUSTIÇA E DE CIDADANIA PROJETO DE LEI Nº DE (Apensados: PL nº 5.448/01 e PL nº 2.276/07)

RESPONSABILIDADE DOS ATORES POLÍTICOS E PRIVADOS

ASPECTOS DA DESAPROPRIAÇÃO POR NECESSIDADE OU UTILIDADE PÚBLICA E POR INTERESSE SOCIAL.

PROPOSTA DE LEI N.º 151/IX APROVA O REGIME DA RESPONSABILIDADE PENAL DAS PESSOAS COLECTIVAS. Exposição de motivos

Eventos independentes

O SUJEITO EM FOUCAULT

Apostila Exclusiva Direitos Autorais Reservados 1

Parecer nº.: Processo nº.: Interessado: Assunto:

Por que há sonhos dos quais não nos esquecemos?

O Determinismo na Educação hoje Lino de Macedo

BuscaLegis.ccj.ufsc.br

DIREITO TRIBUTÁRIO I: NOÇÕES GERAIS DO DIREITO FINANCEIRO

A ESSÊNCIA DA CAPACIDADE PARA O DIREITO

1. Referencial Teórico a essência da informática para a administração pública

Nº /2015 ASJCRIM/SAJ/PGR Petição n Relator : Ministro Teori Zavascki Nominados : ANTÔNIO PALOCCI

O CRIME E A PENA NO PENSAMENTO DE ÉMILE DURKHEIM Crime and Punishment in thought of Emile Durkheim

A 3ª EDIÇÃO DO FÓRUM DA CIDADANIA

COMISSÃO DE SEGURIDADE SOCIAL E FAMÍLIA PROJETO DE LEI Nº 2.804, DE 2011

Luiz Eduardo de Almeida

TOMADA DE DECISÃO EM SITUAÇÃO DE EXCEÇÃO. particulares a aplicação exata das regras do direito consagrado.

EDITAL CONVOCAÇÃO PARA MATRÍCULA NA PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU DA FACULDADE ASCES CIÊNCIAS HUMANAS, SOCIAIS APLICADAS E ENGENHARIA

Lucro e a sua contabilização, distribuição e responsabilidades

PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA Controladoria-Geral da União Ouvidoria-Geral da União DESPACHO

NORMA PENAL EM BRANCO

Daniela Portugal 1. "Vou-me embora pra Pasárgada Lá sou amigo do rei Lá tenho a mulher que eu quero Na cama que escolherei" (Manoel Bandeira)

PLANO DE AULA OBJETIVOS: Refletir sobre a filosofia existencialista e dar ênfase aos conceitos do filósofo francês Jean Paul Sartre.

Aluno(a): / / Cidade Polo: CPF: Curso: ATIVIDADE AVALIATIVA ÉTICA PROFISSIONAL

Tribunal de Justiça do Distrito Federal

CRIME DOLOSO E CRIME CULPOSO PROFESSOR: LEONARDO DE MORAES

COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS E MINORIAS

L G E ISL S A L ÇÃO O ES E P S EC E IAL 4ª ª-

TEORIAS DA CONDUTA DIREITO PENAL. Cléber Masson + Rogério Sanches + Rogério Greco

Manual do Módulo de Correspondência

Introdução de Sociologia

material dado com autoridade. Com isso, coloca-se, sobretudo, a questão, como essas valorações podem ser fundamentadas racionalmente.

OS CANAIS DE PARTICIPAÇÃO NA GESTÃO DEMOCRÁTICA DO ENSINO PÚBLICO PÓS LDB 9394/96: COLEGIADO ESCOLAR E PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO

1. FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE: PREVISÃO CONSTITUCIONAL

PADRÃO DE RESPOSTA PEÇA PROFISSIONAL

Uma globalização consciente

Lei n.º 22/97 de 27 de Junho

Na data designada, foi aberta audiência inaugural, a reclamada apresentou sua defesa, anexando procuração e documentos. Alçada fixada.

Cartilha do Orçamento Público

Filosofia da natureza, Teoria social e Ambiente Ideia de criação na natureza, Percepção de crise do capitalismo e a Ideologia de sociedade de risco.

PROJETO DE LEI N O, DE (Do Sr. Ivo José) O Congresso Nacional decreta:

Guia Prático para Encontrar o Seu.

CRISTO E SCHOPENHAUER: DO AMAR O PRÓXIMO COMO A TI MESMO À COMPAIXÃO COMO FUNDAMENTO DA MORAL MODERNA

BuscaLegis.ccj.ufsc.Br

Autores importantes PROF. ADRIANO FERREIRA

Princípios Políticos e Pedagógicos que subsidiaram as discussões das capacitações realizadas pelo DET/SEED até a presente data

Torre de Babel. Luis Flavio Sapori. Nota sobre a I Conseg

Teresina, 08 de junho de 2015.

FUNDEP. Pesquisa de Opinião Pública Nacional

A Ação Controlada na Lei de Drogas e na Lei de Organização Criminosa. Um possível conflito de normas.

CONSELHEIRO EDUARDO BITTENCOURT CARVALHO TRIBUNAL PLENO - SESSÃO: 07/10/09 EXAME PRÉVIO DE EDITAL SECÇÃO MUNICIPAL

A Ética no discurso da Comunicação Pública

Consumidor e produtor devem estar

Memorando nº 16/2015-CVM/SEP Rio de Janeiro, 19 de janeiro de 2015.

Conselho da Justiça Federal

Transcrição:

CRIMINOLOGIA CRÍTICA E ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO: breves considerações HEKELSON BITENCOURT VIANA DA COSTA Bacharel em Direito pelo Centro Universitário de Brasília UNICEUB e servidor público federal do Superior Tribunal de Justiça/STJ RESUMO Aponta a evolução histórica da Criminologia e a necessidade de um novo conteúdo conceitual e de objeto dentro da perspectiva de um Estado Democrático de Direito. Ressalta que a criminalidade atual, principalmente a de alta soma, é fruto de incongruências do Estado na prevenção e repressão de crimes e conclui que tal ciência pode ajudar a se ter um sistema penal mais justo e eficaz. PALAVRAS-CHAVES Criminologia; Criminologia crítica; Direito Penal; Estado Democrático de Direito. ABSTRACT It s demonstrates the historical evolution of the Criminology and the need of a new conceptual content and of object inside in the perspective of a Democratic State of Right. Also points out that the current criminality, mainly the one of high adds, it is fruit of incongruities of the State in the prevention and repression of crimes and concludes that such science can help having a fairer and effective penal system.

KEYWORDS state of Right Criminology; Critical criminology; Criminal right; Democratic Sumário: 1. Introdução. 2. Antecedentes históricos. 3. Criminologia Crítica: Objeto e Conteúdo. 4. Estado Democrático de Direito. 5. Conclusão. 6. Notas. 7. Referências bibliográficas 1. INTRODUÇÃO À primeira vista o termo criminologia parece não demonstrar dúvida acerca de seu objetivo, se for, à luz de sua etimologia, realizada uma análise. Assim chegar-se à conclusão de que é a ciência que se ocupa do estudo do crime e de sua gênese. De certo modo está correto! Apenas que a criminologia crítica é uma evolução (como qualquer ciência), que passou por etapas (no caso, Escolas) quais sejam: a Clássica e a Positiva. De maneira introdutória, pode-se dizer que a criminologia estuda tudo o que envolve o Sistema Penal inclusive todas as relações com instituições sociais, nelas compreendidas o Sistema repressivo: polícia e complexo penitenciário e o Sistema Judicial, incluído o parquet. Cremos se fazer necessário antes de se adentrar no título em tela, dar, ao menos em passant, breves considerações a respeito das Escolas que cronologicamente antecederam a criminologia crítica. 2

2. ANTECEDENTES HISTÓRICOS A Escola Clássica viu o crime como um ente jurídico, porque é dado da razão (mera violação de um direito). A responsabilidade penal foi vista como tendo por fundamento a responsabilidade moral derivada do livre arbítrio do agente, em corolário a pena foi concebida na sua finalidade meramente retributiva. Essa escola usou do método dedutivo. Como representantes tivemos Beccaria, Feurebach e Carrara. A Escola Positiva, por seu turno, teve o crime como fato natural, praticado pelo Homem causamente determinado (porque detentor da conduta anti-social e perigosa). A responsabilidade penal fundamentou-se na responsabilidade social o Homem merece a repressão pois vive em sociedade em conseqüência teve a pena como um meio de defesa social. Usou do método cientifico. Um de seus integrantes, Lombroso - outro integrante foi Ferri - chegou a traçar o perfil antropológico (aparência física) como um padrão de tendência para o crime!. Retornando ao ponto em que se asseverou que a Criminologia Crítica estuda tudo que envolve o Sistema Penal, tem se que ela estuda a própria sociedade, na forma que se organiza, como estão as relações de poder, as formas de ascensão de classes, preconceitos, distribuição de renda etc. Razão pela qual se afirma a que sociedade industrial e mesmo a pós-industrial é um ente criminógeno, pois o desenvolvimento econômico feroz desperta, pela cobiça, o aparecimento da criminalidade mais ardilosa e de escol. Todo movimento de vanguarda, seja ideológico, filosófico ou artístico, é oriundo da crise de seus antecessores, e com a Criminologia Crítica não foi diferente. Ora, os modelos das Escolas Clássica e Positiva já não conseguem dar respostas ao crime inovador e ao aumento da violência nas sociedades capitalistas. Aquela por apenas enxergar o crime como fato jurídico, não centrando-se também no delinqüente, é inábil 3

You are reading a preview. Would you like to access the full-text? Access full-text

6. NOTAS 1 In Criminologia Integrada, 1931, RT, pág. 471 a 473 2 Não por acaso, Dahrendof nomeia este fenômeno de sociedade dividida. 3 Teoria de Robert Merton, ou seja, na proporção em que escasseiam-se os meios legítimos para se alcançar o sucesso, instala-se na proporção direta, uma situação de anomia, de crime, de fraude, etc, onde comportamentos ilegais e eticamente negados, tornam-se comuns. Tal teoria distingue os fins culturais, que são as aspirações que a cultura induz ao homem, das normas - lato sensu - ou seja, dos meios legítimos existentes para buscar esses fins culturais. 4 In Sociologia da Corrupção. Rio de Janeiro: Jorge Zahar editor, 1987 5 Esta forma inspirou o Estado Fascista: Totalitário e ditatorial em que os direitos e liberdades humanas ficam praticamente anulados e totalmente submetidos ao arbítrio de um poder político onipotente e incontrolado, no qual toda participação popular é sistematicamente negada em benefício de uma minoria que controla o poder político e econômico. Nada se pode confundir com Estado submetido ao Poder Judiciário. In José Afonso da Silva, 13ª ed. 6 In Do Estado Liberal ao Estado Social. Apud idem. 7 In Estado de Derecho y Sociedad Democratica. Apud idem 8 Este princípio exprime que o Estado Democrático de Direito se funda na legitimidade de uma Constituição rígida, emanada da vontade popular, que, dotada de supremacia, vincule todos os poderes e os atos deles provenientes, com as garantias de atuação livre de regras da jurisdição constitucional. In José Afonso da Silva. Op. Cit. 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARATTA, Alessandro. Criminologia Crítica e Crítica do direito Penal. 2ª ed. Freitas Bastos editora, Rio de Janeiro, 1999. COSTA, Hekelson Bitencourt Viana da. Lavagem de Dinheiro Lei 9613/98. Revista de informação legislativa, v. 38, n. 150, p. 121-143, abr./jun. 2001. OLIVEIRA, Frederico Abrahão de. Manual de Criminologia. Sagra DC Luzatto, Porto Alegre, 1996. FERNANDES, Newton e Válter. Criminologia Integrada. RT, 1931. MORAES FILHO, Antônio Evaristo de; LEITE, Celso Barroso; CARVALHO, Getúlio; PACINI, Mário; JOHNSTON, Michael. Sociologia da corrupção. São Paulo: Jorge Zahar Editor, 1981. 14

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 13ª edição. Malheiros. 15