ABSTRACT CONDICIONANTES METEOROLÓGICAS E GEOGRÁFICAS PARA A OCORRÊNCIA DE NEVE NO SUL DO BRASIL Rodolfo de Oliveira Souza, doutorando do Departamento de Geografia da USP Fone: (021) 281.6975 The south of Brazil is one of the few subtropical areas on the globe recording snowfall in winter wery year. The phenomenon is essentially assocated with (i) the trajectory of the polar anticiclone, (ii) the shape of the continent and (iii) the lower continentality index of the southern hemisphere. Introdução Este trabalho procura demonstrar o papel da conexão entre a circulação atmosférica e o fenômeno geográfico da continentalidade para a ocorrência de neve no sul do Brasil. A circulação em altitude desempenha papel fundamental na determinação da trajetória do anticiclone polar em superfície. A forma do continente produz um índice de continentalidade reduzido na faixa temperada, o que permite o abastecimento de umidade contínuamente o que associado à trajetória continental do Anticiclone polar, produzirá neve no sul do Brasil. Metodologia Para a elaboração da presente pesquisa utilizamos dados de superfície das estações meteorológicas de São Joaquim, SC, Bom Jesus, RS e Palmas, PR. Utilizamos também cartas sinóticas de superfície do Instituto Nacional de Meteorologia-INMET e cartas de altitude da Telecomunicações Aeronáuticas, SA-TASA nos níveis de 500 e 300 hpa. O período de análise se estendeu por vinte anos entre 1971 e 1990. Resultados e Discussões Para que haja queda de neve na zona temperada é necessário que se conjuguem dois fenômenos: advecção de ar frio e aporte de umidade. Na Região Sul do Brasil isto é possível de ocorrer entre os meses de maio a setembro, quando então o fenômeno pode ser observado em média entre um e cinco dias no Planalto da Neve, já definido por Souza, 1997. A trajetória do Anticiclone Polar em superfície é o fator preponderante que determina a sua capacidade de resfriamento. Pela análise de cartas sinóticas de superfície nos vinte anos de análise, foi possível identificar duas trajetórias: uma continental e outra marítima. Na primeira, a alta polar caminha no sentido dos meridianos, indo se alojar na região do Chaco, mantendo suas características térmicas de alta polar continental. Já na Segunda trajetória, adquire uma movimentação zonal, saindo do continente na latitude do estuário do Prata ou mesmo mais ao sul. Nesta situação, em virtude do elevado calor específico da água, a massa polar se degenera e é incapaz de produzir uma onda de frio com a ocorrência de neve e geada. O que determina a trajetória do Anticiclone Polar em superfície são ondas meteorológicas nos níveis médios (500hPa) e elevados (300hPa) da troposfera. Quando a circulação em altitude está lenta, formam-se ondas que originam cristas e cavados que, por sua vez, induzem a trajetória continental do anticiclone Polar. Por outro lado, em situação de circulação rápida, as ondas desaparecem e os ventos em altos níveis ficam zonais, forçando uma trajetória marítima do Anticiclone Polar em superfície. As figuras 1 e 2 representam esquemáticamente as duas situações. Os índices de continentalidade na América do Sul não são muito elevados na zona temperada. Isto se deve a sua forma triangular com o véritce voltado para o sul. Na América do Norte ocorre o inverso. Em função disto, mesmo que os invernos sejam mais rigorosos no continente setentrional, com uma cobertura de neve persistente sobre o solo, as nevadas não atingem latitudes tão baixas como se dá por aqui. A tabela 01 mostra o índice de continentalidade
para algumas localidades das duas américas. Este índice foi obtido a partir de fórmula extraída de Serra, 1975. K = T / Lat onde: K= índice de continentalidade; T= amplitude térmica anual; Lat= latitude do local Tabela 1: Índice de continentalidade na zona temperada do continente Americano. Localidade % Localidade % S. Joaquim, BR 26 Winnipeg, CAN 76 Palmas, BR 35 F. Smith, CAN 100 P. Alegre, BR 35 N. Blate, EUA 49 Alegrete, BR 33 Oklahoma,EUA 70 B. Aires, ARG 25 S. Francisco, EUA 22 Mendoza, ARG 29 Jacksonville, EUA 49 Rosário, ARG 28 Atlanta, EUA 56 Macachim, ARG 19 S. Louis, EUA 69 C. Malal, ARG 9 N. Orleans, EUA 50 Ushuaia, ARG 5 Fairbanks, EUA 60 Posadas, ARG 38 S. Diego, EUA 24 Assunção, PAR 34 Observa-se que a média é bem mais alta na América do Norte. Os maiores índices em nosso continente são observados em Posadas, ARG, Palmas, PR e Porto Alegre, RS, podendo-se considerar estes valores como sendo indicativos de transição para um clima continental, visto que a amplitude térmica anual são aí as maiores registrada no continente, principalmente nas localidades ao nível do mar, onde o fator altitude não se constitui em moderador das temperaturas durante o verão. Acreditamos ser o baixo valor do fator continentalidade que provoca, por um lado, um reduzido tempo de permanência da neve no solo e por outro, a ocorrência do fenômeno em latitudes tão baixas, como chega a se registrar na Serra da Mantiqueira, em regime de inverno, embora este alinhamento montanhoso esteja localizado na faixa intertropical. A continentalização do Anticiclone Polar é fundamental para a ocorrência de neve o Sul do Brasil, pois em 100% dos episódios nos 20 anos de análise, a condição para a nevada foi a trajetória continental. A tabela 2, extraída de Souza (1997), mostra que a maior parte das altas polares (35%) estão com valores entre 1026 e 1030 hpa. Os mais intensos, acima de 1041 hpa e os mais fracos (inferiores a 1020 hpa) se igualam em frequência com 4,12%. Tabela 2: Classificação dos Anticiclones Polares em função de suas frequências Intervalo de classe (hpa) Frequência absoluta Frequência relativa (%) 1020 2 4,16 1021 1025 3 6,25 1026-1030 17 35,41 1031-1035 13 27,08 1036-1040 11 22,91 1041-1045 2 4,16 Fonte: Souza, 1997
Souza (1997) ao relacionar a intensidade e área atingida pelas nevadas com o valor isobárico do Anticiclone Polar, não encontrou uma correlação estatísticamente satisfatória, pois apenas 30,76% das altas polares com valores acima de 1036hPa produziram nevadas amplas e fortes. Isto eleva a importância do fenômeno geográfico da continentalidade/maritimidade na intensidade e amplitude das nevadas, já que são função da quantidade de umidade provinda do oceano, que ocorre quando do aprofundamento do cavado sobre o continente, que devido a sua forma afunilada em direção à faixa temperada, facilita a influência marítima. Conclusões A Região Sul do Brasil é uma das poucas áreas subtropicais do mundo a apresentar queda anual de neve em regime de inverno. Isto se deve tanto a fenômenos meteorológicos, quando estes provocam a advecção de ar frio com trajetória continental, quanto por fenômenos geográficos, quando estes determinam o grau de continentalidade/maritmidade. A associação dos dois fenômenos, são os responsáveis para que se desenvolvam condições propícias à ocorrência de neve. Na realidade há uma associação tripla entre a atmosfera, continente e oceano. Diante disto, o valor isobárico do Anticiclone Polar perde importância diante de sua trajetória e continentalização, ou seja, as grandes ondas de frio com ocorrência de neve e geada no Sul e friagem na Amazônia estão associadas ao Anticiclone Polar continentalizado e não ao seu potencial isobárico. Por sua vez, a alta polar continentalizada se define a partir do momento em que a circulação na alta troposfera, ao tornar-se mais lenta, forma ondas meteorológicas que se repercutem em superfície, determinando a trajetória do Anticiclone Polar em superfície. Bibliografia Bruniard, A Aspectos Geográficos de las Precipitaciones Nivales en la República Argentina Boletin de Estudios Geográficos de la Universidad Nacional de Cuyo, Instituto de Geografia, vol. XXII, 1986. CrivellI, E. S. et all As Massas Polares de 1981 sobre o Paraná Universidade Estadual de Maringá, Centro de Ciências Exatas, Departamento de Física, 1981. Serra, A. Climatologia do Brasil 2 Boletim Geográfico 244, IBGE, jan/mar 1975. Souza, R. O. A Ocorrência de Neve em Planaltos Subtropicais: o Caso do Sul do Brasil Dissertação de Mestrado apresentada na FFLCH da Universidade de São Paulo - USP, ago/1997
Legenda - - - - - Cavado Crista - Frente fria A - Alta pressão B - Baixa pressão Fig. 1 - Condicionantes meteorológicas para a trajetória continental do Anticiclone Polar
Legenda J - Jato - Frente fria A - Alta pressão B - Baixa pressão Fig. 2 - Condicionantes meteorológicos para a trajetória marítima do Anticiclone Polar