Georreferenciação direta rigorosa de imagens aéreas com GNSS e técnica de structure from motion



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Transcrição:

Georreferenciação direta rigorosa de imagens aéreas com GNSS e técnica de structure from motion José Alberto GONÇALVES 1, Luísa BASTOS 2 e Wenlin YAN 1 1 Faculdade de Ciências da Universidade do Porto 2 Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental (jagoncal@fc.up.pt; lcbastos@fc.up.pt; ) Palavras-chave: Georreferenciação direta, Orientação externa, GNSS, Modelo Digital de superfície, Ortorretificação Resumo: A georreferenciação rigorosa de imagens aéreas requer normalmente o levantamento preciso de pontos fotogramétricos. A implementação de técnicas simplificadas de georreferenciação direta é de grande interesse na medida em que permite reduzir, ou mesmo eliminar, o trabalho de campo. Este artigo descreve uma metodologia de determinação da atitude de uma câmara colocada numa aeronave equipada com recetor GNSS de dupla frequência. É usada a metodologia structure from motion que, através de pontos conjugados obtidos automaticamente, permite determinar a orientação relativa de fotos consecutivas. Foram efetuados testes num avião ligeiro, com uma câmara disparada através de um sinal PPS dado por um recetor GNSS de dupla frequência. O processamento cinemático dos dados adquiridos por este recetor permite o conhecimento rigoroso da posição da antena, cujas coordenadas podem ser transportadas para a câmara. Os testes descritos incluíram cerca de 1000 imagens adquiridas, parte delas em linhas de voo cruzadas e outras em linhas longas. Concluído o processo de orientação das imagens pelo método descrito, usando o programa Agisoft Photoscan, e sem recorrer a pontos de controlo no terreno, gerou-se um modelo digital de superfície e um mosaico de ortoimagens. Utilizando pontos de verificação levantados no terreno, avaliou-se, respetivamente, o rigor altimétrico e planimétrico desses produtos, tendo-se obtido erros médios quadráticos de cerca de 29 cm em planimetria e de 22 cm em altimetria. O rigor dos ângulos de atitude foi estimado como sendo da ordem do décimo de grau. Esta metodologia tem elevado potencial de aplicação na realização de levantamentos expeditos, utilizando veículos aéreos tripulados ou não tripulados, atendendo à possibilidade de utilização de sensores de baixo custo e fácil instalação. 1

1. Introdução O conceito de georreferenciação direta na fotogrametria tem vindo a ser implementado há mais de duas décadas. Tem como principal objetivo conhecer os parâmetros de orientação externa das imagens através de uma medição direta, que dispense a orientação indireta, isto é, baseada em pontos de controlo. Os métodos utilizados baseiam-se no posicionamento por satélite - GNSS (Global Navigation Satellite System) - integrado com sistemas de navegação inercial (INS, Inertial Navigation System). O processamento integrado das medidas recolhidas por estes dois tipos de instrumentação resulta no conhecimento de posição e atitude do sistema, que estando rigidamente associado à câmara aérea, permite transportar para ela esses parâmetros de orientação externa. De forma a garantir níveis de rigor posicional decimétricos e tendo em conta as velocidades típicas das aeronaves para aquisição de fotografia aérea, a sincronização temporal deverá ser garantida com um rigor da ordem dos milissegundos (Yastikli and Jacobsen, 2005). A principal vantagem do uso das técnicas de georreferenciação direta consiste na possibilidade de obter os produtos essenciais de informação georreferenciada mosaicos de ortoimagens e modelos tridimensionais sem pontos de controlo. A aquisição de pontos de controlo tem custos elevados, atendendo ao tempo necessário para a sua identificação nas imagens e ao trabalho de campo que envolve. Os sistemas comerciais de georreferenciação direta existentes no mercado têm custos relativamente altos e destinam-se a associar a câmaras fotogramétricas convencionais ou outros sensores de deteção remota, como os sistemas de varrimento laser. Tem havido desenvolvimentos no sentido de explorar instrumentação mais simples, como os MEMS (Micro Electro Mechanical Systems), (Ayres-Sampaio et al., 2014), inclusive com aplicações em drones de pequena dimensão (Chiang et al., 2012). Contudo a incorporação de um sistema que combine sistemas GNSS e INS, com sincronização temporal, pode não ser simples para plataformas muito leves. Neste artigo descreve-se uma abordagem em que a avaliação da atitude é conseguida através das imagens adquiridas por uma câmara a bordo na aeronave. Nesta abordagem considera-se a existência de posicionamento GNSS cinemático de elevado rigor, com disparo de imagens controlada pelo próprio recetor através do sinal PPS (pulso por segundo). Desta forma é possível conhecer com grande rigor a posição da antena, e consequentemente do centro de projeção da câmara, ficando assim resolvida a parte posicional da orientação externa das imagens. A componente angular é obtida pela orientação relativa conjunta das sucessivas imagens ao longo das fiadas. As técnicas automáticas de orientação de imagem, baseadas na extração de grande número de pontos homólogos por algoritmos como o SIFT (Scale Invariant Feature Transform), (Lowe, 2004), são atualmente de fácil utilização e encontram-se na generalidade dos programas de processamento de imagens de drones. Esta técnica é frequentemente referida na área da visão computacional como SFM (structure from motion). Consideremos duas fotos adquiridas ao longo de uma fiada, com uma sobreposição de 60%, como é típico da aquisição fotogramétrica. Dado um conjunto de pontos homólogos nas duas fotos, é possível fazer a orientação relativa do par, que consiste na determinação de 5 parâmetros de orientação. Mesmo com o conhecimento das posições rigorosas da câmara (6 parâmetros) não é possível obter completamente a orientação externa, já que permanece um parâmetro livre, do total de 12 das duas fotos. Neste caso isso pode ser interpretado como o grau de liberdade de rotação do modelo estereoscópico em torno do eixo definido pelas duas posições. A existência de uma terceira foto, com posição do centro de perspetiva também conhecida, mas não colinear com as outras duas, permite resolver essa ambiguidade. No caso de uma fiada com posições perfeitamente colineares, mantêm-se a ambiguidade. Normalmente as posições ao longo de uma fiada não serão exatamente colineares, mas o rigor dos ângulos determinados será baixo, em particular do ângulo de rotação em torno da direção de voo (roll). Num voo com fiadas adquiridas em diferentes direções, e preferencialmente com fiadas cruzadas, poderá ser possível obter-se uma solução rigorosa, apenas baseadas nas posições de disparo das fotos. 2. Descrição da metodologia implementada No sentido de testar esta metodologia foi instalada numa pequena aeronave (Figura 1-a) uma câmara AVT Pike. A câmara encontra-se numa caixa, que foi acoplada no apoio da asa direita (Figura 1-b), sobre a qual está também montada uma unidade 2

inercial MEMS XSens Mti, que se destinava a outros estudos, não descritos neste artigo. Esta unidade forneceu no entanto informação de atitude que facilitou o processo de transporte de coordenadas da antena GPS para a câmara. Os dois dispositivos estão ligados por cabos a um sistema de registo de dados colocado no interior da aeronave. Foi também instalado um recetor GNSS de dupla frequência, com antena sobre a fuselagem. Um outro recetor de uma frequência, ligado ao computador de registo de dados da câmara, foi usado para o disparo da câmara nos segundos inteiros. As posições relativas da antena GNSS principal, sensor Xsens e da câmara foram medidas com uma estação total, de forma a que as posições obtidas possam ser transportadas para os outros sensores. (a) Figura 1 Aeronave onde foi montado o equipamento: (a) antena de dupla frequência no topo, (b) caixa com a câmara no apoio da asa direita A câmara dispõe de um sensor de 5 Megapixeis (2452 por 2054), com CCD de 3.45 m, e lente C-Mount com distância focal de 8.3 mm. A esta configuração correspondem coberturas angulares de 54º e 46º, respetivamente na maior e na menor dimensão da imagem. A câmara foi montada com a maior dimensão na direção do voo. (b) O voo foi feito nas proximidades do aeródromo de Espinho, junto à costa, numa extensão de 13 km, como se mostra na figura 2. A altura média de voo foi de 150 m, o que resultou numa resolução no terreno de 6.2 cm. A velocidade média foi de 40 m/s, a que corresponde um espaçamento de 40 m entre disparos consecutivos e uma sobreposição longitudinal de 73%. A figura 3 mostra a cobertura das sucessivas fotos, permitindo concluir que cada ponto será observado em 3 fotos consecutivas, e frequentemente em 4. Ao todo foram obtidas 1530 imagens em voo; contudo, cerca de 500 não puderam ser utilizadas por conterem essencialmente mar ou superfícies de água, como a Barrinha de Esmoriz, na parte sul da zona coberta. A obtenção automática de pontos homólogos requer a existência de padrões comuns entre fotos consecutivas. Foi feito o processamento GNSS cinemático das medidas GNSS da antena de dupla frequência, relativo à estação GNSS de Gaia, da RENEP (Rede Nacional de Estações Permanentes). No estudo feito em paralelo com este, de avaliação da atitude pela integração entre as medidas GNSS/INS, ficaram disponíveis os 3 ângulos de Euler (pitch, roll, heading), que permitiram o transporte de coordenadas para o sensor Xsens, e daí para a câmara AVT Pike (para o ponto estimado como centro de projeção). 3 Figura 2 Representação da linha de voo.

Numa situação em que não existisse o sensor inercial seria necessário dispor de uma aproximação inicial dos ângulos de atitude, que permitiria determinar uma aproximação dos centros de projeção. O processamento fotogramétrico permitiria refinar iterativamente os ângulos de atitude. Figura 3 Cobertura das sucessivas fotos com sobreposição de 73%. O processamento fotogramétrico referido é um ajuste de feixes, que foi efetuado no programa Agisoft Photoscan. Este programa é frequentemente usado no processamento de imagens obtidas com drones. Inicialmente é feita uma operação de determinação de pontos homólogos entre imagens sucessivas, usando algoritmos do tipo do SIFT. Com esses pontos é possível fazer então um ajuste de feixes em que as posições dos centros de projeção, obtidas por GNSS, são fixadas, deixando apenas como incógnitas os ângulos de atitude. Na verdade o procedimento efetuado consiste em atribuir a essas coordenadas um peso muito grande, através de um desvio padrão muito pequeno, da ordem do que seja de esperar no posicionamento cinemático. No caso presente usou-se o valor de 5 cm. O ajuste de feixes pode incorporar também uma auto-calibração da câmara, que neste caso foi necessário, já que não era conhecida uma calibração prévia. Foram considerados correção à distância focal, posição do ponto principal e distorção radial. Do procedimento de ajuste de feixes resultam os ângulos de atitude de todas as fotos, completando assim o processo de orientação externa. No sentido de determinar o rigor destes parâmetros optou-se por avaliar o seu desempenho na continuação do processo de mapeamento. As fases seguintes são a extração de uma nuvem densa de pontos, a geração de um modelo digital de superfície (MDS) na forma de rede de triângulos e finalmente a geração de um mosaico de imagens ortorretificadas. Este pode ser exportado, assim como o MDS, na forma de grelha regular de altitudes. A figura 4 mostra extratos desses dados. (a) (b) Figura 4 Extratos da informação extraída: (a) MDS na forma de relevo sombreado e (b) ortomosaico Estes dados podem ser inseridos num programa de sistema de informação geográfica para confrontar com outros dados e análise do rigor altimétrico e planimétrico. 4

3. Análise de resultados Fez-se o levantamento de 27 pontos de verificação com GNSS, usando um recetor Trimble R6, com posicionamento RTK em relação às estações da RENEP. A precisão estimada no processamento foi sempre melhor que 3 cm, confirmada pela reobservação de alguns pontos. Foram escolhidos pontos em locais bem definidos, planos, com contraste, como esquinas de lancis ou marcas de pintura no pavimento. A maior parte dos pontos encontram-se na parte sul da zona coberta, onde há várias sobreposições da linha de voo. Um número menor de pontos está em partes soltas, isto é, em locais onde a fiada não tem continuidade de ligação. As coordenadas dos pontos foram calculadas no datum ETRS89, na projeção nacional (ETRS89/PT-TM06). Foram medidas coordenadas planimétricas sobre o ortomosaico e foram obtidas altitudes a partir do MDS por interpolação bilinear. Calcularam-se os erros planimétricos, e X, e Y, assim como a respetiva norma, e XY, e os erros altimétricos, e H, de acordo com as seguintes expressões: e e X H X X (1) GPS GPS 2 2 orto, ey YGPS Yorto, exy ex ey H H (2) MDS Observaram-se erros planimétricos em geral bastante inferiores a 1 m, sendo contudo 5 deles maiores que 1 m, como se mostra no gráfico da figura 5, que tem os erros nos 27 pontos por ordem decrescente. Os 5 pontos com erros grandes encontram-se nas partes soltas, onde se terá verificado deriva da orientação. Figura 5 Representação gráfica dos erros planimétricos nos 27 pontos de verificação Optou-se for fazer estatísticas separadas destes erros. O Quadro 1 apresenta os resultados, tendo-se designado por grupos A e B, respetivamente os 5 pontos com erros grandes e os restantes 22 pontos. Calcularam-se a média e a raíz quadrada do erro médio quadrático (REMQ), dado pelas expressão seguintes (3), em que e se refere genericamente aos erros e x, e y, e xy ou e H. REMQ 1 n n i 1 e 2 (3) 5

Quadro 1 Estatísticas dos erros encontrados nos 27 pontos de verificação Grupo Estatística e X (m) e Y (m) e XY (m) e H (m) A (5 pontos) B (22 pontos) Média -0.58-0.62 ---- 0.47 REMQ 0.73 1.10 1.32 0.69 Média 0.00 0.04 ---- -0.05 REMQ 0.17 0.24 0.29 0.22 Os resultados são bastante mais favoráveis no caso do grupo B. Um erro planimétrico de 29 cm corresponde a menos de 5 pixeis na resolução espacial destas imagens. Em termos angulares, esse erro, associado a uma altura de voo de 150 m, traduz-se numa precisão da atitude de cerca de 0,1º. Como de certa forma era esperado, este procedimento funciona melhor quando há sobreposição de imagens adquiridas em diferentes direções. Duma forma geral será o que acontece numa cobertura convencional com fiadas paralelas obtidas em sentidos contrários. Uma sobreposição lateral razoável, de 30 %, ou até superior, dará mais robustez à orientação externa obtida por este processo. 4. Conclusões e trabalho futuro O trabalho descrito permitiu concluir da possibilidade de determinar a atitude de um voo fotogramétrico recorrendo apenas a posicionamento GNSS rigorosamente sincronizado com a aquisição de imagem através do disparo PPS. A principal limitação resultou do facto de só dispormos de fiadas lineares sem sobreposição para além da longitudinal, devendo o processo de aquisição ter isso em conta. Outra grande limitação ocorre quando as imagens não fornecem a possibilidade de obter pontos homólogos, como é o caso das superfícies de água. No caso presente isso aconteceu nas partes de voo sobre o mar e sobre águas interiores e suas envolventes. O maior potencial desta metodologia está na combinação também com medidas inerciais, num processo de integração tripartida, controlando melhor os processos de deriva e tornando a solução final mais robusta. Na componente da imagem podem ser feitos alguns melhoramentos, nomeadamente através de câmaras com maior resolução e também de câmaras com calibração rigorosa previamente conhecida, o que dispensaria o procedimento de auto-calibração no ajuste. O método poderá ser aplicado também com imagens de câmaras fotogramétricas convencionais. Referências Bibliográficas Ayres-Sampaio, D.; Gonçalves, J. A.; Magalhães, A.; Bastos, L. (2014). Evaluating the performance of MEMS-based IMUs for direct georeferencing. Atas da 8ª Assembleia Luso Espanhola de Geodesia e Geofísica. Chiang, K.-W.; Tsai, M.-L.; Chu, C.-H. (2012). The Development of an UAV Borne Direct Georeferenced Photogrammetric Platform for Ground Control Point Free Applications. Sensors, Vol. 12, No. 3, Págs. 9161-9180. Lowe, D. (2004.) Distinctive image features from scale-invariant keypoints. International Journal of Computer Vision, Vol. 60, No. 2, Págs. 91 110. Yastikli, N.; Jacobsen, K. (2005). Direct Sensor Orientation for Large Scale Mapping Potential, Problems, Solutions. The Photogrammetric Record, Vol. 20, No. 111, pp. 274-284. 6