ANÁLISE DOS PROCESSOS DE PLANEJAMENTO E OPERAÇÃO DE UM SISTEMA DE COLETA PROGRAMADA DE PEÇAS, MILK RUN, EM UMA INDÚSTRIA AUTOMOBILÍSTICA NACIONAL



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Transcrição:

ANÁLISE DOS PROCESSOS DE PLANEJAMENTO E OPERAÇÃO DE UM SISTEMA DE COLETA PROGRAMADA DE PEÇAS, MILK RUN, EM UMA INDÚSTRIA AUTOMOBILÍSTICA NACIONAL 1

1. INTRODUÇÃO O setor automobilístico está em constante desenvolvimento devido ao elevado nível de competitividade, que exige a inovação como fator chave para as empresas se manterem no mercado, requerendo soluções que busquem eficiência somada à redução de custos. Segundo Domingos et al. (2012), como fruto dessa busca pela inovação, surge o milk run como um método de aceleração de fluxo de materiais no ciclo produtivo. Este sistema de coleta programada de peças visa, num tempo previamente determinado, coletar as peças nos fornecedores, cumprindo-se determinadas rotas, visando minimizar o custo de transporte da operação e reduzir o estoque na cadeia de suprimentos, segundo Mouta e Botter (2002, p. 01). O desafio é de como agregar valor na cadeia de suprimentos e, além disso, reduzir estoques e perdas. Dessa forma, a ideia é ter um fluxo com lotes menores na produção, refletindo na redução dos ciclos de produção e na rapidez da resposta à demanda do mercado, segundo Shingo (1996 apud RIBEIRO; MARINS, 2003). Neste contexto o objetivo do trabalho é analisar a adoção do sistema milk run em uma montadora de caminhões e ônibus que atua no Brasil, visando estudar as etapas de planejamento e operacionalização do sistema para identificar e analisar as possíveis variáveis que influenciam os processos do sistema de coleta programada de peças e o comportamento destas quando confrontadas à realidade da Empresa em questão. Para atender a esse objetivo, realizou-se uma revisão bibliográfica, observou-se as rotinas de planejamento e operação de milk run da montadora por um período de 90 dias, entrevistando os envolvidos com a atividade. 2. O SISTEMA DE COLETA PROGRAMADA DE PEÇAS, MILK RUN A indústria automobilística está cada vez mais competitiva e é nesse cenário que a logística se torna um dos principais meios para aumentar a competitividade, produtividade e reduzir os custos. Há uma forte tendência estratégica de integração entre os atores logísticos de uma empresa, objetivando o aperfeiçoamento de processos logísticos. É neste contexto que destaca-se o milk run como resultado da busca pela inovação, visando otimizar o fluxo na cadeia produtiva. (MOURA, 2000) Milk run é um termo para descrever um sistema de coleta programada, o qual utiliza um veículo para realizar a coleta de cargas em diferentes fornecedores, seguindo uma rota e janelas de carregamento previamente definidas. As características mais marcantes deste sistema são: frequência de entrega bem definida, horário pré-determinados de carga e descarga, aglutinação de fornecedores de uma mesma região e previsão de demanda bem estruturada. (JÓ; CARDOSO, 2008) 2

Figura 1 - Sistema de abastecimento da indústria leiteira Fonte: Rodrigues, p.144 (2014) Além do objetivo mercadológico/competitivo do Milk run, assim como de todo o pensamento lean, o sistema de coleta programada é um importante elemento de aumento da eficiência do fornecimento de suprimento às empresas. A coleta programada é inicialmente planejada de modo a otimizar o máximo possível à ocupação dos veículos de carga e diminuir o número de veículos necessários para a coleta, assim como reduzir a distância total percorrida pela carga até o destino final (montadora), assegurando padronização de embalagens. 2.1. SISTEMA CONVENCIONAL VERSUS MILK RUN O Milk run se difere do sistema de coleta convencional essencialmente no modo de execução do abastecimento de peças na montadora. Em um passado recente as entregas eram baseadas em uma relação direta empresa-cliente, onde o fornecedor esperava a consolidação da carga em um veículo, isto é, esperava-se ocupar todo o veículo (geralmente veículos grandes) para realizar a entrega. Devido a essa longa espera para completar a carga, a frequência das entregas em sua grande parte eram mensais. Em consequência desse processo longo e volumoso observava-se níveis elevados de estoques tanto nas montadoras, como nos fornecedores, o que escondia alguns erros na produção e na qualidade das peças. (RIBEIRO; MARINS, 2003) 3

Figura 2 - Sistema convencional (esquerda) versus Milk run (direita) Fonte: Moura e Botter (2002) 2.2. DESAFIOS Segundo Moura e Botter (2002) um dos objetivos e desafio do milk run é a agregação de valor na cadeia de suprimentos, acompanhada pela redução de estoque e desperdícios. Dessa forma, se torna possível reduzir o tempo de resposta às flutuações de demanda, pois se tem um melhor controle sobre as peças solicitadas e uma maior frequência de abastecimento, facilitando o planejamento e a programação da produção. Para Moura e Botter (2002), o fluxo de informações é um dos principais desafios do milk run, a grande maioria das empresas sistematiza esse fluxo via EDI (Eletronic Data Interchange) ou outro sistema que facilite o fluxo de informações e a programação das peças. Graziano et al. (2010) complementam que a comunicação e a organização são fatores fundamentais para garantir o sincronismo das rotas do milk run com a linha de produção, pois um problema de uma rota pode gerar um efeito dominó, afetando outras rotas e a dinâmica de produção da montadora, uma vez que não há interesse e na maior parte das vezes nem espaço para acumular peças na planta. Parte dos desafios de implementação e operação do Milk run é derivada da extensa gama de participantes, a qual influencia drasticamente na estabilidade da demanda e consequentemente em todas as relações da cadeia, visto que em uma metodologia lean trabalha-se com um fluxo puxado (CARDOSO; JÓ, 2008). Devido ao grande número de participantes da cadeia e sua direta influência na estabilidade da demanda, as rotas Milk run requerem um plano de revisão constante, o qual garanta a eficiência global da rota. Além dos planos de revisões periódicas, se faz interessante à existência de um plano para gerenciar imprevistos diante de condições externas alheias à indústria e aos fornecedores, é comum o acordo com a transportadora de disponibilizar veículos para coletas extras em caso de eventual necessidade. 4

3. METODOLOGIA Para classificação de pesquisa do presente trabalho foi adotado a natureza exploratória na medida em que se busca um entendimento sobre a natureza geral de um problema, segundo Vergara (2004), Aaker, Kumar e Day (2001). Em seguida desenvolveu-se o estudo de caso nas unidades da empresa e as técnicas fundamentais aplicadas foram à observação e a entrevista. O estudo de caso se caracteriza como um tipo de pesquisa cujo objetivo é uma unidade que se analisa profundamente, visando ao exame detalhado de um ambiente, de um simples sujeito ou de uma situação em particular. (GODOY, 1995). Optou-se por uma linha de pesquisa descritiva e explicativa, descritiva, no sentido em que visa descrever os conceitos sobre o transporte de suprimentos para a indústria automobilística, em especial com foco no sistema de coleta programada, Milk run. A característica explicativa do trabalho se justifica pela exposição das ferramentas e métodos de análise utilizadas no Milk run na empresa em estudo. O presente estudo tem como objetivo a análise do comportamento das variáveis do milk run em uma indústria de caminhões e ônibus. Os dados foram coletados durante o período de três meses em que atividades relacionadas ao sistema de coleta programa de peças estavam sendo realizadas como parte de um programa de estágio. A coleta de dados deu-se por meio de questionários semiestruturados, entrevistas em profundidade e observações. Segundo Marconi e Lakatos (1990), a observação é uma técnica que utiliza os sentidos para obtenção de determinados aspectos da realidade, não consistindo em apenas ver e ouvir, Por questionários semiestruturados entende-se como um roteiro de perguntas e tópicos a serem discutidos com especialistas das áreas, essas entrevistas foram conduzidas interativamente, onde novos tópicos e perguntas foram abordados conforme o assunto era aprofundado. Os questionários, assim como as entrevistas e reuniões foram feitas em grande parte com os colaboradores da montadora e dos operadores logísticos parceiros e de alguns fornecedores. Dessa forma, entrevistou-se: analistas (planejamento logístico, melhoria contínua, embalagens, MRP, transporte, programas e compras); coordenador e subcoordenador do planejamento logístico da montadora; supervisor do planejamento e operação logística; coordenadores de operação das transportadoras; coordenadores e analistas de implementações e melhorias de transporte das transportadoras; gerentes logísticos dos fornecedores e agentes da disposição das instituições envolvidas no sistema de coleta discutido. Os dados coletados foram analisados contrapondo o embasamento teórico adquirido por meio dos tipos de referenciais bibliográficos citados, com a aplicação e criticidade das atividades de planejamento e operação desempenhadas na rotina da indústria automotiva em questão. Entende-se que para o melhor entendimento e análise dos fatores influentes nas diferentes etapas do sistema de coleta programada é interessante caracterizar esses pontos de influências em variáveis, as quais compõem uma esfera de planejamento e outra de operacionalização. 5

A análise das variáveis levantadas se deu primeiramente como forma de comparação entre a teoria obtida bibliograficamente e as informações coletadas durante os 3 meses de estágio. Em um segundo momento buscou-se entender a origem das divergências entre a teoria pura e a aplicada. Em uma etapa mais conclusiva, visou-se entender quais seriam os pontos que mais distorciam as variáveis do sistema e como esses poderiam ser contornados. 4. PLANEJAMENTO E OPERAÇÃO DO MILK RUN O milk run é um clássico problema de roteirização, mas com uma forte dependência de informações e sincronismo com outros atores logísticos de planejamento e operação. Para entender o sistema de coleta programada e suas possíveis variáveis deve-se primeiro entender as etapas para a implementação de uma rota, abrangendo os processos desde a seleção dos fornecedores para compor a rota até a coleta propriamente dita da carga pelo milk run. Figura 3 - Etapas do planejamento de um rota milk run 6

Para melhor análise divide-se o processo de implementação do milk run em planejamento e operacionalização. As análises de variáveis e fluxo do sistema de coleta programada desse estudo foram feitas com base nos procedimentos seguidos pela indústria automobilística objeto do estudo, os quais podem ser observados na Figura 3. 5. VARIÁVEIS DO MILK RUN NA EMPRESA ESTUDADA 5.1. JANELA DE COLETA NO FORNECEDOR A janela de coleta estipulada pela montadora é de 1 hora, nesses períodos o fornecedor tem que descarregar as embalagens vazias, carregar o veículo conforme a demanda e realizar todos os processos administrativos, os quais incluem a emissão de nota fiscal da carga e da embalagem. Antes do início da rota os fornecedores recebem um comunicado oficial informando suas obrigações a serem cumpridas durante a janela de coleta e também as medidas que serão tomadas pela montadora em caso de descumprimento. Em casos que o fornecedor persiste no não cumprimento do tempo estipulado de coleta, o fornecedor recebe uma notificação, podendo ser até uma multa administrativa. Em casos que o atraso da janela ocasiona uma criticidade na linha, uma coleta emergencial é solicitada pela montadora a débito do fornecedor e em situações ainda mais graves, como parada de linha, os prejuízos decorrentes do incidente são debitados do fornecedor. 5.2. JANELA DE RECEBIMENTO As janelas de recebimento da montadora são geridas com o auxílio de um sistema informatizado via Internet e Intranet para agendar, monitorar e administrar horários nas docas de recebimento de peças de modo a reduzir tempos de fila, de descarga e de permanência dos veículos. A grade da janela de recebimento segue um programa fixo, onde os horários de chegada dos veículos milk run e dos outros veículos de carga já estão previamente estabelecidos. A planta conta com uma área chamada de Gate onde os veículos fazem uma espécie de check-in antes de dar continuidade ao descarregamento. Três motivos que foram identificados como problemas frequentes que resultam no atraso do veículo na entrada para fábrica, são: problema na janela de coleta no fornecedor, imprevistos no trânsito e falta de contingente em determinados turnos para o recebimento e cadastramento dos veículos e cargas. A solicitação de coletas extras ou emergenciais de peças desestabiliza o processo de recebimento dos veículos, pois esses veículos de caráter especial tem preferência para serem descarregados, sendo necessário remanejar a programação. 5.3. MONITORAMENTO DO MATERIAL EM TRÂNSITO No modelo de operação atual da montadora o monitoramento do material em trânsito e da rota é feito via rádio, contando com apenas alguns veículos com GPS. Essa atividade é de responsabilidade da transportadora, embora as informações obtidas via monitoramento são de alta importância para ações de curto e longo prazo do planejamento logístico. 5.4. FLUXO DE EMBALAGENS O fluxo de embalagens adequado inclui um planejamento logístico que considere o manuseio desde o fornecedor até o ponto de uso na planta da montadora. Dessa forma, a seleção da 7

embalagem correta será vantajosa para a montadora e seus fornecedores à medida que ajudará a reduzir custos, racionalizar métodos de transporte, carga e descarga e manuseio do material assegurando que a peça chegue ao seu ponto de uso isenta de danos. Foi identificado que o processo de controle e separação das embalagens vazias é feito de modo não sistêmico e visual, sendo o padrão de embalagem fundamental para a sua identificação. Constatou-se com frequência a chegada de peças em embalagens fora do padrão de identificação e até mesmo identificadas com o nome de outras montadoras. Considerando que a embalagem é um ativo e que a empresa tem um custo em cima deste, as atividades de monitoramento e controle das embalagens vazias são essenciais, garantindo a chegada dos produtos conforme os padrões de qualidade exigidos e na quantidade exigida, além de auxiliar na identificação de gargalos no fluxo. 5.5. TEMPO DE PERMANÊNCIA O tempo de permanência dos veículos no interior da fábrica, quando elevados, geram impactos negativos como: congestionamento no recebimento, no estoque, e na carga de embalagens vazias (logística reversa), sendo estes fatores ligados diretamente aos resultados operacionais (perdas de produção, cripples, paradas de linha). Identificou-se que parte considerável dos veículos está demorando mais do que o planejado. Os principais fatores de interferência neste tempo são: elevado número de PD s (pontos de descarga), quebra de janelas, atraso na liberação de veículos no Gate, insuficiência de recursos no recebimento e na estocagem. 5.6. VIABILIDADE OPERACIONAL A viabilidade operacional é uma resposta às solicitações do planejamento milk run sob uma ótica empírica do operador logístico. A frequência de coletas das rotas seguem uma frequência de 3 ou 5 vezes semanais, pois operacionalmente não é viável que se opere fora dessa faixa de frequência, para cada rota é necessário ter um veículo e motorista devidamente cadastrado e legalizado. Devido à localização dos fornecedores a distância percorrida e o tempo para execução de uma rota milk run por completo é muito grande. Sendo assim, o operador logístico avalia se o tempo de percurso proposto pelo planejamento é adequado e se o trajeto é o considerado ótimo, mediante as possíveis restrições, qualidade das rodovias e intensidade do tráfego. A operadora também avalia se há restrições físicas nas vias de acesso aos fornecedores ou no próprio fornecedor. 6. CONCLUSÃO Este estudo teve por finalidade analisar o sistema milk run adotado por uma indústria automotiva no Brasil. Inicialmente foi realizado um levantamento bibliográfico sobre o tema, contemplando conceitos de cadeia de suprimentos e milk run, abrangendo a integração da cadeia e a importância do transporte de materiais. A partir da revisão da literatura, foram identificadas as melhores práticas de planejamento e gerenciamento do sistema de coleta programada, assim como benefícios e desafios da implementação e operação. Após uma ampla revisão bibliográfica e participação nas atividades diárias de milk run da empresa, entendeu-se que o 8

sistema poderia ser analisado com base nos postos de influência dos diversos fatores que o compunham. Dessa forma o sistema de coletas programadas de peças foi caracterizado por intermédio de variáveis, que se dividem em esferas de planejamento e operacionalização e que posteriormente foram analisadas de comparativamente com as informações obtidas da montadora. De acordo com os dados obtidos no levantamento, observou-se que o sistema de coletas programadas de peças da montadora é de implementação muito recente e que ainda há espaço para melhorias tanto nos processos de planejamento quanto nos de operação. O milk run evidenciou ser um sistema que depende do envolvimento de todos os atores da cadeia produtiva. Como exposto a coleta programada necessita de uma padronização das embalagens e de comprometimento das partes envolvidas, o que implica em uma mudança cultural, exigindo uma forma sistêmica de trabalho, tudo isto em prol de um melhor atendimento ao cliente. 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AAKER, D. A.; KUMAR,V.; DAY,G.S. Pesquisa de marketing. São Paulo: Atlas, 2001. CARDOSO, P.; JÓ, M.. A prática do milk run no fornecimento a indústria automobilística do Brasil. In: CONGRESSO NACIONAL DE EXCELÊNCIA EM GESTÃO, 4, Niterói, 2008 DOMINGOS, B. S. et al. Análise comparativa do sistema de coletas programadas milk run em uma indústria de máquinas e equipamentos. In: ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO, 32, Bento Gonçalves. 2012 GODOY, A. S. Introdução à pesquisa qualitativa e suas possibilidades. In: Revista de Administração de Empresas - RAE, v.35, n.2, mar./abr., 1995, p.57-63. GRAZIANO, G. et al. O Transporte na gestão da cadeia de suprimento e as empresas que utilizam a ferramenta milk run. In: ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO, 30, São Carlos. 2010 MARCONI, M.; LAKATOS, E. Técnicas de pesquisa. São Paulo: Atlas, 1999. MOURA, D. A. Caracterização e Analise de um sistema de coleta de peça, Milk Run, na indústria automobilística nacional. Tese (Mestrado). Departamento de Engenharia Naval e Oceânica, Escola Politécnica, Universidade de São Paulo. São Paulo, 2000. MOURA, D. A.; BOTTER, R. C. Caracterização do sistema de coleta programada de peças, Milk Run. Revista RAE-eletrônico. v. 1. nº1. jan-jun/2002. RIBEIRO, F.; MARINS, F.. Sistema de coleta programada milk run em uma unidade produtiva do setor automotivo. In: Simpósio Brasileiro de Pesquisa Operacional. 35. 2003. Natal, Rio Grande do Norte. RODRIGUES, M. V. Entendendo, aprendendo e desenvolvendo sistemas de produção Lean Manufacturing. Rio de Janeiro: Elsevier, 2014. VERGARA, S. C. Projetos e relatórios de pesquisa em administração. 5º ed. São Paulo: Atlas, 2004. 9