INCLUSÃO DIGITAL NA EJA - AGRICULTURA FAMILIAR: COLETIVIDADE E COOPERAÇÃO NO ESPAÇO-TEMPO DE NOVAS APRENDIZAGENS Leonardo Matheus Pagani Benvenutti 1 ; Lilian Baungratz de Oliveira 2 ; Márcia Adriana Rosmann 3 Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha Câmpus Santo Augusto Introdução No presente trabalho, nos propomos a refletir sobre as possibilidades pedagógicas na Educação de Jovens e Adultos (EJA), no caso específico de agricultores familiares, objetivando traçar diretrizes e rotas para a efetivação da inclusão digital nestes grupos, "entendida como elemento central para o exercício da cidadania" (TEIXEIRA, 2010, p.23). Estes, em grande parte, encontram-se alheados do uso de ferramentas digitais, em especial o ciberespaço, que consideramos ser um meio facilitador da emancipação de indivíduos e da sociedade como um todo. Para embasar nossas afirmações, nos inspiramos em pensadores humanistas, sob a ideia de inclusão digital com o propósito de desenvolvimento humano em contraponto ao capital humano, pois temos a crença de que a condição atual em que se encontram estes grupos de agricultores é de subordinação às pressões do capital. Portanto, um trabalho que não almeja o desenvolvimento humano, cultural e profissional, serve apenas para dar continuidade à estabelecida relação de opressão das classes populares. À luz das teses de Paulo Freire, esperamos desenvolver uma prática onde as pessoas tenham autonomia para pronunciarem suas próprias vozes, saberes e anseios. Freire (2011, p.113) acredita que a desconsideração total pela formação integral do ser humano e sua redução a puro treino fortalecem a maneira autoritária de falar de cima para baixo (grifo do autor), e é com o olhar crítico sobre este treino que objetivamos conduzir nossa práxis, para o devido afastamento de mecanicismos pragmáticos. 1 Acadêmico do Curso de Licenciatura em Computação do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha - Câmpus Santo Augusto. 2 Licenciada em Computação pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha - Câmpus Santo Augusto. 3 Docente do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha - Câmpus Santo Augusto.
O ciberespaço, entendido como novo espaço do conhecimento (Gadotti, 2011, p.23) é uma Tecnologia de Rede (TR), chave no processo de inclusão digital, pois tradicionalmente tem-se a ideia de inclusão como o simples acesso a ferramentas digitais, entretanto, com o desenvolvimento deste novo contexto, podese superar essa definição. No ciberespaço, os indivíduos podem atuar de forma crítica e protagonista de apropriação das TRs e cujo cerne é a vivência de uma cultura de rede (TEIXEIRA, 2010, p. 20). Isto é, as pessoas podem atuar, gerar conhecimentos e interagir nesta experiência que supera os limites territoriais, geográficos (LÉVY, 2011, p.147), onde significante parcela dos agricultores familiares estão engessados. Exemplificando o parágrafo anterior, através do uso crítico das redes de computadores conectadas à internet, acreditamos que os agricultores familiares possam expandir seus horizontes de conhecimento, e para que essa prática se efetive, o papel do professor é de grande relevância. Notamos que, em alguns espaços formais de educação disponibilizados a esta parcela da sociedade, a prática pedagógica não se dá de forma progressista, sendo a questão da cibercultura tratada de forma estratificada, como um conteúdo a aprender de forma descontextualizada e individual. Isto culmina no afastamento desses grupos da cultura de rede apontada por Teixeira (2010), mantendo os indivíduos alienados deste espaço de conhecimento que é considerado fundamental nas sociedades contemporâneas. Gadotti (2011, p. 42) aponta que é necessário formar-se para a cooperação, logo, podemos pensar em algumas possibilidades pedagógicas. Se conseguirmos romper a barreira do individualismo cômodo e territorializado nas disciplinas, poderemos projetar um currículo integrado, incluindo na sua investigação e aplicação todos os atores do processo educativo, como professores, alunos e comunidade local. Para Gadotti (2011, p.43), antes de se perguntar o que deve saber para ensinar, a professora deve se perguntar por que ensinar e como deve ser para ensinar (grifo do autor). Então, tendo a clareza dessas prerrogativas, acreditamos que o aprendizado das técnicas de utilização das ferramentas digitais tem caráter secundário.
Se os indivíduos do processo educativo compreenderem que através do ciberespaço há cidadania, conhecimento, ciência, lazer e colaboração, o aprendizado será prazeroso e, portanto, mais efetivo. Assim, durante o planejamento do ensino de determinadas ferramentas na internet, por que não selecionar coletivamente quais saberes serão trabalhados no laboratório? Por que não problematizar sobre esta seleção? Será possível uma avaliação crítica da atividade? Refletindo coletivamente, confirmamos nossa aposta na dialogicidade do ato pedagógico, como amplamente sustentado por Paulo Freire em sua obra. Ao considerarmos o ensino de Informática aos Jovens e Adultos que buscam uma formação profissional, esbarramos em um currículo formal, no qual precisamos dar conta de determinados conteúdos. Mas, como fazê-lo? Se a gama de conhecimentos dentro da sala de aula é eclética, temos alunos que a pouco concluíram o Ensino Médio e alunos que ficaram décadas sem estudar. Diante dessas demandas, que são distintas, onde os tempos de aprendizagem são diversos, acreditamos em uma organização pedagógica que, muito além de dar conta das mais amplas áreas do conhecimento, permita que possam ser desenvolvidos conteúdos teóricos, os quais posteriormente se articulem com a prática. Esse exercício será possível se partirmos de uma análise da realidade e das vivências apresentadas pelos alunos no que diz respeito às vivências sociais e ao trabalho. Conforme Libâneo (1994, p. 21): Fizemos essas considerações para mostrar que a prática educativa, a vida cotidiana, as relações professor-alunos, os objetivos da educação, o trabalho docente, nossa percepção do aluno estão carregadas de significados sociais que se constituem na dinâmica das relações entre classes, entre raças, entre grupos religiosos, entre homens e mulheres, jovens e adultos. Essa análise parte da compreensão que temos sobre o meio social em que o jovem e o adulto está inserido, a que tipos de tecnologia ele tem acesso, como faz uso delas, ou não o faz. Saber, quando há possibilidade de acesso, porém não se efetiva o uso, os motivos que levam a essa realidade. E no trabalho, quais são as tecnologias utilizadas por esses alunos? Lembrando que tecnologia não se restringe apenas a utensílios eletrônicos/digitais, mas a qualquer instrumento, ferramenta ou aparato que possa fazer com que eles consigam desempenhar suas atividades de forma mais rápida (fazer mais em menos tempo), de forma mais confortável.
Após essa análise, seremos capazes de mensurar o que o aluno veio procurar no(s) curso(s) que frequenta; podemos propiciar meios para que dele encontremos formas para que a teoria e a prática se complementem, e que esse aprendizado seja significativo e duradouro. Caso contrário, se ensinarmos o que é padrão para todos os cursos, corremos o risco de ficarmos ensinando a expectadores que não nos dão atenção por estarmos falando de uma realidade na qual eles não estão inseridos. Por mais que sejam incluídos (no caso digitalmente), ainda assim não será uma inclusão de fato, pois a mesma será momentânea e, quando de seu regresso à atividade cotidiana, acabará esquecida devido à não aplicação nas suas vivências. O que teremos feito será apenas uma inclusão momentânea que não será perdurada, exercitada e difundida entre os seus pares e nas localidades onde residem. O conhecimento está para a vida assim como a vida é constituída pelos conhecimentos e experiências que vamos tecendo ao longo da nossa história. O conhecimento é uma árvore que cresce da vida [...], cujo corpo tem uma precisa filosofia de aprendizagem: ele aprende os saberes que o ajudam a resolver os problemas com que está se defrontando (ALVES, 2001, p. 51-63). Nesse sentido, a escola deve ocupar-se com o desenvolvimento integral dos indivíduos, cuja formação para a cidadania perpassa a formação profissional. Considerações finais Nossa condição de indivíduos sócio históricos, constituídos pela história e igualmente constituidores dela, nos permite o movimento da reciprocidade e da diversidade das relações que estabelecemos e das produções que efetivamos em todos os espaços e tempos por onde e quando frequentamos, dando nossa parcela contribuinte e recebendo dos nossos pares as informações sobre suas experiências. Com isso, vamos permitindo aos alunos da agricultura familiar apropriar-se dos meios tecnológicos de rede, ao tornar significativo para eles os conhecimentos advindos da área da computação, pois o que ele aprende e sabe, faz sentido. Ele sabe o uso dos seus saberes (ALVES, 2001, p. 51-63). Esse processo de ensino e aprendizagem torna-se real quando trabalhamos com objetos do conhecimento que tenham significado para o aluno. Daí a importância de selecionar e, em colaboração com o próprio aluno, elencar e eleger, de acordo com as necessidades profissionais e motivações pessoais, pois o ato de
aprender acontece em resposta a um desejo (ALVES, 2001, p. 51-63). Portanto, precisamos considerar o quê, para quê, porquê e como os objetos de conhecimento devem ser desenvolvidos no decorrer da prática pedagógica em turmas da agricultura familiar. Referências ALVES, RUBEM. A escola com que sempre sonhei sem imaginar que pudesse existir. São Paulo: Papirus, 2001. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 43. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2011. GADOTTI, Moacir. Boniteza de um sonho: ensinar-e-aprender com sentido. 2. ed. São Paulo: Editora e Livraria Instituto Paulo Freire, 2011. LÉVY, Pierre. A inteligência coletiva - por uma antropologia do ciberespaço. 8. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2011. LIBÂNEO, José Carlos. Didática. São Paulo: Cortez, 1994. TEIXEIRA, Adriano Canabarro. Inclusão digital: novas perspectivas para a informática educativa. Ijuí: Unijuí, 2010.