K. B. Viera, Contribuição do Sector Florestal a Economia Moçambicana, Maputo,

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DESTAQUE RURAL Nº 6 16 de Maio de 219 COBERTURA FLORESTAL DO CORREDOR DA BEIRA Mélica Helena Chandamela e João Mosca 1. INTRODUÇÃO Apesar da grande extracção que se observa em Moçambique e em África, o contributo do sector florestal nas economias africanas (segundo estudos da FAO, dos anos 199 a 6) é menor comparado a outras zonas do globo: África representa apenas 3% do valor acrescentado e exportações globais. 1 Em Moçambique, conforme Marzoli (7), a floresta ocupa cerca de 4,1 milhões de hectares do território nacional. O objectivo principal deste Destaque Rural é o de abordar alguns aspectos da exploração florestal no país. Estão presentes no texto dados estatísticos do desflorestamento no corredor da Beira, a partir dos quais se procura compreender quais os factores principais da evolução da cobertura florestal. Faz-se, no fim, um breve resumo e apresentam-se algumas sugestões sobre possíveis opções de políticas públicas. Como sugestão geral central, propõe-se que a análise da floresta e as opções de políticas sejam interdisciplinares, onde os aspectos económicos, sociais e culturais não podem ser secundarizados. 2. A DESFLORESTAÇÃO NO CORREDOR DA BEIRA O decréscimo da área florestal observado em Moçambique pode ser justificado pelos seguintes factores: (1) exploração concentrada em poucas espécies para fins comerciais e de consumo (geralmente as espécies de maior valor económico); (2) exploração florestal sem licença; (3) exportação de madeiras preciosas e de primeira classe sem ou com pouca transformação; (4) corte de madeira com diâmetro inferior ao determinado por espécies; (5) não cumprimento dos limites de corte permitidos por operador; (6) corte em zonas de conservação e ecossistemas frágeis 2 ; (7) agricultura itinerante; e, (8) aumento da área agricultada devido ao crescimento demográfico. 3 Os gráficos a seguir demonstram a cobertura florestal e agrícola no corredor da Beira entre os anos 1 e 216 (com destaque para alguns distritos com variações mais acentuadas). Os tipos florestais representados são a floresta decídua e Miombo, a floresta sempreverde e o Mopane. 1 K. B. Viera, Contribuição do Sector Florestal a Economia Moçambicana, Maputo, 214. 2 Idem 3 A. Sitoe, A. Salomão e S. Wertz-Kanounnikoff, O Contexto de REDD+ em Moçambique: Causas, Actores e Instituições, Publicação Ocasional, vol. 76, 212. 1

As árvores constituintes da floresta decídua (trepadeiras, entre outros tipos) perdem suas folhas como um mecanismo contra a desidratação. São usadas para fins decorativos, medicinais, para obtenção de madeira, de infusões, etc. 4 As florestas de Miombo são importantes para a subsistência das populações rurais. Para além da madeira, várias das suas espécies florestais fornecem produtos não madeireiros, como frutas, mel, caça (carne), forragem para gado e lenha. 5 A madeira de Mopane é uma das mais duras da África Austral e é difícil de a trabalhar devido à sua dureza, sendo essa é a razão da sua resistência à térmites. Por esta razão, tem-se recorrido ao seu uso para a construção. Têm sido usadas para fins medicinais. A madeira também é usada para fazer carvão e madeira braai. 6 As árvores da floresta sempreverde são assim chamadas por manterem as folhas durante todo o ano, inclusive no período de seca. Eles são, na sua maioria, árvores altas e de madeira dura. Ocorrem em uma ampla gama de zonas climáticas e incluem árvores como coníferas, carvalho vivo e azevinho em climas frios, eucaliptos e acácias em zonas mais temperadas, e árvores da floresta tropical em zonas tropicais. As árvores são usadas para obtenção de madeira, polpa de celulose, medicamentos, decoração, etc. 7 Não obstante a grande variedade, a exploração para fins energéticos (obtenção de lenha e carvão), bem como para fim comercial, é concentrada em poucas espécies: mais de metade do volume de madeira explorada é pertencente a ( ) Chanfuta, Umbila e Panga-panga ( ). O estudo refere que 85% do consumo é distribuído em 3 espécies, Chanfuta, Umbila e Jambirre. 8 Gráfico 1 Área Desflorestada por tipo e Área utilizada na agricultura - total do corredor da Beira 9 4 [Online]. Disponível: http://www.agencia.cnptia.embrapa.br/agencia16/ag1/arvore/ag1_67_911585234.html. [Acedido 11 Abril 219]. 5 Bruce M Campbell (1996). The Miombo Transition: Woodlands & Welfare in Africa, CIFOR, ISBN 979-8764-7-2 Standard reference on the description & uses to which animals and man put these savanna woodland; [Online]. Disponível: https://www.worldwildlife.org/ecoregions/at76. [Acedido 15 Abril 219]. 6 Oppong, C.K., Addo-Bediako, A., Potgieter, M.J. & Wessels, D.C.J. 21.Nymphalbehaviour and lerp construction in the mopane psyllid Retroacizziamopani (Hemiptera: Psyllidae). African Invertebrates 51: 21-25. 7 [Online]. Disponível: http://www.expert-eyes.org/green.html. [Acedido 12 Abril 219]. 8 K. B. Viera, Contribuição do Sector Florestal a Economia Moçambicana, Maputo, 214. 9 Dados obtidos no Inventário Nacional de Florestas, em 219 2

Indicam-se a seguir, nos gráficos, o desflorestamento nos distritos com maiores áreas desflorestadas. Gráfico 2 Báruè Gráfico 3 Búzi 3 3 2 2 Gráfico 4 Gondola Gráfico 5 Nhamatanda 2 Como é possível verificar nos gráficos acima, existe uma relação estreita entre o aumento das áreas agricultadas e a redução das áreas cobertas. A floresta é uma fonte de rendimento e parte dos sistemas de produção agrários; com a expansão das áreas agricultadas, por efeito demográfico (e não pelo aumento das áreas médias por exploração 1 ), e devido à agricultura itinerante, vastas áreas são sistematicamente desflorestadas. Os troncos obtidos do corte das árvores são aproveitados para lenha, na construção (casas, cercados, etc.), ou na produção de carvão, e nos três casos para consumo e venda. Após a queima, o solo torna-se mais fértil durante 3 a 6 anos, baixando rapidamente nos anos seguintes, o que obriga à abertura de novos campos 11 (agricultura itinerante). No corredor da Beira, além do efeito demográfico e da agricultura itinerante, existe muita extracção de madeira para a produção de carvão para abastecimento dos centros urbanos, sobretudo Beira e Chimoio e das grandes vilas ao longo do corredor. Ultimamente, parte do carvão consumido em Maputo provém das províncias de Manica e Sofala. O acesso fácil aos mercados, devido à rede viária e dos caminhos-de-ferro ao logo do corredor, facilita esse negócio. 1 A. Sitoe, A. Salomão e S. Wertz-Kanounnikoff, O Contexto de REDD+ em Moçambique: Causas, Actores e Instituições, Publicação Ocasional, vol. 76, 212. 11 [Online]. Available: https://enxada.com/artigos/que-agricultura-itinerante. [Acedido em 24 Abril 219]. 3

Em 212, o consumo de combustíveis lenhosos nos centros urbanos foi estimado em 257 mil metros cúbicos e nas zonas rurais, em mil m 3. A produção foi de 169 mil sacos de carvão vegetal em, sendo de cerca de 1,1 milhão de sacos em 9. A produção de carvão ensacado tem sido superior ao volume licenciado, sendo que este representa apenas de 1% a 5% da produção total (Del Gatto, 3). Quanto ao processamento local, as serrações são abastecidas de madeira obtida por licenças simples (cerca de %), concessões florestais e compra a terceiros (DNTF, 5). Grande parte da madeira usada nas carpintarias é obtida no mercado informal. Entre e 9, houve um aumento de 34 serrações e carpintarias no país, tendo aumentado também a produção de produtos como travessas, parquet e folheado, vendidos no mercado nacional e internacional 12. O número de concessões florestais também tem aumentado ao longo dos anos. Dados da DNTF (213), revelam que a média da área de concessões, no princípio da década de 7, era de 1.231 hectares, contra os actuais 39.98 hectares. De acordo com o relatório anual da DNTF de 9, 55% das concessões florestais possuíam planos de maneio. Esta entidade defende que uma das razões para tal facto tem sido a falta de capacidade financeira de grande parte dos operadores nacionais para a realização dos inventários florestais detalhados e planos de maneio. 13 A legislação prevê que a exploração florestal para consumo próprio seja permitida às comunidades, em qualquer época do ano, com o benefício de isenção da taxa de exploração florestal. Apesar de ser um factor positivo, devido às condições económicas das comunidades, pode levar à exploração florestal desregrada e insustentável. O volume de consumo doméstico de combustíveis lenhosos ocorre nas zonas rurais como também nas zonas urbanas e é elevado devido ao baixo acesso à energia eléctrica e a outras fontes de energia. Segundo os resultados do IDS (211:22), mais de 8% da população moçambicana utiliza lenha para confecção de alimentos. Por sua vez, o carvão vegetal é usado numa percentagem de 15% em zonas urbanas, e 3,4% nas zonas rurais. O comércio ilegal de produtos florestais é outro factor de desflorestação acelerada. No caso de Moçambique, é sobejamente conhecido o corte, a comercialização e a exportação ilegal de madeira. A cadeia de valor entre o corte e a exportação inclui os cortadores contratados nas comunidades, por líderes e outros agentes económicos locais, o transportador dos toros e os parques de recepção da madeira nas cidades portuárias para exportação, geralmente de propriedade de empresários chineses. Este fenómeno afecta negativamente, não só a conservação e sustentabilidade do recurso florestal, como reduz os impostos a serem pagos e as receitas em divisas devido às exportações não declaradas. Conforme se observa no gráfico abaixo, os valores registados pelo Banco de Moçambique são bastante inferiores quando comparados aos da FAO. Esta diferença pode ser justificada por diferentes formas de ilegalidade, como, por exemplo: exportação não declarada; subfacturação; classificação inferior da madeira reduzindo o valor da exportação e o pagamento de impostos. Grandes quantidades de madeira poderão estar sendo exploradas ilegalmente sem qualquer respeito pelos padrões ambientais estabelecidos para a sustentabilidade das florestas. 12 K. B. Viera, Contribuição do Sector Florestal a Economia Moçambicana, Maputo, 214. 13 Idem 4

Valor (Milhões USD) Gráfico 6 Valores de exportação de produtos florestais, em milhões de USD 14 4 3 1 2 3 4 5 6 7 8 9 21 211 212 213 214 215 216 FAO Banco de Moçambique 3. RESUMO Os gráficos apresentados no texto revelam claramente a relação entre o declive das áreas desflorestadas e o aumento das áreas de exploração agrícola. Pode-se, num primeiro momento, sugerir que o crescimento demográfico e a agricultura itinerante são factores principais da desmatação nos locais estudados. Os distritos do corredor da Beira são importantes abastecedores de carvão e outros materiais florestais para o centros urbanos, que não possuem alternativas de outras fontes energéticas e que sejam mais baratas. O crescimento da população em centros urbanos é outro factor do aumento rápido do consumo de materiais florestais. Pode-se questionar sobre os critérios de autorização de licenciamento a agentes económicos para as diferentes actividades relacionadas com a floresta. O ritmo do aumento de licenças deve ser verificado sobre a capacidade produtiva da floresta considerado o uso sustentável do recurso. O gráfico das exportações indica a existência de mercados e exportações não contabilizadas, o que pressupõe, certamente, uma extracção de madeira cima da licenciada, circuitos de tráfico, corrupção e perdas importantes para o erário público e para as receitas em divisas. 4. SUGESTÕES Considerando os factores que mais influenciam a desflorestação, é necessário encontrar soluções para a grave evolução do sector florestal. As soluções implicam medidas integradas e cujos resultados são de médio e longo prazo. Destacam-se as seguintes: Redução dos factores que implicam a necessidade das práticas de agricultura itinerante, em consequência da perda de fertilidade dos solos e do baixo rendimento por hectare. Neste âmbito, é importante conhecer o desempenho da floresta nos sistemas agro-florestais e no rendimento das famílias. Este conhecimento parece ser fundamental para que as políticas encontrem alternativas de aumento de produtividade e de rendimento das famílias, considerando também a gestão sustentável da floresta. A agricultura itinerante e a sobreexploração da floresta pelas comunidades 14 Gráfico elaborado pela autora com recurso aos dados da FAO e do Banco de Moçambique 5

em contexto de pobreza, aliado aos fenómenos migratórios, transformam o camponês de guardião em predador da natureza. O crescimento da população em Moçambique tem vindo a incrementar, atingindo, segundo o último censo, cerca de 4% ao ano, com zonas de mais de 7% de crescimento demográfico. É necessário compreender as razões socioeconómicas e culturais das taxas elevadas e encontrar soluções integradas que incluam as economias familiares (aumentos de rendimento, emprego, formação, saúde, etc.). Em sentido mais amplo, a exploração sustentável da floresta não deve estar dissociada das medidas de redução da pobreza. É importante o reforço da capacidade de gestão e fiscalização das instituições públicas relacionadas com a cadeia produtiva da madeira, incluindo as exportações. Formação e preparação das comunidades para: (1) a negociação com agentes económicos externos e internos e com instituições públicas; (2) o empoderamento das comunidades para retirar da floresta, de forma sustentável, recursos que aumentem os seus rendimentos e a dieta alimentar; (3) capacitar as comunidades para exigirem e receberem os valores conforme a legislação das florestas e de outros recursos (minas). Este pequeno texto procurou revelar que a floresta está relacionada com a agricultura, com o rendimento das famílias e de agentes económicos integrados em cadeias de valor, com o conjunto da economia e com a participação e empoderamento das comunidades. Não há soluções (políticas e medidas) sustentadas sem o conhecimento e intervenções interdisciplinares. Os resultados com medidas estrictamente técnicas estão condenados a não se alcançarem os objectivos pretendidos. A recuperação das áreas desmatadas exige medida urgentes. Sugerem-se as seguintes 15 : Interdição de uso do toro: está interdito o uso do toro, produto madeireiro principal, da Chanfuta, Umbila e Panga-panga, para fins energéticos. Porém, exceptuam-se os toros sem aproveitamento industrial madeireiro, segundo a legislação. Esta normativa tem sido pouco respeitada. Reclassificação de espécies de 1ª categoria: a classificação do Mondzo, do Chanato, do Pau-Ferro e da Muaga na primeira classe foi a razão do número reduzido de exportações em 7, segundo a DNTF (7). Esta pode ser uma opção eficaz para conservação das espécies de grande procura e valor. Sistemas de gestão de recursos: a criação de Conselhos Locais de Gestão de Recursos é importante para garantir a protecção, conservação e promoção de uso sustentável dos recursos, assim como a participação das comunidades locais na exploração e benefícios. Até 211, 14 milhões de meticais foram doados a 861 comunidades neste âmbito DNTF (211). Nestes conselhos participam membros das comunidades, o Estado a nível local e organizações não-governamentais. É importante rever a utilização destes recursos para que revertam efectivamente em benefícios para as comunidades. Reflorestamento: a área com potencial de reflorestamento no país é de 7.85.436 de hectares, nas províncias de Niassa, Zambézia, Nampula, Manica e Sofala (MINAG, 212). Entre 9 e 211, o sector privado realizou 93% do reflorestamento em Moçambique (41.33 hectares) e o governo, 2.973 hectares. Porém, apesar do aumento da área reflorestada ao longo do tempo, os números continuam baixos em relação ao potencial. 15 K. B. Viera, Contribuição do Sector Florestal a Economia Moçambicana, Maputo, 214. 6