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Transcrição:

O PROCESSO DE FORMAÇÃO DA REGIÃO SUL DO PARÁ: A TRAJETÓRIA DE GRUPOS DISTINTOS NUMA ÁREA DE FRONTEIRA DA AMAZONIA BRASILEIRA Vania Vaz (Pesquisadora, bolsista PNPD/Capes- PPG- História/ Unicentro) Palavras chave: Amazônia, conflitos, terras Este trabalho apresenta parte do processo de formação da região sul do Estado do Pará, a área faz divisas com os estados do Mato Grosso e de Tocantins integrando a mesorregião do sudeste paraense. Assim, o artigo apresenta parte da trajetória dos principais grupos que contribuíram diretamente para a constituição dessa região, destacando principalmente as dinâmicas de ocupação que ocorreram nos municípios de: Conceição do Araguaia, Redenção, Cumaru do Norte, Santa Maria das Barreiras e Santana do Araguaia.

2 Mapa do Sul do Pará e suas fronteiras com Mato Grosso, Norte de Goiás. DIVINO, Uiramar. Dez/2011 Adecol Topografia e Agrimensura. Redenção - PA. Grande parte desse estudo foi realizado durante a elaboração da tese de doutorado, apresentada ao programa de pós-graduação do Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília, intitulada: A Formação dos Latifúndios no Sul do Estado do Pará: Terra, Pecuária e Desflorestamento. O estudo sobre os grupos que marcaram a trajetória da região sul do estado do Pará contribuiu para elucidar as diferentes dinâmicas, não só do uso da terra, mas também de apropriação da terra nessa área de fronteira da Amazônia brasileira. Os grupos sociais, que contribuíram diretamente para formação do sul do estado do Pará destacaram-se principalmente por suas características sócio-culturais, bem como, por suas estratégicas e ambições específicas quanto à necessidade de ocupação da região. O grupo pioneiro no processo de ocupação era formado por sertanejos de cultura

3 pastoril. Os sertanejos partiram do Maranhão, cruzaram o norte do território goiano, atual estado do Tocantins e ocuparam áreas de pastagens naturais próximas à margem paraense do rio Araguaia, nos últimos anos do século XIX e passaram a dividir o território com os indígenas Kayapós e outras tribos vizinhas. Mapa de Conceição do Araguaia e os povos indígenas vizinhos. Fonte: Audrin (1946, p.70). Mapa Original: Arquivo dos Missionários dominicanos em Toulouse - France.

4 O grupo de sertanejos praticava a pecuária de modo rústico e etinirante, um modo de vida; cultura, tradição e trabalho sempre estavam envoltos a questão do manejo e da criação de animais, principalmente de bovinos 1. Apesar disso, questões ligadas ao meio natural e principalmente a terra passaram a incorparar seus anseios, relacionados a necessidade de encontrar áreas livres das disputas violentas de fazendeios e/ou posseiros. Nessa época, em muitas áreas do Maranhão e de Goiás eram frequentes as disputas de terras, geralmente com conflitos armados. Assim, surgiram pequenas aglomerações de famílias principalmente no extremo norte goiano, distantes de qualquer núcleo populacional. E nesse trabalho, fazemos menção a um grupo de famílias que cruzaram o rio Araguaia e chegaram ao território paraense, levando algumas cabeças de gado em rústicas embarcações. Esses sertanejos estavam decididos a continuarem o modo de vida tradicional de seus antepassados, baseado essencialmente na atividade pecuária itinerante, sem a necessidade do uso formal e contínuo da mesma terra. De certa forma, esse isolamento da frente sertaneja pastoril, não se prolongou por muito tempo. Pois no mesmo período, missionários franceses, pertencentes a Ordem Dominicana de Toulouse - França, estavam no Brasil e procuravam levar a catequese para algum grupo indígena. Tal ordem religiosa foi criada em 1216 e somente chegam ao Brasil no ano 1861, concentrando suas atividades em regiões interioranas de Minas Gerais e Goiás, mesmo com a escassez de grupos indígenas a época, para evangelizar (SANTOS,1996). E foi somente em outubro de 1896, que dois os freis Gil Villanova e Ângelo Dargainaratz, baseados no seminário de Minas Gerais, iniciaram um longo e desafiador trajeto na busca de tribos indígenas para catequizar. Deslocaram-se até o porto fluvial de Leopoldina 2, seguiram o rio Araguaia, passaram a Ilha do Bananal e no final desse mesmo ano encontraram uma aldeia de sertanejos, com cerca de 30 cabanas e uma 1 Aos moldes da Grande Civilização do Couro tão bem denominada e ilustrada por Capistrano de Abreu (1998). 2 Porto de Leopoldina, atualmente região do município de Aruanã - GO.

5 rústica capela, já em águas paraenses do rio Araguaia (AUDRIN, 1946; SANTOS, 1996). Assim o grupo recém-chegado ao sul do Pará, passa a dividir o território com a missão dominicana 3. Segundo Tapie (1926), a partir da autorização dos superiores na França, agilizaram as primeiras tarefas e as modestas construções. A missão religiosa no estado do Pará transformou-se no mais distante e também no mais perigoso posto dos Dominicanos no Brasil, pela complexidade do meio natural e pela precariedade das vias de acessos e de comunicação. E mesmo com algumas baixas de religiosos por mortes acidentais ou por doenças tropicais, persistiram com a missão. O gradativo processo de instalação foi um de certa forma, conflituoso no novo território, principalmente marcado pela disputa da atenção dos índios com frente pecuarista. Pois os sertanejos rapidamente perceberam o potencial da nova região e na ânsia de rapidamente ampliar o rebanho, em terras livres e com água em abundância, arriscaram atrair homens indígenas para o trabalho, geralmente oferecendo pequenos utensílios ou cachaça, como troca nas relações de trabalho. No entanto, os relatos sobre cotidiano da missão religiosa dos dominicanos, contribuíram para quebrar muitos paradigmas sobre a habitual vida nesse sertão amazônico. O isolamento, característica tão comum em relatos sobre tal realidade, não foram um ponto negativo e sim uma oportunidade de ampliação da produção de bovinos. Leonardi (2006) discute que esses afastamentos característicos de pequenas comunidades ou até de famílias, podem em algumas situações gerar hostilidade, mas principalmente oportunizam em muitas situações, a hospitalidade e as relações de confiança e amizade. Outro dilema para a missão foi o comportamento do grupo de índios quando já estavam convencidos de buscar a salvação de suas almas por meio da catequese. Para Audrin (1946), os índios tentaram ganhar variados objetos e utensílios dos missionários, mas também passaram a exigir boas recepções, principalmente com carne 3 A relação entre religiosos e indígenas, não são o cerne dessa discussão, entretanto foi necessária a imersão em alguns trabalhos específicos sobre essa relação para levantar o maior número de informações e fontes sobre a relação desses dois grupos, com os demais, a exemplos dos sertanejos, extrativistas e camponeses.

6 bovina fresca, farinha e rapadura quando precisavam ir até o núcleo da missão, para receber ensinamentos ou entregar as crianças indígenas aos cuidados dos religiosos. Entretanto por mais que as diferenças culturais e principalmente religiosas tenham proporcionado conflitos e resistências, em diferentes esferas, quanto ao uso do território e das relações de poder entre índios, sertanejos e dominicanos; as rápidas e agressivas transformações a partir da década de 1950 é que vão desenhar as novas formas de ocupação de terras nessa área. Nos anos finais da década de 1950 chegou à região uma frente impactante, formada principalmente por profissionais liberais e empresários com conhecimentos em produção pecuária ou em corretagem de grandes imóveis rurais, provindos principalmente do estado de Goiás. Ou com experiências em processos de colonização no interior de São Paulo e no Paraná. Assim, a principal intenção era legalizar, junto ao governo do estado do Pará, áreas imensas, com o intuito primário de realizar especulação imobiliária. O outro grupo foi formado por empresas de capital nacional ou estrangeiro, que instalaram fazendas na região a partir do ano de 1964. Essas organizações empresariais aproveitaram as oportunidades de fomento para desenvolver grandes projetos agropecuários, tornando toda a região um imenso polo desse modelo de ocupação. O governo brasileiro preocupado em levar progresso até região, fez um chamado a essas empresas para contrubuírem para o desenvolvimento local. Todas essas frentes que chegaram ao sul do Pará marcaram a trajetória, a cultura e os costumes locais, a própria fundação do primeiro núcleo populacional, a vila paraense de Conceição do Araguaia, em abril de 1897, estabeleceu um marco. Os sertanejos mais católicos e devotos permaneram muito próximo à vila, enquanto outros procuraram outras áreas de pastagens naturais, fundando inclusive novas localidades, a exemplo da comunidade de Pau D Arco. Essa comunidade foi área de pesquisa de campo na década de 1950 do antropólogo Carlos Antônio de Moreira Neto, o qual publicou um importante trabalho: A Cultura Pastoril do Pau d Arco, realizado em um importante momento de transição da região, a década de 1950. E mostrou-se imprescindível para refletir sobre as diferenças e sobreposições das perspectivas dos diferentes grupos que atingiram o sul

7 do Pará. Em suas análises foi possível perceber os distintos momentos do processo ocupacional. Desde a fase inicial de expansão das áreas de pastagens naturais em território de domínio indígena, até mesmo as mudanças no uso das terras em decorrência do grande volume de áreas tituladas, a partir de 1958, momento que marcou o fim da pecuária em áreas abertas. Assim esse novo modelo de frente de expansão, a partir dos anos finais da década de 1950 foi ilustrado pelo estudo de algumas fazendas. A Fazenda Santa Tereza, área titulada desde 1958/1959 nos municípios de Redenção e Cumaru do Norte e de propriedade da família Lanari da cidade de São Paulo e a Fazenda Cristalino, instalada em 1978/1979 situada nos municípios de Santana do Araguaia e Santa Maria das Barreiras, propriedade do Grupo Volkswagen do Brasil. Torna-se importante frisar que as movimentações políticas e econômicas que ocorram em território nacional nas décadas de 1940 e 1950 entusiasmaram essas novas frentes pioneiras. São praticamente inexistes os registro sobre as áreas atingidas por pastagens naturais, cobertas pelas novas áreas tituladas e com estabelecimentos rurais privados em moldes do centro sul brasileiro. Contudo, não faltam diferentes conflitos de terras, com os mais variados tipos de disputas entre: populações indígenas e fazendeiros, fazendeiro e fazendeiros, posseiros e fazendeiros, etc. Mais do que estudar as diferentes consequências dos conflitos agrários, as reflexões sobre as diferentes frentes de expansão permitem diferencia-las pelas formas de uso e ocupação do território e, consequentemente, pelo impacto socioambiental nessa área de transição entre o Cerrado e a Amazônia no sul do Pará. Outra característica marcante desses conflitos foram os choques socioculturais dos diferentes grupos, principalmente sobre as concepções sobre o novo e o antigo, o moderno e o atrasado, o tecnológico e o rústico; mas principalmente sobre o espaço público e o espaço privado. Provavelmente, o grande motor desse intenso processo de ocupação da região foi o processo e a divulgação de algumas políticas para a ocupação do interior do território nacional. Destacando-se ações como a Expedição Roncador-Xingu (VILLAS BOAS, 1994), a Fundação Brasil Central e o projeto da conclusão da rodovia Belém-Brasília. É um grande desafio tentar apresentar parte da história da ocupação do território

8 amazônico, mais do que uma história do meio natural e do uso da terra, existiu uma trajetória de sobreposições de frentes de ocupação. Cada uma a seu modo, usou e se apropriou de áreas utilizando as mais diferentes estratégias, estabelecendo diferentes relações de poder e imposição frente aos grupos locais. Referencias bibliográficas ABREU. Capistrano de. Capítulos da História Colonial. Ministério da Cultura. Fundação Biblioteca Nacional. Departamento Nacional do Livro. Brasília, 1998. AUDRIN, J.M. Entre índios e sertanejos do norte. Rio de Janeiro: Edições Pugil, 1946. LEONARDI, V. P. B. Entre Árvores e Esquecimentos. História Social nos sertões do Brasil. Brasília: Editora UnB, Paralelo 15 editores, 1996. MOREIRA NETO, C. A. A cultura pastoril do Pau D Arco. Boletim do Museu Paraense Emilio Goeldi Antropologia, Belém, n. 10, mar. 1960. SANTOS, E. A. Os Dominicanos em Goiás e Tocantins (1881-1930). Dissertação. Mestrado em História das Sociedades Agrárias. Goiânia, UFG, 1996. TAPIE, P. M. Chez les peaux-rouges- Feuilles de route d um missionaire dans le Brésil inconnu. VILLAS BOAS, C.; VILLAS BOAS, O. A marcha para o Oeste. São Paulo: Globo, 1994.