Guthier Nascimento Juan Manuel Lucas de Souza Silva
ÍNDICE 1. Introdução - Contexto ecológico global e local; 2. Localização; 3. Características da região: 3.1 Clima 3.2 Relevo 3.3 Hidrografia 3.4 Solo 3.5 Vegetação 3.6 Fauna 4. Peculiaridades do Bioma; 5. Principais impactos relacionados à ação humana no Bioma; 6. Estado atual do Bioma Campos Sulinos; 7. Medidas remediadoras para conter a ação humana no Bioma Campos Sulinos; 8. Artigo: Diversidade e conservação da fauna dos Campos do Sul do Brasil, Glayson Ariel Bencke
INTRODUÇÃO
Domínios Morfoclimáticos no Brasil: Pradarias, também conhecido como domínio das coxilhas (relevo com suaves ondulações), situa-se no extremo Sul do Brasil, no estado do Rio Grande do Sul. (Aziz Ab' Saber) Domínios Morfoclimáticos no Mundo: FORMAÇÕES HERBÁCEAS Europa e Ásia - Estepe América do Norte - Pradarias África do Sul - Veld América do Sul - Pampas Brasil - Campos Sulinos
Os Campos Sulinos é muitas vezes confundido com os pampas, termo de origem indígena para região plana, na metade sul do Estado do Rio Grande do Sul. No entanto, o termo Campos Sulinos abrange uma região ainda maior, de mais de 200 mil km², no Sul do Brasil, reunindo a paisagem de relevo suavemente ondulado na forma de colinas recoberto por gramíneas de pequeno porte e arbustos (campos da metade sul do Rio Grande do Sul); a vegetação das áreas úmidas do extremo sul, junto ao litoral gaúcho, onde se encontram os banhados (ecossistemas alagados), com uma vegetação que favorece a existência de muitas espécies como capivaras, marrecos, garças, veados e lontras; e os Campos de Cima da Serra, característicos das regiões de maior altitude nos Estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Este último (Campos de Cima da Serra), aparece como enclave de campos em meio à região de domínio da Mata Atlântica, tanto que a delimitação de Campos Sulinos do mapa do Instituto Brasileiro de Geografia a e Estatística (IBGE) corresponde à metade sul e o extremo sul. Várias designações têm sido adotadas para referir-se aos campos do sul do Brasil Campos Subtropicais (Veloso 1966), Campos Gerais e Pampas (Rizzini 1979), Campos Sulinos (MMA 2002, Joly et al. 1999, Marchiori 2004), região das Estepes (IBGE 2004), Campos do Sul do Brasil (IBGE 2004), Campos (Overbeck et al. 2007), dentre outras.
LOCALIZAÇÃO
CARACTERÍSTICAS DA REGIÃO
CLIMA Devido à sua posição geográfica estar cerca do paralelo 30ºS de latitude, um limite virtual para os tipos de vegetação tropical (Cabrera & Willink 1980), e estar no leste da América do Sul, o sul do Brasil ocupa uma região de transição entre os climas tropical e temperado, com verões quentes e invernos frios, sem estação seca. O clima é temperado (Köppen 1948) e úmido, as geadas são freqüentes durante o inverno e a pluviosidade, além de elevada, é relativamente bem distribuída ao longo do ano. Este cenário climático é um dos fatores determinantes da singularidade desta vegetação, quando comparada às outras formações campestres brasileiras.
RELEVO Variações no substrato geológico e na altitude também contribuem para a diversidade de tipos vegetacionais da região (Waechter 2002). O relevo nos Campos Sulinos é suavemente ondulado, aplainado entre 500m e 800m de altitude. Predominam planícies, mas podem ser encontradas algumas colinas, na região conhecidas como coxilhas. Além das coxilhas existem também alguns planaltos. Cavernas e grutas são comuns. A Pedra do Segredo, em Caçapava do Sul, tem 160 metros de altura e três cavernas em seu interior
Pedra do Segredo, em Caçapava do Sul
HIDROGRAFIA Destacam-se como rios importantes deste Bioma o Santa Maria, o Uruguai, o Jacuí, o Ibicuí e o Vacacaí. Estes e outros da região se dividem em três bacias hidrográficas: a do Uruguai, a do Guaíba e a Litorânea. Trata-se de rios que apresentam boas condições para navegação, constituindo verdadeiras hidrovias na região. Próximos ao litoral existem muito lagos e lagoas. A Lagoa dos Patos, localizada no município de São Lourenço do Sul, é a maior laguna do Brasil e a segunda maior da América Latina, com 265 km de comprimento.
Lagoa dos Patos, São Lourenço do Sul
SOLO Na região dos Campos Sulinos o solo é altamente fértil. Por isso, estes campos são normalmente procurados para desenvolvimento de atividades agrícolas. Ainda mais férteis são as áreas com solo do tipo "terra roxa". Em áreas de planalto os solos são também avermelhados, mas não possuem a fertilidade da terra roxa. Na planície litorânea o solo é bastante arenoso.
Terra Roxa
INFLUÊNCIA DA CORDILHEIRA DOS ANDES Uma das principais questões levantadas quando se pensa em planícies e vegetações campestres é "porque tão planas?" No caso dos pampas a explicação se encontra em formações montanhosas que estão em sua volta e influenciam diretamente nas camadas de ar, na precipitação e no clima da região, dificultando o crescimento das suas plantas e fazendo com que o pampa se torne uma enorme "bacia".
VEGETAÇÃO Na atual classificação oficial da vegetação do Brasil (IBGE 2004), os Campos Sulinos correspondem à formação fitoecológica Estepe (Veloso et al. 1991, Leite 2002), embora também possam estar presentes em algum grau na tipologia das Formações Pioneiras. O uso do termo estepe para referir-se aos campos advém de um esforço em adaptar a classificação brasileira a um sistema universal fisionômico-ecológico (Veloso et al. 1991). A expressão Campos Sulinos, portanto, parece ser a mais adequada para designar estas formações campestres, já que resgata uma nomenclatura regional tradicional Campos e, ao mesmo tempo, os circunscreve ao sul do Brasil, diferenciando-os das demais formações campestres brasileiras. Além disso, tem sido adotada por vários autores (e.g. Joly 1999, MMA 2002, Marchiori 2004). A fisionomia de formação aberta, característica dos Campos Sulinos, resulta do predomínio de espécies herbáceas, principalmente gramíneas, e da presença pouco expressiva de árvores ou arbustos.
VEGETAÇÃO De acordo com a maioria das classificações de vegetação, estepe e savana são termos inapropriados para descrever os Campos do sul do Brasil. Estepes são usualmente consideradas campos semi-áridos sob um clima temperado frio, tais como as pradarias (prairies) de gramíneas baixas e altas na América do Norte e os campos da Eurásia, desde a Ucrânia até a Mongólia (Breckle 2002, Bredenkamp et al. 2002, Schultz 2005). Nestas regiões, a baixa precipitação, em geral menor que 250 mm durante a estação quente, restringe o desenvolvimento de vegetação florestal, o que claramente não é o caso no sul do Brasil. Na América do Sul, estepes podem ser encontradas apenas no leste da Patagônia (Schultz 2005). O termo Pampa também parece inadequado, pois ele é usualmente associado com os campos ao sul do Rio da Prata (Soriano et al. 1992). Savanas geralmente são definidas como um tipo de vegetação que possui um misto de formas de vida herbácea e lenhosa, em estratos distintos, que ocorre em regiões tropicais, com precipitação marcadamente sazonal (Walker 2001). No Brasil, o termo savana é aplicável para a vegetação de Cerrado (Oliveira & Marquis 2002); entretanto, quando usado mais livremente (Cerrado lato sensu), o termo Cerrado também inclui os campos tropicais conhecidos como campo limpo e campo sujo (Oliveira-Filho & Ratter 2002). Descrever os Campos do sul do Brasil como savanas e estepes está, por isso, em desacordo com o uso internacional destes termos (veja também Marchiori 2002).
FAUNA E FLORA Com vegetação herbácea entre 10 e 50 cm de altura, os pampas possuem uma paisagem homogênea que se assemelha quando vista de longe a um imenso tapete verde. Estimativas recentes indicam que esta região é composta de pelo menos 3.000 plantas vasculares, com 450 espécies de gramíneas e 150 de leguminosas, além de 385 aves e 90 mamíferos (Nabinger, 2007), sendo parte destas espécies chamadas endêmicas, pois só ocorrem neste ecossistema. É por isto que os campos pampeanos, na sua composição de flora e fauna, podem ser considerados tão importantes quanto uma floresta tropical, para a conservação da biodiversidade planetária. Os pampas é considerado um dos mais ricos ecossistemas quando falamos de biodiversidade de espécies animais. Isso inclui espécies endêmicas desenvolvem-se em áreas muito restritas -, raras, ameaçadas de extinção, migratórias, cinegéticas e de interesse econômico para a região. Como exemplo das espécies ameaçadas de extinção podemos citar a onça-pintada, a jaguatirica, o mico-leão-dourado, o tamanduá, entre muitas outras espécies. Entre os mamíferos, podemos dizer que 39% são endêmicos, assim como a maioria das borboletas, répteis, anfíbios e aves nativas. A grande biodiversidade da região, no entanto, ainda não foi completamente descrita pela ciência.
PECULIARIDADES DO BIOMA As características deste bioma fazem dele um dos mais peculiares e belos do planeta. O clima subtropical frio ajuda a dar o tom brejeiro dos Campos Sulinos. No inverno, as baixas temperaturas podem fazer gear, encobrindo lagos e plantas com gelo. Entre as espécies exóticas que avançam sobre os pampas estão o eucalipto, a acácia-negra e o pínus, de alto valor comercial. O avanço das plantações destas árvores não se dá somente pela mão humana, mas também pela forte capacidade de invasão de ecossistemas, que as espécies de pínus notoriamente apresentam. E o pínus é invasora em potencial, capaz de ocupar o espaço de espécies nativas e produzir alterações nos processos ecológicos naturais.
Floresta de Pínus
PRINCIPAIS IMPACTOS RELACIONADOS À AÇÃO HUMANA NO BIOMA A proteção dos campos tem sido negligenciada no acelerado processo de expansão agrícola que iniciou nos anos 1970 (que continua até o presente), e mais recentemente nos planos para conversão de extensas áreas de campos em monoculturas florestais. O resultado desse processo foi uma brutal conversão de campos em outros usos entre 1970 e 1996, de acordo com o último Censo Agropecuário. A área diminuiu de 14 para 10,5 milhões de hectares nesse período, uma conversão de cerca de 25%. Por outro lado, apenas 0,36% dos ecossistemas campestres estão protegidos em unidades de conservação no Rio Grande do Sul. O problema é semelhante também no Uruguai e Argentina. Não que os campos devessem ser protegidos apenas em unidades de conservação, mas essa baixa proteção dá uma idéia do valor de conservação atribuído aos campos pelo poder público e pela sociedade.
A produção de milho (Zea mays), aumentou de 1,4 para 11,8 milhões de toneladas de 1940 a 1996; A produção de soja aumentou de 1530 toneladas em 1940 para 10,7 milhões de toneladas em 1996; A produção de trigo passou de 95 mil para 1,4 milhão de toneladas durante o mesmo período (censo agrícola de 1996; dados do IBGE); Os aumentos em área ocorreram principalmente às custas dos campos naturais. Os três Estados do sul do Brasil atualmente produzem 60% do arroz no Brasil (sendo 50% apenas no RS), totalizando 6,5 milhões há em área (EMBRAPA, 2005). As queimadas e o uso inadequado do solo na agricultura têm provocado erosão e empobrecimento das terras que fazem parte desse ecossistema.
ESTADO ATUAL DO BIOMA
RELATÓRIO TÉCNICO O mapeamento de remanescentes dos biomas brasileiros foi coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente, no âmbito do PROBIO. Este projeto envolveu não somente um tipo de vegetação, mas todos os remanescentes de vegetação natural. Na região sul do Brasil, o bioma Campos Sulinos foi mapeado sob a coordenação do grupo de pesquisa da UFRGS liderado pelo Prof. Heinrich Hasenack, com término em 2007. Para o mapeamento, foi utilizadas imagens de satélite Landsat, ano base 2002. Foram estabelecidas classes de acordo com o manual de vegetação do IBGE de 1992, o que permitiu a comparação com o mapa de vegetação do projeto RADAMBRASIL (mapeamento da década de 1970). A escala do mapeamento nem sempre permite diferenciar de campos naturais as áreas utilizadas anteriormente para agricultura e que agora encontram-se em uso como pastagens. Umas das principais preocupações no momento é selecionar áreas prioritárias de conservação e nelas estabelecer unidades de conservação.
Um panorama sobre as iniciativas de conservação dos Campos Sulinos Legislação ambiental Unidades de Conservação (UCs) Mapeamento dos Campos Sulinos Monitoramento dos Campos Sulinos Programas de conservação da biodiversidade Mobilização social e institucional Redes de pesquisa, desenvolvimento tecnológico e inovação Uso sustentável dos Campos Sulinos: pecuária, turismo rural e turismo ecológico Zoneamento e licenciamento ambiental
Legislação Ambiental Constituição Estadual e Federal Em termos constitucionais, existe na Constituição do Estado do RS, promulgada em 03.10.89, publicada em 04.10.89 e republicada em 14.12.89, um dispositivo resultante de um Emenda Constitucional de 23.02.2005 que se refere especificamente ao bioma Pampa: Art. 1º Acrescenta inciso ao art. 251 da Constituição do Estado, que será o XVI, com a seguinte redação: Art. 251... XVI valorizar e preservar o Pampa Gaúcho, sua cultura, patrimônio genético, diversidade de fauna e vegetação nativa, garantindo-se a denominação de origem. Outro dispositivo que tem vinculação ao tema da conservação da biodiversidade refere-se à vedação da prática das queimadas: Art. 251... 1... XIII Combater as queimadas, responsabilizando o usuário da terra por suas conseqüências. Na Constituição Federal não há menção específica aos Campos Sulinos, nem tampouco ao bioma Pampa, onde eles correspondem à fisionomia representativa. Porém, tramita no Congresso Nacional uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) no 237/08, proposta pelo deputado Pedro Wilson (PTGO), que inclui o Pampa entre os biomas brasileiros considerados patrimônio nacional. Art. 1º Fica acrescido ao 4º do art.225, da Constituição, que passa a vigorar com a seguinte redação: Art. 225... 4º A Floresta Amazônica, a Mata Atlântica, Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense, o Pampa e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.
Unidades de Conservação (UCs) A Comissão Nacional de Biodiversidade (CONABIO) estabeleceu nas Metas Nacionais da Biodiversidade para 2010 (Resolução n 03, de 21/12/2006) o objetivo de proteger 10% dos biomas terrestres em unidades de conservação, com exceção do bioma amazônico, para o qual o índice é de 30%. O atual percentual de unidades de conservação nos biomas Pampa e Mata Atlântica está muito aquém desta meta, especialmente no caso do bioma Pampa. Em se tratando especificamente dos Campos Sulinos este quadro é ainda mais dramático, já que as unidades de conservação existentes em ambos os biomas têm sido criadas principalmente com o objetivo de conservar florestas, no caso da Mata Atlântica, e áreas úmidas, no caso do bioma Pampa. Brandão et al. (2007) identificaram uma área equivalente a 271.657 ha campos no sistema de UCs no RS, o que representa 2,58% da área total de campos remanescentes, e de somente 1,41% em relação à cobertura original dos campos.
ARTIGO - Diversidade e conservação da fauna dos Campos do Sul do Brasil Até recentemente, os campos de zonas temperadas eram reconhecidos apenas por sua função tradicional de sustentar a produção pecuária. No Brasil, a preocupação com o futuro da diversidade biológica e cultural dos campos temperados é ainda mais recente à tendência de expansão desenfreada de monocultivos agrícolas e silviculturais a partir de 2004, com a instalação de empresas transnacionais do ramo da celulose na metade sul do Rio Grande do Sul. Indubitavelmente, o reconhecimento do Pampa como um bioma independente, em nível nacional (IBGE 2004), contribuiu para a mobilização de setores governamentais e não-governamentais ligados ao meio ambiente em torno da conservação dos campos sul-brasileiros. Entre as principais funções atribuídas aos campos nativos está a manutenção da biodiversidade, que se traduz em diversos serviços ambientais como o provimento de recursos genéticos, a polinização e a estabilização de ecossistemas, incluindo agroecossistemas intensivamente manejados no entorno de áreas preservadas. Ameaças: perda de hábitat pela substituição dos campos nativos por agricultura, silvicultura ou pastagens exóticas(capim-annoni); destruição de áreas úmidas por drenagem ou barramento; queimadas freqüentes; descaracterização do hábitat por sobrepastejo e pisoteio pelo gado; perseguição e caça; captura para criação em cativeiro ou comércio de fauna, e efeito de invasões biológicas. Causas menores de ameaça incluem poluição, urbanização, atropelamentos, mineração, desmatamento, efeitos de patógenos e desconhecidas relações de dependência com fatores bióticos e abióticos do meio onde vivem. Compreender melhor essas relações é essencial para a conservação da fauna associada aos Campos Sulinos. Autor: Glayson Ariel Bencke, biólogo pesquisador.
Capim-Annoni
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Campos Sulinos - conservação e uso sustentável da biodiversidade / Valério De Patta Pillar... [et al.]. Editores. Brasília: MMA, 2009. Relatório Técnico, PROBIO Cobertura vegetal do Bioma Pampa, UFRGS, 2007. http://www.revistaecologico.com.br/ Diversidade e conservação da fauna dos Campos do Sul do Brasil, Glayson Ariel Bencke.