TRABALHO E PRODUÇÃO DO ESPAÇO: ELEMENTOS HISTÓRICOS QUE CONTRIBUÍRAM PARA A PRODUÇÃO ESPACIAL DA CIDADE DE VITÓRIA DA CONQUISTA BA



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Jemeffer Souza Lebrão Mestranda em Geografia pela Universidade Federal da Paraíba UFPB Programa de Pós Graduação em Geografia PPGG. jhelfny@yahoo.com.br TRABALHO E PRODUÇÃO DO ESPAÇO: ELEMENTOS HISTÓRICOS QUE CONTRIBUÍRAM PARA A PRODUÇÃO ESPACIAL DA CIDADE DE VITÓRIA DA CONQUISTA BA 1.0- INTRODUÇÃO Vitória da Conquista, cidade média, localizada na região centro-sul da Bahia, terceira maior do estado, é o objeto de estudo desse trabalho. O objetivo é compreender a produção do espaço urbano dessa cidade, tomando como base os principais eventos históricos que contribuíram e contribuem para o seu crescimento urbano, econômico e social. Apesar da amplitude que o título parece apresentar, não pretendemos dar conta de todo o processo em suas minúcias, mas apresentar de forma concisa e sucinta os eventos históricos e seus rebatimentos no espaço conquistense pelo viés dialético. A metodologia empregada para a obtenção dos resultados aqui apresentados foi a consulta bibliográfica de autores que relatam a história e da produção espacial da cidade em questão como Ferraz (2009), Souza (2008), Silva (2013), Medeiros (1979). Além de levantamento documental de dados primários e secundários, dados censitários entre outros. A pesquisa se encontra em fase inicial e os resultados obtidos ainda são preliminares. 2.0- TRABALHO E PRODUÇÃO DO ESPAÇO GEOGRÁFICO O Espaço é por definição histórica na epistemologia da Geografia moderna seu objeto e categoria de análise central. É consenso a importância desse conceito no âmbito da ciência que se propõe estudar a relação entre a sociedade e a natureza e o resultado desse intercâmbio no que se conveniou chamar de espaço geográfico.

Esse espaço de conteúdo social, muito difere do espaço natural da Física e Biologia, e na nossa concepção, se refere não somente ao espaço em que o homem se desenvolve, mas é também, produto e ao mesmo tempo produtor em uma relação dialética. Essa produção se realiza por meio do trabalho, nesse sentido, o que interessa à Geografia é o conjunto da materialização dos processos sociais como espaço. De acordo com Silva (2001): O espaço geográfico, para nós, é produzido pelas relações contraditórias entre a natureza orgânica e inorgânica interior e exterior ao homem. O homem é espaço, está no espaço e produz espaço a um só tempo. Espaço social. Isto se dá por meio de sua propriedade, pela função e pelo resultado dessa propriedade. Através da propriedade, inclusive, e principalmente, da força de trabalho do homem é um dos momentos do espaço geográfico pela via natural e histórica ao mesmo tempo. [...] ( p. 50,51) Baseado na propriedade privada do solo e na divisão da sociedade em classes sociais antagônicas, a produção do espaço no capitalismo não poderia deixar de reproduzir o modelo de desigualdade e consequentemente de desequilíbrio que tem se perpetuado no decorrer do desenvolvimento histórico desse sistema. As desigualdades expressam as contradições estruturais do modo de produção, que embora possam ser abrandadas em sua conjuntura e em determinados espaços, não podem ser totalmente eliminadas, pois fazem parte da própria lógica destrutiva do capital. Não é possível conceber produção do espaço sem trabalho, seja em seu sentido concreto e ontológico ou abstrato e alienado, o trabalho é a única forma possível de produção. Nesse viés, o espaço é produzido coletivamente pela sociedade em um processo que é ontologicamente inerente à espécie humana. Dessa forma, a categoria trabalho se torna fundamental para a compreensão de como o espaço geográfico se produz e se configura. Compreender como esse trabalho se estabelece significa considerar como essa sociedade capitalista encontra-se organizada, daí a relevância em se entender como as classes sociais produzem o espaço geográfico a imagem e semelhança do modo de produção desigual

do capital, portanto voltado, predominantemente, para os interesses das classes dominantes, que controlam a natureza, via apropriação privada, e o trabalho, via subsunção deste ao capital. (SOUZA, 2014 p. 12). Conformando todas as coisas aos seus mandos, o capitalismo, que nada mais é do que um sistema de relações sociais, também impôs sua lógica à produção do espaço, moldando-o de acordo com os seus interesse e para benefício próprio, criando espaço destinados à sua acumulação e espaços de segregação. 3.0- A PRODUÇÃO O ESPAÇO DE VITÓRIA DA CONQUISTA. A produção do espaço de Vitória da Conquista teve início antes mesmo de se constituir cidade, esse processo histórico começa em meados do século XVIII, quando em 1752 uma expedição de portugueses chega à região do Sertão da Ressaca com Conquista o objetivo estabelecido pela Coroa portuguesa de fundar um povoado e criar gado, pois a tentativa de encontrar ouro se viu frustrada nesse local. Antes da criação do Arraial da Conquista, outras áreas do sertão já haviam sido ocupadas por colonizadores no início de 1700. (FERRAZ, 2009). A criação de gado que foi encaminhada para a região do sertão devido à conflitos entre criadores e produtores de cana no litoral brasileiro, além da demanda por produtos para a subsistência das regiões do ouro e no interior (Rio de Contas e Jacobina). Esses fatos fizeram com que o gado fosse deslocado para o sertão com o subsídio do poder público que doou consideráveis frações de terra para a fixação dessa atividade. Nesse contexto esta aliança entre ordem pública e ordem privada é visível no desenvolvimento da ocupação da grande zona conquistense. (327). O estabelecimento da criação de gado e as atividades decorrentes disso garantiram o povoamento que deu origem ao município de Vitória da Conquista que de início recebeu o nome de Arraial da Conquista. (MEDEIROS apud SOUZA. S., 2008). No século XIX o Arraial da Conquista se consolida como lugar de passagem entre o sertão e o litoral facilitando a mobilidade, fato que proporcionou o contato com outros entrepostos comerciais. A abertura de estradas também facilitava o transporte da

produção do interior da Bahia para a Europa. A tarefa da abertura de estradas foi dada ao bandeirante João Gonçalves da Costa como afirma Medeiros. O problema das estradas assumiu importância fundamental, sobretudo daquelas em direção ao litoral. Manuel da Cunha Menezes, Governador do Estado da Bahia, em 1776, propôs a João Gonçalves da Costa a construção de uma estrada que ligasse o litoral até sair na Estrada Geral do Rio São Francisco. Sabe-se que o Sertanista terminou o trabalho em outubro de 1779 (MEDEIROS apud FERRAZ, 2009. p.43). Existem relatos importantes desse período, entre eles encontram-se as descrições do príncipe Maximiliano de Wied Neuwied fruto de sua viagem ao Brasil em 1817 quando descreve o Arraial com suas características físicas sua organização, habitantes e a importância que esse lugar já apresentava no contexto dessa época. Arraial da Conquista, principal localidade do distrito, é quase tão importante como qualquer vila do litoral. Contam-se aí umas quarenta casas baixas e uma igreja em construção. (...) Independente dos recursos que a cultura dos campos fornece para a subsistência dos habitantes, a venda do algodão e a passagem das boiadas, que vão para a Baia, lhes proporcionam outros meios de vida; as boiadas que vêm do Rio São Francisco passam também por essa localidade: Algumas vezes veem-se chegar, numa semana, para mais de mil bois, que se destinam à capital. (WIED NEUWIED, 1942 p. 409). O crescimento urbano nesse período, apesar de eminente, acontecia de forma lenta e a economia da localidade permaneceu voltada para atividades primárias, sendo que a mais importante era a pecuária, (com criação de gado bovino, ovino e caprino), além disso, eram desenvolvidas no arraial atividades subsidiárias à criação de gado como agricultura de subsistência, a fabricação de artefatos simples e vestes de couro, o pequeno plantio do algodão e o aluguel de pastagens para o gado que vinha de passagem do Alto sertão. (SOUZA, S., 2008 p.377). Medeiros (2003) explica que a economia estava centrada em grandes propriedades onde se praticava a policultura e a pecuária, havia a presença de escravos e de alguns trabalhadores que realizavam a agricultura de subsistência nas franjas dos

latifúndios, esses trabalhadores também garantiam a mão-de-obra suplementar para os grandes proprietários. A relação classista já se manifesta desde o início da produção do arraial e esses latifúndios eram controlados pelas famílias que exerciam influência e que formavam verdadeiras parentelas. (SOUZA. B., 2008). Favorecida pela localização, na qual é cortada por importantes estradas do Brasil, a figura do migrante se tornou de extrema importância na produção do espaço dessa cidade e o processo de mobilidade do trabalho percebido desde a década de 1930, quando Conquista já tinha título de cidade, influenciou e vem repercutindo até os dias atuais na produção do espaço urbano de conquistense, sobretudo na periferia da cidade. A abertura e pavimentação de vias de circulação são eventos de extrema relevância para se compreender a produção do espaço dessa cidade, pois desde sua origem, Vitória da Conquista se configura como lugar de passagem e consequentemente de atração de pessoas, consolidadando-se como um importante nó na rede rodoviária Brasileira. As estradas favorecem o desenvolvimento econômico facilitando o escoamento das mercadorias e direcionam a expansão urbana. O comércio e a agropecuária eram as principais atividades da economia local que se desenvolviam largamente e a cidade se consolida como polo de atração de pessoas, que buscavam, essa cidade à procura de condições de trabalho e de vida. Muitos vêm de outras cidades da Bahia, até mesmo outros estados e das zonas rurais de municípios do entorno. Dessa forma, a mobilidade do trabalho é percebida no processo histórico e na produção do espaço conquistense, fato que se consolidará como uma constante nesse município. A década de 1940 é um marco na história da cidade. Até o início dessa década era chamada de Conquista, mas para evitar coincidências de nomenclatura com outras cidades, optou-se por retomar os antigos nomes (Arraial da Conquista e Villa da Victória) e o município passa definitivamente a se chamar Vitória da Conquista em 1943 Esse período abre as portas para transformações importantes na realidade socioeconômica. Medeiros (1977) explica que a mudança ocorrida na década,

entretanto, não ficou circunscrita apenas ao nome, mas que esse período marca o início do surgimento de uma nova realidade social. Para exemplificar essa nova realidade, o autor cita vários elementos, como a abertura de estradas que continua fazendo parte da história da cidade, o contexto internacional, o comércio que se fortalece gradativamente e os emigrantes atraídos pelo desenvolvimento da economia conquistense que foram fundamentais para a produção do espaço dessa cidade. A estrada Rio-Bahia [BR-116]* abre-se integrando a cidade a outras regiões e ao sul do país; a estrada Ilhéus-Lapa [BA 415]* corta-a em seu meio caminho entre o litoral e o Sertão do São Francisco. Elas permitem maior escoamento da produção e um fenômeno, sempre presente na história do município. (..) A Segunda Guerra Mundial, que colocara na ordem do dia necessidade de suprimentos, influencia para o desenvolvimento da região e do município. O comércio se desenvolve. Agora não é mais o comércio dos velhos tropeiros que guiavam muares para o litoral e para o sertão e nem apenas o comércio dos ambulantes. Surgem modernas casas comerciais dignas desse nome. O comércio, o desenvolvimento econômico, sua diversificação, fazem surgir em cena personagens correspondentes às novas atividades econômicas, inclusive migrantes atraídos pela expansão econômica do município. (MEDEIROS, 1977, p.9). *Grifo nosso. É importante pensar que todos esses processos ocorridos em Vitória da Conquista desde sua origem, não são fatos desconexos nem ocorridos ao acaso, pelo contrário, são ações planejadas pelos sujeitos que exercem influência sobre esse espaço, são estratégias das classes dominantes que vão produzindo e organizando o espaço a fim de que ele atenda às suas necessidades individuais. Existe uma relação entre todos os fatos e sempre há por trás do discurso do progresso e do desenvolvimento intencionalidades particulares. A primeira vista o discurso se mostra claro e válido, não parece esconder nada, no entanto possuem um lado sombrio. Os benefícios e os malefícios dos chamados projetos de desenvolvimento regional, e investimentos milionários em infraestrutura são distribuídos de forma desigual, segundo o modelo contraditório do capital, no qual a classe dominante se apropria da riqueza produzida no espaço, enquanto resta às classes subalternas a miséria e a desrealização de suas vidas.

Muitos progressos puderam ser observados no decorrer da história trilhada pelo município, no entanto, não se pode considerar apenas os aspectos positivos desse processo, existiam também uma falta de infraestrutura urbana e baixas condições socioeconômicas para a população, sobretudo das classes mais baixas. A relação campo cidade não pode ser desprezada, pois o campo possuiu papel fundamental na produção espacial de Vitória da Conquista. Muitas análises consideram campo e cidade como opostos, ou como lados diferentes de uma moeda que apesar de estares unidos historicamente, são analisados de forma separada e dualista, no entanto, essa concepção não nos dá sustentação teórica para entender o processo histórico que culminou na produção de Vitória Conquista. É preciso analisar dialeticamente as contradições desses espaços que são, ao mesmo tempo, diferenciados e semelhantes em determinados aspectos, são separados, próximos, contínuos e se influenciam mutuamente. Neste sentido, a cidade não se faz sem a ligação estreita com o meio rural e o próprio campo também se transforma em função do urbano e das demandas do mercado. Na década de 1950, a população de vitória da Conquista era em sua maior parte rural 58,5%. Na década seguinte (1960) se tem uma inversão nesses dados e a população urbana passa a ser predominante constituindo 60,7 desse contingente. Nos anos posteriores essa tendência se afirma registrando em 1970 (67,5%), 1980 (74,7%), 1991 (83,7%), 2000 (85,9%) e 2010 (89,7%). Transformações substanciais acontecem em Vitória da Conquista a partir da década de 1970, especialmente no ano de 1973, quando o complexo cafeeiro é instalado na região do planalto da Conquista com investimentos destinados à criação de uma infraestrutura necessária á expansão da cafeicultura, dando enfoque nas vias de comunicação e circulação. Nesse contexto muitas terras passam a ser tituladas na região, inventários que há décadas não haviam sido realizados são retomados. As terras são bastante valorizadas e se tornam fonte de exploração e especulação (SOUZA, 2008 p.397).

Além de dificultar o acesso à terra para os pequenos agricultores o esses acontecimentos também impulsionam uma intensa mobilidade do trabalho caracterizada pela expulsão do trabalhador rural das suas antigas propriedades. Uma grande parcela desses camponeses e trabalhadores rurais da região migrou para a cidade e neste contexto. Vieram também migrantes de outras cidades da Bahia e até mesmo outros estados em virtude do desenvolvimento de Vitória da Conquista que vivenciou um intenso processo de mobilidade do trabalho que culminou na produção do espaço e expansão da malha urbana conquistense. A população de baixa renda ou sem nenhum salário, buscou, sobretudo na periferia urbana, novos espaços para a sua reprodução social. Para atender a demanda por moradia dessa população crescente, a ocupação do solo passou a ser realizada, basicamente, por meio dos loteamentos que iam se multiplicando, inicialmente devido á ausência de um plano diretor que normatizasse o parcelamento do solo urbano e posteriormente baseado na ilegalidade quando os loteamentos eram abertos em áreas afastadas do centro urbanizado sem nenhum tipo de infra estrutura. O processo tem início em 1950, quando 11 loteamentos são criados e alguns deles só são regularizados posteriormente. Na década seguinte 29 loteamentos, foram licenciados e em 1970, foram aprovados 21 loteamentos, sendo que somente no ano de 1977 receberam o licenciamento por parte da prefeitura Municipal. Resultado dessas ações, em 1978, Vitória da Conquista contava com 65 loteamentos, dos quais alguns já estavam completamente ocupados. Muitos deles foram destinados as classes mais baixas, esses estavam localizados nas áreas mais distantes do centro e em locais totalmente desprovidas de infraestrutura, no entanto também houveram áreas dedicadas ás classes média e alta, aumentando o preço da terra. (SOUZA, 2009). Medeiros (1978) destaca que o grande crescimento populacional e espacial de Vitória da Conquista era oriundo não apenas do crescimento interno da cidade, mas sobretudo da migração proveniente de outras áreas e do campo e também de outras cidades para Conquista.

Mapas de expansão urbana de Vitória da Conquista de 1976 e 1986 Fonte: FERRAZ e ALMEIDA, 2007 Ao observarmos os dois mapas, é possível identificar além do crescimento urbano, o espraiamento da cidade em direção a áreas bastante afastadas do centro com vazios urbanos entre eles. Esse processo que ocorreu durante o final da década de 1970 e 1980 tem como vetor, a atividade loteadora, que durante esse período aumentou substancialmente devido à permissividade do Estado e à violação dos códigos e leis de uso e ocupação do solo estabelecidos no Plano Diretor Urbano de 1976. É nesse momento que a produção da periferia de Vitória da Conquista ganha impulso, não uma periferia considerada apenas como áreas distantes do centro e tampouco a localização nas margens da cidade, mas com um conjunto de fatores sociais, políticos e econômicos que fizeram com que essas áreas fossem produzidas. 4.0- CONSIDERAÇÕES FINAIS Mais uma vez ressaltamos o papel da mobilidade do trabalho e dos migrantes na constituição do espaço urbano de Vitória da Conquista. Essa cidade tem sua história, caracterizada pela população que chegava a essa localidade em busca de trabalho e condições concretas de sobrevivência atraídas pelo seu crescimento econômico. A pesquisa, apesar de estar em fase inicial já nos mostra a importância do trabalho e da mobilidade dos trabalhadores repercutindo diretamente na produção do espaço conquistense.

O nosso objetivo no contexto geral da pesquisa é encontrar fatos que demonstrem a tese central, de que a mobilidade do trabalho foi importante, e ainda o é para a produção da cidade em geral, pois entendemos que o trabalho categoria central para a vida e assim, ele se torna o direcionador das trajetórias que os sujeitos desempenham durante suas vidas na busca por lugares que possam lhe garantir a sobrevivência.

5.0- REFERÊNCIAS FERRAZ, Ana Emília. de Quadros. O espaço em movimento: O desvelar da rede dos processos sociotécnicos do sistema de saúde de Vitória da Conquista. Tese (Doutorado em Geografia). São Cristóvão: UFS NPGEO, 2009. FERRAZ, Ana Emília de Quadros., ALMEIDA, Mírian Cléa Coelho. Transformações Sócio-Territoriais na cidade de Vitória da Conquista - BA. In: Simpósio nacional de Geografia Urbana, X, 2007, Florianópolis, ANAIS Trajetórias da geografia urbana no Brasil: tradições e perspectivas. Florianópolis, UFSC, 2007. p. 1-17 MAXIMILIANO, Wied. Neuwied. Viagem ao Brasil nos anos de 1815 a 1817. São Paulo, trad. Edgard Sussekind de Mendonça e Flávio Poppe defigueiredo: Brasiliana, 1942. Disponível em <http://www.brasiliana.com.br/obras/viagemao-brasil-nos-anos-de-1815-a-1817/busca> Consultado em Janeiro de 2014. MEDEIROS, Ruy H. Os loteamentos e a expansão urbana em Vitória da Conquista- BA, Fifó. Vitória da Conquista, 25 de Janeiro. 1978. Ensaios Conquistenses. MEDEIROS, Ruy H. A. Aspecto urbano de Conquista através da história. In: Fifó, Vitória da Conquista 11 de novembro de 1977. Ensaios Conquistenses. SANTOS, Ronan Soares. A construção de Cidades no Brasil: Capital, poder público, população e a produção do espaço urbano em Vitória da Conquista (1940-2010). Tese (Doutorado em Geografia). Barcelona: Universitat de Barcelona. Programa De Doctorado: Geografia, Planificación Territorial Y Gestión Ambiental, 2013. SILVA, Lenyra Rique da. A natureza contraditória do espaço geográfico. São Paulo: Contexto, 2001. SOUZA, Belarmino de Jesus. O bacharelismo na política conquistense dos anos 20. In anais de evento ANPUH. Vitória da Conquista. 2008 Disponível em < http://www.uesb.br/anpuhba/artigos/anpuh_i/belarmino_jesus_souza.pdf> Consultado em Janeiro de 2014. SOUZA, Suzane Tosta. Categorias de Análise centrais para a compreensão do processo de produção do espaço no âmbito da Geografia crítica marxista. Relatório

para promoção na carreira Docente para professor adjunto titular. Vitória da Conquista: UESB, 2014.. Da negação ao discurso hegemônico do capital à atualidade da luta de classes no campo brasileiro. Camponeses em luta pelo/no território no sudoeste da Bahia. Tese (Doutorado em Geografia). São Cristóvão: UFS NPGEO, 2008.